terça-feira, 23 de julho de 2024

Formas e sistemas de governo

Conceitos e características

Forma de governo e sistema de governo são conceitos semelhantes, mas com características específicas. A forma de governo define o modo de atribuição da soberania, o tipo de relações entre o poder e a comunidade e as finalidades que o próprio Estado cumpre. O sistema de governo refere-se à titularidade, às formas de exercício e às relações entre os órgãos que exercem a função de direção política do Estado.
O sistema de governo é condicionado pela forma de governo, em função da qual age e depende. Cada forma de governo – monarquia, autocracia ou democracia – comporta diferentes sistemas de governo.

Sistemas democráticos de governo

Existem quatro categorias básicas de sistemas democráticos de governo: o sistema parlamentarista, o sistema presidencialista, o sistema semipresidencialista e o sistema diretorial.
O sistema parlamentarista
Este sistema ou modelo é de criação britânica e foi-se formalizando progressivamente desde a Revolução Gloriosa de 1688, com o impulso democratizante do regime político, até que se estabeleceu com as reformas eleitorais iniciadas em 1832. O processo evolutivo para a consolidação deste sistema caracteriza-se pela progressiva perda de poder do monarca em funções de direção política, que passa principalmente para o parlamento. Ainda que o sistema parlamentarista apresente diferentes modalidades, há uma série de características comuns nos Estados que utilizam esse formato governamental.
— Distinção entre o chefe de governo, em quem se concentra a titularidade da função política, e o chefe de Estado, com funções moderadoras e arbitrais, sem responsabilidade política, uma vez que não intervém diretamente no processo político.
— A titularidade do poder executivo é concebida como emanação permanente do parlamento, em virtude de uma relação de confiança entre ambos. No sistema parlamentarista, o governo necessita da confiança do parlamento para governar.
— Controles políticos de responsabilidade, que permitem ao parlamento obrigar o governo a demitir-se por meio de determinados mecanismos previstos para esse fim, como a moção de censura – iniciativa do parlamento – ou o voto de confiança – iniciativa do próprio governo. Por outro lado, o governo pode dissolver arbitrariamente o parlamento, convocando novas eleições.
— Inexistência de separação estrita de poderes, levando em conta a previsão de mecanismos de colaboração entre o governo que representa a maioria parlamentar, e que conta com a sua confiança para exercer as respectivas funções, e o parlamento. Existe a possibilidade de que o governo participe na função legislativa, que em teoria corresponde ao parlamento.
O modelo parlamentarista é muito frequente em países de tradição liberal democrática. Pode ser encontrado em monarquias (como o Reino Unido, Bélgica, Países Baixos, Suécia, Espanha etc.) e em repúblicas (Itália e Alemanha).
O sistema presidencialista
Modelo no qual o chefe de Estado e o parlamento são eleitos direta ou indiretamente pelos cidadãos. Em consequência disso, ambos os poderes têm legitimidade popular direta. Essa forma de governo encontra-se em países como os EUA e o Brasil.
É característico do sistema de governo presidencialista, no qual o chefe de Estado também é o chefe de governo. O presidente nomeia os seus ministros, que são os dirigentes administrativos dos seus ministérios, além de conselheiros e colaboradores do presidente, a quem corresponde a decisão política.
O presidente é eleito pelo voto popular e não está vinculado por uma relação de confiança ao poder legislativo, ou seja, ao parlamento ou, neste caso, ao congresso. Os congressistas e o governo, cujos membros não podem integrar o parlamento nem o congresso (salvo o vice-presidente dos EUA, que é presidente do senado), convivem de forma independente, recebem separadamente a legitimação popular e funcionam também separadamente, sem que haja nenhuma relação de subordinação.
O parlamento, ao qual corresponde exclusivamente a função legislativa, não pode ser dissolvido e nem afastado do exercício das suas funções pelo presidente. No entanto, o parlamento supervisiona as atividades do governo e o seu parecer deve ser levado em conta nas suas iniciativas ou nomeações, enquanto o presidente, por outro lado, pode vetar as leis aprovadas pelo parlamento.
As principais características do modelo presidencialista são:
— Apresenta uma concepção monocrática do poder executivo, ao contrário do modelo parlamentarista, que tem um conceito dualista de executivo.
— O sistema presidencialista caracteriza-se por uma separação formalmente rígida de poderes que o distingue claramente do sistema parlamentar.
— Não existem mecanismos no parlamento que permitam exigir responsabilidade política direta do presidente, que só poderá ser afastado das suas funções no caso de ocorrer crime de responsabilidade, mediante um processo específico de acusação (impeachment).
O sistema semipresidencialista
O sistema semipresidencialista constitui um modelo teorizado, sobretudo, a partir da Constituição da V República Francesa (1958). Portugal aproxima-se do modelo francês, protótipo do sistema semipresidencialista, por intermédio da Constituição Portuguesa de 1976.
Nele, o parlamento tem uma ação parcial na formação do governo, já que, na sua designação e cessação, intervém igualmente o chefe de Estado. O governo, consequentemente, deve contar com a confiança tanto do chefe de Estado quanto do parlamento.
O chefe de Estado ou presidente da República é eleito por sufrágio universal, participa de atribuições do poder executivo e partilha com o governo a faculdade de dissolver o parlamento, que, por sua vez, controla a atividade do governo, podendo derrubá-lo por meio de um voto de censura.• O sistema diretorial
Neste sistema, cujo único exemplo atual é o da Suíça, o governo é um órgão de execução de decisões políticas que emanam de uma assembleia. Esta assembleia intervém exclusivamente na formação do governo, um diretório (conselho federal), dado que elege individualmente os membros para um dado período e indica ao executivo as linhas dos programas de atuação.
Neste modelo, o governo é submetido à assembleia, que, por sua vez, responde politicamente perante o eleitorado nas seguintes eleições legislativas. O governo partilha a iniciativa legislativa com a assembleia e os seus membros têm acesso a ela, podendo participar nos debates. Não existe voto de confiança nem moção de censura. O governo não é derrubado em caso de conflito, sendo obrigado pelo parlamento a alterar a sua linha política.

As formas de governo autocráticas

Embora os distintos tipos de autocracia apresentem traços específicos, todos eles repetem certos padrões comuns: o chefe de Estado não é escolhido pelos cidadãos, não existe nenhum mecanismo legal por meio do qual a oposição possa chegar ao poder, os três poderes não se encontram separados, ainda que o possam simular, e o governo tende a tomar decisões arbitrárias que julga necessário. É frequente, além disso, que as autocracias recorram ao culto da personalidade ou exaltação do grupo que detém o poder, de forma a reforçar a sua posição.
Monarquia absoluta
As monarquias absolutas consideram o rei como a personificação da soberania. Esta forma de governo tem como objetivo primordial controlar o governo de forma total, impedir a existência de poderes alternativos e reivindicar o direito ilimitado de governar. Tal concepção do poder costuma ter uma raiz teológica. Neste caso, considera-se que o rei tem procedência divina, de modo que aquele que se rebela contra a coroa estará na verdade rebelando-se contra Deus. Esta forma de governo, cuja liderança é de caráter hereditário, foi muito habitual em quase todos os países europeus até o séc. XVIII, e atualmente resiste na maioria dos países da península Arábica, que, após o processo de descolonização, foram controlados pelas famílias mais poderosas e, segundo a tradição, descendentes do profeta Maomé.
Nas monarquias absolutas não existe liberdade de expressão nem de comunicação, já que um pacto tácito entre governados e governante outorga a este último a autoridade de fazer o que considera mais oportuno para a manutenção da ordem e da paz.
Ditadura militar
No caso do Sudão, por exemplo, que é uma das numerosas ditaduras militares africanas, o general Omar Hassan Ahmed al-Bashir sublevou-se em 1989, suspendeu a Constituição e dissolveu o parlamento para criar um governo transitório de "salvação nacional" em face da situação de guerra no país. No entanto, Al-Bashir não só permaneceu no poder sem possibilidade de substituição, como também forjou eleições de forma a conferir contornos democráticos à ditadura. O caso do Sudão reflete outra constante das autocracias militares: o chefe de Estado e de governo são a mesma pessoa, que elege arbitrariamente o Conselho de Ministros e é abertamente anticomunista. A maior parte das ditaduras militares é de caráter reacionário, antiliberal e autoritário, e caracteriza-se pela militarização da vida civil e por um forte nacionalismo de teor marcial que tende a enaltecer os valores militares e, concretamente, a exaltar o grupo que detém o poder, que vê a si mesmo como salvador e garantidor da paz e da ordem. O Brasil esteve submetido a uma ditadura militar entre 1964 e 1985.
Ditadura pessoal
A ditadura pessoal é uma forma de governo em que o poder é detido e monopolizado por uma única pessoa. Apesar de ter origem em revoluções de caráter fascista, comunista ou militar, as ditaduras pessoais caracterizam-se pela absoluta submissão da razão de Estado – e, consequentemente, dos três poderes – às decisões de um único indivíduo que, em muitas ocasiões, está cercado por uma estrutura política falsamente democrática de forma a outorgar legitimidade ao que, na realidade, é uma derivação ideológica do absolutismo.
Frequentemente, a proteção deste poder unipessoal é mobilizada por meio de propaganda, da afirmação de que o principal mandatário é um salvador que se sacrifica para salvar o seu povo de catástrofes políticas derivadas do modelo liberal. Neste caso, a legitimação de um governo não democrático realiza-se, quase sempre, por meio da exaltação do nacionalismo e da transformação da oposição política em crime passível de punições geralmente não oficializadas. No Brasil, Getúlio Vargas governou ditatorialmente entre 1937 e 1945.
Ditadura de partido
A ditadura de partido, salvo algumas exceções, tem origem em revoluções de caráter comunista. Segundo esta doutrina, que prega uma organização igualitária a partir da posse coletiva dos meios de produção, o único modo de superar a luta de classes e as desigualdades do Estado burguês é a ditadura do proletariado, uma forma de governo autocrática que garantiria a igualdade de todos os cidadãos antes da passagem para um verdadeiro Estado comunista. Deste modo, seria do proletariado enquanto classe e, por extensão, do Partido Comunista, que emanaria a soberania detida pelo indivíduo nas democracias burguesas. No entanto, o que segundo a teoria marxista deveria ser uma ditadura transitória transformou-se, na ex-URSS, nos seus países satélites, na China e em alguns outros Estados, em um regime autoritário baseado no sacrifício da liberdade individual e no poder ilimitado do Partido Comunista, que deveria garantir a igualdade, mas que pune severamente qualquer expressão de desacordo.



Divisão dos poderes

Os três poderes

O Estado constitucional baseia-se na divisão material de funções e na separação formal de poderes. Por essa razão, na atividade comum do Estado, distinguem-se três funções: a de aprovação de leis (legislativa), a de executar os mandatos contidos nas leis (executiva) e a de resolver os conflitos que possam surgir da sua aplicação e interpretação (judicial). Para assegurar uma certa especialização no exercício de tais poderes e evitar sua concentração, o constitucionalismo atribui cada uma destas três funções a diferentes órgãos: a função legislativa é atribuída aos parlamentos; a executiva é atribuída aos governos e à administração; e a judiciária é atribuída ao conjunto de órgãos que controlam a justiça.
A divisão de poderes que estabelece a atual estrutura política dos estados democráticos de direito conta com pouco mais de dois séculos de história e é consequência direta da Revolução Francesa, que conduziu à prática os ideais do Iluminismo e conseguiu afastar os esquemas de poder do absolutismo. Nas monarquias absolutistas, o poder estava concentrado nas mãos do rei, o único depositário da autoridade. Desse modo, só o rei podia julgar ou fazer julgar, e era ele quem decidia quando e onde era conveniente a aplicação da justiça, visto que os juízes se subordinavam a ele.
A divisão de poderes, defendida por autores como Montesquieu, formalizou-se na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que proclamava que a nação desprovida de uma declaração de direitos individuais e de separação de poderes não tinha uma verdadeira Constituição. A Revolução Francesa estendeu a ideia de que a soberania reside na nação, da qual emanam todos os poderes.
Após a Revolução Francesa, os juízes passaram a estar apenas submetidos às leis, o que, no moderno Estado constitucional, implica a independência de quem julga, que não deverá estar submetido a nenhuma ordem ou instrução que possa afastá-lo da estrita aplicação da lei. No entanto, além da independência dos que julgam, conseguiu-se o reconhecimento da independência do poder judiciário como poder de Estado, com uma esfera de autogoverno que tanto o poder executivo como o legislativo devem respeitar.
Sendo o Brasil um Estado de direito democrático, também a divisão de poderes é um princípio consagrado na Constituição da República.

O poder judiciário

O poder judiciário é um poder do Estado. Além disso, a função de administrar a justiça, que corresponde aos juízes e magistrados, constitui um serviço público derivado do monopólio estatal do poder jurisdicional.
É integrado por um conjunto de órgãos – tribunais de vários tipos e instâncias – encarregados de administrar a justiça. Essa função consiste em julgar e fazer executar as sentenças decididas em qualquer julgamento, mediante a aplicação do direito. Isso é necessário sempre que surjam conflitos entre os cidadãos ou entre estes e os poderes públicos.• A independência do poder judiciário e o seu alcance
Do princípio de separação de poderes deriva a necessidade de os órgãos investidos da função jurisdicional serem distintos dos titulares das decisões políticas que emanam dos poderes legislativo e executivo. Essa independência se verifica mediante uma série de mecanismos de caráter orgânico, funcional, assim como das garantias de estatuto pessoal do juiz.
Fala-se de independência orgânica sempre que se faz referência à não intromissão do governo na organização e administração dos tribunais. De uma perspectiva funcional, a independência é a própria essência da função jurisdicional e está relacionada com outros princípios, como o de unidade e o de exclusividade jurisdicional.
A função judicial está nas mãos de um conjunto de juízes magistrados independentes e imparciais, submetidos apenas à Constituição e às leis que determinam a aplicação da justiça, sobre os quais não se pode exercer nenhum tipo de pressão ou manipulação.
No que se refere ao estatuto pessoal do juiz, estabelecem-se uma série de garantias para velar pela sua independência tanto orgânica como pessoal: a inamovibilidade, a reserva da lei para os pressupostos de separação, suspensão, transferência e reforma, assim como o estabelecimento de um rígido sistema de incompatibilidades que chega ao ponto de impedir a sua filiação a partidos e organizações sindicais.• A organização da administração da justiça
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal, que forma a cúpula do poder judiciário, tem como função primordial a defesa do cidadão contra o arbítrio. Entre suas atribuições, tem a de interpretar e aplicar a Constituição federal e decidir os litígios entre a União e estados estrangeiros, a União e os estados federados e dos estados entre si. Os outros órgãos do judiciário são o Superior Tribunal de Justiça que, entre suas atribuições, tem a de julgar crimes comuns cometidos por governadores dos estados e outras autoridades; os tribunais regionais federais e juízes federais; os tribunais e juízes do trabalho; os tribunais e juízes eleitorais; os tribunais e juízes militares; e os tribunais e juízes dos estados e do Distrito Federal. Existem ainda Juizados Especiais cíveis e criminais, para causas de menor complexidade.
O poder legislativo
Desde que John Locke (1632-1704) e Montesquieu (1689-1755) formularam a teoria da divisão de poderes, o poder legislativo tem sido atribuído ao parlamento, o qual, todos os regimes democráticos, assume a função legislativa e encarna a representação nacional, sendo os seus membros designados por um processo de eleição baseado no voto igualitário, livre e secreto dos cidadãos.

Em alguns países esse órgão é conhecido por assembleia, em outros por congresso, corte etc. Contudo, independe da nomenclatura que receba, o parlamento é um colegiado formado por um vasto número de membros, eleitos pelos cidadãos, em sua representação. Em geral, sua composição se renova periodicamente, variando entre dois a seis anos, segundo o sistema político adotado. No Brasil, o mandato de deputado federal é de quatro anos e o de senador, de oito. O poder legislativo pode ser composto por uma só câmara ou por duas. A maior parte dos Estados opta por um parlamento bicamaral, formado por uma câmara alta (no Brasil, o Senado) e uma câmara baixa (Câmara dos Deputados), que geralmente é a mais importante. Adotam esse sistema países como a Alemanha, a Itália e a Espanha, onde cabe ao parlamento, como órgão titular do poder legislativo, eleger o chefe do poder executivo. Esses regimes são ditos parlamentaristas.

No sistema político democrático parlamentarista existe uma separação de poderes atenuada, já que há mecanismos de colaboração entre eles, sobretudo entre o governo e o parlamento. Este elege o chefe de governo, que pode ser destituído por meio de alguma moção de censura ou se perder o apoio da maioria parlamentar que lhe permitiu chegar ao poder.
No sistema político democrático presidencialista, adotado pelos EUA e pelo Brasil, existe uma divisão de poderes muito mais estrita. O poder executivo, dirigido por quem assume a dupla função de chefe de Estado e de governo, não necessita do apoio parlamentar para governar, pois o chefe do poder executivo não é eleito pelo parlamento mas sim pelos cidadãos.

O poder executivo

O poder executivo é essencialmente atribuído ao governo, no qual o presidente (que pode ou não coincidir com o chefe de Estado, segundo as diversas formas de governo) ou o primeiro-ministro ocupa o papel central. Abaixo do governo situa-se a administração pública, que também é considerada elemento integrante do poder executivo.
À parte, deve-se destacar o caráter residual do poder executivo em relação aos outros poderes do Estado liberal democrático: o legislativo e o judiciário. Historicamente, a esfera de competência dos demais poderes, sobretudo do legislativo, foi-se alimentando das competências que anteriormente tinham pertencido ao monarca, de modo que este passava a conservar apenas aquelas que não tinham sido atribuídas expressamente a outros órgãos, como sucedia nas monarquias limitadas, ou só as que lhe atribuía a Constituição, como sucedia nas monarquias constitucionais.
Com o tempo, essas competências residuais do monarca passaram a ser exercidas por um órgão, o governo, que se tornou o titular do poder executivo. Juntamente com o governo, destaca-se a administração pública, um poder público com personalidade jurídica própria que também exerce funções executivas. Importa distinguir dois tipos fundamentais de executivos: monistas e dualistas.
Os executivos monistas, com um órgão que exerce toda a função executiva, é característico dos sistemas presidencialistas inspirados no dos EUA, nos quais o chefe de governo e o chefe de Estado são a mesma pessoa. Nesses sistemas, o presidente representa e simboliza o Estado, dirigindo também a política governativa. Encabeça o poder executivo e, para desenvolver a sua tarefa executiva, nomeia livremente ministros e/ou secretários, aos quais delega funções. O presidente pode ser eleito diretamente pelos cidadãos, quando estes escolhem um entre vários candidatos, ou indiretamente, quando os cidadãos elegem delegados que, por sua vez, escolhem a pessoa que deve ocupar a presidência.
Nos executivos dualistas, o chefe de governo distingue-se do chefe de Estado, que é o presidente da República – como em Portugal, Itália, Alemanha e Irlanda – ou o monarca – como no Reino Unido, Espanha, Suécia, Noruega e Dinamarca. Esses executivos são característicos da maior parte dos países europeus de tradição parlamentarista.
No sistema parlamentarista, ao chefe de Estado correspondem funções políticas arbitrais e de alta representação, ao passo que as funções propriamente executivas são atribuídas ao governo. Uma das funções mais importantes do chefe de Estado é a de nomear o chefe de governo.
Nesses países, portanto, o poder executivo é encabeçado pelo chefe de governo, que pode receber diversas denominações segundo os estados – primeiro-ministro em Portugal, chanceler na Alemanha, presidente do governo na Espanha – e deve contar com o apoio de uma maioria parlamentar que lhe permita formar governo. Em princípio, o chefe do governo, que normalmente é o líder do partido que ganhou as eleições, nomeia e destitui livremente os membros que farão parte do governo, ou seja, os ministros.
Também os países com sistema presidencialista, como a França, têm um executivo dual, mas com algumas particularidades: existe um presidente, eleito pelo povo e dotado, além de poderes simbólicos, também de importantes funções executivas; e um primeiro-ministro, indicado pelo presidente mas eleito por maioria no parlamento, também com funções executivas. Nesse sistema, o parlamento influencia apenas parcialmente o nascimento de um governo, já que o chefe de Estado ou presidente da República intervém também na sua nomeação e na cessação das suas funções. O governo necessita, portanto, da confiança do chefe de Estado e do parlamento.
Finalmente, na Confederação Helvética (nome oficial da Suíça), existe o chamado sistema diretorial, no qual a Assembleia Federal (Parlamento), que consta de duas câmaras – o Conselho Nacional e o Conselho dos Estados –, elege todos os membros do executivo (Conselho Federal), em um total de sete, para um mandato de quatro anos. Cada um dos membros do Conselho Federal é responsável por um ministério. Nesse sistema, o governo não passa de um órgão de execução: executa as decisões políticas, que têm como único titular a Assembleia.




Direito: concepção e ramos

O direito é um fenômeno social que atua dentro de um determinado grupo com a finalidade de regular as ações dos membros desse mesmo grupo. No entanto, o direito é também um conjunto de normas que regula as relações sociais, um conceito herdado da tradição clássica e cristã.

Direito e moral não devem ser confundidos. O direito estabelece deveres externos e regula as ações que afetam o bem-estar de terceiros ou lhes causam prejuízos. Por outro lado, a moral é formada por um conjunto de normas que procedem do próprio indivíduo e que se referem a ações nas quais intervém o próprio sujeito, já que, quando estas repercutem no outro, entram no campo do direito.• Direito público e direito privado
O direito divide-se tradicionalmente em dois ramos: direito público e direito privado. Entretanto, a sua distinção nem sempre é fácil.
Em linhas gerais, designa-se por direito público o conjunto de normas que regulam o funcionamento do Estado, assim como as relações entre este e os particulares. Nas relações de direito público existe uma superioridade ou autoridade do Estado sobre os cidadãos.
Por outro lado, o direito privado é o conjunto de normas que regula as relações entre particulares, como relações familiares, contratuais, de propriedade, sucessórias, hereditárias, etc., em que todas as partes que intervêm são juridicamente iguais.
Existem diversos ramos que pertencem ao direito público. No campo externo podemos colocar o direito internacional público, que regula a situação e atividade do Estado como membro da comunidade internacional, assim como as relações que estabelece com outros Estados ou organizações internacionais.
No âmbito do direito público interno encontram-se o direito político, o direito constitucional, o direito administrativo, o direito penal e o direito processual.
O principal ramo do direito privado é o direito civil, conjunto de normas que regulam as relações entre particulares, considerados como pessoas em geral.
Outro ramo do direito privado é o direito comercial, conjunto de normas que regulam as relações jurídicas derivadas da atividade comercial, assim como a organização e atividade profissional dos empresários no mercado.
O direito internacional privado estipula como resolver os conflitos que se colocam quando algum elemento estrangeiro intervém em uma relação. O sistema de direito internacional privado de cada Estado estabelece quando os seus tribunais são competentes para julgar estas relações com elementos estrangeiros e qual é o direito aplicável a relações entre pessoas de diferentes nacionalidades.
A prática do direito
Os profissionais de direito, ou juristas, estão presentes em muitos momentos da vida prática do direito: intervêm nos processos de elaboração das normas (concebendo e prestando assessoria na redação de novas leis), nos processos de execução das normas (por exemplo, como pessoal a serviço de vários órgãos da administração pública, assumindo a responsabilidade de comprovar se as atuações administrativas respeitam as normas a que estão sujeitas), nos processos de interpretação e aplicação do direito (seja como juízes, procuradores e advogados) ou dotando de segurança a atividade jurídica e as relações patrimoniais (como os tabeliães e os escrivães).
O advogado é um profissional liberal cuja função é a condução e defesa dos direitos e interesses públicos e privados alheios, sobretudo nas causas levadas a tribunal.
Os procuradores são agentes do Ministério Público, e entre eles inclui-se o procurador-geral da República e o vice-procurador geral da República. Aos demais procuradores compete representar o Ministério Público nos tribunais de segunda instância (procuradores gerais adjuntos) ou nos tribunais de primeira instância (procuradores da República e delegados do procurador da república), entre outras funções.
As carreiras de tabelião e escrivão (registro civil, de títulos e documentos e de imóveis) são duas outras opções tradicionais no âmbito do direito. O tabelião intervém em atos, contratos e negócios jurídicos extrajudiciais que se refletem em escrituras públicas que lhes conferem autenticidade, permitem a conservação de originais e possibilitam a emissão de certidões relativas ao seu conteúdo.
Os escrivães de registro civil, de títulos e documentos e de imóveis dirigem cartórios de registro nos quais registram, perante terceiros, determinadas situações de relevância jurídica. Os escrivães de registro de imóveis dão fé pública de situações jurídicas relativas à propriedade e aos direitos reais sobre imóveis. Os escrivães de registro de títulos e documentos dão fé pública de circunstâncias que afetam os comerciantes e as sociedades comerciais, ao passo que os escrivães de registro civil dão fé de circunstâncias relacionadas, por exemplo, com os casamentos, nascimentos, óbitos, etc.
Os juízes e magistrados são funcionários da administração da justiça aos quais corresponde julgar e fazer cumprir o que se decide em julgamento.
Os escreventes ou serventuários da Justiça são funcionários que exercem a fé pública judicial, prestam assistência aos juízes nas suas funções e encarregam-se da gestão e organização de todos os procedimentos judiciais.
A filosofia do direito
A filosofia do direito é a disciplina científica que estuda as causas e os fundamentos do direito. Atende, em princípio, aos problemas jurídicos com absoluta independência de todo ordenamento jurídico concreto.
A filosofia do direito analisa normalmente a realidade jurídica de três pontos de vista diferentes. Em primeiro lugar, o direito é um fato social, de modo que o seu estudo deve ser feito a partir da perspectiva da sua ocorrência em sociedade. Uma das condições essenciais do direito é o seu caráter social. O direito, além de um fato social, também é norma, regra de conduta obrigatória. Esta característica não tem lugar em outros fatos sociais não normativos.
Por último, o direito deve ser também visto enquanto valor: o fato social e normativo é valioso, ou seja, é portador de valores (particularmente do valor da justiça) que se projetam sobre a realidade social.

Direito internacional

O direito internacional é um conjunto de normas que regulam diferentes setores da realidade fora das fronteiras de um Estado. Divide-se em direito internacional público e direito internacional privado.
Direito internacional público
Em direito internacional público podem ser criadas normas por meio, sobretudo, de três mecanismos: as convenções ou tratados internacionais, o costume ou prática internacional e os princípios gerais do direito.
— Os tratados internacionais são acordos de vontade entre sujeitos de direito internacional com o objetivo de produzir efeitos jurídicos.
— O costume internacional é a expressão de uma prática seguida geralmente por sujeitos de direito internacional público, prática essa da qual deriva a convicção de se acharem perante o direito.
— Os princípios gerais do direito são princípios comuns dedutíveis das normas convencionais (tratados), das consuetudinárias (costume) ou dos ordenamentos jurídicos dos Estados, que são aplicáveis no âmbito internacional. Estes princípios servem para solucionar casos concretos que não estejam previstos em nenhuma norma internacional.
Os atos unilaterais dos Estados são uma declaração de vontade de um só sujeito de direito internacional, que produz efeitos para o sujeito que a emite e, em determinados casos, também para terceiros. A maior parte das organizações internacionais pode emitir resoluções das quais derivem direitos e obrigações internacionais. A jurisprudência (formada por decisões dos tribunais internacionais) e a doutrina (a opinião dos juristas na matéria sobre temas de direito internacional público) são meios auxiliares para interpretar e aplicar as regras internacionais.
A aplicação do direito internacional público em cada Estado necessita de uma incorporação ou recepção do mesmo nos direitos destes. As normas do direito interno estabelecem como se integra o direito internacional público nos direitos internos de cada Estado e quais são os órgãos e os procedimentos internos que devem ser seguidos para que cada Estado participe na formação das normas internacionais.
A subjetividade internacional consiste na capacidade de ser titular direto e imediato de direitos e deveres reconhecidos pelo direito internacional público. O principal sujeito da sociedade internacional é o Estado, que se caracteriza por quatro elementos: território definido, população estável, organização política ou governativa e soberania.

As organizações internacionais como, por exemplo, a Organização das Nações Unidas, são sujeitos internacionais não estatais, dotados de personalidade internacional e criados pelos Estados por meio de tratados internacionais que delimitam o alcance da sua atuação. Outros sujeitos semelhantes às organizações internacionais são os movimentos de libertação nacional, os movimentos beligerantes e a Santa Sé.
Na sociedade internacional existem outros agentes que, apesar da sua importância, são desprovidos de personalidade internacional. Por um lado, o indivíduo tem direitos humanos tanto em nível internacional como regional. As empresas transnacionais têm filiais ou sucursais em muitos países do mundo e a sua importância para o direito internacional reside no fato de que, do ponto de vista econômico, a sua relevância é superior à de muitos países em desenvolvimento, com os quais muitas vezes estabelecem acordos sobre exploração de recursos naturais.
As organizações não governamentais (ONG), de número crescente, atuam na sociedade internacional sem fins lucrativos. Pretendem conseguir que sejam cumpridos objetivos de interesse geral, sobretudo relativos aos direitos humanos ou ao meio ambiente.
Apesar de ser mais difícil aplicar o direito internacional público que o direito interno dos Estados, quando um Estado viola o direito internacional, causando danos, existem mecanismos de aplicação do direito internacional público que são basicamente medidas de pressão, cujo objetivo primordial é o de assegurar o cumprimento do ordenamento jurídico internacional. Estas medidas estão normalmente reguladas em tratados internacionais ou em resoluções de organizações internacionais.
Os meios de aplicação das medidas internacionais podem ser unilaterais (por exemplo, a ruptura de um Estado com outro), ou medidas coercitivas de uma organização internacional para restaurar o respeito do direito internacional público (por exemplo, as medidas que o Conselho de Segurança da ONU pode adotar em caso de ameaça ou de ruptura de paz e atos de terrorismo).
O direito internacional privado
O direito internacional privado é o setor do direito de cada Estado que se ocupa da regulação jurídica das relações privadas internacionais. Este tipo de relação é pessoal e transcende as fronteiras nacionais ou, dentro de um mesmo Estado, as de uma comunidade com direito próprio. Atualmente há um evidente incremento das relações privadas internacionais, como resultado dos movimentos de trabalhadores, dos deslocamentos derivados da cultura do turismo e da globalização da economia.
Não existe um direito internacional privado único para todos os países. Para salvaguardar a relatividade do direito internacional privado foram postas em prática diversas medidas, tais como a unificação de vários Estados mediante convenções ou tratados internacionais de direito internacional privado.

A matéria ou objeto que regula o direito internacional privado são as relações entre sujeitos privados que apresentam um ou vários elementos estrangeiros. O elemento estrangeiro nestas relações jurídicas consiste em qualquer dado presente na relação que não esteja relacionado com o país cujos tribunais se encarregam do assunto.
As relações jurídicas reguladas são privadas quando nelas intervêm sujeitos particulares, ou um sujeito de direito público (como um Estado ou uma organização internacional) que atua como particular e não exerce funções estritamente públicas nem faz uso de prerrogativas. As partes estão numa situação de igualdade.
O direito internacional privado estrutura-se em três grandes setores: a competência judicial internacional, o direito aplicável às relações privadas internacionais e a validade extraterritorial dos atos e das decisões de autoridades e órgãos judiciais estrangeiros.
— A competência judicial internacional: em primeiro lugar, as normas de competência judicial internacional determinam que tribunal, e sob que condições, é competente para resolver determinada situação privada internacional.

O direito aplicável: em segundo lugar, uma vez determinado o tribunal competente para solucionar um litígio, coloca-se outro problema: o direito de qual Estado deverá ser aplicado para resolver as pretensões das partes em conflito.

— O reconhecimento e a execução das resoluções judiciais: finalmente, outro problema que se coloca em direito internacional privado é o do reconhecimento e execução, num Estado, de decisões ou atos estrangeiros relativos a relações privadas internacionais.

Existem Estados cujo ordenamento jurídico se compõe de uma pluralidade de sistemas jurídicos: estes estados têm ordenamentos jurídicos plurilegislativos e, de acordo com a sua estrutura, distinguem-se em Estados federais e Estados do tipo regional. Os Estados federais pertencem a uma federação de Estados soberanos, cada um dos quais tem a sua própria organização judicial e o seu direito, razão pela qual, tal como no direito internacional privado, se colocam problemas de competência judicial, de direito aplicável e de validade de resoluções ditadas por autoridades de outros Estados.
Nos Estados de tipo regional existe apenas um Estado soberano que detém uma autoridade política comum, com uma organização judicial única para todo o território estatal. No entanto, dentro deste tipo de Estado existem comunidades que não formam Estados soberanos e que têm um direito privado próprio. Neste caso, só se apresentam problemas de determinação de direito aplicável às relações entre membros de comunidades distintas dentro do mesmo Estado.

Ordenamento jurídico do Brasil

Antecedentes
O direito hispano-português procede diretamente das fontes romana-justiniana, germânica e canônica. O direito romano penetrou na península ibérica no final do séc. III a.C. e se manteve em vigor até a conquista dos visigodos, quando foi introduzida a duplicidade de direitos decorrente do princípio da personalidade das leis. A ocupação muçulmana, a partir do séc. VIII, quebrou a unidade do reino visigótico. Com a reconquista e o fortalecimento do poder real, surgiram tentativas de unificar a legislação e a administração da justiça, principalmente por meio do recurso de outorgar um mesmo foro a diversas cidades.
Deu-se nessa época (fim do séc. XII e séc. XIII), antes na Espanha e depois em Portugal, a recepção do direito justiniano e do direito canônico, com interpretações e comentários elaborados pelos mestres italianos. Essas novas fontes prevaleciam muitas vezes sobre os direitos locais e eram reconhecidas como direito comum vigente, aplicado pelos tribunais.
No intento de unificar o direito na Espanha, Afonso X o Sábio mandou elaborar um código intitulado Lei das Sete Partidas, redigido em meados do séc. XIII por um grupo de jurisconsultos, sob orientação do próprio soberano. As principais fontes em que se inspiraram as Partidas foram o direito romano justiniano, o direito canônico, a glosa ordinária de Acúrsio e os foros e costumes locais de Castela e Leão. Por seu caráter sistemático e profundamente inovador, o novo código não teve força para superar os particularismos dos sistemas locais e o ânimo conservador do povo. Permaneceu por mais de um século sem vigência efetiva.
Desde as primeiras décadas do séc. XII, Portugal já se constituíra como Estado independente. Todavia, a independência política não alterou o sistema jurídico, no qual predominava um complexo de atos dispersos sem unidade orgânica. A convocação das cortes de Coimbra em 1221 resultou na decretação de leis gerais para todo o reino. Na segunda metade do séc. XIII, D. Dinis mandou traduzir do espanhol a Lei das Sete Partidas e fundou a Universidade de Coimbra, onde se passou a ensinar direito romano e canônico.
Começaram a surgir as primeiras tentativas de codificação no início do séc. XV, de que foram sucessivamente incumbidos o chanceler João das Regras, João Mendes Cavaleiro e Rui Fernandes. Com o falecimento do rei D. Duarte, o príncipe-regente D. Pedro encarregou uma comissão de ultimar e rever o trabalho realizado. Essa comissão concluiu sua obra em 1446 e o código, denominado Ordenações Afonsinas, foi promulgado nesse mesmo ano por Afonso V. Além de profundamente impregnadas de direito romano e canônico, as Ordenações receberam influência das Partidas. Dividem-se em cinco livros: o primeiro contém normas de direito constitucional e de organização judiciária; o segundo, uma compilação de concordatas; o terceiro, normas de processo; o quarto, o direito civil; e o quinto, o direito penal.
Após sessenta anos, em 1505, quando D. Manuel ocupava o trono português, iniciou-se a reforma do código afonsino. Conservou-se essencialmente a mesma disposição do código anterior, com a inclusão de todas as leis extravagantes (não codificadas) promulgadas desde 1447 e a introdução de maiores modificações apenas no livro primeiro. As Ordenações Manuelinas, primeiro código do mundo publicado pela imprensa, foram decretadas em 1521.
Filipe I de Portugal (II da Espanha), investido soberano de Portugal, manteve separados os sistemas jurídicos dos dois países. Em 1595 ordenou a compilação de toda a legislação portuguesa com vistas a sua codificação. As Ordenações Filipinas foram aprovadas pela lei de 11 de janeiro de 1603 e se tornaram imediatamente obrigatórias em terras de aquém e de além-mar. Seus cinco livros dispõem sobre direito público; privilégios jurisdicionais, regalias e bens; processo civil e criminal; direito privado; e direito penal. No direito peninsular ibérico estão as fontes do sistema jurídico brasileiro.• O sistema jurídico brasileiro

Derivado do direito lusitano transplantado para o Novo Mundo, o sistema jurídico brasileiro se filia ao chamado grupo continental europeu. Suas raízes históricas estão na península ibérica: é nas instituições do direito luso dos sécs. XVI, XVII e XVIII que se encontra o ordenamento jurídico que esteve em vigor no Brasil durante um longo período. A importância do antigo direito ibérico para o direito brasileiro e sua história pode ser avaliada pela permanência das Ordenações Filipinas, de 1603, em vigor no Brasil durante mais de três séculos. Essa ordem jurídica não foi abalada pela independência política, em 1822, nem pela queda da monarquia, em 1889. Em matéria penal, no entanto, o livro quinto das Ordenações foi revogado pelo código criminal de 1830. Logo depois, o processo penal passou a regular-se pelo código de processo criminal de 1832.
O código comercial e o regulamento 737, relativo ao código de processo civil, datam de 1850. As Ordenações Filipinas, resultantes da tomada de Portugal pela Espanha em 1580 e da profunda alteração do direito português realizada por Filipe II (I de Portugal) com o concurso de juristas portugueses, deram nova organização à justiça e disciplinaram o processo civil e criminal. Só com a vigência do novo código civil brasileiro, redigido pelo jurista Clóvis Beviláqua e promulgado em 1.º de janeiro de 1917, deixaram de vigorar as Ordenações Filipinas. Em 2003 entrou em vigor no Brasil um novo código civil, que deu ao ordenamento das relações sociais uma feição muito mais moderna.
Embora integrado ao grupo continental europeu, o sistema brasileiro adquiriu, notadamente no campo do direito público, características próprias.

Direito de família

O direito de família é o ramo do direito civil encarregado fundamentalmente de regular a relação matrimonial e as relações entre pais e filhos, além das questões conexas, como as da propriedade familiar e a das sucessões. Ao prevalecer, no direito de família, o interesse social sobre o interesse individual, estas normas são, em grande parte, imperativas, para acatar os princípios constitucionais, sobretudo de igualdade.
• O casamento
Os elementos básicos que caracterizam o casamento são o consentimento dos cônjuges, validamente expressos, assim como a vida em comum. O consentimento para efetivar o casamento deve ser expresso no momento da celebração perante a autoridade civil ou religiosa competente para realizar o casamento.
O casamento une os cônjuges numa comunhão de vida que tem efeitos internos para o casal e externos para terceiros. Dos efeitos internos nasce um conjunto de direitos e deveres para ambos os cônjuges. Como deveres consideram-se a convivência, a ajuda, o auxílio mútuo, o respeito, a fidelidade mútua e a obrigação de atuar no interesse da família.

O sistema de livre escolha atribui a mesma eficácia ao casamento religioso que ao civil, de modo que os cidadãos escolhem a fórmula matrimonial que melhor se ajusta às respectivas crenças.
• Anulação, separação e dissolução do casamento
A anulação do casamento implica que este nunca chegou a existir e nunca foi consumado, o que ocorre quando não se cumprem os requisitos exigidos para a celebração de um casamento válido.
As causas de anulação do casamento referem-se a questões excepcionais do casamento, como a falta de consentimento ou o impedimento de idade. As anulações matrimoniais obrigam à constituição de advogado, tal como nos casos de divórcio, e são registradas, após consentimento judicial, no cartório de registro civil. A anulação matrimonial pode ser requerida pelos cônjuges, pelo Ministério Público ou por qualquer pessoa que tenha um interesse legítimo e direto.
A separação matrimonial consiste na cessação da convivência conjugal, sem que, no entanto, haja ruptura do casamento. Pode ser decretada por um tribunal (separação judicial), ou pode se tratar de uma situação real (separação de fato), se não é tramitada por nenhum juízo. A separação judicial de pessoas e bens extingue os deveres de coabitação e assistência, sem prejuízo do direito a alimentos. Permite também o início do processo de divórcio. A reconciliação entre os cônjuges põe fim ao procedimento de separação e deixa sem efeitos posteriores qualquer resolução anterior.
O divórcio determina a dissolução do casamento, pelo que é necessária uma sentença judicial proferida pela vara de família. Para que tenha efeito perante terceiros, a dissolução do casamento por divórcio tem de ser registrada no cartório de registro civil.
Os acordos entre cônjuges devem de ser aprovados por um juiz, que só não o fará caso estes acarretem consequências negativas para os filhos ou sejam gravemente prejudiciais para um dos cônjuges. Na impossibilidade de ambas as partes chegarem a um acordo, o juiz pode tomar, após audiência com os cônjuges, as medidas que considerar convenientes e ajustadas ao direito.
Filiação, responsabilidade parental e tutela
No seio de uma família, as principais relações jurídicas que se estabelecem entre pais e filhos são a filiação, a responsabilidade parental e a tutela.
A filiação é a relação jurídica existente entre uma pessoa e os seus genitores. A relação entre pais e filhos é baseada na figura da responsabilidade parental, que assenta no critério de cuidado e autoridade dos pais sobre os filhos.
A responsabilidade parental caracteriza-se pelo dever dos pais de velar pelos filhos, tê-los na sua companhia, alimentá-los, cuidar deles, educá-los, providenciar-lhes uma formação integral que permita o livre desenvolvimento da sua personalidade, representá-los e administrar os seus bens. Os filhos, por sua vez, devem obedecer aos pais enquanto permanecerem sob a sua responsabilidade. Devem também respeitá-los sempre, assim como contribuir, dentro das suas possibilidades, para as despesas da família enquanto conviverem com ela.
A responsabilidade parental extingue-se pela morte dos pais ou do filho, pela emancipação do filho, pela adoção por terceiros ou por sentença judicial que regule o descumprimento dos deveres próprios da responsabilidade parental. A responsabilidade parental pode ser ampliada se, quando chegar à maioridade, o filho se encontrar em situação de incapacidade.
A tutela é um sistema de proteção de menores e de pessoas incapacitadas que se aplica quando o pai ou a mãe não são titulares da responsabilidade parental. A tutela, tal como a responsabilidade parental, é uma função que se exerce em benefício de quem é tutelado no sentido de supri-la.

Direito do trabalho

O direito do trabalho é o ordenamento jurídico que regula as relações de trabalho pessoal (realizado por quem tenha sido contratado), voluntário, dependente ou por conta própria (e, como tal, remunerado). O direito do trabalho regula as relações entre empresários e trabalhadores dentro da empresa.
O direito do trabalho é um ramo jurídico que vem adquirindo cada vez mais importância. No Brasil, a primeira tentativa de estabelecer um organismo conciliatório foi um decreto de 1907, que regulava a sindicalização. Em 1922, constituíram-se em São Paulo, por lei estadual, tribunais rurais mistos para julgar questões dos contratos de locação de serviços agrícolas.
No plano federal, as primeiras comissões mistas de conciliação foram instaladas em 1932 e limitavam-se aos acordos nos dissídios coletivos e na elaboração das convenções coletivas de trabalho. No mesmo ano, instituíram-se as juntas de conciliação e julgamento, que tinham competência para dissídios individuais. A expressão "justiça do trabalho" apareceu pela primeira vez em lei na Constituição de 1934, com a finalidade de "dirimir questões entre empregadores e empregados, regidas pela legislação social", dispositivo que se manteve na Constituição de 1937. A justiça do trabalho foi organizada por decreto de 1939 e seus órgãos, criados em 1940, instalaram-se em 1941. A partir da Constituição de 1946, a Justiça do Trabalho foi incluída no poder judiciário. Com a criação da Justiça do Trabalho e através do Decreto-lei nº 5.452, baixado pelo presidente Getúlio Vargas, no dia 1º de maio de 1943, foi aprovada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que passou a regular as relações de trabalho entre empregados e empregadores.
A justiça do trabalho no Brasil é constituída pelos seguintes órgãos: Tribunal Superior do Trabalho, tribunais regionais e varas do trabalho.
• Definição e características do contrato de trabalho
O contrato de trabalho consiste num acordo entre o empresário e o trabalhador, através do qual este se compromete a prestar determinados serviços por conta do empresário em troca de uma remuneração. O contrato de trabalho pode ser efetuado por escrito ou basear-se simplesmente na palavra, exceto em alguns casos, como os contratos de estágio ou de formação, que devem ser feitos por escrito.
Segundo a CLT, "contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego (...) O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito e por prazo determinado ou indeterminado".
A entidade empregadora é qualquer pessoa física ou jurídica que recebe a prestação de serviços dos trabalhadores assalariados, assim como das pessoas contratadas por empresas de trabalho temporário cedidas por um período determinado a alguma empresa. O empregador pode ser uma entidade privada (tanto uma pessoa física como uma sociedade mercantil) ou uma entidade pública (dependente do Estado, como o emprego público, por exemplo).
A relação contratual entre empregador e empregado estabelece uma série de direitos e deveres. Entre os vários direitos do trabalhador estão, por exemplo, a liberdade de expressão e de opinião, a preservação da intimidade da vida privada, a proteção de dados pessoais, direito à respectiva integridade física e moral (tal como o empregador), confidencialidade de mensagens, entre outros.
Os deveres do trabalhador são vários também. Segundo o artigo 482º da CLT, o trabalhador tem a obrigação de:
— Agir com probidade;
— Ter um bom comportamento (aquele compatível com as normas exigidas pelo senso comum do homem médio);
— Ter continência de conduta (compatível com a moral sexual e desde que relacionada com o emprego);
— Evitar a desídia (caracterizada como a falta de diligência do empregado em relação ao emprego, nas formas de negligência, imprudência e imperícia, embora haja divergências doutrinárias quanto à inclusão desta última);
— Não se apresentar no trabalho embriagado (embora alguns autores sustentem que a embriaguez habitual deve ser afastada da lei como justa causa para demissão);
— Guardar segredo profissional (quanto às informações de que dispõe sobre dados técnicos da empresa e administrativos);
— Não praticar ato de indisciplina (descumprimento de ordens diretas e pessoais);
— Não praticar ato lesivo à honra e boa fama do empregador ou terceiros, confundindo-se com a injúria, calúnia e difamação;
— Não praticar ofensas físicas, tentadas ou consumadas, contra o empregador, superior hierárquico ou terceiros (quanto a estes desde que relacionadas com o serviço).
E o empregador tem como proibições:
— Exigir serviços superiores às forças do empregado, defesos por lei, contrários aos bons costumes ou alheios ao contrato;
— Tratar o empregado com rigor excessivo (válido para empregador ou por qualquer superior hierárquico);
— Colocar o empregado em situação de correr perigo manifesto de mal considerável;
— Deixar de cumprir as obrigações do contrato (ex: atraso no salário);
— Ofender fisicamente o empregado, salvo caso de legítima defesa própria ou de outrem;
— Reduzir o trabalho por peça ou tarefa sensivelmente, de modo a afetar o salário.
Além do descanso diário e anual, o trabalhador tem direito a férias anuais remuneradas. O período de descanso anual não é acumulável com o período de anos posteriores, assim como também não é permitida a sua compensação econômica total nem a sua redução pelo empregador.
O salário
O salário é a compensação econômica que o trabalhador obtém pela prestação dos seus serviços. Essa remuneração pode ser feita em dinheiro ou, se for previamente acordado, parcialmente em prestações de outra natureza. Qualquer prestação pecuniária deve destinar-se à satisfação de necessidades pessoais do trabalhador ou da sua família.
A todos os trabalhadores é garantido um salário mínimo mensal com o valor que é fixado anualmente pelo governo. Na definição do valor do salário mínimo nacional são ponderados, entre outros fatores, as necessidades dos trabalhadores, a taxa de inflação e a evolução da produtividade. A parte da remuneração satisfeita em prestações não pecuniárias não pode exceder a parte paga em dinheiro.
No ato do pagamento do salário, o empregador deve entregar ao trabalhador um documento no qual conste a sua identificação e o nome completo do trabalhador, assim como o seu número de inscrição na Previdência Social, a sua categoria profissional, o período ao qual respeita a remuneração, discriminando a remuneração-base e as demais prestações, os descontos e deduções efetuados e, por último, o montante líquido a receber. A remuneração deve ser paga no lugar onde o trabalhador presta a sua atividade e, no caso de ser outro esse lugar, o tempo que o trabalhador gastar para receber a remuneração considera-se tempo de trabalho.
O pagamento do salário deve ser feito semanalmente, quinzenalmente ou mensalmente, exceto se acordado de diferente maneira. Se o trabalhador não puder dispor do seu vencimento na data acordada, por culpa a ele inimputável, o empregador fica constituído em mora.
Vicissitudes da relação trabalhista
Durante a vigência do contrato de trabalho podem ocorrer diversas situações que afetem a prestação de serviço normal e que levem à cessação desse contrato. Assim, por exemplo, podem ter lugar algumas das seguintes dispensas:
— Dispensa por fato imputável ao trabalhador: se houver justa causa, isto é, se o comportamento do trabalhador for suscetível de punição e, pela sua gravidade e consequências, tornar imediatamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

Dispensa coletiva: quando a cessação do contrato de trabalho abrange mais de dois trabalhadores simultaneamente e se deve a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos.

Dispensa por extinção do posto de trabalho: a extinção do posto de trabalho pode determinar a dispensa justificada por motivos econômicos, sejam de mercado, estruturais ou tecnológicos.

Dispensa por inadaptação: a inadaptação do trabalhador ao posto de trabalho pode ser causa de dispensa justificada.

É ilícita qualquer dispensa que não seja precedida dos procedimentos previstos em lei, como por exemplo o aviso prévio, que se fundamente em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos ou que invoque justificativa improcedente.
A suspensão do contrato de trabalho pode-se dever à vontade das duas partes ou ser apenas resultado de uma delas e fundamentar-se na impossibilidade temporária, parcial ou total, da prestação do trabalho, quer por fato respeitante ao trabalhador quer ao empregador. Durante a redução ou suspensão mantêm-se os direitos, deveres e garantias das partes na medida em que não impliquem a efetiva prestação do trabalho. O período de suspensão conta para efeitos de contagem de tempo de trabalho e não interrompe o decurso do prazo para efeitos de caducidade, nem impede que qualquer das partes opte por pôr fim ao contrato. Podem ser causas da suspensão do contrato, por parte do trabalhador, a prestação do serviço militar obrigatório ou serviço cívico, doença ou acidente. A redução do período normal de trabalho ou a suspensão do contrato por motivos relacionados com a representação sindical da comissão de trabalhadores não prejudica o direito ao exercício normal dessas funções no interior da empresa.

Barsa Planeta Internacional 2012 

Produção de energia no Brasil

Movimentar máquinas, cargas e pessoas por longas distâncias demanda muita energia. No Brasil, usam-se combustíveis derivados de fontes não r...