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A segunda presidência de Getúlio Vargas (1951-1954)

“Se for eleito a 3 de outubro, no ato de posse, o povo subirá comigo as escadas do Catete. E comigo ficará no governo.” Com um linguajar demagógico e algumas propostas nacionalistas, Getúlio pleiteou novamente a presidência, candidatando-se pelo PTB e apoiado pelo Partido Social Progressista (PSP) nas eleições no final do governo Dutra, foi eleito com 48,7 dos votos, derrotando nas urnas Eduardo Gomes (UDN), Cristiano Machado (PSD) e João Mangabeira (PSB).
Getúlio Vargas
Getúlio, de volta ao poder, procurou direcionar a economia para uma linha intervencionista e nacionalista, preocupado principalmente com o desenvolvimento da indústria de base: siderurgia, petroquímica, energia, transporte etc.

Nacionalismo e trabalhismo 

Com a volta de Getúlio Vargas ao poder, foram retomados o nacionalismo e a política trabalhista. O período foi marcado pelo conflito entre grupos nacionalistas, que apoiavam o governo, e grupos que queriam abrir a economia do país ao capital estrangeiro. Esse embate mobilizou vários setores da sociedade, como trabalhadores, estudantes, parlamentares e a imprensa.
Em seu governo, Vargas deu prioridade à industrialização do país e criou mecanismos para conter a inflação, que crescia aceleradamente. Com seu projeto econômico nacional-desenvolvimentista, procurava conciliar o desenvolvimento do país com a independência nacional perante o capital externo. Com a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), em junho de 1952, Vargas buscou oferecer crédito para o desenvolvimento de projetos voltados à melhoria de portos e ferrovias e à ampliação do setor elétrico.
A ampliação do setor industrial de base implicava o aumento de divisas, que, entretanto, diminuíam devido à remessa ilegal de lucros por firmas estrangeiras ao exterior e, ainda, pelo declínio dos preços do café. Para prosseguir com o crescimento econômico da indústria, era preciso acabar com os privilégios do capital estrangeiro ao mesmo tempo em que se realizava uma redução relativa dos salários dos trabalhadores, evitando que os aumentos salariais fossem superiores à taxa de produtividade. Além disso, seria necessário criar canais de transferência das divisas do setor agroexportador para o setor industrial, o que se tornara muito difícil com a queda dos preços dos produtos agrícolas no mercado internacional.

“O petróleo é nosso!”

Uma das questões mais polêmicas foi a nacionalização do petróleo. Os nacionalistas defendiam que o petróleo fosse extraído por uma empresa estatal brasileira e fizeram campanha usando o lema “O petróleo é nosso”.
A nacionalização do petróleo era uma antiga reivindicação de muitos brasileiros. O escritor Monteiro Lobato, por exemplo, publicou em 1936 o livro O escândalo do petróleo, no qual acusava o governo de não explorar o petróleo existente no subsolo brasileiro nem permitir que ele fosse explorado. No ano seguinte, o livro foi proibido pela ditadura do Estado Novo.
Em 1948, um grupo de intelectuais, militares e políticos brasileiros fundou o Centro de Estudos e Defesa do Petróleo, no Rio de Janeiro. O objetivo era limitar a atuação de empresas estrangeiras na exploração do petróleo e assegurar a exclusividade de empreendimentos nacionais. Com o lema “O petróleo é nosso!”, a campanha recebeu apoio de diferentes setores do país. Em outubro de 1953, Vargas sancionou a lei que criou a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras). A empresa, controlada pelo Estado, assumiu o monopólio da exploração do petróleo em território nacional.
Ainda em 1953, o governo propôs limitar a remessa ao exterior dos lucros das empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil. A proposta foi barrada no Congresso Nacional por pressão de grupos internacionais.
A política nacionalista brasileira foi combatida pelo governo dos Estados Unidos, que apoiava os interesses das empresas estrangeiras sediadas no Brasil, principalmente as estadunidenses.

Oposição e crise política

Vargas começou a enfrentar uma crise política ainda no início de seu governo. A inflação continuava alta, o déficit da balança comercial crescia, a imprensa denunciava casos de corrupção no governo e a UDN, principal partido de oposição, reagia às medidas nacionalistas na economia. A política trabalhista também foi alvo de grandes debates.
Os diversos setores das classes dominantes passaram a se desentender e se lançaram em uma acirrada disputa pelas divisas, criando uma crise política. A estratégia econômica resultou também em uma rápida espiral inflacionária. Os reajustes salariais deixaram de acompanhar o ritmo do custo de vida, provocando enorme descontentamento entre os trabalhadores.
Em março de 1953, cerca de 300 000 operários de diversas categorias de São Paulo entraram em greve exigindo uma baixa do custo de vida e aumento salarial.
O prestígio de Vargas nos setores sindicais ligados ao PTB ainda era grande, mas ele passou a enfrentar muitas greves operárias, protestos populares e reivindicações de aumento salarial. Em uma tentativa de reconquistar o apoio dos trabalhadores, em junho de 1953, Vargas nomeou João Goulart, principal líder do PTB, para o Ministério do Trabalho.
Em fevereiro de 1954, “Jango”, como João Goulart tornou-se conhecido, propôs dobrar o valor do salário mínimo. As reações contra a proposta foram tão fortes que, no final do mesmo mês, Jango foi demitido pelo presidente.
Contudo, em seu discurso no Dia do Trabalho, Vargas anunciou a mesma proposta de aumento do salário mínimo. A notícia foi muito mal recebida pelo empresariado e pela oposição.
Em razão das medidas de proteção aos trabalhadores e às riquezas nacionais, a UDN (partido da oposição) e setores ligados ao capital estrangeiro passaram a conspirar contra o governo Vargas. Um dos principais líderes da UDN era Carlos Lacerda, político e diretor do jornal Tribuna da Imprensa, do Rio de Janeiro. Lacerda pregava abertamente a destituição de Vargas por qualquer meio.
O governo de Getúlio encontrava-se num impasse e encaminhava-se para o seu trágico fim.

O fim do governo Getúlio Vargas

A ascensão dos movimentos de massa preocupava a classe dominante, inclusive setores ligados ao governo, temerosos de uma radicalização da qual o próprio Getúlio perdesse o controle. Este, entretanto tinha se disposto a sustentar uma linha econômica nacionalista apoiada na mobilização popular.
Os grupos de oposição a Vargas se manifestava através da imprensa, acusando-o de estar preparando um golpe que criaria uma república sindicalista no Brasil, nos moldes do governo de Perón havia instalado na Argentina. O jornalista Carlos Lacerda liderava a ala mais antigetulista da oposição e apontava como corruptas pessoas ligadas ao governo, denunciando até mesmo financiamentos ilegais feitos pelo Banco do Brasil.
O presidente, por sua vez, afirmava que os setores ligados ao capital estrangeiro eram os desencadeadores das dificuldades brasileiras: “(...) A remessa de lucros pelas empresas estrangeiras é o nosso maior problema”, dizia.
No 1º de maio, Getúlio concedeu o aumento dos salários mínimos prometidos por Goulart, conclamando os trabalhadores a mobilizarem-se e participarem da política nacional. O nível de conscientização e organização dos trabalhadores, no entanto, não era suficiente para mobilizá-los, devido aos próprios entraves que o getulismo colocara anteriormente.

Embora nunca tivesse ficado provada a participação Getúlio, pessoas ligadas a ele tentaram assassinar Carlos Lacerda. Nesse episódio, que ficou conhecido como crime da rua Toneleros, foi morto o major da Aeronáutica Rubens Vaz. Ao se apurarem os acontecimentos, concluiu-se que o responsável era Gregório Fortunato, principal guarda-costas do presidente.
O país se agitava. O Exército exigia a renúncia do presidente. “Tenho a impressão de me encontrar sobre um mar de lama”, declarava Getúlio. No dia 22 de agosto de 1995, oficiais da Aeronáutica exigiam o afastamento do presidente; a seguir, o Exército e alguns outros setores da sociedade assinavam manifesto semelhante. No dia 24 pela manhã, um novo ultimato, dessa vez com a assinatura do ministro da Guerra, Zenóbio da Costa, foi entregue a Vargas. Isolado no Palácio do Catete, este redigiu uma carta-testamento e suicidou-se com um tiro no peito.
Com a morte de Vargas, a presidência passou para o vice-presidente Café Filho, incumbido de completar o mandato, que se estenderia até o fim de 1955.
Para o novo mandato, o PSD e o PTB, procurando manter a herança getulista, realizaram um pacto lançado Juscelino Kubitschek de Oliveira para a presidência e João Goulart para vice-presidência. A UDN, em acordo com o Partido Democrata Cristão (PDC), apresentou Juarez Távora. Além desses, candidataram-se Ademar de Barros e o ultradireitista Plínio Salgado. Juscelino saiu-se vencedor, mas sua posse foi precedida de uma tentativa de uma tentativa golpista.
Com o afastamento de Café Filho, por motivos de saúde, assumiu o cargo o presidente da Câmara Carlos Luz, que, apesar de pessedista, era adversário de Juscelino. Suspeitando de uma tentativa de golpe, o então ministro da Guerra, general Henrique Teixeira Lott, ordenou que as forças do Exército ocupassem prédios públicos, estações de rádios e os principais jornais do Rio de Janeiro. Carlos Luz e os supostos golpistas da UDN refugiaram-se no navio Tamandaré. O poder passou ao presidente do Senado, Nereu Ramos, o que garantiu a posse de Juscelino e Goulart em 31 de janeiro de 1956.

Fonte: Luís César Amad Costa; Leonel Itaussu Mello – História de Brasil; Editora Scipione.




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