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HERBART - E O SISTEMA DA TEORIA EDUCATIVA

  

      Johann Friedrich Herbart, filósofo e educador, nasceu em Oldenburg (Alemanha) no ano de 1776. Morreu em 1841, em Göttingen, depois de uma vida entregue inteiramente à atividade acadêmica. Estudou na Universidade de Jena, onde foi discípulo de Fichte. Não se deixou, no entanto, seduzir pelo idealismo cientista e militante do mestre. em 1797 esteve na Suíça (onde visitou a escola de Burgdorf, dirigida por Pestalozzi). Em 1805 foi professor de Filosofia em Goetingen; mais tarde, em Königsberg, de 1809 a 1833.  As obras pedagógicas mais importantes de Herbart são: Relatórios de um Preceptor, Pedagogia Geral deduzida do fim da Educação, Esboço para um curso de Pedagogia, Lições Preliminares sobre Pedagogia e Ideia de Pestalozzi de um ABC da instrução.

Herbart

    Herbart trouxe grandes contribuições para pedagogia como ciência, emprestando rigor e uma certa cientificidade ao seu  método; foi o precursor de uma psicologia experimental aplicada à pedagogia. Foi o primeiro a elaborar uma pedagogia que pretendia ser uma ciência da educação. Em Herbart, o processo educativo se baseia, em seus objetivos e meios, na Ética e na Psicologia, respectivamente.

    Como teórico da educação, defendeu a ideia de que o objetivo da pedagogia é o desenvolvimento do caráter moral. O ensino deve fundamentar-se na aplicação dos conhecimentos da psicologia. criou o sistema que denominou de instrução educativa. Esse sistema, segundo Lourenço Filho, consiste no ensino que, por "situações sucessivas, bem reguladas pelo mestre, chegasse a fortalecer a inteligência e, pelo cultivo dela, a formar a vontade e o caráter. Propôs por isso que cada lição obedecesse a fases bem estabelecidas ou a passes formais. Seriam eles o de clareza da apresentação dos elementos sensíveis de cada assunto: o de associação à; o de sistematização e, por fim, o de aplicação.

        O sistema da Pedagogia

    Segundo ele, a ação pedagógica se orienta por três procedimentos: o governo, a instrução e a disciplina.
O governo: é a forma de controle da agitação da criança, inicialmente exercido pelos pais e depois pelos mestres, com a finalidade de submeter a criança às regras do mundo adulto e viabilizar o início da instrução.
A instrução, é o principal procedimento da educação e pressupõe o desenvolvimento dos interesses.
O interesse determina quais as ideias e experiências que receberão atenção por parte do indivíduo. Herbart não separa a instrução intelectual da instrução moral, pois para ele, uma é condição da outra. Para que a educação seja bem sucedida é conveniente que sejam estimulados o surgimento de múltiplos interesses.
A disciplina é a responsável por manter firme a vontade educada, no caminho e propósito da virtude, supondo autodeterminação, que é uma característica do amadurecimento moral levando para a formação do caráter que está sendo proposta, ao contrário do governo, que é heterônomo e exterior, mais adequado ao trato com as crianças pequenas.

Método de Instrução

Herbart propõe 5 passos formais que favorecem o desenvolvimento da aprendizagem do aluno:
- preparação: o mestre recorda o que a criança já sabe para que o aluno traga ao nível da consciência a massa de ideias necessárias para criar interesse pelos novos conteúdos;
- apresentação: a partir do concreto, o conhecimento novo é apresentado;
- assimilação: o aluno é capaz de comparar o novo com o velho, distinguindo semelhanças e diferenças;
- generalização: além das experiências concretas, o aluno é capaz de abstrair, chegando a conceitos gerais, sendo que esse passo deve predominar na adolescência;
- aplicação: através de exercícios, o aluno evidencia que sabe usar e aplicar aquilo que aprendeu em novos exemplos e exercícios. É deste modo, e somente deste modo, que a massa de ideias passa a ter um sentido vital, perdendo o aspecto de acumulação de informações inúteis para o indivíduo.

    Com Herbart a história da educação tocou a figura mais importante do século XIX e uma das quatro cabeças diretoras (junto com Comênio, Rousseau e Pestalozzi) da Pedagogia clássica dos Tempos Modernos. Não é sem razão que suas ideias pedagógicas se propagaram, com êxito envolvente, durante toda a metade do século XIX e, ainda que detidas, de um lado pela doutrina neokantiana de Paulo Natorp e a neo-begeliana de Gentile, e, de outro, pela Pedagogia de Dewey e a atividade de Kerschensteiner, ainda contam, depois de formadas, com talentosos e brilhantes defensores.

      Herbart construiu o primeiro sistema da teoria educativa, o primeiro ensaio de grande porte destinado a explicar e fundamentar o complexo e vasto fato educativo num corpo de doutrina. Pode-se dizer, com efeito, que Herbart conseguiu clarificar a turbamulta dos problemas pedagógicos à luz de uma ampla e congruente doutrina, tomando, como antes ninguém o havia feito, a tarefa de uma ciência da educação no verdadeiro sentido do termo, pois seus predecessores (como Locke, Comênio, Rousseau e mesmo Pestalozzi) se haviam limitado a encarar tópicos da educação sem atender a uma exposição de conjunto.

  Herbart não apenas empreendeu o estabelecimento e resolução de alguns problemas. Seu plano de trabalho foi um estudo abrangente e sistemático da vida educativa: desde os temas da Didática especial, na qual se revelou um talento criador, até as questões dos objetivos filosóficos e das relações da educação com a vida e a cultura, tudo tem ajuste pertinente na doutrina.

   Com nítida consciência da tarefa que se propôs, mostrou que, antes de tudo, é preciso diferenciar a Pedagogia como ciência, da arte da educação. "Qual é o conteúdo de uma ciência? Uma coordenação de postulados que constituem uma totalidade de ideias e que, na medida do possível, procedem uns de outros como consequências de princípios e como princípios de fundamentos. Que é arte? Uma soma de habilidades que há de reunir-se para conseguir um determinado fim. A ciência, pois, exige derivar os postulados de seus fundamentos - pensar filosófico; a arte exige atuar sempre apenas de acordo com os resultados daquele; não pode, durante sua execução, perder-se em especulações; cada momento exige sua ajuda; sua resistência apresenta mil pequenos obstáculos."

      "É preciso diferenciar também a arte do educador culto da execução empírica da arte. Aquele sabe tratar toda natureza e toda idade; esta age por acaso, por simpatia, por amor paternal."

  "Qual destes três círculos é o de nosso estudo? Indubitavelmente nos falta a oportunidade para a execução real e, ainda mais, a ocasião para todos os exercícios e ensaios pelos quais unicamente se pode aprender a arte. Nossa esfera é a ciência. Por isso, temos que reflexionar sobre a relação entre a teoria e a prática."

   Ora, qual é o ponto obrigatório de partida de uma teoria pedagógica? O conceito fundamental da Pedagogia é a educabilidade (Bildsamkeit), isto é, a ductilidade e plasticidade do homem para conformar-se com certo modo de vida regida por fins moralmente valiosos. Por isso, a Pedagogia, como ciência, depende da Filosofia prática e da Psicologia. "A Pedagogia mostra o fim da educação; a Psicologia o caminho, os meios e os obstáculos." A tarefa da educação reside em formar o caráter, que, na luta da vida, deve manter-se inquebrantável, e não, precisamente, pela força da ação externa sobre a pessoa, mas graças a uma resoluta e clara atitude moral. "Virtude é o nome que convém à totalidade do fim pedagógico. É a ideia da liberdade interior convertida numa pessoa em realidade permanente." Herbart enfatizou, no Problema moral, a importância decisiva do assentamento prazeroso na decisão da vontade. O homem, como já o havia demonstrado Schiller, deve realizar o bem com íntima e fecunda alegria, com prazer estético. As apreciações e valorizações por íntima e prazenteira inclinação (em sua linguagem, "representações estéticas") incluem, ao mesmo tempo, "o digno, o belo, o moral, o justo; numa palavra: o que agrada em seu estado perfeito, depois de uma contemplação perfeita". Em conjunto, cinco ideias definem, com rigor, este caráter moral que tem em vista a formação humana:

      a) A liberdade interior, vale dizer, a liberdade resoluta e cheia de gozo para desejar o bem.

      b) A plenitude de valores, que propende para a realização de objetivos nobres, cada vez em maior número.

      c) A benevolência, ou seja, querer o bem do próximo.

      d) A justiça, isto é, dar a cada um o que é seu.

      e) A equidade, recompensa e reparação adequadas.

  A estas cinco ideias ou virtudes correspondem, sucessivamente, cinco ideais sociais: uma sociedade de homens livres, um sistema de bens culturais, uma comunidade jurídica, um sistema de ideais e um regime de recompensas e salários equitativos.

     A formação do caráter não é a formação de certa faculdade do espírito, talvez da vontade. Herbart rejeitou "a doutrina das faculdades da alma". É errôneo considerar a alma humana como um agregado de faculdades. A vida psíquica é, para Herbart, um mecanismo de representações. Com tal conceito se aproximou, não pouco, da Filosofia mecanicista da Época das Luzes. "As representações são produzidas por sensações sensíveis e subsistem na alma uma vez que tenha cessado seu motivo exterior. Porém, como devido à estreiteza da consciência somente poucas representações podem chegar a ser conscientes, as demais ficam sob o umbral da consciência, onde, como molas de aço comprimidas, esperam voltar a surgir (reprodução). As representações são, pois, forças que se acham em luta entre si e se contrapõem ou se unem, segundo leis muito determinadas. Nas uniões de representações (associações) se baseia o mecanismo da memória e de todas as formas especiais e temporais de nosso representar. A acolhida de novas representações se realiza por massas antigas de representações semelhantes (apercepção). Os sentimentos e desejos não são nada independentes e, em nenhum caso, uma faculdade anímica particular. São apenas estados variáveis das representações, nas quais residem. Os sentimentos nascem 'quando uma representação se acha comprimida entre forças opostas'; os atos volitivos são produzidos pela pressão recíproca das representações." Herbart não reconheceu a liberdade da vontade no sentido de Kant. As massas mais fortes de representações determinam nosso agir, e, como a instrução pode criar tais massas de representações, vê-se, aqui, também a possibilidade da formação do caráter.

    Em última instância, esta luta das representações se explica metafisicamente, recorrendo a certo numero de elementos subjacentes na consciência chamados reais. Além disso, são suscetíveis de medir-se matematicamente os diversos estados psíquicos (Psicologia matemática).

      Em suma: a Psicologia de Herbart pode ser caracterizada como metafísica intelectualista, associacionista, mecanicista e matemática.

        Instrução educativa

    Assentadas estas bases, Herbart fixou os termos do problema teórico da Pedagogia: o caráter moral, finalidade da educação, alcança-se pela instrução, pela disciplina e pelo governo.

      A instrução (do latim, in-struo, edificar em) é o círculo de ideias que se vão construindo na consciência do educando, graças ao fato da apercepção. De acordo com o mecanismo da psique, tais representações são modificáveis e determinam, definitivamente, o comportamento e a ação do homem. Mas a conduta e a ação humanas são, assim, as mais evidentes manifestações do caráter. Portanto, a instrução tem um fim educativo a verdadeira instrução é instrução educativa. A instrução, no mero sentido de informação, não contém garantia alguma para fazer frente aos defeitos e à influência dos grupos existentes de ideias, que são independentes da informação recebida. Mas a educação deve apossar-se destas ideias, visto como a classe e o grau de ajuda que a instrução pode proporcionar ao comportamento dependem do domínio que têm sobre elas.

      Assim, só é educativa a instrução que modifica os grupos de ideias que o espírito possui, impulsionando este a formar uma nova unidade de representações ou uma série harmônica de unidades, que, por sua vez, determinam o comportamento. Uma volição não é mais do que uma idéia que se desenvolveu cabalmente, realizando um círculo completo, que começa com o interesse e termina com a ação. Esta instrução educativa, que forma a vontade ou o querer e modela o caráter, é a verdadeira tarefa da escola. O meio de conseguir. esta instrução educativa é produzir, no espírito da criança, um interesse multíplice.

       Pedagogia do interesse

    Com efeito, a primeira condição para que o ensino seja fecundo é que excite o interesse do educando. "O interesse é a grande palavra, a palavra mágica da Pedagogia." Interessar a criança é depositar em sua consciência o gosto e íntimo atrativo da verdade, da beleza e do bem; não é um mero distrair ou divertir, mas a fonte da atividade intelectual. O interesse exclui a violência, suaviza o esforço até quase suprimi-lo. Tudo está perdido se, desde o princípio, se converte o estudo numa espécie de miséria e tormento.

  Para Herbart existem seis classes de interesses: três que provocam o conhecimento e três que provêm das relações sociais. As primeiras levam a conhecer as coisas, as segundas, a conviver com os homens. O interesse que se liga ao conhecimento pode ser interesse empírico, enquanto só se dirige à observação de objetos; interesse especulativo, quando conduz ao estudo das leis e relações das coisas e interesse estético, se traz em si a apreciação prazenteira dos fatos. Observar as árvores de um bosque é o resultado de um interesse empírico; reflexionar sobre as leis de seu nascimento, o produto de um interesse especulativo. Enfim, o interesse estético propende para sentir a beleza da floresta.

    Os interesses que dão margem às relações humanas são: o interesse simpático, que impulsiona o homem a participar na alegria e na dor do próximo; o interesse social, que faz sentir o destino da classe social a que pertence, do povo, da Humanidade; o interesse religioso, que o guia ao sentimento de dependência a respeito de Deus.

    Nenhuma das seis formas de interesse deve ser descuidada ou sacrificada. O interesse deve ser multíplice e equilibrado. "A flor não deve romper o cálice – a plenitude não deve converter-se em debilidade pelo excesso de dispersão em muitos sentidos. A sociedade humana julga, como necessária, de há muito tempo, a divisão do trabalho, para que cada um possa fazer bem o que empreende. Mas quanto mais se limita, se divide a empresa, tanto mais se multiplica o que cada um recebe dos outros. Pois como a receptividade espiritual se baseia numa afinidade de espírito, e esta, por sua vez, sobre exercícios espirituais semelhantes, é evidente que, no reino supremo da Humanidade propriamente dita, não podem permanecer isolados os trabalhos até o ponto de se ignorarem reciprocamente. Todos hão de ser diletantes de tudo, cada um há de ser virtuoso numa especialidade. Mas a virtuosidade particular é assunto de eleição; pelo contrário, a receptividade multíplice, que só pode originar-se das multíplice tentativas do esforço pessoal, é assunto da educação. Por esta causa consideramos como primeira parte da finalidade pedagógica a multiplicidade do interesse, que é preciso diferenciar de seu exagero, da multiplicidade de ocupação. E posto que os objetos da vontade, as próprias orientações particulares, nos interessam todas igualmente, para que não destoe ver a debilidade ao lado da força, acrescentaremos este predicado: multiplicidade equilibrada."

Referências:

História Geral da Pedagogia, de Francisco Larroyo.

Enciclopédia Barsa


 

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