segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Zabala - As sequências didáticas e as sequências de conteúdo

 

      

AS SEQÜÊNCIAS DE ENSINO/APRENDIZAGEM OU DIDÁTICAS

Das diferentes variáveis que configuram as propostas metodológicas, analisaremos primeiro a que é determinada pela série ordenada e articulada de atividades que formam as unidades didáticas. Situamos esta variável em primeiro lugar porque é a mais fácil de reconhecer como elemento diferenciador das diversas metodologias ou formas de ensinar. Os tipos de atividades, mas sobretudo sua maneira de se articular, são um dos traços diferenciais que determinam a especificidade de muitas propostas didáticas. Evidentemente, a exposição de um tema, a observação, o debate, as provas, os exercícios, as aplicações, etc., podem ter um caráter ou outro segundo o papel que se atribui, em cada caso, aos professores e alunos, à dinâmica grupai, aos materiais utilizados, etc. Mas o primeiro elemento que identifica um método é o tipo de ordem em que se propõem as atividades. Deste modo, pode se realizar uma primeira classificação entre métodos expositivos ou manipulativos, por recepção ou por descoberta, indutivos ou dedutivos, etc. A maneira de situar algumas atividades em relação às outras, e não apenas o tipo de tarefa, é um critério que permite realizar algumas identificações ou caracterizações preliminares da forma de ensinar. Em qualquer caso, e como já dissemos no primeiro capítulo, o parcelamento da prática educativa em diversos componentes tem certo grau de artificialidade, unicamente explicável pela dificuldade que representa encontrar um sistema interpretativo que permita, ao mesmo tempo, o estudo conjunto e inter-relacionado de todas as variáveis que incidem nos processos educativos. Como tais, estes processos constituem uma realidade global que é totalmente evidente quando pensamos numa sequência de ensino/ aprendizagem sem, por exemplo, ter definido o tipo de relações que se estabelece na aula entre professores e alunos e entre os próprios meninos e meninas. Estas relações são fundamentais na configuração do clima de convivência e, por conseguinte, de aprendizagem. Mas acreditamos que a opção de começar pelas sequências se justifica se, tal como já mencionamos nos capítulos anteriores, levamos em conta a importância capital das intenções educacionais na definição dos conteúdos de aprendizagem e, portanto, do papel das atividades que se propõem. Desta forma, haverá uma grande diferença entre um ensino que considere conteúdo de aprendizagem, por exemplo, a observação dos fenômenos naturais, e o que situe num lugar de destaque as atitudes ou determinadas habilidades sociais, o que determinará um tipo de conteúdos, algumas atividades e, sobretudo, um tipo de sequência.

Podemos considerar que frente a um modelo geralmente expositivo e configurador da denominada aula magistral, surgiu uma diversidade de propostas nas quais a sequência didática se torna cada vez mais complexa. Não é tanto a complexidade da estrutura das fases que a compõem, mas a das próprias atividades, de tal forma que, esquematicamente e seguindo, a sequência do modelo tradicional, que ele denomina circuito didático dogmático, estaria formada por quatro fases:

a) Comunicação da lição.

b) Estudo individual sobre o livro didático.

c) Repetição do conteúdo aprendido (numa espécie de ficção de haver se apropriado dele e o ter compartilhado, embora não se esteja de acordo com ele), sem discussão nem ajuda recíproca.

d) Julgamento ou sanção administrativa (nota) do professor ou da professora.

Se bem que este modelo, tal como descreve Bini, normalmente não se dá de forma tão simples, constitui, sim, o ponto de partida, com variações significativas, de muitas das formas de ensino habituais. Se excetuamos a avaliação negativa que se pode deduzir da forma como se descreve a fase de estudo individual, certamente poderemos concluir que corresponde à sequência estereotipada do modelo tradicional expositivo.

O objetivo deste livro, como já dissemos, não consiste em avaliar determinados métodos, nem propor nenhum em conclusão, mas em pôr sobre a mesa os instrumentos que nos permitam introduzir nas diferentes formas de intervenção aquelas atividades que possibilitem uma melhora de nossa atuação nas aulas, como resultado de um conhecimento mais profundo das variáveis que intervêm e do papel que cada uma delas tem no processo de aprendizagem dos meninos e meninas. Portanto, a identificação das fases de uma sequência didática, as atividades que a conformam e as relações que se estabelecem devem nos servir para compreender o valor educacional que têm, as razões que as justificam e a necessidade de introduzir mudanças ou atividades novas que a melhorem. Assim, pois, a pergunta que devemos nos fazer, em primeiro lugar, é se esta sequência é mais ou menos apropriada e, por conseguinte, quais são os argumentos que nos permitem fazer esta avaliação.

Se adotarmos esta proposição sobre a sequência do modelo tradicional, também deveremos aplicá-lo a qualquer outra sequência, como a do modelo de "estudo do meio", que consta das seguintes fases:

a) Atividade motivadora relacionada com uma situação conflitante da realidade experiencial dos alunos.

b) Explicação das perguntas ou problemas que esta situação coloca.

c) Respostas intuitivas ou "hipóteses".

d) Seleção e esboço das fontes de informação e planejamento da investigação.

e) Coleta, seleção e classificação dos dados.

f) Generalização das conclusões tiradas.

g) Expressão e comunicação.

O que podemos dizer desta sequência além da constatação de sua maior complexidade? Vale a pena complicar tanto? Contribui para melhorar a aprendizagem dos alunos? Podem se acrescentar ou eliminar algumas atividades? Quais? Mas, sobretudo, que razões podemos esgrimir para fundamentar as avaliações que fazemos ou as decisões que tomamos? Que avaliação podemos fazer desta sequência e que razões a justificam?

Para poder responder a estas e outras perguntas, utilizaremos neste capítulo os referenciais básicos para a análise de quatro sequências correspondentes a quatro unidades didáticas exemplificadas, muito utilizadas e conhecidas por todos nós. Em primeiro lugar, depois da descrição de cada uma delas, analisaremos as diferentes concepções do ensino que as respaldam, utilizando os diferentes tipos de conteúdos como instrumentos para detectar as posturas que as fundamentam. Posteriormente, uma vez vistas as intenções de cada uma das unidades, comprovaremos que modificações e mudanças haveriam que introduzir para melhorar a aprendizagem, dos conteúdos. Para realizar esta análise utilizaremos as condições da aprendizagem significativa, o que nos obrigará a introduzir uma nova unidade de análise, a sequência de conteúdo, a fim de poder acompanhar os processos de ensino/aprendizagem segundo as características particulares de cada um dos diferentes tipos de conteúdos.

QUATRO UNIDADES DIDÁTICAS COMO EXEMPLO

Nos quatro exemplos de unidades de intervenção, poderemos observar um grau diferente de participação dos alunos, assim como a apresentação por parte do professor ou da professora de uma situação problemática relacionada com um tema

O professor ou a professora desenvolve um tema em tomo de um fato ou acontecimento, destacando os aspectos problemáticos e os que são desconhecidos para os alunos.

Como na unidade anterior, os conteúdos do tema c da situação que se coloca podem ir desde um conflito social ou histórico, diferenças na interpretação de certas obras literárias ou artísticas, até o contraste entre um conhecimento vulgar de determinados fenômenos biológicos e possíveis explicações científicas.

2. Proposição de problemas ou questões

Os alunos, coletiva e individualmente, dirigidos e ajudados pelo professor ou professora, expõem as respostas intuitivas ou suposições sobre cada um dos problemas e situações propostos

4.     Proposta das fontes de informação

Os alunos, coletiva e individualmente, dirigidos e ajudados peio professor ou professora, propõem as fontes de informação mais apropriadas para cada uma das questões: o próprio professor, uma pesquisa bibliográfica, uma experiência, uma observação, uma entrevista, um trabalho de campo.

5.     Busca da informação

Os alunos, coletiva e individualmente, dirigidos e ajudados peio professor ou professora, realizam a coleta dos dados que as diferentes fontes lhes proporcionaram. A seguir selecionam e classificam estes dados.

6.     Elaboração das conclusões

Os alunos, coletiva e/ou individualmente, dirigidos e ajudados pelo professor ou professora, elaboram as conclusões que se referem às questões e aos problemas opostos.

Generalização das conclusões e síntese

Com as contribuições do grupo e as conclusões obtidas, o professor ou professora estabelece as leis, os princípios que se deduzem do trabalho realizado.

8.     Exercícios de memorização

Os meninos e meninas, individualmente, realizam exercícios de memorização que lhes permitam lembrar dos resultados das conclusões, da generalização e da síntese.

9.     Prova ou exame

Na classe, todos os alunos respondem às perguntas e fazem os exercícios do exame durante uma hora.

10.   Avaliação

A partir das observações que o professor fez ao longo da unidade e a partir do resultado da prova, este comunica aos alunos a avaliação das aprendizagens realizadas.

Antes de continuar insistindo no que manifestei anteriormente, e para não fazer uma leitura com preconceitos contra ou a favor, faremos algumas considerações em relação a estes exemplos. Com estas representações não pretendo ilustrar nenhuma tendência nem, naturalmente, fazer avaliações tendenciosas. Uns mais, outros menos, todos temos utilizado, ou utilizamos, formas de ensinar relacionadas com alguma destas sequências. Como observaremos a seguir, todas elas podem ser válidas. Cada uma delas tem aspectos suficientemente positivos, daí que todas podem ter alguma utilidade. De qualquer forma, segundo quais sejam nossos objetivos, nosso conhecimento dos processos subjacentes à aprendizagem e o contexto educativo em que se realizam, nos daremos conta de que são incompletas. O que nos interessa desta análise é reconhecer as possibilidades e as carências de cada unidade, com o fim de que nos permita compreender outras propostas e reconhecer, em cada momento, aquelas sequências que se adaptam mais às necessidades educacionais de nossos alunos.

CRITÉRIOS PARA A ANÁLISE DAS SEQUÊNCIAS:OS CONTEÚDOS DE APRENDIZAGEM COMO EXPLICITAÇÃO DAS INTENÇÕES EDUCATIVAS

Um primeiro olhar nos exemplos propostos servirá para examinar se cada um deles pretende alcançar os mesmos objetivos. Assim, para a análise das sequências examinaremos, em primeiro lugar, os conteúdos que se trabalham, a fim de julgar se são os mais apropriados para a consecução dos objetivos.

• Se observamos o Quadro 3.1, veremos que os conteúdos da primeira unidade são fundamentalmente, conceituais. A técnica expositiva dificilmente pode tratar outra coisa que não seja conteúdos conceituais. Em todo caso, podem se expor modelos de realização do algum conteúdo procedimental, ou pode se fazer*

• Alguma avaliação sobre as atitudes de algum personagem. Mas o tratamento é basicamente conceituai. As habilidades que se trabalham (tomar notas, técnicas de estudo, síntese, memorização) não podem ser consideradas conteúdos de aprendizagem, já que em nenhum momento são levadas em conta como objetos de ensino, mas como meios para a memorização e, portanto, não se ensinam nem se avaliam diretamente. As atitudes que se desenvolvem nesta unidade não vão além das necessidades para a manutenção da ordem e do respeito dos professores. Com tudo isto podemos concluir que os conteúdos que se trabalham são conceituais e que o objetivo fundamental dos professores consiste em que os alunos "saibam" determinados conhecimentos.

• Os conteúdos da unidade 2 são fundamentalmente procedimentais no que se refere ao uso do algoritmo e conceituais quanto à compreensão dos conceitos associados, neste caso os de fração, sintagma nominal ou velocidade. Os conteúdos atitudinais mais claros só aparecem na fase de diálogo entre alunos e professor ou professora, enquanto que nas outras fases são apenas o resultado do papel exigido. 

• Na unidade 3 se pretende que os alunos cheguem a conhecer determinados conteúdos de caráter conceituai. Para sua compreensão se utiliza uma série de técnicas e procedimentos - diálogo e debate, fundamentalmente mas como na primeira unidade analisada, estes conteúdos têm uma função de uso, já que certamente não serão levados em conta ao se avaliar. Os conteúdos atitudinais que aparecem - interesse em fazer propostas, participação nos diálogos e debates, respeito pela vez de falar e pela opinião dos demais - tampouco serão considerados conteúdos avaliáveis. Vemos, pois, que nesta unidade aparecem atividades que, apesar de se centrarem na aprendizagem de conteúdos conceituais, utilizam conteúdos de caráter procedimental e atitudinal, e que aparentemente não são objeto de estudo porque não há uma intenção explicitamente educativa, uma vez que tampouco são objeto da avaliação. Se isto é assim, e estes conteúdos procedimentais não são avaliados no desenvolvimento da unidade nem ao final dela, podemos concluir que a-única coisa que se pretende é a aprendizagem de conteúdo os conceituais, que "saiba m " sobre temas históricos, sociais, literários, artísticos ou científicos. Pelo contrário, se os conteúdos de caráter procedimental ê atitudinal que se trabalham são avaliados posteriormente e, portanto, se tem consciência de que também são conteúdos que devem se "ensinar" enquanto são utilizados, poderemos dizer que se pretende que os meninos e meninas "saibam" os temas, "saibam fazer" diálogos e debates e "sejam" participativos e respeitosos.

Na unidade 4- vemos que em praticamente todas as atividades que formam a sequência aparecem conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais. Neste caso, os alunos controlam o ritmo da sequência; atuando constantemente e utilizando uma série de técnicas e habilidades: diálogo, debate, trabalho em pequenos grupos, pesquisa bibliográfica, trabalho de campo, elaboração de questionários, entrevista, etc. Ao mesmo tempo, encontram-se diante de uma série de conflitos pessoais e grupais de sociabilidade que é preciso resolver, o que implica que devam ir aprendendo a "ser" de uma determinada maneira: tolerantes, cooperativos, respeitosos, rigorosos, etc. Nesta sequência vemos que, como nas outras, aparecem conteúdos das três categorias. Mas neste caso existe um trabalho muito explícito no campo dos conteúdos procedimentais e atitudinais. Do mesmo modo que na unidade anterior, o fato de que apareçam estes conteúdos não quer dizer que exista uma consciência educativa. Enquanto isto não se traduza na maneira de trabalhar estes conteúdos por parte dos professores e não sejam objeto de avaliação, não poderemos considerá-los conteúdos explícitos de aprendizagem. No entanto, se nos detemos na fase de avaliação, pode se ver que não se faz apenas uma avaliação da prova realizada, mas que a classificação é o resultado das observações feitas durante toda a unidade. Neste caso, pode se afirmar que se pretende que os alunos "saibam" os termos tratados, "saibam fazer" questionários, investigações, entrevistas, etc., e que cada vez "sejam" mais tolerantes, cooperativos, organizados, etc.

Uma primeira avaliação feita segundo a tipologia de conteúdos, como reflexo da função que se atribui ao ensino, permite nos darmos conta de que nos três primeiros casos encontramos diferentes formas de ensinar que não deixam de estar situadas num modelo de formação centrado nos conteúdos convencionais ligados ao "saber" e ao "saber fazer" mais ou menos acadêmicos, com uma função basicamente propedêutica. No caso da unidade 4, se não fosse a aparência de que a avaliação observa os diferentes tipos de conteúdo, poderíamos dizer que se trata de uma forma de ensinar que também se limita aos conteúdos convencionais do "saber", e também poderíamos pensar que os procedimentos, os valores e as atitudes que se desenvolvem são simplesmente' uma estratégia para fazer com que a aprendizagem seja mais interessante ou mais profunda. Por outro lado, dado que a avaliação também contempla os procedimentos e atitudes como conteúdos de aprendizagem, podemos considerar que o objetivo do ensino, para este professor ou professora, atende a uma formação mais integral.

A avaliação que podemos fazer destes casos até agora está relacionada à ideia que temos sobre o que deve ser o ensino e, portanto, na maior ou menor coincidência com os objetivos implícitos de cada uma das unidades. Numa primeira aproximação, e se partíssemos do pressuposto de que estes professores sempre utilizam a mesma forma de ensinar, poderíamos estar mais ou menos de acordo com cada um deles, segundo o sentido e o papel que nós atribuímos ao ensino. Agora, se nossa concepção perseguisse a formação integral do aluno, só poderíamos nos inclinar para a unidade 4, já que é o único caso em que se trabalham explicitamente as diferentes capacidades da pessoa. Mas, inclusive neste caso, seria necessário comprovar posteriormente se existe uma coincidência com o tipo de cidadão e cidadã que se promove. No entanto, em nenhum caso podemos pensar que estas são as únicas formas de trabalhar e, portanto, podemos pensar que o próprio professor combina estes quatro tipos de unidades, além de outras. Assim, supondo que em cada caso estes sejam os conteúdos que se querem trabalhar, nos interessa descobrir se a sequência didática proposta serve para alcançar os objetivos previstos, quer dizer, se promove a aprendizagem. É neste momento que temos que nos perguntar se todas as sequências são úteis para chegar àquilo que pretendemos. Então, é o momento de utilizar o outro referencial de análise: a atenção à diversidade e a concepção construtivista.

A CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA E A ATENÇÃO À DIVERSIDADE

Podemos extrair do conhecimento da forma de produção das aprendizagens duas perguntas: a primeira, relacionada com a potencialidade das sequências para favorecer o maior grau de significância das aprendizagens, e a segunda, sua capacidade para favorecer que os professores restem atenção à diversidade.

Expressada de forma muito sintética, e como vimos, a aprendizagem é uma construção pessoal que cada menino e cada menina realizam graças à ajuda que recebem de outras pessoas. Esta construção, através da qual podem atribuir significado a um determinado objeto de ensino, implica a contribuição por parte da pessoa que aprende, de seu interesse e disponibilidade, de seus conhecimentos prévios e de sua experiência. Em tudo isto desempenha um papel essencial a pessoa especializada, que ajuda a detectar um conflito inicial entre o que já se conhece e o que se deve-saber, que contribui para que o aluno se sinta capaz e com vontade pelo, que propõe o novo conteúdo como um desafio interessante, cuja resolução terá alguma utilidade, que intervém de forma adequada nos progressos e nas dificuldades que o aluno manifesta, apoiando-o e prevendo, ao mesmo tempo, a atuação autônoma do aluno. É um processo que não só contribui para que o aluno aprenda certos conteúdos, mas também faz com que aprenda a aprender e que aprenda que pode aprender. Sua repercussão não se limita ao que o aluno sabe, igualmente influi no que sabe fazer e na imagem que tem de si mesmo.

Este conhecimento nos permite estabelecer uma série de perguntas ou questões variadas, diferentes sequências didáticas com o objetivo de = reconhecer sua validade, mas, sobretudo, de nos facilitar pistas para reforçar algumas atividades ou acrescentar outras novas. As perguntas podem ser feitas da seguinte forma: Na sequência didática existem atividades:

a)     que nos permitam determinar os conhecimentos prévios que cada aluno tem em relação aos novos conteúdos de aprendizagem?

b)     cujos conteúdos são propostos de forma que sejam significativos e funcionais para os meninos e as meninas?

c) que possamos inferir que são adequadas ao nível de desenvolvimento de cada aluno?

d)   que representem um desafio alcançável para o aluno, quer dizer, que levam em conta suas competências atuais e as façam avançar com a ajuda necessária; portanto, que permitam criar zonas de desenvolvimento proximal e intervir?

e) que provoquem um conflito cognitivo e promovam a atividade mental do aluno, necessária para que estabeleça relações entre os novos conteúdos e os conhecimentos prévios?

f) que promovam uma atitude favorável, quer dizer, que sejam motivadoras em relação à aprendizagem dos novos conteúdos?

g) que estimulem a autoestima e o autoconceito em relação às aprendizagens que se propõem, quer dizer, que o aluno possa sentir que em certo grau aprendeu, que seu esforço valeu a pena?

h) que ajudem o aluno a adquirir habilidades relacionadas com o aprender a aprender, que lhe permitam ser cada vez mais autônomo em suas aprendizagens?

Se utilizamos estas perguntas nas quatro unidades que apresentamos como exemplo, poderemos estabelecer as considerações que se expõem a seguir.

1. Comunicação da lição

2. Estudo individual sobre o livro-texto

3. Repetição do conteúdo aprendido

4. Prova ou exame

5. Avaliação

Unidade 1

a) Conhecimentos prévios

Nesta unidade podemos observar que o professor ou a professora pouco controla o processo de aprendizagem dos alunos, as atividades propostas não lhes permitem saber de que conhecimentos prévios dispõem. O professor supõe que todos os meninos e meninas sabem do que necessitam para esta unidade, ou prescinde deste conhecimento. Em todo caso, podemos supor que parte do resultado da última avaliação. Se esta informação é insuficiente, certamente bastaria introduzir urna atividade inicial, por exemplo, um diálogo ou debate sobre o tema, que facilitasse informar-se sobre os conhecimentos dos alunos para que servisse corno ponto de partida da exposição.

b) Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

Pela descrição da sequência não podemos saber se os conteúdos tratados são suficientemente significativos ou funcionais. Que o sejam ou não depende de como se tenha iniciado a intervenção. Se a exposição é uma simples transmissão dos conteúdos que não guarda nenhuma relação com algum fato próximo à realidade experiencial ou afetiva do aluno - como partir de alguma situação conflitante ou problemática -, os conteúdos do tema serão considerados somente como uma lição que é preciso conhecer para desempenhar-se com êxito na prova e não tanto como um conhecimento que é interessante possuir.

c) Nível de desenvolvimento

O grau de complexidade da exposição e o número de variáveis inter-relacionadas que se utilizem determinarão a dificuldade da compreensão. Se à exposição não se acrescentam atividades de diálogo com os alunos ou entre eles, que permitam nos darmos conta da conveniência dos novos conteúdos, tanto em relação às dificuldades de compreensão como a sua capacidade, será um processo sem controle, no qual a aprendizagem dependerá apenas da capacidade pessoal de cada um dos meninos e meninas.

d) Zona de desenvolvimento proximal

Se, quando se estabeleceram formas de comunicação individualizadas, já é bastante difícil determinar se os desafios que se propõem aos alunos e o tipo de ajuda são apropriados para cada um deles, poder controlar esta condição é praticamente impossível numa sequência como esta. Será necessário introduzir atividades que estimulem os alunos a expressar o que pensam sobre o tema tratado, de forma que nos deem pistas acerca dos diferentes níveis de complexidade que deve ter a exposição.

c) Conflito cognitivo e atividade mental

Numa sequência deste tipo, o professor nunca controla a atividade mental do aluno. Se a exposição introduz as possíveis questões, paradoxos ou contradições, sem dúvida favorecerá os conflitos cognitivos de alguns alunos, mas não os de todos, nem com a profundidade suficiente para garantir que cada um deles realize o processo construtivo que a aprendizagem exige. Para poder influir no processo de elaboração individual, na atividade mental de cada menino e menina, terá que introduzir atividades que obriguem os alunos a questionar seus conhecimentos e a reconsiderar as interpretações que fizeram deles.

f) Atitude favorável

A motivação para a aprendizagem não decorre da sequência em si mesma, ao menos neste caso, já que tal como está descrita não conta com nenhuma atividade prévia à exposição para despertar o interesse dos alunos. O fato de que seja mais ou menos interessante dependerá da forma e das características da exposição. A maneira de fazê-la, o tipo de relações e cumplicidades que se estabelecem entre professor e aluno, os exemplos, a empatia e o grau de comunicação são as cartas de que o professor pode dispor, numa sequência deste tipo, para fomentar o interesse pela aprendizagem. Se efetuamos uma leitura tópica desta sequência, tal como a descreve Bini, certamente poderemos dizer que as razões que justificam a motivação dos alunos estão fora do conteúdo de aprendizagem e se centram em alcançar alguns bons resultados. O que mais importa não é saber, mas superar as provas da avaliação, de maneira que as estratégias de aprendizagem que se mobilizam são aquelas que garantem o êxito na prova e não no conhecimento. Para poder incidir nesta variável é necessário pôr em jogo diferentes recursos que não podem se concretizar somente numa atividade mais ou menos satisfatória no começo da unidade, mas terá que complementá-la com uma série de medidas estreitamente relacionadas com a necessidade de promover a autoestima e o autoconceito de cada menino e menina.

g)     Autoestima e autoconceito

Este tipo de sequência dispõe poucos meios para o professor se relacionar afetivamente com os alunos, daí que é muito difícil que os aspectos associados aos sentimentos, às avaliações próprias e dos outros, às expectativas, etc. se traduzam em ações dos professores que possam incidir favoravelmente. Devemos ter presente que, usando exclusivamente uma sequência deste tipo, os momentos de relação pessoal se limitam a alguns contatos esporádicos, muitas vezes fora da aula, ou à informação, geralmente por escrito e muito concisa, que se dá nas avaliações. Se levamos em conta que o fomento da autoestima e do autoconceito é fundamental para favorecer a aprendizagem, teremos que introduzir atividades que permitam intercâmbios frequentes professor/ aluno. Teremos que reconsiderar, também, que sentido deve ter a avaliação, para que se centre não tanto no que lhes falta aprender como no progresso que estão experimentando.

h)     Aprender a aprender

Neste modelo, as atividades que o aluno realiza de forma independente são básicas. A partir da exposição do professor ou da professora, o aluno fica com o papel principal - será ele que fará o estudo, as atividades de memorização e a prova, de maneira que terá que se virar naquelas atividades que lhe permitam superar as provas ou exames. Tanto é assim que estas últimas certamente serão as habilidades em que conseguirá ser mais competente. Mas não devemos esquecer que não são habilidades exclusivas, nem certamente as mais importantes, para posteriormente realizar aprendizagens de maneira autônoma - sempre que entendamos que estas aprendizagens não são unicamente as relacionadas com a superação de provas mais ou menos escolares.

Conclusões

Podemos deduzir, desta análise, que dificilmente se pode atender aos princípios de uma aprendizagem significativa e que leve em conta a diversidade se não se incluem muitas outras atividades que ofereçam mais informação acerca dos processos que os alunos seguem, que permitam adequar a intervenção a estes acontecimentos. Mas como veremos quando tratarmos, neste mesmo capítulo, do ensino dos conteúdos factuais e conceituais, esta sequência é, com algumas mudanças, muito benéfica. Principalmente quando os conteúdos são factuais (nomes, obras, datas, aconteci mentos, dados, descrições, etc.) ou quando os conceitos são suficientemente simples para a idade dos alunos. Neste caso, somente se atendidas as condições que promovem a motivação, dado que há poucas dificuldades de compreensão e que muitas vezes a simples exposição e memorização posterior é suficiente para que a aprendizagem seja significativa. Por outro lado, quando os conteúdos são mais complexos, esta sequência é muito simples para poder satisfazer todas as condições de que os professores necessitam para controlar os processos de ensino que garantam uma aprendizagem verdadeiramente compreensiva.

O desprestígio de que goza esta sequência, nas posições progressistas, se deve ao uso único e excludente que se faz dela e ao fato de ser utilizada normalmente pelas propostas que consideram que uma das SB funções primordiais do ensino é a seletiva, transformando assim o modelo de intervenção num instrumento seletivo essencial. De certo modo se diz: não apenas não serve quem não sabe, como tampouco serve quem não é capaz de aprender um sistema de exposição simples. Quem não aprende desta maneira não está preparado ou não está em condições de seguir os estudos. O êxito, ou a sobrevivência no modelo, é o que o legitima, ao mesmo tempo, como meio e como fim em si mesmo. Mas este uso perverso do modelo de sequência não deve nos fazer perder de vista sua potencialidade para determinados conteúdos.

Unidade 2

1 Apresentação, por parte do professor ou da professora, de uma situação problemática 2. Busca de soluções 3. Exposição do conceito e algoritmo 4. Generalização. 5. Aplicação 6. Exercitação 7. Prova ou exame 8. Avaliação

a)     Conhecimentos prévios

A segunda atividade desta sequência, quando o professor pede aos alunos diferentes formas de resolver o problema ou conflito, é a que pode permitir saber que conhecimentos têm acerca do tema em questão. Mas para que isto seja assim, será necessário que estas perguntas, e principalmente as respostas, tenham sido feitas pelos alunos que se encontram numa situação mais desfavorável e não apenas por uns poucos alunos, nem por aqueles que geralmente dispõem de mais informação. Caso contrário, é fácil cair na ilusão de acreditar que as respostas dadas espontaneamente por parte dos alunos correspondem ao conhecimento de todos e de cada um dos meninos e meninas.

b)     Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

Esta sequência resolve com clareza esta condição, já que o conceito não aparece antes de que tenha se apresentado sua necessidade. Em primeiro lugar, foi preciso elaborar o conceito para poder resolver o problema, de maneira que o termo aparece quando já se construiu o significado. A generalização necessária de todo conceito se produz quando já se comprovou seu valor num caso concreto e não antes. Nas atividades posteriores de aplicação, irá se aprofundar na significância e na funcionalidade dos conceitos. No entanto, a ressalva que podemos fazer está relacionada com o grau de participação na elaboração do conceito, de maneira que se não existe um diálogo constante entre professor e alunos, especialmente com os que apresentam mais dificuldades, pode se produzir o paradoxo de que a única pessoa que realmente construiu o significado do novo conteúdo seja o próprio professor.

c)     Nível de desenvolvimento

Como acontece com os conhecimentos prévios, o momento fundamental para determinar a capacidade dos alunos para compreender os novos conteúdos é a atividade em que eles mesmos propõem soluções ao problema colocado pelo professor ou professora. Sempre que estas propostas não sejam de uns poucos alunos nem as dos menos representativos. Nas atividades posteriores de exercitação e sobretudo nas de aplicação, também poderemos comprovar o grau de compreensão e as dificuldades de cada aluno.

d)     Zona de desenvolvimento proximal

A informação que pode se tirar da segunda atividade pode indicar onde se deve situar os desafios na exposição que dará lugar à conceitualização. Mas isto não bastará se na exposição não se introduz um diálogo com todos os alunos, que permita reconduzir o discurso segundo as interpretações que façam. Os dados que tenhamos sobre o que sabem e podem saber ou fazer serão cruciais no planejamento dos exercícios. Esta informação deve nos permitir estabelecer uma ordenação progressiva das atividades, a fim de que cada aluno avance segundo seu ritmo e suas possibilidades reais.

e)     Conflito cognitivo e atividade mental

A primeira atividade proposta, em que o professor propõe uma situação problemática, e a segunda, em que os alunos tentam dar uma resposta, são as que permitem satisfazer esta condição. Estes problemas, caso se consiga que os alunos se apropriem deles, são os que devem promover a atividade mental necessária para a construção do conceito. Mas toda a sequência está sujeita a esta condição, de maneira que o processo de generalização e a aplicação descontextualizadora posterior efetivam esta fruição de incentivo à construção de significado. Será preciso ver o grau de envolvimento dos alunos neste processo, a fim de que não se limite a um acompanhamento mecânico de alguns passos supostamente construtivos.

f)      Atitude favorável

A primeira atividade pode cumprir uma função motivadora sempre que os problemas propostos tenham sua origem em situações próximas dos interesses dos alunos. Portanto, dependerá do tipo de problemas e das situações propostas que os alunos estejam dispostos a aprender. O grau de envolvimento dos alunos em todo o processo também será o que nos informa sobre sua atitude. Devemos levar em conta que, com exceção das duas primeiras atividades e as posteriores, de aplicação e exercitação, os intercâmbios possíveis com os alunos podem ser insuficientes para mantê-los interessados. Também dependerá do papel da avaliação e do tipo de provas que se realizem, já que o interesse pelo saber pode se deslocar facilmente para o interesse pela nota ou conceito.

g)     Autoestima e autoconceito

O fato de partir das opiniões dos alunos e de suas contribuições para resolver os problemas é uma forma de avaliá-los. Nesta sequência, apesar de se dar muita importância aos conhecimentos e às ideias dos alunos, a potencialização ou a não-potencialização da imagem pessoal dependerá do tipo de comentários efetuados e do tipo de avaliações realizado ao longo da unidade. Será também o tipo de avaliação, mas sobretudo a avaliação que se faça tanto dos resultados obtidos como dos processos seguidos, o que determinará que a autoestima ou o autoconceito sejam mais ou menos positivos.

h)     Aprender a aprender

A contribuição essencial desta sequência é que segue fases fundamentalmente indutivas, nas quais o aluno elabora certos conceitos e faz a descontextualização necessária de toda generalização, aplicando o conceito em outras situações. Esta forma de pensar lhe oferece estratégias cognitivas extremamente valiosas em qualquer situação de aprendizagem. Mas, apesar disso, o grau de autonomia do aluno é limitado e as habilidades aprendidas se concretizam mais no contexto escolar: estudo compreensivo, memorização e exercitação.

Conclusões

Como pudemos ver, esta sequência satisfaz de maneira adequada muitas das condições que fazem com que a aprendizagem possa ser o mais significativa possível. Permite prestar uma atenção notável às características diferenciais dos alunos, sempre que se introduza um maior número de intercâmbios que favoreça o deslocamento do Protagonismo para os alunos. E é aqui que se encontra a grande debilidade desta sequência, já que facilmente se corre o risco de dar por bom o discurso do professor e as respostas de alguns alunos como supostos representantes do pensamento da maioria. Ao mesmo tempo, a motivação inicial pode perder força se não se introduzem atividades que dêem sentido à tarefa de aprendizagem, principalmente nas atividades mais pesadas de exercitação. E, finalmente, é crucial o papel que se atribui à avaliação, já que pode modificar por completo a valoração da sequência segundo a função que este elemento tenha na unidade.

d) Zona de desenvolvimento proximal

A segunda e terceira atividades são cruciais para examinar o que pensam os alunos, que dúvidas têm e que interpretações fazem. Esta série de informações pode ser suficiente para orientar o tipo de exemplos que é preciso dar, ou argumentos que é preciso colocar para que a construção do conhecimento seja realizada por todos os meninos e meninas.

 Unidade 3

1. Apresentação por parte do professor ou da professora de uma situação problemática em relação a um tema 2. Diálogo entre professor ou professora e alunos 3. Comparação entre diferentes pontos de vista 4. Conclusões 5. Generalização 6. Exercícios de memorização 7. Prova ou exame 8. Avaliação.

a)     Conhecimentos prévios

Como se pode ver, esta sequência apresenta uma diferença fundamental em relação às anteriores no que se refere ao grau de participação dos alunos. As duas primeiras atividades são como as da unidade 2. Portanto, como naquele caso, a segunda permite examinar com bastante fidelidade que conhecimentos têm os meninos e meninas, sempre que todos participem do diálogo. Neste caso, devemos acrescentar que os alunos participam na maioria das atividades que compõem a unidade,  fato que permite que o conhecimento sobre o estado de elaboração e o que sabem apareça frequentemente e que possibilita, ao mesmo tempo, a adequação das intervenções do professor às necessidades que se apresentam.

b)     Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

O esquema da sequência é muito similar ao anterior, mas além das mudanças determinadas pelo grau de participação dos alunos, cabe acrescentar que neste caso só se tratam de maneira manifesta conteúdos de caráter conceituai, enquanto que no anterior os procedimentais eram básicos. Como no modelo anterior, isto faz com que o sentido das aprendizagens esteja claramente determinado desde o começo. Os novos conteúdos de aprendizagem aparecem, no princípio, como meios para resolver os conflitos que o professor propôs e não como um conhecimento fora de um contexto mais ou menos próximo do aluno.

c)     Nível de desenvolvimento

A participação dos alunos durante a sequência permite, desde que o professor esteja alerta, reconhecer as dificuldades de compreensão que se apresentam. Portanto, é possível adequar as explicações aos diferentes graus de assimilação.

e) Conflito cognitivo c atividade mental

O ponto de partida desta sequência é a criação do conflito cognitivo e a ativação do pensamento, de maneira que esta é uma das funções da primeira atividade. Mas este argumento não se limita a esta atividade, senão que nas seguintes se busca que os alunos manifestem suas opiniões, a fim de que lhes seja mais fácil entender as conclusões e o processo de generalização. No entanto, dado o protagonismo que o professor tem ao tirar conclusões, e no momento da generalização, é bem possível que este processo construtivo só seja realizado por aqueles capazes de participar ativamente. Certamente será necessário introduzir alguma atividade que promova um maior grau de participação dos alunos no processo de generalização e, portanto, um maior controle do professor sobre o processo de aprendizagem.

f)      Atitude favorável

Esta é a outra função que a primeira atividade deveria cumprir. O fato de que se parta de uma situação conflitante pode facilitar que os alunos se engajem, mas, logicamente, para que este interesse não se manifeste apenas nos mais estimulados intelectualmente, será necessário entreter os alunos para permitir a participação de todos. A vantagem desta unidade é que oferece a possibilidade de potencializar nas atividades seguintes, o interesse inicial ou favorecer outros momentos para provocá-lo novamente. Como sempre, o papel que desempenhe a avaliação será crucial como meio para promover interesse pelo conteúdo de aprendizagem ou simplesmente pela nota final.

g)     Autoestima e autoconceito

As opiniões dos alunos são a-matéria-prima para a construção do discurso do professor e para gerar as conclusões. É lógico que se os diferentes momentos de diálogo são utilizados para promover a avaliação pessoal, estes ajudarão na formação de imagens positivas. Mas o simples fato de que haja um maior número de relações interpessoais não quer dizer que ajudem na melhora do autoconceito. O tipo pie intercâmbios, as avaliações que se fazem das opiniões e, principalmente, o tipo de valoração final das aprendizagens alcançadas e sua publicidade serão peças cruciais na construção positiva da autoestima.

O que comentamos na unidade 2 em relação a este fator também pode se aplicar a esta unidade. Esta sequência ajuda a promover certas habilidades de construção pessoal de conceitos, às quais é preciso acrescentar as técnicas de estudo e de memorização. Todas elas são estratégias cruciais para possibilitar novas aprendizagens, mas têm. o defeito de se limitar a um determinado tipo de habilidades, embora sejam, sem dúvida, as mais habituais no contexto escolar.

Conclusões

Esta sequência, pelo fato de seguir um esquema centrado na construção sistemática dos conceitos^ e oferecer um grau notável de participação dos alunos, especialmente nos processos iniciais, satisfaz em grande parte, as condições que possibilitam que as aprendizagens sejam o mais significativas possível. As carências são consequência da dificuldade para manter o controle do processo individual de cada aluno. É fácil cair na tentação de acreditar que todos e cada um dos meninos e meninas participam numa autentica construção pessoal de significados. Dado que o ritmo da classe, e sobretudo a obtenção de conclusões, tem como protagonista o professor ou a professora, pode se cair facilmente numa situação em que os alunos se limitam apenas a reproduzir as explicações finais - objeto de avaliação - e considerem as atividades prévias como uma simples liturgia necessária para dar um tom atual à intervenção educativa. Neste caso, será responsabilidade do tipo de provas de avaliação conseguir que a aprendizagem seja mais ou menos profunda, que se reduza à simples exposição das conclusões e generalizações, ou que se converta num instrumento da revisão que o aluno faz — do processo que seguiu, desde as perguntas iniciais até a elaboração de suas próprias "descobertas".

Unidade 4

1. Apresentação por parle do professor ou da professora de uma situação problemática em relação a um tema

2. Proposição de problemas ou questões

3. Explicitação de respostas intuitivas ou suposições

4. Proposta das fontes de informação

5. Busca da informação

6. Elaboração de conclusões

7. Generalização das conclusões e síntese.

8. Exercícios de memorização

9. Prova ou exame

10. Avaliação

a) Conhecimentos prévios

Como nas duas unidades anteriores, as atividades iniciais têm como uma das funções prioritárias evidenciar os conhecimentos prévios.

No entanto, neste caso a estrutura da sequência se organiza em torno das contribuições que os alunos fazem em cada momento. São eles que manifestam seus problemas ou perguntas, que serão os que deverão articular toda a intervenção. O objetivo da unidade não consiste em conhecer um tema, mas em dar resposta a determinadas perguntas que os alunos se fazem e que consideram que é interessante resolver. Também se parte dos princípios de que os alunos possuem um conhecimento. Portanto, antes de iniciar a investigação, busca-se que este conhecimento aflore ou que os alunos se inclinem por possíveis soluções, quer dizer, que elaborem suas hipóteses ou suposições. Estes dados serão cruciais para saber que conhecimentos têm os alunos sobre o tema tratado. O problema surge quando nos perguntamos qual é o grau de envolvimento dos alunos nas perguntas e hipóteses que fazem. Neste ponto é necessário empreender um trabalho em pequenos grupos ou individualmente, que ajude todos- os meninos e meninas a participarem em sua elaboração. Nesta sequência, o papel fundamentai do professor consiste em incentivar a participação. Se não há participação, o processo só será seguido por uns poucos, embora se tenha a falsa impressão de se tratar de um processo coletivo.

b) Significância e funcionalidade dos novos conteúdos

Neste caso, o que se" aprende sempre é o resultado da resposta às perguntas que se fazem. Portanto, todos os conteúdos que se referem ao tema têm sentido como meios para ampliar o conhecimento ou resolver situações que os alunos considerem interessantes, já que se não fosse assim não teriam feito a pergunta. Assim, quanto aos conteúdos conceituais, a significância e a funcionalidade estão garantidas. Por outro lado, se nos detemos nos conteúdos procedimentais, nos damos conta de que nunca aparecem como uma necessidade da aprendizagem escolar, mas como um meio imprescindível para resolver os problemas ou questões colocados. A realização de uma pesquisa bibliográfica ou a utilização da medida, da enquete, da observação direta, da experimentação, etc., para não mencionar todas as habilidades, técnicas e estratégias ligadas às funções da língua - ler, escrever, escutar, falar têm lugar de forma natural em função de uma necessidade de uso, o que implica a evidente significância destas aprendizagens.

c) Nível de desenvolvimento

As perguntas feitas, as suposições propostas, o diálogo que se estabelece em pequenos grupos ou coletivamente, o tipo de técnicas de informação utilizadas, os dados selecionados, etc., podem proporcionar informação suficiente para determinar qual o grau de dificuldade de aprendizagem que apresenta o tema. No entanto, será necessário que o professor ou a professora não deixe nas mãos de uns poucos alunos a dinâmica do processo e que intervenha para promover a participação e a explicitação do pensamento de todos os meninos e meninas.

d) Zona de desenvolvimento proximal

A segunda e a terceira atividades são cruciais para examinar o que pensam os alunos, que dúvidas têm e que interpretações fazem. Esta série de informações pode ser suficiente par orientar o tipo de exemplos ou argumentos que é necessário oferecer a fim de que a construção do conhecimento seja realizada por todos e cada um dos meninos e meninas.

e)     Conflito cognitivo e atividade mental

Apesar do fato de que a sequência se articula segundo o esquema da pesquisa, o que quer dizer que seu desenvolvimento implica um profundo processo intelectual, seguidamente os aspectos que chamam mais a atenção das fases de investigação - por exemplo, visitas, observações, ensaios de laboratório, entrevistas, elaboração de simulações ou produtos podem fazer com que o aluno demonstre muita atividade sem que estas ações cheguem a se transformar no meio intencional para favorecer a realização do processo mental exigido pela aprendizagem. Tanto é assim que, com a passagem do tempo, muitas vezes os alunos se limitam a recordar os aspectos mais episódicos do trabalho realizado. Agora, esta consideração não tem cabimento nesta unidade, já que houve um verdadeiro trabalho nas fases 1, 2, 3 e 4. No entanto, seria um comentário acertado naquelas unidades cujas atividades de pesquisa são feitas sem que o aluno participe da definição de razões que justificam a saída, a experimentação ou a observação, de forma que se convertem em atividades sem nenhum outro sentido além da decisão mais ou menos arbitrária do professor. Fazem-se coisas bastante interessantes, mas não se sabe- o porquê. O que deveria ser um meio para promover a atividade mental, dado que para favorecê-la é preciso contribuir com manipulações - sobretudo em determinadas idades -, se converte numa finalidade em si mesma.

f)      Atitude favorável

A motivação é-a alma da sequência. Ou os alunos estão interessados ou a sequência se interrompe em alguma das fases. A atividade inicial pretende criar os primeiros interesses e deve ser a que provoca as perguntas. E, pois, a peça-chave da unidade. Ou se criam as condições para que os meninos e meninas formulem as questões que querem resolver ou dificilmente se pode seguir adiante. Mais, todas as fases posteriores giram em torno do protagonismo dos alunos, de tal forma que além de ser um fator motivador em si mesmas, a tensão necessária para desenvolver a unidade passa pela manutenção constante do interesse. E aqui é onde o papel do professor adquire todo seu sentido, como favorecedor e dinamizador de todo o processo, estabelecendo os desafios individuais e coletivos e oferecendo meios que mantenham a atenção dos alunos.

g)     Autoestima e autoconceito

Nesta unidade, todo o peso do trabalho repousa na dinâmica do grupo. Suas contribuições são as que configuram as diferentes fases da sequência e a maioria dos conteúdos. Portanto, há uma valoração das contribuições e dos conhecimentos dos alunos e certas expectativas em relação às suas capacidades, tanto para solucionar os problemas que lhes suscitam os temas tratados, como para resolver os conflitos de todo tipo e surgirão numa sequência pouco determinada. Ao mesmo tempo, levando em conta a quantidade de relações que se estabelecem, as possibilidades de intervir durante o processo permitem fazer avaliações que ajudem ou não a criar sensações positivas de autoestima e auto conceito. Logicamente, será a consciência dos professores diante destas necessidades que influirá nas idéias dos alunos, já que, evidentemente, a umidade não o garante por si mesma. Por último, temos que examinar novamente o papel decisivo da avaliação. Neste caso, o único traço diferencial que encontramos é o fato de que a avaliação não apenas é o resultado da prova, como também do trabalho realizado ao longo da unidade. Agora, em nenhum caso podemos saber que tipo de avaliação se faz, o que nos permite tirar conclusões sobre se promove ou não as avaliações pessoais que melhoram a autoestima e o autoconceito.

h)     Aprender a aprender

Este é um dos fatores mais claros nesta unidade, no mínimo pelo fato de incluir, além das habilidades escolares de estudo individual, muitas outras de variedade e características suficientemente diferenciadas. Dependendo dos diferentes tipos de instrumentos ou fontes de informação, sejam diretos ou indiretos, o número de técnicas e habilidades para favorecer que aprendam a aprender será notável, mas será necessário que haja um verdadeiro trabalho de ensino destas estratégias de aprendizagem, um trabalho que não se reduza a um uso mais ou -menos episódico.

Conclusões

Esta sequência, comparada com os demais, é-a que apresenta uma maior variedade de atividades, o que logicamente lhe permite satisfazer a totalidade dos condicionantes, a fim de que as aprendizagens sejam o mais significativas possível. Para que estas razões sejam acertadas, os professores deverão ter uma consciência clara a respeito do sentido de cada fase. Numa unidade deste tipo é fácil se deixar levar pela dinâmica do grupo e perder de vista os objetivos que se perseguem. Os problemas e a complexidade da organização do grupo fazem com que esta tarefa ocupe um espaço de tempo notável, somado à necessidade de reconduzir os interesses naturais dos alunos para os objetivos previstos. Apesar de tudo, o maior risco está na possibilidade de cair no denominado falso ativismo, quer dizer, que a atenção do educador se centre nas atividades de pesquisa: observações diretas, visitas, excursões, elaborações, etc., abandonando as atividades prévias e posteriores que são básicas para alcançar a compreensão dos conhecimentos propostos. Embora este não seja o caso, também é possível que não realize um trabalho sério de estudo, posterior às atividades de compreensão, de forma que não haja oportunidade para se fazer os exercícios de memorização imprescindíveis para possibilitar sua lembrança posterior.

AS SEQÜÊNCIAS DE CONTEÚDO, OUTRA UNIDADE DE ANÁLISE

A confluência do referencial construtivista com a explicitação dos conteúdos segundo sua tipologia nos permitiu analisar algumas sequências didáticas, isto tornou possível que examinássemos os diferentes conteúdos e chegássemos a algumas conclusões sobre a necessidade de insistir, modificar ou ampliar estas sequências com outras atividades. No entanto, vocês devem ter se dado conta de que a análise focalizou os conteúdos conceituais, deixando de lado os outros, de tal forma que a maioria das considerações foi feita em relação a estes conteúdos. Portanto, as atividades propostas têm por objetivo a melhora da significância na aprendizagem dos conteúdos conceituais. Esta inclinação é determinada pelas próprias características das sequências. Como pudemos ver, todas elas trabalham conteúdos conceituais, mas só a segunda introduz determinados conteúdos procedimentais, enquanto que a quarta os amplia com outros de tipo procedimental e atitudinal. Assim, pois, o estudo esteve condicionado pelas características das sequências. Se, em vez de nos centrarmos preferencialmente nos conteúdos conceituais, tivéssemos prestado atenção aos procedimentais e atitudinais, poderíamos considerar que a análise está completa?

Em primeiro lugar, vamos nos deter na segunda sequência que, além dos conceitos, considera como conteúdos de aprendizagem os algoritmos, a análise sintática ou a aplicação da fórmula da velocidade, segundo os exemplos de uma ou outra área. Agora, a pergunta que nos colocamos é a seguinte: com a sequência descrita e o conhecimento que temos sobre a aprendizagem destes conteúdos de caráter procedimental, podemos deduzir que as atividades propostas são apropriadas? Nesta unidade pudemos comprovar que algumas atividades tomaram possível a compreensão dos conceitos associados aos procedimentos, de maneira que os meninos e meninas podem entender que função têm e como são utilizados, ao mesmo tempo que fizeram toda uma série de exercícios para se iniciar em seu domínio. Se agora examinamos os conteúdos procedimentais da unidade 4, veremos que se utilizam alguns como o trabalho em equipe, a pesquisa, a entrevista, etc. Mas com o trabalho realizado nestas duas unidades não podemos assegurar que os alunos cheguem a dominar estes diferentes procedimentos e técnicas. Sabemos que os trabalham, mas isto não basta. Para que realmente cheguem a dominá-los, será necessário, em primeiro lugar verificar se nas outras unidades, anteriores e posteriores, há momentos em que estes conteúdos voltam a aparecer.

Ampliemos agora nosso objeto de análise aos conteúdos atitudinais que podem ser trabalhados na unidade 4 e nos perguntemos: nesta unidade, se aprendeu a ser mais tolerante, respeitoso e cooperador? Nossa resposta nos fará ver ainda mais a necessidade de revisar não apenas as unidades anteriores e posteriores da própria área ou disciplina, como todas as unidades de todas as áreas que incidem nos alunos. Assim, pois, vemos que nos falta uma nova unidade de análise que se centre em todas aquelas atividades que podem incidir na aprendizagem de um determinado conteúdo. Trata-se de um conjunto de atividades que em alguns casos se concretiza em apenas uma unidade didática e em outros casos se estende ao longo de várias, ou inclusive de todas as unidades didáticas.

Para poder estabelecer as características desta unidade de análise - básica sobretudo nas áreas de caráter mais procedimental e para os conteúdos de caráter atitudinal e, também, portanto, para os conteúdos dos denominados eixos transversais e aqueles objetivos relacionados com a moral e a ética - proporemos um exemplo em que se utilizam sequências didáticas da unidade de tipo 4 ao longo de todo um curso.

Vamos nos situar na área de conhecimento do meio no ensino fundamental. Organizemos os conteúdos em quinze unidades, de forma que para cada uma corresponda duas semanas. As unidades são as seguintes: Unidade 1 - A paisagem; Unidade 2 - A vegetação; Unidade 3 - A hidrografia... Unidade 15 - A passagem do tempo. Dos possíveis conteúdos que serão abordados nas diversas unidades, iremos nos fixar somente em três: os componentes da paisagem, a interpretação e a realização de planos e mapas e a cooperação. Conteúdos fundamentalmente de caráter conceituai, procedimental e atitudinal, respectivamente.

O conteúdo conceituai "componentes da paisagem" será trabalhado especificamente na primeira unidade. Será realizada uma série de atividades de ensino com o objetivo de que ao final da unidade se tenha aprendido esse conteúdo. Teremos uma série de atividades com um princípio e um finai na própria unidade. No começo, os alunos desconhecem a maioria dos "componentes da paisagem", mas no final, se as atividades foram apropriadas, podem considerá-los aprendidos. Neste caso, temos uma sequência de atividades específicas para este conteúdo. Nas unidades posteriores utilizaremos estes conceitos e certamente ampliaremos e melhoraremos seu conhecimento, mas podemos considerar que as atividades fundamentais se desenvolveram na primeira unidade. Estas atividades são as que configurarão a sequência do conteúdo "componentes da paisagem".

O conteúdo procedimental "interpretação e realização de planos e mapas" já aparece na primeira unidade, que, pelo fato de estar localizada no começo do curso, implica um grau de exigência muito baixo. Nesta unidade será iniciado um trabalho de elaboração de planos e mapas que se estenderá ao longo de todo o curso, em diversas unidades. Assim, haverá muitas atividades que terão como objetivo o conhecimento e o domínio deste conteúdo. Este conjunto de atividades necessárias para sua aprendizagem constitui a sequência do conteúdo "interpretação e realização de planos e mapas".

O conteúdo atitudinal "cooperação" certamente já aparece na primeira unidade e em outras se toma um conteúdo essencial, seja pelo tema, seja pelas situações de trabalho e convivência que se propõem. Ao longo do curso, e em todas as unidades, haverá vivências ou experiências cruciais para a aprendizagem deste conteúdo. O conjunto destas atividades deverá garantir o alcance dos objetivos estabelecidos em relação à cooperação. Portanto, dentro do conjunto de atividades que ajudam uma formação cooperativa, será necessário observar aquelas que se realizam, explícita ou implicitamente, não apenas na área de conhecimento do meio, como nas demais-áreas e em outros momentos escolares. A sequência do conteúdo "cooperação" estará formada pelo conjunto de atividades, nas diferentes unidades didáticas das diferentes áreas ou fora delas, que incidem na formação de atitudes cooperativas.

Assim, podemos definir a unidade de análise que desenhamos como o conjunto ordenado de atividades estruturadas e articuladas para a consecução de um objetivo educacional em relação a um conteúdo concreto. Esta unidade de análise, como as sequências didáticas, está inserida num contexto em que se deverá identificar, além dos objetos didáticos e do conteúdo objeto da sequência; as outras variáveis metodológicas: relações interativas, organização social, materiais curriculares, etc.

Por tudo o que vimos a respeito destas sequências, a exemplo das didáticas, não nos interessa preliminarmente tanto a forma em que se desenvolve cada uma das atividades, mas estabelecer sua inserção ou não no conjunto de atividades, uma vez determinadas suas características. O que convém é examinar o sentido total da sequência e, portanto, o lugar que ocupa cada atividade e como se articula e estrutura nesta sequência, com o objetivo de prever quais são as atividades que é preciso modificar ou acrescentar.

Estas sequências serão mais ou menos complexas conforme o número de atividades envolvidas na aprendizagem de um conteúdo determinado, a duração da sequência 4e o número de unidades didáticas das quais fazem parte as diferentes atividades.

O ENSINO SEGUNDO AS CARACTERÍSTICAS TIPOLÓGÍCAS DOS CONTEÚDOS

Uma vez identificadas as sequências de conteúdo, o passo seguinte consiste em relacioná-las com o conhecimento que temos sobre os processos subjacentes à aprendizagem dos diferentes conteúdos, segundo sua tipologia. Isto nos permitirá estabelecer que condições de ensino devem

observar as sequências que encontramos representadas de maneira esquemática no Quadro 3.2, para cada um dos diferentes tipos de conteúdo.

Ensinar conteúdos factuais

No capítulo anterior já vimos que se aprendem os fatos mediante atividades de cópia mais ou menos literais, com o fim de integrá-los nas estruturas de conhecimento, na memória. O caráter reprodutivo dos fatos implica exercícios de repetição verbal. Repetir tantas vezes quanto seja necessário até que se consiga a automatização da informação. Assim, pois, as atividades básicas para as sequências de conteúdos factuais terão que ser aquelas que têm exercícios e repetição e, conforme a quantidade e a complexidade da informação, utilizem estratégias que reforcem as repetições mediante organizações significativas ou associações.

Esta simplificação da aprendizagem faz com que as sequências para estes conteúdos possam ser extremamente simples. Uma apresentação dos conteúdos sob um modelo expositivo, um estudo individual que consiste em exercícios de repetição e uma posterior prova pode ser suficientes; sempre com a condição de que cada uma destas fases cumpra uma série de requisitos para evitar que as aprendizagens estejam desvinculadas da capacidade de utilizá-las em outros contextos que não sejam os estritamente escolares. Desse modo, o modelo descrito na unidade 1 pode atender perfeitamente às condições para esta aprendizagem, sempre que a exposição consiga atrair o interesse dos alunos, que não haja um excesso de informação, que se conheçam e se tomem como ponto de partida os conhecimentos que já têm e, sobretudo, que os alunos disponham dos conhecimentos conceituais a que pertence cada um dos fatos: saber o que é um rio quando se aprendem os nomes dos rios ou uma corrente artística quando se memorizam suas obras mais representativas.

Quanto à atenção à diversidade, devemos levar em conta que numa aprendizagem de fatos, se os alunos são suficientemente maduros, a atenção sempre recai nos próprios alunos. São eles, e apenas eles, que terão que realizar as atividades de estudo, que, como vimos, são de repetição. Neste caso, levar em conta a diversidade dos alunos consiste em avaliar o número de atividades que deve realizar cada aluno para aprender o conteúdo e não a maneira de ensiná-lo. Uma vez exposto o conteúdo, para atender à diversidade o professor ou a professora só tem que estimular os meninos e meninas a que façam as atividades de memorização de que cada um necessita. Que cada aluno realize o número de exercícios que precisa é algo que não depende do professor. Portanto, o próprio aluno tem que exercitar por sua conta até que seja capaz de assimilar o conteúdo. De qualquer forma, será necessário propiciar um clima que favoreça a realização de determinados exercícios individuais que costumam ser bastante monótonos.

        Ensinar conceitos e princípios

Como os conceitos e princípios são temas abstratos, requerem uma compreensão do significado e, portanto, um processo de elaboração pessoal. Neste tipo de conteúdo são totalmente necessárias as diferentes condições estabelecidas anteriormente sobre a significância na aprendizagem: atividades que possibilitem o reconhecimento dos conhecimentos prévios, que assegurem a significância e a funcionalidade, que sejam adequadas ao nível de desenvolvimento, que provoquem uma atividade

mental, etc. As sequências de conteúdos conceituais têm que levar em conta todas elas. Portanto, a análise que fizemos anteriormente nos exemplos das quatro unidades é a adequada, já que, como vimos, a maioria destas sequências se situa numa mesma unidade didática.

Ensinar conteúdos procedimentais

Teremos que dedicar mais tempo a estes conteúdos, posto que a adaptação que devemos fazer das considerações gerais da aprendizagem significativa é mais complexa. Neste caso, o dado mais relevante é determinado pela necessidade de realizar exercícios suficientes e progressivos das diferentes ações que formam os procedimentos, as técnicas ou estratégias. Uma vez aceita essa informação, as sequências dos conteúdos procedimentais deverão conter atividades com algumas condições determinadas:

As atividades devem partir de situações significativas e funcionais, a fim de que o conteúdo possa ser aprendido junto com a capacidade de poder utilizá-lo quando seja conveniente. Por isto é imprescindível que este conteúdo tenha sentido para o aluno: ele deve saber para que serve e que função tem, ainda que seja útil apenas para poder realizar uma nova aprendizagem. Caso se desconheça sua função, ter-se-á aprendido o conteúdo procedimental, mas não será possível utilizá-lo quando se apresente a ocasião. Em geral estes conteúdos são trabalhados prescindindo de suas funções, se insiste às vezes em sua aprendizagem, mas não na finalidade a que estão ligados. Assim, encontramos trabalhos repetitivos e, portanto, esgotantes, cujo único sentido parece ser o domínio do conteúdo procedimental em si mesmo.

• A sequência deve contemplar atividades que apresentem os modelos de desenvolvimento do conteúdo de aprendizagem. Modelos onde se possa ver todo o processo, que apresentem uma visão* • completa das diferentes fases, passos ou ações que os compõem, para passar posteriormente, se a complexidade do modelo assim o requer, ao trabalho sistemático das diferentes ações que compreendem. Estes modelos deverão ser propostos unicamente quando se inicia o trabalho de aprendizagem, mas será necessário insistir neles em diferentes situações e contextos sempre que convenha.

• Para que a ação educativa resulte no maior benefício possível, é necessário que as atividades de ensino/aprendizagem se ajustem ao máximo a uma sequência clara com uma ordem de atividades que siga um processo gradual. Esta consideração é visível nos conteúdos mais algorítmicos como, por exemplo, o cálculo, onde o processo de mais simples para mais complexo é uma constante. Por outro lado, não é tão evidente na maioria dos outros conteúdos procedimentais. Um exemplo bastante evidente é o do ensino da observação. Hoje em dia, sobretudo nas áreas de Ciências Sociais e Naturais, se propõem atividades de observação de uma maneira sistemática. Mas se analisamos as características das atividades que se propõem ao longo das diferentes unidades didáticas, observamos que normalmente não respondem a uma determinada ordem de dificuldade. Existem algumas atividades e uma exercitação, mas não há uma ordem progressiva que facilite a aprendizagem além da simples repetição.

• São necessárias atividades com ajudas de diferente grau e prática guiada. A ordem e o progresso das sequências de ensino/aprendizagem, no caso dos conteúdos procedimentais, estarão determinados, na maioria das vezes, pelas características das ajudas que se irão dando ao longo da aplicação do conteúdo. Assim, em muitos casos, a estratégia mais apropriada, depois da apresentação do modelo, será a de proporcionar ajudas ao longo das diferentes ações e ir retirando-as progressivamente. Agora, a única maneira de decidir o tipo de ajuda que se deve dar e a oportunidade de mantê-la, modificá-la ou retirá-la consiste em observar e conduzir os alunos através de um processo de prática guiada, em que eles poderão ir assumindo, de forma progressiva, o controle, a direção e a responsabilidade da execução.

• Atividades de trabalho independente. Estreitamente ligado ao que comentávamos em relação ao ponto anterior, o ensino de conteúdos procedimentais exige que os meninos e meninas tenham a oportunidade de levar a cabo realizações independentes, em que possam mostrar suas competências no domínio do conteúdo aprendido. O trabalho independente, por um lado, é o objetivo que se persegue com a prática guiada e, por outro, se assume em sua verdadeira complexidade quando se aplica a contextos diferenciados.

Ensinar conteúdos atitudinais

As características dos conteúdos atitudinais, e o fato de que o componente afetivo atue de forma determinante em sua aprendizagem, fazem com que as atividades de ensino destes conteúdos sejam muito mais complexas que as dos outros tipos de conteúdo. O caráter conceituai dos valores, as normas e as atitudes, quer dizer, o conhecimento do que “cada um deles é e implica, pode ser aprendido mediante estratégias já descritas para os conteúdos conceituais. Agora, para que este conhecimento se transforme em referência de atuação é preciso mobilizar todos os recursos relacionados com o componente afetivo. O papel e o sentido que pode ter o valor solidariedade, ou o respeito às minorias, não se aprende apenas com o conhecimento do que cada uma destas ideias representa. As atividades de ensino necessárias têm que abarcar, junto com os campos cognitivos, os afetivos e condutuais, dado que os pensamentos, os sentimentos e o comportamento de uma pessoa não dependem só do socialmente estabelecido, como, sobretudo, das relações pessoais que cada um estabelece com o objeto da atitude ou do valor. Como bem se sabe, as intenções, neste âmbito, não coincidem indefectivelmente com as atuações.

E fundamental levar em conta não tanto os aspectos evidentes e

-Explícitos dos valores no momento das exposições, debates ou diálogos em que são tratados, como toda a rede de relações que se estabelece em aula: o tipo de interação entre professores e alunos, entre os próprios alunos e entre todos os membros da equipe docente. Estas relações e imagens, e as interpretações das condutas e comportamentos, serão algumas das peças-chave na configuração dos valores e das atitudes pessoais.

O fato de que estas inter-relações sejam um dos fatores determinantes supõe que é preciso prestar atenção a muitos dos aspectos que não se incluem de maneira manifesta nas unidades didáticas e que se referem aos aspectos organizativos e participativos. Muitos dos valores que se pretendem ensinar se aprendem quando são vividos de maneira natural; e isso só é possível quando o ambiente cie aula, as decisões organizativas, - as relações interpessoais, as normas de conduta, as regras de jogo e os papéis que se atribuem a uns e a outros correspondem àqueles valores que se quer que sejam aprendidos. A maneira de organizar as atividades e os papéis que cada um dos meninos e meninas deve assumir pode promover ou não atitudes como as de cooperação, tolerância e solidariedade.

Estas considerações exigem que se dê uma atenção especial à série de medidas que se toma na escola e que nunca foi objeto dos planos de ensino - o denominado currículo oculto posto que muitas atuações podem ser contraditórias com os propósitos estabelecidos nos objetivos educacionais da escola. Neste sentido, a manifestação explícita dos conteúdos em geral implícitos, e a reflexão pessoal e grupai dos professores e de todos os componentes da comunidade escolar, tornam-se algo fundamental.

E uma das primeiras medidas a se tomar é a de sensibilizar o aluno e do grupo-classe em geral. Como nos demais tipos de conteúdos, os conhecimentos prévios de que o aluno dispõe devem ser o ponto de partida, mas neste caso a medida tem que ser observada de forma muito mais "sutil". A interpretação que é preciso fazer dos diferentes valores deve levar muito mais em conta os traços socioculturais dos alunos, sua situação familiar e os valores que prevalecem em seu ambiente para que a interpretação dos diferentes valores se adapte às características de cada um dos contextos sociais em que se encontram as escolas. Partir da realidade e aproveitar os conflitos que nela se apresentam tem que ser o fio condutor do trabalho destes conteúdos. Aproveitar as experiências vividas pelos alunos e os conflitos ou pontos de vista contrários que apareçam nestas vivências ou na dinâmica da aula, a fim de promover o debate e a reflexão sobre os valores que decorrem das diferentes atuações ou pontos de vista. Propor situações que ponham em conflito os conhecimentos, as crenças e os sentimentos de forma adaptada ao nível de desenvolvimento dos alunos, sobre as normas existentes na escola e na aula, com o objetivo de que compreenda sua necessidade e de que, a partir da reflexão e da análise, não apenas as aceite, mas as respeite como suas. Essa finalidade requer a promoção da participação ativa do aluno, fugindo do verbalismo e potencializando o intercâmbio entre os alunos para debater as opiniões e ideias sobre tudo o que os afeta em seu trabalho nas aulas e na escola, pedindo, ao mesmo tempo, compromissos derivados dos valores e atitudes aceitos livremente. Esse processo deve permitir que os meninos e meninas se sintam protagonistas de suas aprendizagens e agentes na formulação das propostas de convivência e trabalho, mediante a promoção da aceitação e da internalização das concepções e avaliações das atitudes a serem promovidas, participando no controle do processo e dos resultados.

Neste sentido a assembleia de alunos como recurso didático pode responder às necessidades de participação na formação dos valores que queremos que governem a escola. A introdução do caráter público que a assembleia representa faz com que os compromissos pessoais tenham uma implicação condutual, emocional e cognitiva diante dos demais, o que possibilita que o grupo-classe, e não apenas os professores, possa colaborar na regulação dos compromissos adquiridos.

Além destes critérios de caráter geral, nas sequências de aprendizagem para estes conteúdos, em cada unidade didática e no curso das diferentes unidades, será preciso levar em conta uma série de medidas:

* Adaptar o caráter dos conteúdos atitudinais às necessidades e situações reais dos alunos, levando em conta, ao defini-las, as características, os interesses e as necessidades pessoais de cada um deles

* Introduzir processos de reflexão crítica para que as normas sociais de convivência integrem as próprias normas. É preciso ajudar os alunos a relacionar estas normas com determinadas atitudes que se queiram desenvolver em situações concretas e promover a reflexão crítica acerca dos contextos históricos e institucionais nos quais se manifestam estes valores.

Favorecer modelos das atitudes que se queiram desenvolver, não apenas por parte dos professores, incentivando e promovendo comportamentos coerentes com estes modelos. Desenvolver atividades que façam com que os alunos participem em processos de mudança atitudinal, pondo em crise suas próprias proposições. Incentivar e ajudar para que ensaiem e provem as mudanças que em muitos casos serão necessárias, favorecendo o apoio dos colegas nestas mudanças e promovendo as avaliações adequadas ao trabalho realizado e aos êxitos alcançados.

Fomentar a autonomia moral de cada aluno, o que implica não apenas que os professores estabeleçam espaços para colocá-la em prática, como também que criem nos alunos espaços de experimentação dos processos de aquisição que permitam esta autonomia.

Conclusões

Neste capítulo pudemos ver que a partir de nossas propostas de trabalho aparecem, para os alunos, diferentes oportunidades de aprender diversas coisas e, para nós como educadores, uma diversidade de meios para captar os processos de construção que eles edificam, de possibilidades de neles incidir e avaliá-los. Também observamos que os diferentes conteúdos que apresentamos aos meninos e meninas exigem esforços de aprendizagem e ajudas específicas. Nem tudo se aprende do mesmo modo, no mesmo tempo nem com o mesmo trabalho. Discernir o que pode ser objeto de uma unidade didática, como conteúdo prioritário, do que exige um trabalho mais continuado, ao longo de diversas unidades e, inclusive, em áreas e situações escolares diversificadas, talvez seja um exercício ao qual não estamos suficientemente acostumados, mas nem por isso é menos necessário. Quantas vezes nos mostramos

perplexos porque nossos alunos esqueceram a realização de um procedimento? Quantas vezes nos perguntamos como é possível que não sejam capazes de utilizar o que sabem fazer numa área quando lhes é apresentado um problema numa área diferente? Por que nosso desejo de que sejam tolerantes e respeitosos se vê frustrado justamente naquelas ocasiões em que é mais necessário exercer a tolerância e o respeito? Como pode ser que os conceitos que pareciam seguros não resistam ao embate das mínimas contradições?

A resposta que atribui estes fatos exclusivamente a características dos alunos não deveria nos tranquilizar, embora seja lógico que a utilizemos, se não temos outras. Em minha opinião, refletir sobre o que implica aprender o que propomos, e o que implica aprendê-lo de maneira significativa, pode nos conduzir a estabelecer propostas mais fundamentadas, suscetíveis de ajudar mais os alunos e ajudar nós mesmos. As contribuições deste capítulo pretendem, por um lado, oferecer elementos para esta reflexão e, por outro, demonstrar que as diferentes propostas didáticas que oferecemos de maneira mais ou menos consciente têm diferentes potencialidades. Em resumo, o que queremos dizer é que mais do que nos movermos pelo apoio acrítico a um ou outro modo de organizar o ensino, devemos dispor de critérios que nos permitam considerar o que é mais conveniente num dado momento para determinados objetivos a partir da convicção de que nem tudo tem o mesmo valor, nem vale para satisfazer as mesmas finalidades. Utilizar estes critérios para analisar nossa prática e, se convém, para reorientá-la em algum sentido, pode representar, em princípio, um esforço adicional, mas o que é certo é que pode evitar perplexidades e confusões posteriores.

Antoni Zabala – A Prática Educativa


Produção de energia no Brasil

Movimentar máquinas, cargas e pessoas por longas distâncias demanda muita energia. No Brasil, usam-se combustíveis derivados de fontes não r...