terça-feira, 31 de maio de 2022

MODERNISMO NO BRASIL - PROSA

 SEGUNDA FASE (PROSA)

       Passada a fase mais agressiva da luta modernista, observamos, a partir do decênio de 1930, que a literatura brasileira começa a caminhar em direção a seu amadurecimento, sobretudo com a estreia de uma nova geração de escritores que iriam se firmar como autenticamente modernos, preocupados com os problemas humanos e sociais de seu tempo. A prosa da 2ª fase modernista caracteriza-se pelo regionalismo, pela relação do homem com o meio em que vive.

 A Literatura Brasileira já apresentava uma tendência regionalista. Desde o Romantismo, a busca de traços particulares da realidade brasileira já estava presente em algumas obras, entretanto, neste período, a partir das conquistas da primeira fase modernista e das ideias socialistas, os autores dão um novo tom a esse regionalismo. O livro A bagaceira de José Américo é considerado o primeiro romance regionalista do Modernismo. Mas seu valor deve-se mais à temática histórica da seca, dos retirantes e ao aspecto social do que aos aspectos literários.

O ROMANCE NEO-REALISTA MODERNO

    Refletindo as preocupações sociais e políticas que agitavam o Brasil na época, desenvolveu-se um tipo de ficção que enveredou para o documentário social e o romance político. A publicação, em 1928, de A bagaceira, de José Américo de Almeida, costuma ser indicada como marco inicial dessa série de obras cuja intenção básica foi a denúncia dos problemas econômicos do Nordeste, dos dramas dos retirantes das secas e da exploração do homem num sistema social injusto. Nessa linha neo-realista, destacaram-se Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Jorge Amado, Rachel de Queiroz e Amando Fontes.

Veja os principais autores da prosa dessa segunda fase:

2ª FASE MODERNISTA (1930-1945) PROSA:

Raquel de Queirós
Graciliano Ramos
Jorge Amado
Érico Veríssimo
José Lins do Rego

         Quase todos esses autores voltaram-se basicamente para os temas do Nordeste, como a seca, o cangaço e o ciclo açucareiro. Com exceção de Érico Veríssimo que apresentou uma obra voltada para as relações do homem e a paisagem do Sul do Brasil.

Veja a imagem da representante feminina da prosa dessa 2ª fase:

 

Raquel de Queirós foi a primeira mulher a se “eleger imortal” na Academia Brasileira de Letras. Suas obras regionalistas destacam-se pela reflexão sobre a figura feminina numa sociedade patriarcal.

Em seu livro O quinze, conta a história da luta de um povo contra a seca e a miséria,  tema marcante da prosa modernista da segunda geração.  A força da mulher nordestina também é tratada em toda sua obra. Entre as suas figuras femininas destacam-se: Conceição em O quinze e Maria Bonita em O Lampião.

Veja a imagem de Graciliano Ramos, outro importante autor desse momento:

Graciliano Ramos é considerado pela crítica literária o melhor ficcionista dessa segunda fase.

Sua obra é marcada pela ausência de sentimentalismo e por um forte poder de síntese, refletida na linguagem direta e precisa. Entre seus livros destacam-se Memórias do Cárcere e São Bernardo. Memórias do Cárcere é uma narrativa autobiográfica que analisa as atrocidades cometidas pela Ditadura Vargas. Por suas ligações com o partido comunista Graciliano Ramos foi realmente preso durante um ano. Em São Bernardo, Graciliano Ramos ao contar a história de Paulo Honório, rico proprietário da fazenda São Bernardo, que se casa com a professora Madalena, personagem fortemente influenciada por ideias progressistas, faz uma reflexão sobre o processo de coisificação do ser humano, (“muitas vezes mais preocupado com o ter e do que com o ser”).

Mas é com outro livro que Graciliano Ramos alcança maior notoriedade. Veja as próximas imagens:

 

Menino Morto, de Cândido Portinari.

 

Família de Retirantes, de Cândido Portinari.

Menino Morto e Família de Retirantes apresentam o tema central de Vidas Secas - grande livro de Graciliano Ramos.

Vidas Secas é um romance que narra a história de uma família de retirantes que abandona sua terra atingida por uma forte seca. A família é formada por Sinhá Vitória, a mãe; Fabiano, o pai; seus dois filhos, denominados apenas como menino mais velho e menino mais novo e os animais: o papagaio e a cachorra Baleia.

Veja um fragmento de Vidas Secas em que a família inicia a viagem em busca de uma vida melhor:

“A caatinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas. O voo negro dos urubus fazia círculos altos em redor dos bichos moribundos.

- Anda, excomungado.

O pirralho não se mexeu, e Fabiano desejou matá-lo. Tinha o coração grosso, queria responsabilizar alguém pela sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato necessário – e a obstinação da criança irritava-o. Certamente esse obstáculo miúdo não era culpado, mas dificultava a marcha, e o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde.

                                                 (...)

 Pelo espírito atribulado do sertanejo passou a ideia de abandonar o filho naquele descampado. Pensou nos urubus, nas ossadas, coçou a barba ruiva e suja, irresoluto, examinou os arredores. Sinhá Vitória estirou o beiço indicando vagamente uma direção e afirmou com alguns sons guturais que estavam perto. Fabiano meteu a faca na bainha, guardou-a no cinturão, acocorou-se, pegou no pulso do menino, que se encolhia, os joelhos encostados no estômago, frio como um defunto. Aí a cólera desapareceu e Fabiano teve pena. Impossível abandonar o anjinho aos bichos do mato. Entregou a espingarda a Sinhá Vitória, pôs o filho no cangote, levantou-se, agarrou os bracinhos que caíam sobre o peito, moles, finos como cambitos. Sinhá Vitória aprovou esse arranjo, lançou de novo a interjeição gutural, designou os juazeiros invisíveis.        E a viagem prosseguiu, mais lenta, mais arrastada, num silêncio grande”.

Graciliano Ramos

A secura do ambiente e a dureza da vida aos poucos iam embrutecendo as personagens.

Veja outro importante nome dessa fase:

Jorge Amado é talvez um dos autores mais conhecidos pelo público jovem. Isto porque, muitos de seus livros foram adaptados para a TV e o cinema. E ainda hoje, é um dos escritores brasileiros que mais vendeu livros.

Seus livros traçam um verdadeiro e completo quadro do povo brasileiro, em especial do povo baiano. A linguagem simples, marcada por expressões populares, a preocupação com os costumes e as tradições populares e o bom humor fizeram de Jorge Amado um dos mais queridos escritores brasileiros.

Sua vasta produção é comumente dividida em função da temática. Assim encontramos:

DIVISÃO TEMÁTICA DA OBRA DE JORGE AMADO

Romances da Bahia
Romances ligados ao ciclo do cacau
Crônicas de costumes

Romances da Bahia= Que retratam a vida das classes oprimidas na urbana Salvador. São livros de denúncia das desigualdades sociais. Entre eles destaca-se: Capitães da Areia.

Romances ligados ao ciclo do cacau= Que retratam a exploração dos trabalhadores rurais, pela economia latifundiária no Nordeste. Segundo o próprio Jorge Amado, foi a luta do cacau que o tornou romancista. Entre esses romances destacam-se: Cacau e Terras do Sem Fim.

Crônicas de costumes= Que partem dos cenários do agreste e da zona cacaueira para uma reflexão sobre a vida, os amores e os costumes da sociedade. São desse ciclo as conhecidíssimas figuras femininas de Jorge Amado, como Gabriela, cravo e canela; Dona Flor e seus dois maridos, Tieta do Agreste e Teresa Batista cansada de guerra.

Érico Veríssimo é o grande representante da região Sul do Brasil nessa segunda fase. E assim como Jorge Amado, também foi muito querido pelo público leitor.

Sua obra é frequentemente dividida em romances urbanos, históricos e políticos. Em seus romances urbanos analisa os conflitos e os valores de uma sociedade em crise. Entre os principais livros dessa categoria estão: Clarissa e Olhai os lírios do campo. A sua grande obra prima é a trilogia histórica O tempo e o vento, que narra a disputa pelo poder político entre importantes famílias na região Sul. Entre as personagens principais estão Ana Terra e Rodrigo Cambará.

O livro Incidente em Antares, é um romance político em que Érico Veríssimo explora o absurdo e o fantástico. Num dado momento do romance os coveiros da cidade entram em greve e os mortos por sua vez, resolvem ressuscitar e denunciar a corrupção e a podridão moral existente na cidade. Ocorre uma fusão entre o plano real e o imaginário.

E para concluirmos a aula, veja a imagem de José Lins do Rego:

 

José Lins do Rego, à direita sem chapéu e de óculos, foi um apaixonado por futebol, nessa foto, tirada no Maracanã, ele assistia ao jogo do seu time predileto, o Flamengo do Rio de Janeiro.

José Lins do Rego foi um autor muito identificado com os costumes do povo e sua obra pautou-se fundamentalmente nas recordações de um menino que conviveu com as fazendas produtoras de cana. Seus principais temas são: da decadência dos engenhos produtores de açúcar e da estrutura patriarcal, as disputas políticas na região nordeste e o cangaço. Entre seus livros destacam-se: Menino de Engenho e Fogo Morto.

Veja um fragmento do livro Menino de engenho:

“Coitado do Santa Fé! Já o conheci de fogo morto. E nada é mais triste do que engenho de fogo morto. Uma desolação de fim de vida, de ruína, que dá à paisagem rural uma melancolia de cemitério abandonado. Na bagaceira, crescendo, o mata-pasto de cobrir gente, o melão entrando pelas fornalhas, os moradores fugindo para outros engenhos, tudo deixado para um canto, e até os bois de carro vendidos para dar de comer aos seus donos. Ao lado da prosperidade e da riqueza do meu avô, eu vira ruir, até no prestígio de sua autoridade, aquele simpático velhinho que era o Coronel Lula de Holanda, com seu Santa

Fé caindo aos pedaços (...)”


MODERNISMO NO BRASIL – SEGUNDA FASE

 

SEGUNDA FASE (POESIA)

A segunda fase do Modernismo iniciou-se com a Revolução de 30 e terminou com a deposição de Getúlio Vargas pelas Forças Armadas, em 1945. O período entre 1930 e 1940 foi decisivo para o romance, que denunciou os males sociais, voltando-se para o homem humilde e injustiçado. Desenvolveu-se nessa época o romance regionalista, psicológico e urbano. A poesia amadureceu as conquistas de 22 e também voltou-se para temas sociais.
A segunda fase corresponde ao período de amadurecimento e consolidação das conquistas da fase anterior - da geração de 22. Os autores não apresentavam mais o caráter destruidor e irreverente de antes. Devido à grande produção, didaticamente, costuma-se dividir essa fase em produções em prosa e produções em poesia. Hoje falaremos sobre a poesia da segunda geração do Modernismo.
A segunda fase do Modernismo aproveitou e amadureceu as propostas de 22, eliminando exageros e gratuidades. Ao mesmo tempo que continuou as pesquisas estéticas, a primeira geração reabilitou algumas formas tradicionais, como o soneto e o verso rimado. Sua temática foi mais politizada, mas não deixou de lado o espiritualismo e a introspecção.

Veja quais foram os principais poetas desse período:

2ª FASE MODERNISTA (1930-1945) POESIA:

Carlos Drummond de Andrade

Cecília Meireles

Vinícius de Moraes

Murilo Mendes

       É importante deixar claro que os autores da primeira geração (Mário, Oswald e Bandeira) continuaram escrevendo, mas novos autores surgiram. A temática dessa fase é bem variada: Drummond e Murilo Mendes voltaram se mais para os aspectos da sociedade capitalista e para as questões universais do homem. Já Cecília Meireles e Vinícius de Moraes, embora também apresentando aspectos universais, voltaram-se para uma poesia mais espiritualista. Em Cecília e em Murilo Mendes também encontramos fortes marcas religiosas e místicas.

Veja a imagem de um dos importantes poetas dessa geração:

 

Carlos Drummond de Andrade é considerado o grande representante da poesia contemporânea brasileira. Seus textos, embora partindo da realidade brasileira, refletem os problemas universais do ser humano, apresentando textos com uma temática variada: o amor, a metalinguagem, a saudade, o cotidiano e uma forte preocupação política e social.

            Drummond, influenciado pelo contexto histórico de seu tempo (2ª Guerra Mundial, sistemas políticos autoritários), mostrou-se sempre preocupado com a transformação da sociedade a partir da compreensão do tempo presente

Veja um poema em que o coletivo e o tempo presente são temas essenciais:

                    Mãos dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco.

Também não cantarei o mundo futuro.

Estou preso à vida e olho meus companheiros.

Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.

Entre eles, considero a enorme realidade.

O presente é tão grande, não nos afastemos.

Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história, não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida, não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente.

                                                   Carlos Drummond de Andrade

O primeiro grande poema de Drummond, publicado em 1928 na Revista Antropofagia, foi No meio do caminho:

            No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. 

Nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho no meio do caminho tinha uma pedra.

                                           Carlos Drummond de Andrade


O cotidiano, os acontecimentos banais também viraram temas poéticos nas mãos de Drummond.

Veja o próximo poema em que o cotidiano é retratado de forma irônica e bem humorada, numa aproximação com o poema-piada do momento anterior:

Cidadezinha Qualquer

Casas entre bananeiras mulheres
entre laranjeiras pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.

Carlos Drummond de Andrade

Já apresentando com uma poesia mais intimista nós encontramos uma figura feminina muito importante:

Cecília Meireles trilou um caminho muito particular, o que dificulta sua classificação numa estética literária determinada. Seus versos apresentam características de vários movimentos, em especial do Simbolismo.

Cecília Meireles tornou-se conhecida no meio literário a partir da sua participação na corrente espiritualista da geração de 22. Aos poucos, afasta-se dessa corrente, mas conserva as características introspectivas e intimistas do grupo.

Seus versos, geralmente curtos e cheios de musicalidade, refletem sobre a brevidade da vida, as razões da existência, a solidão e a morte, imprimindo um caráter intimista em toda sua produção poética.

Veja o que Cecília dizia a respeito de sua obra:

“ Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno (...). Em toda minha vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade”.

Cecília Meireles

Esses motivos são responsáveis pelo pessimismo e desencanto que perpassam vários momentos de sua obra.

Veja um de seus poemas mais conhecidos:

        Motivo

Eu canto porque o instante existe e minha vida está completa. 

Não sou alegre nem sou triste: sou poeta.

(...)

Sei que canto. 

E a canção é tudo.

Tem sangue eterno a asa ritmada.

E um dia sei que estarei mudo: - mais nada.

                                               Cecília Meireles

Esse é poema metalinguístico, pois nele Cecília faz uma reflexão sobre o próprio ato de escrever, sem, contudo, perder o tom intimista, introspectivo.

Veja a imagem de Vinícius de Moraes, outro importante poeta dessa segunda fase:

Vinícius de Moraes foi um importante nome não só na literatura, mas também na música popular brasileira. Altamente comunicativo, Vinícius definia-se como “poeta e diplomata, o branco mais preto do Brasil, na linha de Xangô. Sarava!”

Didaticamente sua produção poética é dividida em duas fases. Na primeira, mostrou-se intimamente ligado às características simbolistas. Os textos dessa época apresentam temas ligados a aspectos religiosos, à angústia, ao conflito entre o carnal e o espiritual.

 Na segunda fase, seus textos, sem perder o tom espiritual, voltam-se para os aspectos do cotidiano e para o amor. A mulher também passou a ser um tema frequente em seus poemas. Tanto que uma vez, quando perguntado sobre as três coisas mais importantes de sua vida ele respondeu: “Primeiro mulher; segundo mulher; e por fim mulher!”. Garota de Ipanema, música dele e de Tom Jobim, símbolo da bossa nova, é até hoje a canção brasileira mais gravada em todo o mundo.

Vinícius, ao contrário dos primeiros modernistas que abandonaram todas as formas fixas, apresentou um grande apreço pelo soneto (composição muito utilizada pelos clássicos)

Veja um de seus sonetos mais conhecidos:

      Soneto de Fidelidade

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):

Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinícius de Moraes


Os temas mais próximos da realidade também foram tratados pelo poeta. Veja sua preocupação social no poema Operário em construção:

Operário em construção

Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia por exemplo,
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão (...)

Vinícius de Moraes

Murilo Mendes foi outra importante figura desse período:

 

Murilo Mendes, assim como Cecília Meireles também pertenceu à corrente espiritualista do Modernismo. A religiosidade voltada para a crítica das injustiças sociais é uma de suas características.

Veja um exemplo dessa religiosidade no poema seguinte:

                        Solidariedade

Sou ligado pela herança do espírito e do sangue

Ao mártir, ao assassino, ao anarquista,

Sou ligado

Aos casais na terra e no ar,

Ao vendeiro da esquina,

Ao padre, ao mendigo, à mulher da vida,

Ao mecânico, ao poeta, ao soldado,

Ao santo e ao demônio,

Construídos à minha imagem e semelhança.

                                                          Murilo Mendes


MODERNISMO NO BRASIL –PRIMEIRA FASE


Esta fase, também chamada de “heroica”, foi a que mais combateu a tradição; marcou-se por intensa produção em poesia, cujas principais características foram:
- utilização do verso livre;
- procura de uma língua “brasileira”, privilegiando por isso a linguagem coloquial;
- uso de linguagem telegráfica, condensada;
- ausência de pontuação;
- valorização do cotidiano;
- uso de paródias com o sentido de dessacralizar a tradição;
- uso do humor (poema-piada);
- criação de neologismos;
- aproximação da linguagem da prosa.

PRIMEIRA FASE - AUTORES

A primeira fase, conhecida como heroica, compreende o período de 1922 a 1930 e apresenta o desejo de liberdade, de ruptura e de destruição do passado como características marcantes. Os principais autores são: Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Manuel Bandeira e Alcântara Machado.

1ª Fase (1922-1930) HERÓICA

Oswald de Andrade

Mário de Andrade

Manuel Bandeira

Alcântara Machado

Essa primeira fase foi predominantemente poética. Seus autores pregavam, entre outras ideias, a negação do passado, a valorização poética do cotidiano, o nacionalismo e a liberdade linguística, basicamente através da incorporação da linguagem coloquial e o Anarquismo.

Veja a imagem de um importante nome do Modernismo brasileiro desse período:


A primeira tela é de Lasar Segall e a segunda é de Cândido Portinari. Mário de Andrade é considerado o “papa” do Modernismo da geração de 22.

Mário de Andrade era irreverente e criativo, em suas obras buscou incorporar o novo, rompendo com todas as estruturas ligadas ao passado. Preocupou-se com uma língua que fosse próxima do falar do povo, que fosse reflexo da cultura popular. Escreveu tanto poesias como prosa. Seu livro Paulicéia Desvairada é considerado o primeiro do Modernismo brasileiro, pois rompe com o academismo vigente.

Veja alguns trechos do prefácio desse livro, chamado pelo próprio Mário de Prefácio Interessantíssimo.

Leitor:

Está fundado o Desvairismo.

            Este prefácio, apesar de interessante, inútil.

                                                     (...)

Alguns dados. Nem todos. Sem conclusões.

Para quem me aceita são inúteis ambos.

 Os curiosos terão prazer em descobrir minhas conclusões, confrontando obra e dados.

Para quem me rejeita trabalho perdido explicar o que, antes de ler, já não aceitou.

                                                     (...)

Quando sinto a impulsão lírica escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente me grita.

 Penso depois: não só para corrigir, como para justificar o que escrevi. Daí a razão deste prefácio Interessantíssimo.

                                         (...)

O caráter debochado e inovador está presente não só ao longo de todo o livro, mas em toda sua obra. Como podemos ver em Macunaíma, seu romance modernista, ou como ele próprio nomeou, sua rapsódia.


O livro Macunaíma, que apresenta o subtítulo o herói sem nenhum caráter é um romance-rapsódia que discute a nacionalidade brasileira.

Rapsódia é uma composição que mistura elementos da música e do folclore de um povo. E é justamente isso que Mário de Andrade faz ao contar a história de Macunaíma, o índio que nasceu preto e depois virou branco.

Veja um trecho do livro em que é narrado o nascimento de Macunaíma:

“No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamara Macunaíma.

Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam a falar, exclamava:

_ Ai! que preguiça! ... e não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, trepado no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na força de homem. O divertimento dele era decepar cabeça de saúva. Vicia deitado, mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar banho no rio, todos juntos e nus (...) No mucambo si alguma cunhatã se aproximava dele pra fazer festinha, Macunaíma punha a mão nas graças dela, cunhatã se afasta (...)”

Macunaíma era preguiço, debochado, egoísta, um verdadeiro malandro, muito diferente da figura dos mocinhos dos livros. Ele é considerado um anti-herói, daí a expressão: “o herói sem nenhum caráter”, já sugerida pelo próprio significado do nome Macunaíma, que é mal grande.

Veja a imagem de um outro importante escritor da geração de 22:


Oswald de Andrade é considerado o autor mais irreverente, combativo e polêmico da primeira fase modernista. Foi o idealizador dos principais manifestos modernistas.

Sua obra é muito rica e apresenta claramente o caráter inovador do Modernismo. Seus textos são marcados pela liberdade linguística, pelo nacionalismo e pelo caráter demolidor. Oswald é considerado o criador do poema pílula, do poema curto, direto, mas que nem por isso era menos rico.

Veja dois poemas que ilustram bem as características desse escritor:

        erro de português

Quando o português chegou

Debaixo duma bruta chuva

Vestiu o índio Que pena!

Fosse uma manhã de sol 

O índio tinha despido 

O português.

                         

Pronominais

Dê-me um cigarro

Diz a gramática

Do professor e do aluno

E do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom branco

Da nação brasileira

Dizem todos os dias

Deixa disso camarada  

Me dá um cigarro.

    Oswald de Andrade

Oswald de Andrade também estava preocupado com a proximidade da poesia com o falar brasileiro, seus poemas são curtos, com versos livres trazendo quase sempre um caráter humorístico, bem diferente dos poemas parnasianos.

 Oswald também se dedicou à prosa:

                       

                    Memórias Sentimentais de João Miramar.

Nesse livro, Oswald rompe com os esquemas tradicionais da narrativa. Os capítulos são curtíssimos, apresentando-se como pequenos fragmentos justapostos, próximos da técnica da pintura cubista, que representava ao mesmo tempo, as várias faces de um objeto ou situação, o que impossibilita uma leitura linear.

Veja a imagem de Manuel Bandeira, outro nome importante desse período:


Manuel Bandeira mostrou-se, no início de sua carreira, ainda preso aos valores parnasianos. Mas aos poucos incorporou as inovações modernistas.

A partir do livro Libertinagem firma-se como modernista. Seus poemas refletem uma linguagem simples, identificada com o falar cotidiano, assim como seus temas. Tudo podia ser motivo de poesia, a própria doença, frases corriqueiras e até mesmo uma notícia retirada de jornal. Sua linguagem coloquial e irônica, que atinge grande dramaticidade em poemas como o famoso "Pneumotórax". A ânsia de libertação e a ausência dolorosa de figuras familiares estão presentes em "Vou-me embora pra Pasárgada", "Poema de Finados", "Evocação de Recife", "Profundamente".

   Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

 

Vou-me embota pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconsequente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive

 

E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada

 

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

 

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

(In Poesia e prosa. Rio de Janeiro, Aguilar, 1974. p. 222.)                                             

Veja no poema Pneumotórax, a ironia, outra característica de Bandeira:

          Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.

A vida interia que podia ter sido e que não foi.

Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:

_ Diga trinta e três.

_ Trinta e três ... trinta e três ... trinta e três ...

_ Respire.

_ O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.

_ Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?

_Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Manuel Bandeira

Alcântara Machado, autor de Brás, Bexiga e Barra Funda é outra importante figura dessa primeira geração. Nesse livro de contos, Alcântara Machado retratou a vida dos imigrantes italianos moradores dos bairros populares da cidade de São Paulo. Inovando também a linguagem ao incorporar a linguagem popular, a simplicidade sintática e os italianismos, ou seja, a incorporação de expressões italianas ao português, daí a expressão português macarrônico.

Veja um exemplo desse português macarrônico no conto “A sociedade”, do mesmo livro:

_ Parlo assim para facilitar. Non é para ofender. Primo o doutor pense bem. E poi me dê a sua reposta. Domani, dopo domani, na outra semana, quando quiser. Io resto à sua disposição. Ma pense bem!”







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