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MODERNISMO NO BRASIL – TERCEIRA FASE

 


A terceira fase do Modernismo brasileiro é conhecida como a fase da reflexão e da universalidade temáticaApós a deposição de Getúlio Vargas e o término da Segunda Guerra Mundial, a literatura brasileira entra numa fase a que muitos chamam de Pós-Modernismo.
Na poesia, autores da “geração de 45”, os neoparnasianos, rejeitam as propostas de 22. Concomitante a eles surge um poeta inclassificável: João Cabral de Melo Neto. A intensa produção de romances e contos marcam a prosa, que se orienta para o regionalismo, com Guimarães Rosa e, para a sondagem psicológica, com Clarice Lispector. As décadas 1960 a 1990 veem surgir uma prosa multifacetada.
Três escritores destacam-se pela pesquisa de linguagem na terceira fase do Modernismo: Guimarães Rosa e Clarice Lispector na prosa, e João Cabral de Melo Neto na poesia. No entanto, a “geração de 45”, representada por Péricles Eugênio da Silva Ramos, Ledo Ivo, Geir Campos, Mário Quintana, é neoparnasiana. Negando o ideário de 1922, esses poetas revalorizaram a rima, a métrica e usaram um vocabulário mais erudito, afastando-se do coloquialismo.
Em primeiro lugar, destaca-se o interesse na análise psicológica das personagens, levando a uma abordagem penetrante dos problemas gerados pela tensão existente entre os indivíduos e o contexto social em que vivem. Essa característica está presente nos romances e contos de Clarice Lispector, Osman Lins, Lygia Fagundes Telles, Nélida Pinon, Autran Dourado, Luiz Vilela e Raduan Nassar entre outros.* Essa abordagem, por vezes, realiza-se de forma direta, numa linguagem objetiva e forte, conduzindo o leitor ao âmago das misérias do quotidiano e aos mecanismos de opressão do mundo contemporâneo. É o que ocorre, em diferentes níveis, nas obras de Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, João Antônio, Antônio Callado, Ignácio de Loyola Brandão, Márcio Souza e outros.
Outro caminho trilhado é o chamado realismo fantástico, que expressa uma visão crítica das relações humanas e sociais por meio de narrativas que transfiguram a realidade, fazendo coexistir o lógico e o ilógico, o fantástico e o verossímil. Destacam-se, nessa linha, as obras de Murilo Rubião e José J. Veiga.
Por último, devemos fazer referência ao regionalismo, tendência que desde o Romantismo constitui fonte preciosa para a literatura brasileira. A intenção de representar a realidade do interior do país, com seus tipos humanos e problemas sociais, é comum a Herberto Sales, Mário Palmério, Bernardo Élis, José Cândido de Carvalho, Adonias Filho e, sobretudo, Guimarães Rosa, autor que constitui verdadeiro marco na história da prosa regionalista moderna pelo alto nível de elaboração estética que conseguiu atingir.

Veja os principais representantes dessa 3ª fase Modernista:

3ª Fase (1945 em diante) REFLEXÃO

Guimarães Rosa

Clarice Lispector

João Cabral de Melo Neto

Destacam-se nesse período: Guimarães Rosa, Clarice Lispector, na prosa e João Cabral de Melo Neto, na poesia.

A partir das novas contribuições da Linguística, da atração pelo místico e do introspectivo os autores dessa geração 45 instauraram novos caminhos na Literatura Brasileira. Nessa fase, o texto literário deixa de ser apenas a representação da realidade e adquiri um valor em si mesmo.

Veja a imagem do primeiro e grande representante da terceira geração modernista:

 


Guimarães Rosa foi um grande estudioso, principalmente de línguas. Alguns estudiosos de sua obra afirmam que ele aprendeu sozinho o russo e o alemão. Essa paixão por línguas se reflete em quase todos os seus textos. Ele faleceu três 
dias depois de ter tomado posse na Academia Brasileira de Letras.

Veja as principais características de sua obra:

REGIONALISMO

UNIVERSALISMO

CRIAÇÃO LINGÜÍSTICA

Assim como outros autores, Guimarães utiliza a relação do homem com a paisagem árida do sertão mineiro como matéria-prima de seus textos. Entretanto seu regionalismo apresenta um novo significado extrapola os limites da realidade brasileira, atingindo o plano universal. Como dizia o próprio autor, “o sertão é o mundo”. Tanto que podemos interpretá-lo de várias maneiras: como realidade geográfica, social, política e até mesmo numa dimensão metafísica. 
    Outra característica fundamental de Guimarães Rosa é o seu poder inovador, sua habilidade em trabalhar e inventar palavras. Seus textos são repletos de neologismos (neo= novo, logismo vem de logos que significa palavra), ou seja, neologismos são palavras novas. Dizem que Guimarães sempre andava com um caderninho no bolso anotando palavras e expressões características do falar do povo brasileiro e a partir delas criava outras tantas.

Veja alguns exemplos de seus famosos neologismos:

“desafogaréu” – “cigarrando” – “justinhamente”

“êssezinho”         “ossoso”           “retrovão”

“agarrante”       “bisbrisa”          “desfalar”

Outra característica é o seu poder de fusão dos gêneros literários. Guimarães Rosa não ficou preso a um único gênero. Segundo a crítica literária, ele e Clarice Lispector conseguiram desromancizar o romance, aproximando-o da poesia.

Veja o que o próprio autor diz sobre a sua obra:

        “Não, não sou romancista; sou um contista de contos críticos.

Meus romances e ciclos de romances são na realidade contos nos quais se unem a ficção poética e a realidade. Sei que daí pode facilmente nascer um filho ilegítimo, mas justamente o autor deve ter um aparelho de controle: sua cabeça. Escrevo, e creio que este é o meu aparelho de controle: o idioma português, tal como usamos no Brasil; entretanto, no fundo, enquanto vou escrevendo, extraio de muitos outros idiomas. Disso resultam meus livros, escritos em um idioma próprio, meu, e pode-se deduzir daí que não me submeto à tirania da gramática e dos dicionários dos outros. A gramática e a chamada filologia, ciência linguística, foram inventadas pelos inimigos da poesia”.

Guimarães Rosa

Veja a capa de Sagarana, seu primeiro livro:

Sagarana é um livro composto por nove contos escritos à moda das fábulas. Note que o próprio título do livro também é um neologismo criado pelo autor. A palavra saga, de origem germânica, significa um canto heroico, uma lenda, e rana, de origem indígena, significa à maneira de, à espécie de.

Veja o índice de Primeiras Estórias, outro importante livro desse autor:

                                                             

Esse índice ilustrativo, feito por Luís Jardim, foi ideia do próprio Guimarães. Cada sequência de desenho sintetiza o enredo das 21 estórias que formam o livro. Essas estórias foram retiradas de fatos corriqueiros, de situações fantásticas ou engraçadas, numa proximação com as estórias narradas pelos contadores de “causos” muito comuns no sertão mineiro.

Entre os principais contos de Primeiras Estórias, destacam-se: “A terceira margem do rio”, “O espelho” e “A menina de lá”.

Mas somente a partir de 1956, ano de publicação da sua obra-prima, que o autor alcança a notoriedade.

Veja a capa de Grande Sertão: Veredas:

Grande Sertão: Veredas foi traduzido para muitas línguas, sendo muito vendido em vários países. E é considerado a expressão máxima do regionalismo universalista de Literatura Brasileira.

O romance Grande Sertão: Veredas é construído a partir da narrativa de Riobaldo, um ex-jagunço, que questiona a existência do diabo. O narrador conta a história de sua vida, marcada por vinganças, disputas e mortes. O espaço físico é o sertão. Entre as personagens destacam-se o próprio Riobaldo e o valente Diadorin. Depois de muitas idas e vindas, no final da história Riobaldo descobre que na realidade Diadorin, por quem sempre nutriu um forte sentimento, era uma mulher.

Veja a imagem da representante feminina da terceira fase modernista:

Clarice Lispector aprofunda-se num caminho já percorrido por outros autores no início do movimento modernista, a literatura de caráter introspectivo e intimista. Clarice sempre foi muito mística e supersticiosa, tanto que em 1976, representou o Brasil num Congresso de Bruxaria, na Colômbia.

Clarice Lispector dedicou-se à prosa de sondagem psicológica, à análise das angústias e crises existenciais, ou seja, dedicou-se à análise do mundo interior de suas personagens. Clarice rompeu com a linearidade da estrutura do romance, seus textos baseiam-se no fluxo de consciência (na expressão direta dos estados mentais), na memória. Tempo, espaço, começo, meio e fim deixaram de ser importantes. Segundo a própria autora “o importante é a repercussão do fato no indivíduo” e não o fato em si. Outra característica de Clarice Lispector é o frequente uso do monólogo interior, técnica em que o narrador conversa consigo mesmo, como se estivesse divagando. Entre seus livros mais conhecidos estão: Perto do Coração Selvagem, Laços de Família e A Hora da Estrela, último livro publicado em vida.

Veja a imagem de João Cabral de Melo Neto, outra importante figura dessa geração:

Embora frequentemente estudado como um poeta da geração de 45, João Cabral de Melo Neto apresenta características bem diversas dos escritores dessa fase. Guiado pelo raciocínio lógico, voltou-se para a concretude, para a análise objetiva da realidade.

João Cabral de Melo apresentava uma grande preocupação com a construção formal de seus textos, procurando eliminar tudo o que fosse supérfluo. Caracterizou-se pela linguagem direta e precisa, contrária ao subjetivismo. Para ele os poemas não eram fruto de inspiração, mas de construção. Daí ser conhecido como o “engenheiro das palavras”.

João Cabral de Melo Neto conquistou notoriedade internacional graças ao longo poema Morte e Vida Severina – um auto de natal pernambucano, que em 1969, foi encenado por um grupo de jovens atores do TUCA, Teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Morte e Vida Severina narra a história de um retirante pernambucano que deixa sua terra castiga pela seca e parte em busca de uma vida melhor, mas ao longo de suas andanças só encontra a fome, a miséria e a morte.

Veja alguns fragmentos da grande obra-prima desse autor:

                Morte e vida Severina

O retirante explica ao leitor quem é e a que vai.

_ O meu nome é Severino, não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria; como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias

                 (...)

Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas, e iguais também porque o sangue que usamos tem pouca tinta. E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte, de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença que é a morte Severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida)

             (...)

                    João Cabral de Melo Neto


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