O conflito entre a Rússia e a Ucrânia, iniciado em 2022, tem origem na formação histórica desses países e na disputa por territórios economicamente estratégicos.
Entre os principais motivos para a invasão da Ucrânia pela Rússia (em fevereiro de 2022), estão:
- Conflitos separatistas no leste da Ucrânia (com maioria da população de ascendência russa) — nas províncias de Donetsk e Luhansk, reconhecidas como independentes por Putin.
- Aproximação da Ucrânia com o Ocidente — a possibilidade do país fazer parte da Otan e da União Europeia.
Ao longo dos séculos, a Ucrânia fez parte de impérios, sofreu inúmeras invasões, foi incorporada pelos russos e pelos soviéticos, se tornou independente, mas nunca resolveu por completo sua relação com a Rússia.
A queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria provocaram a diminuição da influência da URSS e a consolidação da hegemonia estadunidense. Por meio da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), os Estados Unidos aumentaram sua influência política e cultural em diversos lugares.
Nesse contexto, muitos países do leste europeu conquistaram sua independência, como a Ucrânia, em 1991. No entanto, o país continuou sob a influência da Rússia, que considera o território estratégico, tendo em vista o acesso ao Mar Negro e os oleodutos e os gasodutos que passam pela região.
A Rússia aumentou sua influência no cenário internacional a partir da década de 2000, quando Vladimir Putin assumiu a presidência do país. Ele tem como uma das estratégias de ascensão econômica do país as parcerias comerciais com os países ex-membros da URSS e a China – o último atualmente se configura como principal parceiro econômico da região – além do domínio do Mar Negro e da produção de gás natural para abastecer o continente europeu.
Em 2014, o ex-presidente da Ucrânia, o líder pró-russo Viktor Yanukovych, foi deposto após uma série de protestos. Isso levou a Rússia a buscar o aumento do controle sobre a região da Crimeia, território ucraniano. Com a independência da Ucrânia em 1991, a Rússia ficou com o controle de uma base naval na região, sede da Frota do Mar Negro.
Nesse mesmo ano, com 95,5% de aprovação dos eleitores da Crimeia, a região foi anexada ao território russo, em um referendo que foi considerado ilegal pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido por ter sido realizado sem a presença de observadores internacionais. Desde então, as relações geopolíticas entre a Ucrânia e a Rússia ficaram mais tensionadas. Com a anexação da Crimeia, a região tem sido um ponto de disputa geopolítica entre a Rússia, a Ucrânia, países europeus e os Estados Unidos.
A região de Donbass tem minorias que pedem a separação da Ucrânia e anexação à Rússia e, por isso, é considerada outra zona de conflito. O argumento é que a formação cultural, econômica, social e política estão mais próximas à Rússia. Após a anexação da Crimeia, os movimentos separatistas se intensificaram na região de Donbass, exigindo autonomia política. Esses movimentos tiveram apoio militar da Rússia e foram fortemente reprimidos pelo governo ucraniano.
A região de Donbass
A partir de 2014, a Ucrânia passou a vivenciar um período de profunda crise econômica, social e política. Entre os motivos que contribuíram para essa instabilidade, no final de 2013, por pressões da Rússia, o governo do então presidente ucraniano Viktor Yanukovych recusou assinar um acordo de livre-comércio com a União Europeia – possibilidade que, caso fosse concretizada, a afastaria da influência russa –, optando pela assinatura de um tratado de assistência econômica oferecido pela Rússia no qual, inclusive, era proposta a redução de 30% no preço do gás russo fornecido à Ucrânia.
Tal desistência foi o estopim para que se intensificassem as manifestações contrárias ao governo do presidente Yanukovych em várias regiões da Ucrânia, e provocou, sobretudo na porção ocidental do país, a sua destituição, a realização de novas eleições e o estabelecimento de um novo governo, que contava com o apoio das potências ocidentais e, ao mesmo tempo, prometia afastamento da influência russa.
Os desdobramentos desse episódio foram graves para a Ucrânia, pois a deposição do governo pró-Rússia não foi bem recebida em todo o país, ocasionando o fortalecimento de movimentos separatistas em sua porção leste. Especificamente, isso ocorreu nas regiões de Donetsk e Lugansk, que abrangem cerca de um terço da região de Donbass, densamente povoada – com cerca de 6 a 7 milhões de habitantes –, e que é considerada o coração industrial da Ucrânia por concentrar metalúrgicas, termelétricas e empresas de extração de carvão mineral. De 2014 a 2021, nas duas regiões, ocorreram acirramento de tensões e embates militares entre as forças militares ucranianas – com o apoio dos Estados Unidos e de outros países – e os separatistas – com o apoio da Rússia –, resultando em mais de 14 mil pessoas vitimadas pelos conflitos. Nesse período, vários acordos firmados entre Rússia e Ucrânia (Acordos de Minsk I e II), com a participação de outros países, não foram capazes de colocar um fim à guerra civil.
As relações entre Rússia e Ucrânia se deterioraram ainda mais em 2019, com a eleição de Volodymyr Zelensky à presidência da Ucrânia, que sempre declarou a intenção de se alinhar à Europa.
Em 2022, o governo da Ucrânia anunciou a sua intenção de ingressar na OTAN como estratégia para se desvincular da influência russa. A Ucrânia anunciou, também, uma abertura em um dos canais fluviais mais importantes geopoliticamente para o Leste Europeu, além de abrir espaço para uma aproximação da influência estadunidense.
A presença militar da OTAN no leste da Europa ameaça a influência russa na região, o que provocou o descontentamento do presidente Vladimir Putin. Em fevereiro de 2022, o governo russo reconheceu formalmente a independência das zonas separatistas das autoproclamadas repúblicas populares de Lugansk e Donetsk e as tropas russas cruzaram a fronteira, levando a uma enorme crise diplomática internacional.
A invasão militar da Ucrânia
E apoiando-se na justificativa de que elas estavam sob a ameaça de uma invasão militar da Ucrânia e que um genocídio estaria ocorrendo contra a população civil russa, ele determinou a ofensiva militar contra a Ucrânia em larga escala, em 24 de fevereiro daquele ano, considerando esses territórios como seu principal objetivo militar.
Diante da ofensiva militar russa, Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido e muitos outros países condenaram a decisão unilateral do governo russo e providenciaram de imediato sanções econômicas à Rússia.
Assim que o conflito teve início, graves sanções foram aplicadas à Rússia, entre as quais se destacam o congelamento de bens do presidente Putin, membros do governo e empresários; restrições ao acesso da Rússia aos mercados e serviços financeiros e de capitais da União Europeia; fechamento do espaço aéreo e dos portos da União Europeia a aeronaves e navios russos; suspensão das importações de petróleo e carvão provenientes da Rússia; proibição da exportação de bens e tecnologias para a produção de petróleo e de realização de novos investimentos no setor energético russo.
O estabelecimento dessas sanções foi a maneira encontrada pelas potências ocidentais de evitar um confronto direto com a Rússia, o que certamente levaria a uma guerra de proporções sem precedentes, inclusive com a utilização de armas nucleares.
Tal situação, segundo analistas internacionais, poderia levar a reviver o ambiente de Guerra Fria, quando ainda existia a União Soviética e sua disputa com os Estados Unidos e seus aliados por áreas de influência no mundo. Na verdade, essa questão em andamento trata-se novamente de disputa geopolítica: a Rússia não quer perder a sua área de influência sobre a Ucrânia e não aceita que ela faça parte da Otan – que é entendida pelo governo russo como uma ameaça às suas fronteiras –, nem que seja integrante da União Europeia, fatos, esses, desejados pelos Estados Unidos e por muitos países da Europa.
Na opinião de vários especialistas, no entanto, esses e outros conflitos em que a Rússia tem se envolvido na região mostram claramente o projeto político e estratégico implementado pelo presidente Vladimir Putin, que, há vários anos, governa a Rússia. Esse projeto consiste em reincorporar ao território russo parte dos territórios que, no passado, formavam a antiga União Soviética.
Essas sanções levaram a economia russa a uma profunda recessão. Mas o conflito entre os dois países causou impactos no mundo todo, percebidos rapidamente. São eles:
- Crise alimentar. Em 2021, a Ucrânia produzia 15% do milho e 12% do trigo comercializados no mundo. Com a guerra, o país não pode exportar o que já havia produzido e as novas safras foram reduzidas. Como resultado, os preços dos grãos e de alimentos básicos aumentaram, levando milhões de pessoas à insegurança alimentar.
- Crise energética. Em 2021, a Rússia era um dos líderes mundiais na exportação de gás natural, petróleo e carvão. A União Europeia, que importou 45% da produção de gás e 25% de petróleo, começou a estudar possibilidades para reduzir a dependência da Rússia. O embargo ao petróleo russo fez com que os preços da commodity disparassem, aumentando o preço dos combustíveis em muitos países.
A invasão russa no território ucraniano provocou intensos conflitos armados. De acordo com a Armed Conflict Location & Event Data Project (Acled), até julho de 2022 mais de 10 mil pessoas já haviam morrido em decorrência do conflito. E, segundo o Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), o número de pessoas que fugiram da Ucrânia para escapar da invasão da Rússia passou de 6 milhões, o que configura a pior crise de refugiados na Europa desde o fim da Segunda Guerra Mundial.
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