Para conciliar a corrente contrária à posse com a dos legalistas, o Congresso aprovou um ato adicional estabelecendo o sistema parlamentarista de governo no Brasil. Essa medida, que limitava os poderes do presidente, foi a condição para que João Goulart, conhecido popularmente como Jango, assumisse o poder. Para presidente do Conselho de ministros foi eleito, pela Câmara dos deputados, Tancredo Neves.
João Goulart
Contando com forte apoio popular, João Goulart convocou um plebiscito para 6 de Janeiro de 1963 para decidir sobre a manutenção ou não do sistema parlamentar. O resultado foi a volta ao presidencialismo, que lhe devolvia os poderes retirados em 1961.
O ministério do Planejamento e da Coordenação Econômica, cujo titular era Celso Furtado, partiu para a execução do chamado Plano Trienal. Elaborado no período parlamentarista, pretendia combater a inflação e realizar o desenvolvimento econômico, particularmente do setor industrial. Esse plano, entretanto, entrava em contradição com a política de mobilização popular em apoio ao governo, pois exigia grande austeridade.
A tensão que reinaria durante o período de governo de João Goulart atingiu seu ponto máximo quando o presidente criou uma lei implantando o 13º salário. O Congresso recusou-se, e os trabalhadores entraram em greve.
Após o plebiscito que decidiu o retorno ao presidencialismo, Goulart começou a preparar o chamado Programa de Reforma de Base, que incluía a Reforma agrária, visando a divisão dos latifúndios; a reforma eleitoral, que permitia, entre outras coisas, voto aos analfabetos; a reforma universitária, ampliando as vagas nas universidades públicas e possibilitando aos estudantes terem acesso a órgãos diretivos educacionais. Essas tentativas de transformações encontraram forte oposição de setores da sociedade que teriam seus interesses contrariados.
Goulart levou adiante sua política nacionalista e elaborou leis que limitavam a remessa de lucros para o exterior e o abuso de poder econômico, monopolizando a importação do petróleo e o encampando as refinarias particulares. Descontentamento de setores empresariais com a política do governo tornava-se cada vez mais acentuado. Ao mesmo tempo, os movimentos populares pressionavam para que as medidas fossem concretizadas e até ampliadas.
A crescente pressão da esquerda sobre Jango
A ala radical do PTB e o Partido Comunista foram responsáveis pela deflagração de 105 greves trabalhistas em 1961. Esse número cresceu para 128 no ano seguinte e chegou a 149 em 1963. A maior parte dos movimentos grevistas reivindicava aumentos de salários, por causa das constantes perdas salariais provocadas pela inflação.
Algumas dessas manifestações, entretanto, tiveram um caráter político. Foi o caso da greve da União Nacional dos Estudantes (UNE), em junho de 1962, para ampliar a participação estudantil nos órgãos diretivos das universidades e para implantar a educação pública em todo o país.
Os sindicatos que entraram em greve no dia 14 de setembro de 1962 tinham também um objetivo político: pressionar o Congresso para antecipar o plebiscito que decidiria a continuidade ou não do regime parlamentarista. Das pressões grevistas resultaram medidas de amplo alcance popular, como a formação do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), a decretação do 13º salário e de um significativo aumento do salário mínimo.
Na mesma época, crescia o poder de ação das Ligas Camponesas nos estados do Nordeste, em Minas Gerais e no interior do Rio de Janeiro. Seu líder, o advogado socialista Francisco Julião, brigava pela reforma agrária, para a qual recorreria até a luta armada, tal como na Revolução Cubana.
Em janeiro de 1963, por meio de um plebiscito, os eleitores decidiram pela volta do regime presidencialista, que conferia plenos poderes a João Goulart.
O novo Ministério formado pelo presidente contava com políticos progressistas, como Celso Furtado (Desenvolvimento Econômico), San Tiago Dantas (Fazenda) e Almino Afonso (Trabalho), que elaboraram um projeto de reformas sociais.
As reformas de base
O projeto do governo baseava-se na ideia de auxílio às populações carentes nas áreas de saúde, educação, habitação, transporte e saneamento, além de combater a inflação.
A aplicação desse programa de reformas implicava medidas como:
- reforma agrária, ainda que limitada a determinados latifúndios improdutivos;
- reforma tributária, visando a redistribuição proporcional dos tributos - as pessoas que tivessem mais posse pagariam mais impostos;
- reforma eleitoral, para estender o direito de voto aos analfabetos;
- nacionalização progressiva das indústrias e dos bancos;
- controle da remessa de lucros para o exterior, assim como da entrada do capital estrangeiro no país.
Essas reformas atingiam os interesses econômicos das classes dominantes e das empresas multinacionais. Por isso, foram atacadas pelos deputados conservadores do Congresso, que vetaram a maioria de suas propostas. Os grandes proprietários e usineiros, principalmente os do Nordeste, colocaram-se contra a reforma agrária.
Por sua vez, os nacionalistas desaprovavam alguns aspectos do programa, como os acordos com o Fundo Monetário Internacional e a presença atuante das multinacionais no país.
O maior desgaste do governo, entretanto, ocorria por causa de sua política de combate à inflação, que implicava contenção de créditos e de salários. Além disso, os Estados Unidos restringiram os empréstimos ao Brasil, como uma forma de dificultar as reformas de base.
A reação da direita
Diversos empresários e técnicos executivos articularam-se junto aos militares da Escola Superior de Guerra, no Rio de Janeiro, para propor alternativas ao programa reformista do governo. Em 1961, esse grupo fundou o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (Ipes). Sua posição era radicalmente contrária ao governo João Goulart, a quem acusava de intervenções subversivas.
Dispondo de recursos de banqueiros nacionais e de apoio velado dos Estados Unidos, o Ipes tratou de infiltrar-se nas mais diversas associações onde atuavam as esquerdas nacionalistas, como as entidades estudantis, os sindicatos operários e de camponeses, e até mesmo na Igreja.
Através de uma intensa propaganda nos meios de comunicação, da publicação de livros e revistas e da criação de diversas instituições - como a União Cívica Feminina e o Grupo de Ação Patriótica - o Ipes foi ganhando apoio de amplas parcelas da classe média, atemorizadas com a possibilidade de implantação de um regime socialista no Brasil.
O principal líder do Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais era o general Golbery de Couto e Silva. Ao lado de outros militares, como o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco e o general Ernesto Geisel, Golbery tratou de articular um esquema para defender o grupo e suas ideias.
As realizações do grupo pró Goulart
Um dos principais adeptos do programa de reformas proposto por era Miguel Arraes, governador de Pernambuco, eleito em 1962. Arraes defendia a reforma agrária, embora condenasse a violência de alguns líderes das Ligas Camponesas nordestinas.
O governador pernambucano também apoiou a criação de um Movimento de Cultura Popular (MCP), destinado a alfabetizar a população de seu estado, através do método desenvolvido pelo educador Paulo Freire. Paralelamente, o MCP produzia e divulgava espetáculos de teatro com temática política.
Dado o sucesso junto às comunidades pobres, os grupos de Cultura Popular se expandiram por numerosos estados do Norte e Nordeste do país. Muitos estudantes e padres ligados à Ação Católica começaram a participar das campanhas de alfabetização em massa.
Quando presidente da UNE, nos anos de 1961 e 1962, o estudante paulista Aldo Arantes criou o Centro Popular de Cultura (CPC). Além de produzir shows e espetáculos comprometidos politicamente com as reformas de base, o CPC editava livros, como a coleção Cadernos do Povo Brasileiro. Nesses cadernos eram publicados textos, poemas e peças de teatro escritos por autores engajados, como Oduvaldo Viana Filho (teatro), Arnaldo Jabor (cinema) e Ferreira Gullar (poesia).
Alguns setores da esquerda, finalmente, defendiam a luta armada como o único meio de acabar com os privilégios das classes dominantes e a exploração do país pelo capital internacional. Essa posição acabou sendo defendida por Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul e cunhado do presidente João Goulart.
Em 1963, reunindo grupos armados, recrutados junto à CGT, ao PCB, à UNE, às Ligas Camponesas e aos corpos de sargentos e marinheiros, Leonel Brizola fundou a Frente de Mobilização Popular.
Em setembro do mesmo ano, os sargentos rebelaram-se em Brasília, pela igualdade de direitos com os oficiais superiores. Essa atitude dos sargentos foi considerada uma quebra da hierarquia militar.
O golpe militar
Até então, João Goulart tinha evitado tomar posição por um lado ou por outro, procurando conciliar os interesses dos grupos de esquerda e de direita. No entanto, a crescente oposição do Congresso à realização das reformas de base levou o presidente, no final de 1963, a aproximar-se definitivamente do movimento sindical. Em janeiro do ano seguinte, ele aceitou participar de um comício no Rio de Janeiro, para pressionar os congressistas.
No dia 13 de março de 1964, em um comício em frente à estação da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, 300 000 trabalhadores aplaudiam Goulart, que decretava a nacionalização das refinarias particulares de petróleo e desapropriava terras à margem das ferrovias e em zonas de irrigação dos açudes públicos.
A reação dos proprietários rurais e de setores da burguesia não se fez esperar. Uma semana depois, cerca de 400 000 pessoas, convocadas por grupos conservadores da Igreja e do empresariado, realizaram a Marcha da Família com Deus e pela Liberdade, início de um movimento que vinha sendo organizado por grupos de oficiais das Forças Armadas e alguns setores civis conservadores.
As reivindicações populares penetraram em setores militares, provocando sublevações entre sargentos e marinheiros. Essa situação colocou oficiais aparentemente neutros do lado daqueles que conspiravam contra Goulart.
O movimento político Militar iniciou-se em 31 de março e depôs João Goulart em 1º de abril de 1964. Foi liderado pelos generais Luís Carlos Guedes e Olímpio Mourão Filho, apoiados pelos governadores Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Carlos Lacerda, da Guanabara. O governo Goulart acabou sendo totalmente abandonado pelos militares legalistas. A greve geral decretada pelo CGT fracassou e as manifestações civis foram facilmente reprimidas. No Rio Grande do Sul os partidários do governador Leonel Brizola, cunhado e partidário do presidente, não tiveram condições de resistir. No dia 2 de abril, João Goulart se asilou no Uruguai: findava o período democrático e tinha início a República Militar.
É necessário destacar o papel dos Estados no Golpe de 1964, a partir de 1961, grande número de norte-americanos disfarçados em jornalistas, comerciantes, religiosos, etc., entraram no Brasil para tramar contra o governo nacionalista de Goulart. Não foi por acaso que os governadores Carlos Lacerda, Ademar de Barros e Magalhães Pinto, hostis a Jango, receberam "ajudas" e empréstimos dos norte-americanos. Sabe-se que o General Vernon Walters participou de diversas reuniões com os generais Castelo Branco, Golbery do Couto e Silva, Luís Guedes, entre outros, incitando a dar o golpe.
de porventura Jango resistisse, os norte-americanos interviriam. Era a Operação Brother Sam, composta por porta-aviões, mísseis teleguiados, navios carregados de armas e, ainda, quatro petroleiros com milhares de barris de combustíveis.
Fonte: Luís César Amad Costa; Leonel Itaussu Mello – História de Brasil; Editora Scipione.
José Jobson Arruda; História Integrada; volume IV, Editora Ática.
Renato Mocellin; História; Coleção Vitória - Régia ; IBEP.
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