sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Anos de Chumbo: a luta armada

Logo após o golpe de 1964, jovens universitários de esquerda acusaram a direção do Partido Comunista (PCB) de não resistir ao golpe militar e agir com moderação e cautela. Muitos deles julgavam que o momento era de luta armada contra a ditadura.

A luta armada contra o regime militar foi influenciada por outros vários outros movimentos revolucionários na América Latina, no início dos anos 1970. A principal fonte de inspiração para os revolucionários brasileiros era o triunfo da Revolução Cubana. Militantes dos grupos de esquerda acreditavam que era possível derrubar a Ditadura com a Luta Armada. Estavam certos de que os trabalhadores apoiariam e se engajariam em um movimento revolucionário liderado por essas vanguardas.

Vários grupos revolucionários que pegaram em armas contra a ditadura militar brasileira formaram-se nesse período, quando o Brasil era governado pelo general Emílio Garrastazu Médici. Destaca-se a ALN e a VPR.

- Aliança Libertadora Nacional. O Partido Comunista Brasileiro (PCB) posicionava-se contra a luta armada. Diante disso, uma importante liderança do partido, Carlos Marighela, reuniu um grupo de simpatizantes e fundou a ALN.

- Vanguarda Popular Revolucionária. Essa organização era formada, sobretudo, por militares de esquerda, contrários ao golpe militar de 1964. A principal liderança do movimento era Carlos Lamarca. Ex-capitão do exército. Lamarca rompeu com a VPR, em 1971, para ingressar no Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), onde permaneceu até ser morto pelos militares.

O projeto político dessas organizações era desencadear a revolução no campo, mas para isso era preciso arranjar dinheiro nas cidades. A luta armada contra o regime, além de sequestros para libertar presos políticos, promovia também assaltos a bancos e a instalações militares para financiar e armar o movimento. Eram as chamadas expropriações em nome da revolução. O dinheiro conseguido era gasto no aluguel de apartamentos (os aparelhos das células revolucionárias), no sustento dos militantes e no financiamento de novas operações de expropriação. Manter um guerrilheiro urbano na clandestinidade custava muito dinheiro.

O maior problema dessas organizações revolucionárias consistia em que a sociedade brasileira, no seu conjunto, simplesmente não desejava nenhuma revolução socialista, nem estava disposta a apoiar a luta armada. Os trabalhadores não se entusiasmaram com as ações revolucionárias e a maioria dos brasileiros não entendia o que estava acontecendo, tomando conhecimento dos embates entre guerrilheiros e policiais em silêncio. Além disso, o “milagre econômico” começava a deslanchar. Os guerrilheiros somente encontravam algum apoio no que restava do movimento estudantil.

Os militares reagiram criando novos mecanismos de repressão: em 1969, criaram a Obam (Operação Bandeirantes), com o propósito de organizar a repressão na Região Sudeste do país. Logo após, em vários estados, formaram-se os DOI-CODI (Destacamentos de Operações e Informações e Centro de Operações de Defesa Interna), locais onde eram torturados os suspeitos de envolvimento com os grupos revolucionários.

A tortura dos guerrilheiros era praticada em suas instalações. Tão logo eram presos, sofriam bárbaras torturas para entregar os companheiros à repressão. Alguns desses métodos foram ensinados por agentes norte-americanos. Muitos militantes presos não resistiram e morreram em função das torturas, que incluíam o pau de arara, espancamentos variados e choques elétricos em várias parte do corpo.

Para libertar os companheiros, os militantes realizaram várias ações, como o sequestro do embaixador norte-americano, exigindo a libertação de 15 prisioneiro e a leitura, em rede nacional de televisão, de um manifesto revolucionário. Foram sequestrados também os embaixadores alemão e suíço, além do cônsul do Japão. Com os sequestros, a repressão política tornou-se ainda mais dura e cruel.

A luta armada era desigual: jovens de classe média armados com revólveres enfrentando militares profissionais e agentes treinados. Os grupos guerrilheiros estavam derrotados ao final de poucos anos. No entanto, o fator decisivo para a derrota da luta armada foi, como vimos, o isolamento dos guerrilheiros em relação à sociedade. Calcula-se que cerca de 800 pessoas se engajaram na luta armada, sendo que 386 foram mortas ou desapareceram.

Muitos empresários, satisfeitos com os lucros provenientes do “milagre”, apoiaram e inclusive financiaram a repressão ao movimento sindical. Diversos políticos concordaram com o fim das eleições diretas. Nesse período, conhecido como os “anos de chumbo”, restou uma única instituição fora do controle dos militares: a Igreja católica.


O MST

Desde meados dos anos 1980, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST, tornou-se um dos mais importantes movimentos sociais no Brasil contemporâneo. Herdeiro das lutas camponesas dos anos 1940-1960, ele surgiu da confluência de vários conflitos rurais nos anos 1970, quando “camponeses sem terra” ocuparam terras no noroeste do Rio Grande do Sul.

Ao mesmo tempo, agricultores que estavam sendo desalojados no sudoeste do Paraná para construção da usina de Itaipu formaram o Movimento dos Agricultores Sem Terra do Oeste do Paraná. A Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à Igreja católica, conseguiu articular esses e outros movimentos rurais, contribuindo para a construção do MST, em 1984.

O MST inaugurou novas formas de luta e deu início a uma nova identidade social: o “sem-terra”, em que se considera desde aquele que perdeu sua pequena propriedade no Rio Grande do Sul, o desalojado no Paraná, até o desempregado egresso das grandes cidades e o “morador” nos latifúndios do Nordeste. Pode ser também qualquer pessoa que sinta socialmente marginalizada e se identifique com a causa do movimento. Todos esses são definidos como “trabalhadores sem terra”.

Outra novidade é a organização do movimento, cujas direções são plurais, coletivas. Embora haja líderes que se destacam no MST, como João Pedro Stédile, não há um “presidente”, evitando dessa forma a centralização do poder em um só indivíduo. O trabalho de organização é dividido em setores, como educação, saúde, produção e comunicação.

Inicialmente, a grande bandeira do MST era a reforma agrária. Depois, o próprio movimento percebeu que não bastava apenas ter acesso à terra. Assim, passou também a lutar por créditos e financiamento, bem como pelo escoamento da produção para os mercados. Para os líderes do movimento, o grande problema no Brasil era o desenvolvimento econômico social, sobretudo recusando o chamado “agronegócio” e tendo o socialismo como grande objetivo.

Atualmente, o movimento vem dando ênfase à formação de cooperativas voltadas para a produção, para serviços e para o crédito.

Outra inovação nos métodos de atuação do MST são as ocupações, cujo objetivo é criar fatos políticos, ganhando as manchetes de jornais e televisões, mobilizando a população. Com marchas, romarias, apropriação de prédios públicos, embarreiramentos de estradas e invasões de fazendas. O MST faz com que a sociedade tome conhecimento das suas reivindicações. As caminhadas de uma cidade a outra mostram a força dos militantes e a solidariedade entre eles.

O movimento também inovou no trabalho da educação para jovens e adultos. Ao valorizar a cultura do campo, formulou-se uma “pedagogia da terra”, em que professores e militantes são formados em cursos técnicos oferecidos nas Universidades especialmente para eles.

Por vezes, o MST recorre a estratégias radicais, com métodos considerados à margem da lei – como destruição de plantações e depredação de sedes de fazendas produtivas e de laboratórios de pesquisa. Apesar dessas ações, o MST tornou-se um dos movimentos sociais mais importantes no Brasil contemporâneo. Defensor intransigente da luta pela democratização da terra, acena para milhares de pessoas marginalizadas.
Dois massacres de sem-terra, ocorridos no início do governo FHC, não deixam dúvidas quanto à gravidade do problema da terra no Brasil: o de Corumbiara (Roraima), em agosto de 1995, com 11 mortos, e o de Eldorado dos Carajás (Pará), em abril de 1996, com 19 mortos.
Por lei, os latifúndios (grandes propriedades rurais improdutivas) podem ser desapropriados pelo governo federal e entregues à reforma agrária. Isso, porém, envolve muitos interesses. Os grandes fazendeiros contam com uma bancada ruralista formada por deputados e senadores no Congresso Nacional para defender seus interesses. além do mais, os critérios que determinam se uma propriedade é improdutiva ou não são muitos brandos.
Outro problema é consegui fazer uma reforma agrária de qualidade. Muitas vezes as famílias são assentadas, mas as condições para que de fato produzam naquele pedaço de terra não são garantidas. Assim, muitas acabam vendendo suas terras ou abandonam e seguem para as grandes cidades em busca de emprego.

Massacre em Eldorado

Em 17 de abril de 1996, dezenove sem-terra foram mortos num confronto com a Polícia Militar em Eldorado dos Carajás, no sul do Pará. O confronto ocorreu quando 1 500 sem-terra protestavam contra a demora na desapropriação de terras da fazenda Macaxeira. Acusados de estarem obstruindo uma rodovia, a Polícia Militar foi encarregada de tirá-los do local por meios pacíficos ou pela violência. Um dos líderes do movimento, Oziel Alves Pereira, de apenas 17 anos, foi torturado e executado com um tiro no rosto. A operação esteve sob o comando do coronel Mário Pantoja de Oliveira.
Em junho de 2002, 124 soldados e cabos acusados de terem participado do massacre foram a julgamento. Todos foram absolvidos. Quanto ao coronel Mário Pantoja, em 2004 foi condenado a 228 anos de prisão.

As Ligas Camponesas

Em meados da década de 1950, os trabalhadores rurais do Nordeste, ameaçados de expulsão das terras em que trabalhavam como parceiros ou arrendatários, começaram-se a se organizar para garantir o acesso à terra e conquistar melhores condições de trabalho e de vida. Essa mobilização deu origem as Ligas Camponesas, associações que reuniam, principalmente, pequenos proprietários rurais e trabalhadores não assalariados (boias-frias, parceiros, arrendatários, etc.).

A primeira e mais famosa das ligas foi fundada em 1954, em Vitória de Santo Antão, no estado de Pernambuco, reunindo cerca de 1200 pessoas. Antes dela, em 1945 já haviam surgido ligas camponesas em algumas regiões do país, mas foram resultado de ações isoladas de militantes do Partido Comunista que não tiveram continuidade.

Apesar da forte repressão que sofriam por parte dos fazendeiros e da polícia, a partir de1958 as Ligas Camponesas se espalharam pelo Nordeste e, posteriormente, chegaram a Minas Gerais e ao interior do Rio de Janeiro.

Tendo como lema “Reforma agrária na lei ou na marra”, as Ligas Camponesas eram lideradas pelo advogado e deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) Francisco Julião (1915-1999), que procurava orientar os trabalhadores rurais a respeito de seus direitos. Em 1961, foi realizado em Belo Horizonte o Primeiro Congresso Nacional de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, durante o qual representantes das Ligas Camponesas e de sindicatos rurais de todo o país reivindicavam a reforma agrária e a extensão das leis trabalhistas ao campo. Com o Golpe militar de 1964, a atuação das Ligas Camponesas foi proibida e elas foram extintas.

Futebol e ditadura: a Copa de 1970

A seleção brasileira de 1970 tinha um poderoso ataque, formado por Jairzinho, Pelé e Tostão, junto com um meio-campo eficaz e criativo, composto por Gérson, Clodoaldo e Rivelino. A defesa não era brilhante, mas sabia segurar o adversário nos momentos decisivos, como no jogo contra a Inglaterra: e, se falhasse, o ataque fazia gols para compensar. Mas havia um problema que incomodava muita gente: o Brasil vivia o período mais duro da repressão política e a vitória da seleção poderia ser utilizada pelos generais para popularizar a ditadura. Ao final, a maioria esqueceu a questão política e torceu pela “Seleção Canarinho”, como se dizia na época.

A vitória brasileira foi espetacular e consolidou o prestígio do país no futebol internacional. Internamente, o regime militar incorporou a vitória na Copa como mais um instrumento de propaganda. Médici recebeu os atletas em Brasília demonstrando imensa alegria, diante das câmeras de televisão. Enquanto o Brasil jogava a Copa, em junho de 1970, a guerrilha urbana sequestrava o embaixador alemão no Rio de Janeiro. Para os guerrilheiros só interessava libertar os companheiros presos nos “porões” da ditadura.

O TROPICALISMO

O movimento tropicalista nasceu em 1967, inspirados na peça de Osvaldo de Andrade, O rei da vela, em montagem do Teatro Oficina de 1966, e na instalação Tropicália, de Hélio Oiticica, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Rogério Duprat, Torquato Neto e Tom Zé, entre outros, começaram a produzir canções que buscassem uma renovação cultural. Irreverentes e debochados, os tropicalistas opunham-se ao nacionalismo de parte de intelectuais de esquerda. Incorporaram a guitarra à sua música sem ignorar a bossa nova ou qualquer outro estilo musical. Valendo-se da antropofagia cultural modernista de Osvaldo de Andrade (um dos organizadores da Semana de Arte Moderna de 1922). Procuravam incorporar a cultura estrangeira sem deixar de ser nacionais, quer dizer, não estavam imitando, mas sim criando uma nova música ao introduzir elementos de outras culturas. Utilizavam as guitarras do rock e da jovem guarda, elogiavam a bossa nova e tentavam como referência Carmen Miranda, símbolo dessa fusão cultural. Em 1968, quando Caetano Veloso, Gilberto Gil e Os Mutantes entraram em cena no IV Festival Internacional da Canção da TV Globo para cantar “É proibido proibir”, foram fortemente vaiados pelo público, que condenou o uso das guitarras e a maneira extravagantes como os músicos se apresentaram. Caetano Veloso fez um discurso criticando a juventude que o vaiava e, em uma entrevista para o Jornal da Tarde, Gilberto Gil explicou:

“Não temos culpa se eles não querem ser jovens. É isso mesmo, querem que a gente cante os sambinhas. Mas não tenho raiva deles. Não, eles estão embotados pela burrice que uma coisa chamada Partido Comunista resolveu pôr nas cabeças deles”.

Enquanto parte da juventude politicamente engajada considerava a obra tropicalista fruto da alienação e da reprodução da cultura norte-americana, os tropicalistas acusavam essa mesma juventude de ser conservadora e formatada por um pensamento de esquerda que inibia qualquer movimento de renovação cultural.

Entretanto, pouco depois de encerrado o festival de 1968, em setembro, veio o AI-5. Caetano Veloso e Gilberto Gil foram presos e depois se exilaram na Inglaterra, Chico Buarque foi para a Itália. Geraldo Vandré, para a Argélia, passando depois por vários países da Europa. Em 1969, ocorreria o último festival já sem a presença de muitos daqueles que integraram o movimento de renovação da canção brasileira nos anos 1960.

quarta-feira, 2 de agosto de 2023

O governo Figueiredo (1979-1985) – Redemocratização

A sucessão de Geisel foi disputada por dois militares: o general João Batista Figueiredo, apoiado pela ARENA, e o general Euler Bentes Monteiro, que pregava a rápida redemocratização, apoiado pelo MDB. Mais uma vez o Congresso Nacional ratificou o candidato oficial e o general Figueiredo apresentou uma plataforma em que se propunha a diminuir os gastos públicos, desestatizar a economia e ampliar a abertura política.
general João Batista Figueiredo

Eleito de forma indireta em outubro de 1978, o general João Batista Figueiredo assumiu a presidência da República em março de 1979 para um período de 6 anos – uma das imposições do Pacote de Abril, que aumentou o mandato presidencial para prolongar a permanência dos militares no poder.

O governo Figueiredo foi pressionado por uma articulação cada vez mais corajosa das forças oposicionistas da sociedade civil, que exigiam basicamente volta ao estado de direito, com a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, anistia política e justiça social.
A crise econômica se agravava, confirmando as previsões dos economistas da oposição. A taxa de inflação atingiu a casa dos 200%, a dívida pública interna ultrapassou 90 trilhões de cruzeiros, a dívida externa atingiu mais de 100 bilhões de dólares e o índice de desemprego real chegou aos 20% da mão-de-obra ativa.
A liberdade de imprensa permitiu que viesse à tona muitos escândalos financeiros com envolvimento de autoridades governamentais. O processo de abertura gradual continuou controlado pelo governo federal, embora fosse acelerado pelas exigências de uma sociedade pressionada durante quase duas décadas de ditadura. Por outro lado, setores mais radicais do poder, contrários à continuidade da abertura, organizavam atentados terroristas, buscando desestabilizar o próprio governo e criar condições para um retrocesso político.
Em março de 1979, metalúrgicos do ABC, região da Grande São Paulo, entraram novamente em greve, mobilizando 180 000 operários. O governo federal interveio no sindicato, destituindo suas lideranças. Essa foi a primeira de uma série de greves na região: em abril de 1981, 330 000 operários pararam durante 41 dias, enfrentando violenta repressão. Luís Inácio da Silva, o Lula, líder desses movimentos, tornou-se símbolo de uma ação sindical combativa e renovada. Mais de 200 greves eclodiram por todo o Brasil no ano de 1980, fato que se repetiu nos anos seguintes.
Em agosto de 1979, a União Nacional dos Estudantes (UNE) foi reorganizada, embora não recebesse reconhecimento oficial. Nesse mesmo ano foi aprovada a Lei de Anistia, proposta por Figueiredo, e no início de 1980 os presos políticos libertados e os exilados podiam voltar ao país.
No final de 1979, o governo extinguiu a ARENA e o MDB, forçando uma reforma partidária, em que, entretanto, estavam proibidos os partidos comunistas. Formaram-se os seguintes partidos: Partido Democrático Social (PDS), herdeiro da antiga ARENA; Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), continuidade do antigo MDB; Partido Democrático Trabalhista(PDT), liderado por Leonel Brizola; Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), formado por setores da Antiga ARENA; Partido dos Trabalhadores(PT), com uma proposta socialista; e o Partido Popular(PP), que logo se auto extinguiu.
Em 1981, o governo, através de legislação eleitoral, proibiu alianças entre vários os partidos, objetivando forçar a divisão do bloco oposicionista e facilitar a vitória do PDS.
Em novembro de 1982 realizaram-se eleições diretas para governador, o que não ocorria desde 1967. O PDS saiu vitorioso em 12 Estados e a oposição em 10, embora os partidos oposicionistas tivessem 25 milhões de votos e o partido situacionista, 18 milhões. Nos estados mais populosos e de economia mais desenvolvida a oposição alcançou a vitória, com exceção de Pernambuco e Rio Grande do Sul, onde o PDS conquistou o poder por pequena margem de votos.
No Congresso Nacional o governo perdeu a maioria na Câmara dos Deputados, embora tenha mantido sua liderança no Senado, graças aos senadores “biônicos”.
Os governadores estaduais eleitos foram empossados em 1983, apesar da ameaça da extrema direita, dirigidas sobretudo a Leonel Brizola, eleito no Rio de Janeiro.
A vitória dos oposicionistas ampliou o espaço de atuação das forças que exigiam a redemocratização do país.

A linha dura em ação

Entretanto, apesar de o governo combinar a abertura política com medidas de repressão, a linha dura continuava insatisfeita. Para seus integrantes era preciso continuar a reprimir qualquer oposição ao regime. Como já não podiam obrigar o governo a fazer isso, muitos deles passaram a organizar atentados a Bomba, com o objetivo de tumultuar o processo político e retardar o retorno ao Estado democrático.

Um desses atentados terroristas ocorreu em outubro de 1979, com a explosão de uma Bomba no carro do jornalista Hélio Fernandes, no Rio de Janeiro. Seguiram-se cerca de 40 atentados ao longo de 1980. Em São Paulo, o jurista Dalmo Dallari, da Comissão de Justiça e Paz, foi sequestrado e violentamente espancado; bancas de revistas que vendiam publicações de esquerda sofreram atentados a bomba; uma carta-bomba enviada à sede carioca da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) matou a secretária Lyda Monteiro da Silva.

Na noite de 30 de abril de 1981, os terroristas da linha dura tentaram sua façanha mais espetacular: colocar bombas em um show de música popular brasileira realizado no Riocentro, Rio de Janeiro, onde estavam concentradas milhares de pessoas. Antes que a tragédia acontecesse, uma das bombas explodiu no carro dos terroristas, matando um sargento e ferindo o capitão Wilson Chaves Machado: os dois militares eram agentes do Doi-Codi carioca.

Os responsáveis pelo atentado jamais foram punidos pelo governo, que tudo fez para abafar essa e outras ações terroristas promovidas por setores da linha dura.

A luta pela redemocratização

Em maio de 1978, o movimento sindical iniciado no ABC ganhou impulso. Nos anos seguintes foram deflagadas, diversas greves, e as reivindicações sindicais alastraram-se por todo o país: operários, professores, médicos, camponeses, funcionários públicos, motoristas de ônibus, bancários, motoristas de taxi, todas as categorias se mobilizavam.
De 21 a 23 de agosto de 1981, lideranças sindicais de todo o Brasil reuniu-se no município de Praia Grande, no litoral de São Paulo, na primeira conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (CONCLAT). Participaram 5 036 delegados de 1 091 entidades de trabalhadores urbanos e rurais. Apesar de algumas divergências internas, o encontro aprovou resoluções que, resumidamente, estabelecia o seguinte: fim da política econômica do governo, liberdade e autonomia sindical, liberdade de organização política e não-realização de acordos com o FMI.
Em 1983, as divergências internas no movimento sindical resultaram na formação de mais uma central de trabalhadores, além da CONCLAT: a Central Única dos Trabalhadores (CUT). Essa divisão, embora refletisse disputas partidárias no seio do movimento sindical, indicava na realidade, concepções diferentes quanto à ação das classes trabalhadoras. O clima de abertura política e o razoável grau de articulação dos trabalhadores resultaram na tolerância do governo à existência tanto da CONCLAT quanto da CUT, embora não oficialmente reconhecidas.
As reivindicações sindicais passaram ao patamar das exigências políticas, desaguando em uma participação massiva dos trabalhadores no grande movimento das Diretas Já.
Os prefeitos e vereadores eleitos em novembro de 1982 encontraram um quadro desalentador nos municípios, com recursos financeiros escassos, encargos da dívida pública municipal elevados e intensas reivindicações populares por novas obras e serviços locais. Essa situação era fruto da centralização financeira implantada após 1964 para que, através do controle financeiro, o governo federal controlasse a política dos municípios. A luta pela a autonomia municipal contribuiria para a redemocratização do país.
Em maio de 1983, todos os prefeitos do Estado de São Paulo reuniram-se na cidade de Rio Claro, onde foi constituída uma comissão interpartidária de prefeitos com a finalidade de coordenar a luta pelo fortalecimento dos municípios paulistas. Paralelamente, movimentos semelhantes organizaram-se em outros estados do país e em poucos meses o movimento se articulou por todo o Brasil, sendo formada a Frente Municipalista Nacional, cuja presidência seria entregue ao então vice-governador de São Paulo, Orestes Quércia.
Em 27 de setembro de 1983, 3 000 prefeitos e vereadores realizaram uma marcha a Brasília, unindo-se num movimento que exigia mais recursos para os municípios. A proposta do governo federal às suas reivindicações foi negativa, e dois meses depois a Frente Municipalista Nacional realizaria nova marcha a Brasília. À revelia do presidente, o movimento conquistaria no Congresso Nacional a reforma tributária para os municípios.
A Frente Municipalista Nacional ainda se uniria à luta pela Constituinte e à mobilização pelas Diretas Já. Em abril de 1984, prefeitos e vereadores enfrentaram o estado de emergência decretado pelo governo federal e realizaram uma terceira marcha a Brasília, desta feita para apoiar a emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas para presidente.
Toda a insatisfação da sociedade brasileira culminou em uma reivindicação política que mobilizou o país de norte a sul: a campanha pela eleição direta para presidente da República. A luta pelas Diretas Já, como ficou conhecida, foi responsável pelas mais numerosas manifestações de massa de nossa história.
Passados 20 anos, desde o golpe de 1964, mais uma vez o presidente seria escolhido por um Colégio Eleitoral, que deveria, como sempre, referendar o nome indicado pelos detentores do poder. A proposta de uma emenda à constituição restabelecendo eleições diretas para presidente sensibilizaria o Brasil.
Em 27 de novembro de 1983, liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), aconteceu a primeira manifestação pelas eleições diretas, quando 10 mil pessoas se concentraram em frete ao estádio do Pacaembu, em São Paulo. A campanha cresceu nos meses nos meses seguintes. No dia 25 de janeiro de 1984, nova concentração foi realizada, reunindo-se aproximadamente 300 mil pessoas, na praça da Sé, em São Paulo.
Comícios, concentrações e passeatas fora realizadas nas capitais dos estados, nas grandes e pequenas cidades, tornando pública a emenda Dante de Oliveira.
Em 10 de abril de 1984, cerca um milhão de pessoas concentrou-se no Rio de Janeiro. Menos de uma semana depois, ultrapassando o recorde carioca, reunia-se, em São Paulo, uma multidão estimada em 1,7 milhão de pessoas. Era o auge da campanha. Levantamentos realizados pelos órgãos de comunicação indicaram que mais de 6 milhões de pessoas se manifestaram nas ruas antes de 25 de abril, data da votação da emenda constitucional. Nesse dia, entretanto, frustraram-se os anseios nacionais. Com Brasília, Goiânia e mais nove municípios sob estado de emergência, o Congresso Nacional votou a emenda Dante de Oliveira: 298 deputados votaram a favor, 65 contra, três abstiveram-se e 112 não compareceram. Faltaram 22 votos favoráveis para completar os dois terços necessários para aprovação de uma emenda constitucional.

O fim da República militar

A campanha das diretas concentrou momentaneamente as esperanças de quase toda a população brasileira. Ela se apresentava como o primeiro passo para a resolução dos inúmeros problemas que afligiam a nação. A eleição do presidente pelo Colégio Eleitoral sugeria a continuidade da situação por mais seis anos.
Com a derrota da emenda, os partidos de oposição iniciaram articulações visando derrotar o regime no próprio Colégio Eleitoral. O PMDB, o PDT e o PTB tentaram atrair setores descontentes do PDS. O PT, porém, se manifestou contra a ida ao Colégio Eleitoral.
Em junho de 1984, o senador José Sarney renunciou a presidência do PDS. Setores dissidentes desse partido se articularam e formaram o Partido da Frente Liberal (PFL). Em julho, o PFL e o PMDB formalizaram um acordo de apoio à candidatura de Tancredo Neves para presidente da República e José Sarney para vice-presidente. Em agosto, a convenção do PDS escolheu Paulo Salim Maluf para candidato, derrotando Mário Andreazza, indicado pelo presidente Figueiredo. A derrota de Andreazza resultou no apoio de mais dissidentes do PDS ao candidato oposicionista, garantindo a neutralidade de Figueiredo e da maioria dos militares no processo sucessório.
Em 15 de Janeiro de 1985, Tancredo Neves derrotou Paulo Maluf no Colégio Eleitoral por 480 votos a 180. “Fomos ao Colégio Eleitoral para que ele nunca mais seja utilizado”, afirmou Tancredo Neves, cuja eleição encerrava o período de 21 anos de regime militar no país. No entanto, Tancredo não tomou posse. Adoecendo, o novo presidente passou por uma longa agonia, que comoveu toda a população, vindo a falecer em 21 de abril, após sete intervenções cirúrgicas.


terça-feira, 1 de agosto de 2023

O governo Geisel (1974-1979)

Em 1973 travou-se nova disputa interna pela sucessão presidencial, tendo, desta vez, os chamados militares castelistas conseguido indicar o nome do general Ernesto Geisel. O MDB lançou uma candidatura de protesto: Ulisses Guimarães para presidente e Barbosa Lima Sobrinho para vice-presidente. Com esses candidatos, o MDB enfrentou a propaganda oficial e realizou a pregação da democracia por todo o país.
general Ernesto Geisel
Na eleição indireta realizada no Congresso Nacional, mais uma vez a ARENA referendou o candidato militar. Ernesto Geisel tomou posse em março de 1974, prometendo o retorno à democracia de forma “lenta, gradual e segura”. Era o início do processo conhecido por abertura, que foi marcado por avanços e retrocessos autoritários.
Geisel indicou para chefe da Casa Civil o general Golbery do Couto E Silva, para o comando do SNI designou o general João Batista de Figueiredo e em substituição a Delfin Neto assumiu o Ministério do planejamento o economista e professor Mário Henrique Simonsen.

A  economia no governo Geisel

O modelo econômico implantado a partir de 1968 começava a apresentar sinais de crise, fato que se agravou com o aumento dos preços do petróleo no mercado internacional. Em dezembro de 1974 foi lançada uma campanha contra a estatização da economia. Uma facção da burguesia começava a opor-se ao governo exigindo que fossem retirados menos recursos do setor privado. Gradativamente, a crise econômica foi se agravando.
Diminuíram os empréstimos internacionais que o Brasil vinha fazendo e que haviam promovido o "milagre econômico" brasileiro. Esse crescimento econômico havia sido o sustentáculo do regime militar. Com o fim do Milagre, a insatisfação popular começou a se manifestar. uma das razões disso é que os preços em geral haviam subidos e os salários achatado.
Era necessário solucionar o problema dos altos gastos com importação de petróleo, principalmente no momento em que chegavam menos recursos do exterior. Para isso, o governo implantou o II Plano Nacional do Desenvolvimento. As principais áreas a receber investimentos seriam os setores de energia e de indústrias básicas. Esse plano deveria também fazer com que os investimentos fossem compatíveis com o desenvolvimento do país e reduzir o capital estrangeiro em setores considerados básicos. Assim, em 1975, foi assinado o acordo nuclear Brasil-Alemanha, que comprometia o Brasil a desenvolver, com empresas alemãs, oito grandes reatores nucleares, para gerar eletricidade e a implantar uma indústria de combustível para esses reatores. No mesmo ano, foi lançado o Programa Nacional do Álcool (Proálcool). Para diminuir a importação de petróleo, misturava-se alcool à gasolina consumida em nosso país.
O governo completou a implantação dos setores de metelurgia, petroquímica e bens de capital no país com crédito abundante, e juros muito baixos, vindos princialmente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Entretanto, os empréstimos internacionais haviam feito com que a dívida externa brasileira crescesse muito, o que, somado à crise do petróleo, a inflação e os baixos salários, deixou claro que a política econômica da ditadura estava esgotada.
De qualquer modo, o general Geisel diversificou os contatos diplomáticos e comerciais do Brasil com o exterior - Japão, países europeus e, inclusive, países comunistas, como China e Angola, na África. Essa política exterior mais aberta possibilitou ao país ampliar sua margem de autonomia em relação aos interesses norte-americanos. Em março de 1977, o presidente rompia um antigo acordo de alinhamento militar com os Estados Unidos.
Em novembro de 1974 foram realizadas eleições para as Assembleias Legislativas Estaduais e para o Congresso Nacional. O pleito foi presidido de um grau de liberdade bem maior que os anteriores e o resultado foi uma vitória bastante expressiva do MDB. A certeza de que através de eleições livres a oposição tomaria o poder ampliou as divergências entre os militares castelistas e a Linha Dura, passando os últimos a pressionar por um novo “fechamento” político.

A abertura política questionada

A abertura ou distensão lenta, gradual e segura prometida pelo generalGeisel não foi do agrado geral. Os militares da chamada linha dura começaram a praticar e a estimular uma repressão ainda maior a membros da oposição. Em outubro de 1975, por exemplo, Vladimir Herzog, professor da Universidade de São Paulo e jornalista da TV Cultura foi prestar depoimento no Destacamento de Operações Internas e Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) de São Paulo, onde acabou sendo assassinado. O general comandante do II Exército (Região Militar de São Paulo) apoiou os policiais que afirmaram que herzog havia cometido suicídio. A declaração não alcançou credibilidade no meio social. As forças de oposição, mesmo ameaçadas, realizaram um culto ecumênico na Catedral da Sé, em São Paulo, sob a liderança do Cardeal D. Paulo Evaristo Arns, que teve a participação de milhares de pessoas.
Em janeiro de 1976, o operário Manoel Fiel Filho também morreu em situação parecida. Esses  fatos aumentaram ainda mais a revolta popuar, e muitas manifestações passaram a acontecer. O presidente da República percebeu que, dentro do Exército, havia setores que estavam deliberadamente tentando acabar com a política de liberalização do regime. Para forçar os militares à obediência, Geisel afastou do cargo o general comandante do II Exército. Era sinal do presidente de que não ia suportar insubordinação.
A atitude de Geisel fortaleceu o processo de abertura e delimitou a atuação da Linha Dura. Geisel continuava com a política de repressão, mas, conforme ele mesmo afirmava, considerava-a um “combate perseverante, rigoroso, mas sem excessos condenáveis, duro, porém sem violências inúteis”.
Apesar de o general Geisel sempre reafirmar sua intenção de promover a abertura, no final de 1976, houve ainda um episódio conhecido como massacre da Lapa. Nesse bairro da cidade de São Paulo, foram cercados e mortos vários militantes do Partido Comunista do Brasil (PC do B).
No mesmo ano de 1976, o presidente enviou ao Congresso um projeto de lei que foi aprovado e que mudou o código eleitoral: a Lei Falcão. De acordo com essa lei, a partir das próximas eleições, as campanhas na TV seriam feitas apenas com a foto do candidato, acompanhada de uma voz que apresentaria alguns dados sobre sua vida. Isso significava que os candidatos não poderiam aparecer discursando ou apresentando suas propostas. A Lei Falcão busvava diminuir a possibilidade de derrota da ARENA em futuras eleições.
Além disso, o governo decretou em 1977 um conjunto de medidas para garantir a vitória da ARENA nas eleições parlamentares de 1978. Esse conjunto de medidas, que ficou conhecido como Pacote de Abril e manteve a Lei Falcão, estabeleceu que um terço dos senadores não mais seria eleito (seria nomeado pelo governo - os senadores biônicos) e o mandato presidencial passaria a ter seis anos.

A sociedade se mobiliza

A oposição via-se sob a repressão controlada de Geisel e os atos terroristas da extrema direita, que passou a agir independentemente. Em 1976 vários atentados foram realizados contra jornais alternativos, políticos da oposição, membros do clero, editoras de livros e até mesmo personalidades conservadoras que não compactuavam com a Linha Dura.
Apesar da repressão, aumentavam as esperanças de mudanças. A sociedade civil tratou de se organizar cada vez mais. Surgiram movimentos de defesa dos direitos  humanos (principalmente presos políticos) e para conseguir anistia política para os que tinham sido perseguidos, condenados ou exilados. Houve também movimentos contra o aumento do custo de vida. Nas campanhas por liberdade e justiça destacaram-se a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Igreja católica.
Ao mesmo tempo, alguns sindicatos se reorganizaram e se fortaleceram. Em 1978, os operários metalúrgicos de São Bernardo do Campo, liderado por Luís Inácio da Silva, apelidado de Lula, entraram em greve. O movimento se espalhou pelo estado de São Paulo e impressionou a sociedade de todo o país: desde 1968 era a primeira greve de tamanha importância. Cerca de 150 mil trabalhadores aderiram a ela. Os operários foram reprimidos e muitos foram presos, entre eles, Luíz Inácio Lula da Silva, que se tornou cada vez mais conhecido.
Os estudantes voltaram às ruas reivindicando mudanças na área educacional e apoian os líderes operários na luta contra o regime militar. Nas eleições parlamentares de 1978, o MDB conseguiu a maioria dos votos da população, mas a Arena permaneceu com maioria com maioria no Congresso, devido às regras do Pacote de Abril.
Em 1978, o governo do presidente Geisel acabou com o AI-5, mas fez incorporar à constituição a possibilidade de o presidente decretar estado de sítio sem aprovação do Congresso Nacional, restaurou o habeas corpus e abriu caminho para a volta da democracia no Brasil. Apoiado pelos militares moderados, Geisel demitiu o comandante do Exército e conseguiu impor seu escolhido como novo presidente. O general João Batista de Figueiredo foi aprovado pelo Congresso e tomou posse em março de 1979.
O primeiro ato marcante do Governo Figueiredo foi a Lei da Anistia, de agosto de 1979, que beneficiou presos, casssados, banidos, exilados ou demitidos de seus empregos, entre essas pessoas estavam ex-governadores e ex-líderes estudantis, que começaram a voltar ao Brasil.



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