segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Zabala - As relações interativas em sala de aula

 

Neste capítulo examinaremos como a concepção construtivista do ensino e da aprendizagem e a natureza dos diferentes conteúdos estabelecem determinados parâmetros nas atuações e relações que acontecem em aula. Tomadas como referenciais, permitirão nos aprofundar no conhecimento das diferentes propostas didáticas e de nossa forma de intervenção. Faremos uma revisão sintética do tipo de inter-relações e do papel dos professores e dos alunos que decorre da concepção construtivista, para em seguida examinarmos cada um dos diferentes aspectos que a configuram. Na última parte do capítulo faremos referência às características específicas dos conteúdos tratados.

Segundo esta concepção, ensinar envolve estabelecer uma série de relações que devem conduzir à elaboração, por parte do aprendiz, de representações pessoais sobre o conteúdo objeto de aprendizagem. A pessoa, no processo de aproximação aos objetos da cultura, utiliza sua experiência e os instrumentos que lhe permitem construir uma interpretação pessoal e subjetiva do que é tratado. Não é necessário insistir no fato de que em cada pessoa o resultado deste processo será diferente, trará coisas diferentes, e a interpretação que irá fazendo da realidade também será diferente; apesar de possuir elementos compartilhados com os outros, terá determinadas características únicas e pessoais.

Assim, pois, a diversidade é inerente à natureza humana, e qualquer atuação encaminhada para desenvolvê-la tem que se adaptar a esta caraterística. Falamos, portanto, de um "ensino adaptativo" (Miras, 1991), cuja característica distintiva é sua capacidade para se adaptar às diversas necessidades das pessoas que o protagonizam. Esta característica se concretiza em todas as variáveis que estão presentes nas diferentes estratégias que podem ser postas em marcha para "operacionalizar" a influência educativa.

Portanto, podemos falar da diversidade de estratégias que os professores podem utilizar na estruturação das intenções educacionais com seus alunos. Desde uma posição de intermediário entre o aluno e a cultura, a atenção à diversidade dos alunos e das situações necessitará, às vezes, desafiar; às vezes, dirigir; outras vezes, propor, comparar. Porque os meninos e as meninas, e as situações em que têm que aprender, são diferentes.

Isto tudo sugere que a interação direta entre alunos e professor tem que permitir a este, tanto quanto for possível, o acompanhamento dos processos que os alunos e alunas vão realizando na aula. O acompanhamento e uma intervenção diferenciada, coerentes com o que desvelam, tornam necessária a observação do que vai acontecendo. Não se trata de uma observação "desde fora", mas de uma observação ativa, que também permita integrar os resultados das intervenções que se produzam. Portanto, na boa lógica construtivista, parece mais adequado pensar numa organização que favoreça as interações em diferentes níveis: em relação ao grupo-classe, quando de uma exposição; em relação aos grupos de alunos, quando a tarefa o requeira ou o permita; interações individuais, que permitam ajudar os alunos de forma mais específica; etc. Assim se favorece a possibilidade de observar, que é um dos pontos em que se apoia a intervenção. O outro ponto de apoio é constituído pela plasticidade, a possibilidade de intervir de forma diferenciada e contingente nas necessidades dos alunos.

Uma interpretação construtivista do ensino se articula em torno do princípio da atividade mental dos alunos - e, portanto, também da diversidade. Apesar disso, situar no eixo o aluno ativo não significa promover uma atividade compulsiva, reativa, tampouco situar os professores num papel secundário.

Promover a atividade mental auto estruturante, que possibilita estabelecer relações, a generalização, a descontextualização e a atuação autônoma, supõe que o aluno entende o que faz e por que o faz e tem consciência, em qualquer nível, do processo que está seguindo. Isto é o que lhe permite dar-se conta de suas dificuldades e, se for necessário, pedir ajuda. Também é o que lhe permite experimentar que aprende, o que, sem dúvida, o motiva a seguir se esforçando.

Mas que isto aconteça não é uma casualidade. Que o aluno compreenda o que faz depende, em boa medida, de que seu professor ou professora seja capaz* de ajudá-lo a compreender, a dar sentido ao que tem entre as mãos; quer dizer, depende de como se apresenta, de como tenta motivá-lo, na medida em que lhe faz sentir que sua contribuição será necessária para aprender. O fato de que possa estabelecer relações depende, também, do grau em que o professor lhe ajuda a recuperar o que possui e destaca os aspectos fundamentais dos conteúdos que se trabalham e que oferecem mais possibilidades de relacionar com. o que conhece. Evidentemente, também depende da organização dos conteúdos, que os torne mais ou menos funcionais. Que os meninos e meninas possam seguir o processo e situar-se nele depende também do grau de contribuição do professor, com sínteses e recapitulações, com referências ao que já se fez e ao que resta por fazer; os critérios que pode transmitir acerca do que constitui uma relação adequada contribui, sem dúvida, para que os alunos possam avaliar a própria competência, aproveitar as ajudas que lhes são oferecidas e, se for necessário, pedi-las.

É todo um conjunto de interações baseadas na atividade conjunta dos alunos e dos professores, que encontram fundamento na zona de desenvolvimento proximal, que, portanto, vê o ensino como um processo de construção compartilhada de significados, orientados para a autonomia do aluno, e que não opõe a autonomia - como resultado de um processo - à ajuda necessária que este processo exige, sem a qual dificilmente se poderia alcançar com êxito a construção de significados deveriam caracterizar a aprendizagem escolar.

A INFLUÊNCIA DA CONCEPÇÃO CONSTRUTIVISTA NA FORMA DE AÇÃO DAS INTERAÇÕES EDUCATIVAS NA AULA

Do conjunto de relações interativas necessárias para facilitar a aprendizagem se deduz uma série de funções dos professores, que tem como ponto de partida o próprio planejamento. Podemos caracterizar         pessoas funções da seguinte maneira:

a) Planejar a atuação docente de uma maneira suficientemente flexível para permitir a adaptação às necessidades dos alunos em todo o processo de ensino/aprendizagem.

b) Contar com as contribuições e os conhecimentos dos alunos, tanto no início das atividades como durante sua realização.

c) Ajudá-los a encontrar sentido no que estão fazendo para que conheçam o que têm que fazer, sintam que podem fazê-lo e que é interessante fazê-lo.

d) Estabelecer metas ao alcance dos alunos para que possam ser superadas com o esforço e a ajuda necessários.

e)  Oferecer ajudas adequadas, no processo de construção do aluno, para os progressos que experimenta e para enfrentar os obstáculos com os quais se depara.

f) Promover atividade mental auto estruturante que permita estabelecer o máximo de relações com o novo conteúdo, atribuindo-lhe significado no maior grau possível e fomentando os processos de meta- cognição que lhe permitam assegurar o controle pessoal sobre os próprios conhecimentos e processos durante a aprendizagem.

g)  Estabelecer um ambiente e determinadas relações presididos pelo respeito mútuo e pelo sentimento de confiança, que promovam a autoestima e o autoconceito.

h)  Promover canais de comunicação que regulem os processos de negociação, participação e construção.

i) Potencializar progressivamente a autonomia dos alunos na definição de objetivos, no planejamento das ações que os conduzirão a eles e em sua realização e controle, possibilitando que aprendam a aprender.

j) Avaliar os alunos conforme suas capacidades e seus esforços, levando em conta o ponto pessoal de partida e o processo através do qual adquirem conhecimento e incentivando a autoavaliação das competências como meio para favorecer as estratégias de controle e regulação da própria atividade.

Planejamento e plasticidade na aplicação

A complexidade dos processos educativos faz com que dificilmente se possa prever com antecedência o que acontecerá na aula. Agora, este mesmo inconveniente é o que aconselha que os professores contem com o maior número de meios e estratégias para poder atender às diferentes demandas que aparecerão no transcurso do processo de ensino/ aprendizagem. Este fato recomenda duas atuações aparentemente contraditórias: por um lado, poder contar com uma proposta de intervenção suficientemente elaborada; e por outro, simultaneamente, com uma aplicação extremamente plástica e livre de rigidez. Trata-se de uma aplicação que nunca pode ser o resultado da improvisação, já que a própria dinâmica da aula e a complexidade dos processos grupais de ensino/aprendizagem obrigam a dispor previamente de um leque amplo de atividades que ajudem a resolver os diferentes problemas que a prática educativa coloca.

É imprescindível prever propostas de atividades articuladas e situações que favoreçam diferentes formas de se relacionar e interagir: distribuições grupais, com organizações internas convenientemente estruturadas através de equipes fixas e móveis com atribuições de responsabilidades claramente definidas; espaços de debate e comunicação espontâneos e regrados, como resultado da resolução de um conflito determinado nas assembleias periódicas; trabalhos de campo, excursões e visitas que situem os alunos frente à necessidade de resolver situações de convivência diferentes das que habitualmente lhes oferece a escola, a família ou o grupo de amigos; conjuntos de atividades e tarefas que gerem e favoreçam uma multiplicidade de situações comunicativas e de inter-relação que possam ser orientadas e utilizadas educativamente por parte dos professores.

Ao mesmo tempo, o planejamento tem que ser suficientemente diversificado para incluir atividades e momentos de observação do processo que os alunos seguem. É preciso propor aos alunos exercícios e atividades que ofereçam o maior número de produções e condutas para que sejam processadas, a fim de que oportunizem todo tipo de dados sobre as ações a empreender. Mover-se nos parâmetros de referências metodológicas extremamente abertas à participação do aluno para conhecer o processo que cada um segue. Procurar fórmulas organizativas que permitam a atenção individualizada, o que implica o planejamento estruturado de atividades em pequenos grupos ou individualmente, para que exista a possibilidade de atender a alguns alunos enquanto os demais estão ocupados em suas tarefas. Tudo isso deve permitir a individualização do tipo de ajuda, já que nem todos aprendem da mesma forma nem. no mesmo ritmo e. portanto, tampouco o fazem com as mesmas atividades.

Tem que ser um planejamento suficientemente flexível para poder se adaptar às diferentes situações da aula, como também deve levar em conta as contribuições dos alunos desde o princípio. É importante que possam participar na tomada de decisões sobre o caráter das unidades didáticas e a forma de organizar as tarefas e seu desenvolvimento, a fim de que não apenas aumentem o nível de envolvimento no ritmo da classe em geral, como em seus próprios processos de aprendizagem, entendendo o porquê das tarefas propostas e responsabilizando-se pelo processo autônomo de construção do conhecimento.

Quer dizer, um planejamento como previsão das intenções e como plano de intervenção, entendido como um marco flexível para a orientação do ensino, que permita introduzir modificações e adaptações, tanto no planejamento mais a longo prazo como na aplicação pontual, segundo o conhecimento que se vá adquirindo através das manifestações e produções dos alunos, sou acompanhamento constante e a avaliação continuada de seu progresso.

Levar em conta as contribuições dos alunos tanto no início das atividades como durante o transcurso das mesmas

Para poder estabelecer os vínculos entre os novos conteúdos e os conhecimentos prévios, em primeiro lugar é preciso determinar que interesses, motivações, comportamento, habilidades, etc., devem constituir o ponto de partida. Para conseguir que os alunos se interessem é preciso que os objetivos de saber, realizar, informar-se e aprofundar sejam uma consequência dos interesses detectados; que eles possam saber sempre o que se pretende nas atividades que realizam e que sintam que o que fazem satisfaz alguma necessidade. Mas para isso é indispensável que os meninos e meninas tenham a oportunidade de expressar suas próprias ideias e, a partir delas, convém potencializar as condições que lhes permitam revisar a fundo estas ideias e a ampliar as experiências com outras novas, fazendo com que se deem conta, também, de suas limitações, situando-os em. condição de modificá-las se for necessário, ao mesmo tempo que se buscam outras alternativas.

Estas condições obrigam a que uma das primeiras tarefas dos professores consista em levar em conta os conhecimentos prévios dos meninos e meninas, não aperras em relação aos conteúdos, como também aos papéis de todas as instâncias que participam nos processos de ensino/aprendizagem e, portanto, é preciso examinar a disposição, os recursos e as capacidades gerais com que conta cada aluno em relação à . tarefa proposta.

Para conseguir esta informação, será necessário, em primeiro lugar gerar um ambiente em que seja possível que os alunos se abram, façam

perguntas e comentem o processo que seguem, através de situações de diálogo e participação, como meio para a exploração dos conhecimentos prévios.

Para que tudo isto possa se realizar, os professores devem acreditar sinceramente nas capacidades dos alunos, ganhando a confiança deles a partir do respeito mútuo. Tem que avaliar o aluno pelo que é, confiando nele e dando condições para que aprenda a confiar em si mesmo. Neste sentido, dado o importante papel que desempenham as expectativas dos professores para com os alunos, será preciso encontrar em todos os alunos aspectos positivos (posto que sem dúvida existem) e que as expectativas se expressem convenientemente. Os alunos respondem e se adaptam de maneira diversa às propostas educacionais, mostrando maior ou menor interesse e dedicação nas tarefas, entre outros motivos, em função do que se espera, o que influi na intervenção do professor. Assim, aqueles que sentem que se espera deles um bom rendimento e que receberam ajuda e atenção por parte do professor, provavelmente confirmarão as expectativas gerais; por sua parte, meninos e meninas dos quais se esperavam poucos êxitos e que podem ter recebido uma ajuda educacional de menor qualidade também responderão às expectativas geradas ao não encontrar as condições apropriadas para melhorar seu rendimento (Solé, 1993).

Para poder levar em conta as contribuições dos alunos, além de criar o clima adequado, é preciso realizar atividades que promovam o debate sobre suas opiniões, que permitam formular questões e atualizar o conhecimento prévio, necessário para relacionar uns conteúdos com outros. Quer dizer, apresentar os conteúdos relacionados com o que já sabem, com seu mundo experiencial, estabelecendo, ao mesmo tempo, certas propostas de atuação que favoreçam a observação do processo que os alunos seguem para poder assegurar que seu nível de envolvimento é o adequado. Sem este ponto de partida, dificilmente será possível determinar os passos seguintes.

Ajudá-los a encontrar sentido no que fazem

Para que os alunos vejam sentido no trabalho que irão realizar é necessário que conheçam previamente as atividades que devem desenvolver, não apenas como são, como também o motivo pelo que foram selecionadas essas e não outras; que sintam que o trabalho que lhes é proposto está ao alcance deles e que seja interessante fazê-lo. Levando em conta estas condições, será necessário ajudar os meninos e meninas para que saibam o que têm que se fazer, a que objetivos responde, que finalidade se persegue, com que se pode relacionar e em que projeto global pode se inserir. Trata-se de condições não muito habituais, dada a tendência a dar por bom e inquestionável, e, portanto, com certo grau de imposição, o trabalho escolar e determinados conteúdos, também como resposta às demandas, muitas vezes arbitrárias, dos programas oficiais. É habitual encontrar propostas de exercícios em que os alunos atuam sem ter outra visão do trabalho do que a exclusiva resolução pontual da atividade. Dificilmente pode se produzir uma aprendizagem profunda se não existe uma percepção das razões que a justificam, além da necessidade de superação de alguns exames.

Assim, pois, será necessário comunicar os objetivos das atividades aos alunos, ajudá-los a ver de forma clara os processos e os produtos que se espera que adquiram ou produzam, introduzindo, no maior grau possível, a atividade pontual no âmbito de marcos ou objetivos mais amplos, a fim de que esta atividade adquira um significado adequado. É condição indispensável que vejam a proposta como atrativa, que estejam motivados para realizar o esforço necessário para alcançar as aprendizagens. Vale a pena considerar que, em geral, é preciso provocar o interesse e que este exige atenção para que ao longo do processo de aprendizagem não se dilua. Assim, é fundamental ajudar a tomar consciência dos próprios interesses e buscar o interesse geral, assim como aproveitar a participação e o envolvimento no planejamento, organização e realização de todas as atividades que se desenvolvem em classe, como meio para assegurar que o que fazem responde a uma necessidade.

De qualquer forma, não se deve esquecer que o melhor incentivo ao interesse é experimentar que se está aprendendo e que pode se aprender. A percepção de que a gente mesmo é capaz de aprender atua como requisito imprescindível para atribuir sentido a uma tarefa de aprendizagem. A maneira de ver o aluno e de avaliá-lo é essencial na manifestação do interesse por aprender. O aluno encontrará o campo seguro num clima propício para aprender significativamente, num clima em que se valorize o trabalho que se faz, com explicações que o estimulem a continuar trabalhando, num marco de relações em que predomine a aceitação e a confiança, num clima que potencializa o interesse por empreender e continuar o processo pessoal de construção do conhecimento.

Estabelecer metas alcançáveis

Para aprender não basta que o aluno participe na definição dos objetivos e no planejamento das atividades se estes objetivos e  atividades não representam, em primeiro lugar, desafios que o ajudem a avançar e, em segundo, se não são metas a seu alcance.

Será necessário provocar desafios que questionem os conhecimentos prévios e possibilitem as modificações necessárias na direção desejada, segundo os objetivos educacionais estabelecidos. Isto quer dizer que o ensino não deve se limitar ao que o aluno já sabe, mas que a partir deste conhecimento tem que conduzi-lo à aprendizagem de novos conhecimentos, ao domínio de novas habilidades e à melhora de comportamentos já existentes, pondo-o em situações que o obriguem a realizar um esforço de compreensão e trabalho.

Agora, os desafios têm que ser alcançáveis, já que um desafio tem sentido para o aluno quando este sente que com seu esforço e a ajuda necessária pode enfrentá-lo e superá-lo. Nesse momento sua tarefa será significativa. Assim, é necessário prestar atenção à adequação entre as- propostas e as possibilidades reais de cada menino e menina. Esta necessidade de adequação diversificada dos desafios obriga a questionar a excessiva homogeneidade das propostas que facilmente, pelo fato de implicar para todos o mesmo trabalho, podem excluir aqueles que não encontrem sentido num processo que, supostamente, não lhes trará nenhuma satisfação. Também induz a pensar que a diversificação se estende à maneira de responder dos diferentes alunos: uns com mais facilidade, outros com mais dificuldade; uns mais autonomamente, outros com necessidade de mais ajuda ou de uma ajuda qualitativamente diferente.

Oferecer ajudas contingentes

A elaboração do conhecimento exige o envolvimento pessoal, o tempo e o esforço dos alunos, assim como ajuda especializada, estímulos e afeto por parte dos professores e dos demais colegas. Ajuda pedagógica ao processo de crescimento e construção do aluno para incentivar os progressos que experimenta e superar os obstáculos que encontra. Ajuda necessária, porque sem ela os alunos por si sós dificilmente conseguiriam aprender, e aprender o mais significativamente possível. Mas sabendo, ao mesmo tempo, que deve ser só ajuda, já que o ensino não pode substituir os processos singulares e individuais que deve seguir cada um dos meninos e meninas em sua formação como pessoas.

Oferecer ajudas contingentes supõe intervir e oferecer apoio em atividades ao alcance dos meninos e meninas para que, graças ao esforço no trabalho e a estas ajudas, possam modificar os esquemas de conhecimento e atribuir novos significados e sentidos que lhes permitam adquirir progressivamente mais possibilidades de atuar de forma autônoma e independente em situações novas e cada vez mais complexas.

O apoio e a assistência que têm que acompanhar as exigências e os desafios devem ser instrumentos de todo tipo, tanto intelectuais como emocionais. Ajudas que se refletirão nas características das tarefas e na organização das mesmas e do grupo/classe em geral, de forma que seja possível a intervenção individualizada dos professores, e também como medidas ligadas ao tipo de avaliação, mas fundamentalmente vinculadas à maneira de comunicar e manifestar o conhecimento sobre o processo e os resultados alcançados.

Dada a diversidade dos alunos, o ensino não pode se limitar a proporcionar sempre o mesmo tipo de ajuda nem intervir da mesma maneira em cada um dos meninos e meninas. É preciso diversificar os tipos de ajuda; fazer perguntas ou apresentar tarefas que requeiram diferentes níveis de raciocínio e realização; possibilitar, sempre, respostas positivas, melhorando-as quando inicialmente são mais insatisfatórias; não tratar de forma diferente os alunos com menos rendimento; estimular constantemente o progresso pessoal. Mas também é imprescindível diversificar as atividades, a fim de que os alunos possam escolher entre tarefas variadas e propor diversas atividades com diferentes opções ou níveis possíveis de realização.

Para que tudo isso seja possível é preciso tomar medidas de organização do grupo, de tempo e de espaço e, ao mesmo tempo, de organização dos próprios conteúdos, que possibilitem a atenção às necessidades individuais. Agrupamentos flexíveis, equipes fixas ou variáveis, trabalho individual, oficinas e "cantos", contratos de trabalho, etc., com o objetivo de dispor de tempo e oportunidades para proporcionar em todo

momento a ajuda de que cada aluno necessita. Organização dos conteúdos que possibilite um trabalho adequado às características experimentais e pessoais dos alunos, oferecendo diversos graus de compreensão que permitam distintas aproximações ao conhecimento e diferentes níveis de utilização dos conteúdos de aprendizagem.

Promover a atividade mental auto-estruturante

Aprender significa elaborar uma representação pessoal do conteúdo objeto da aprendizagem, fazê-lo seu, interiorizá-lo, integrá-lo nos próprios esquemas de conhecimento. Esta representação não inicia do zero, mas parte dos conhecimentos que os alunos já têm e que lhes permitem fazer conexões com os novos conteúdos, atribuindo-lhes certo grau de significância. As relações necessárias a estabelecer não se produzem automaticamente - são o resultado de um processo extrema mente ativo realizado pelo aluno, o que há de possibilitar a organização e o enriquecimento do próprio conhecimento. Atividade que não significa fazer coisas indiscriminadamente, quer dizer, fazer por fazer - erro que cometem muitas propostas progressistas baseadas na simples realização de atividades em que o aluno está em constante movimento -, mas ações que promovam uma intensa atividade de reflexão sobre o que propõem as aprendizagens, diretamente proporcional a sua complexidade e dificuldade de compreensão. No entanto, é óbvio que para que esta atividade possa ter lugar, e segundo o nível de conhecimento cognitivo, os meninos e meninas terão que ver, tocar, experimentar, observar, manipular, exemplificar, comparar, etc., e a partir destas ações será possível ativar os processos mentais que lhes permitam estabelecer as relações necessárias para a atribuição de significado. Atividade mental que não pode se limitar à ação compreensiva exclusiva, pois para que essa aprendizagem seja o mais profunda possível, será necessário que,-além disso, exista uma reflexão sobre o próprio processo de aprendizagem.

Para poder realizar este processo mental auto-estruturante, os meninos e meninas necessitam de uma série de estratégias metacognitivas que lhes possibilite assegurar o controle pessoal dos conhecimentos que vão construindo, assim como dos processos que se realizam na aprendizagem. Poderemos considerar que existe um controle pessoal quando se dispõem de estratégias que lhes oferecem a oportunidade de planejar as atividades, regular as atuações, a partir dos resultados que obtêm durante sua realização, e revisar e avaliar a efetividade das ações desenvolvidas.

Esta intensa atividade mental não se realiza facilmente. É preciso que os meninos e meninas sintam a necessidade de se fazer perguntas, de questionar suas ideias, de estabelecer relações entre fatos e acontecimentos, de revisar suas concepções. E para promover todas estas ações será necessário propor aquelas atividades que possibilitem este intenso processo mental. Aqui é preciso considerar a complexidade do conteúdo objeto de aprendizagem e as capacidades de que dispõem os alunos para compreendê-lo e dominá-lo, para planejar as atividades que favoreçam e promovam o esforço mental necessário para estabelecer vínculos entre suas concepções e o novo material de aprendizagem. Conforme as dificuldades do novo conteúdo, haverá que oferecer atividades nas quais os meninos e meninas se sintam cômodos em relação ao processo de compreensão e, portanto, será necessário partir de situações o mais próximas possível do seu mundo experiencial, através de atividades que apresentem referenciais que favoreçam este processo de compreensão. Convém levar em conta que em muitos casos não poderão ser unicamente atividades passivas, serão necessários o debate e o diálogo, quando não os trabalhos de observação, experimentação e manipulação.

Atividades que exigem dos alunos, além do mais, aplicar, analisar, sintetizar e avaliar o trabalho realizado e a eles mesmos; que promovam a reflexão conjunta dos processos seguidos, ajudando-os a pensar, para que sejam constantemente partícipes das próprias aprendizagens. Atividades que fomentem a tomada de decisões quanto às aprendizagens que devem ser realizadas, levando em conta o ponto pessoal de partida; que tornem possível pôr sobre a mesa as habilidades que utilizarão ou requererão; que orientem seus pensamentos mediante a interrogação e a formulação de hipóteses, solicitando aos alunos explicações sobre seus I próprios processos e sobre o processo a partir do qual chegam ao conhecimento e utilizando a linguagem para a generalização em diferentes situações e contextos e a reconceitualização das experiências vividas.

Verbalização também em situações de atividade compartilhada com outros e na resolução de problemas de maneira cooperativa, que permitam, a confrontação de ideias, a resolução de dúvidas e o uso funcional em outras ocasiões em que seja necessário.

Estabelecer um ambiente e determinadas relações que facilitem a auto-estima e o autoconceito

Para aprender é indispensável que haja um clima e um ambiente adequados, constituídos por um marco de relações em que predominem a aceitação, a confiança, o respeito mútuo e a sinceridade. A aprendizagem é potencializada quando convergem as condições que estimulam o trabalho e o esforço. E preciso criar um ambiente seguro e ordenado, que ofereça a todos os alunos a oportunidade de participar, num clima com multiplicidade de interações que promovam a cooperação e a coesão do grupo, interações essas presididas pelo afeto, que contemplem a possibilidade de se enganar e realizar as modificações oportunas; onde convivam a exigência de trabalhar e a responsabilidade de realizar o trabalho autonomamente, a emulação e o companheirismo, a solidariedade e o esforço; determinadas interações que gerem sentimentos de segurança e contribuam para formar no aluno uma percepção positiva e ajustada de si mesmo.

E isto é assim porque na aprendizagem intervêm numerosos aspectos do tipo afetivo e relacional, de maneira que o processo seguido e os resultados obtidos adquirem um papel definitivo na construção do conceito que se tem de si mesmo, na maneira de se ver e se avaliar e, em geral, no autoconceito. Ao mesmo tempo, este autoconceito influi na maneira de se situar frente à aprendizagem: com mais ou menos segurança, ilusão, expectativas.

Uma das tarefas dos professores consistirá em criar um ambiente motivador, que gere o autoconceito positivo dos meninos e meninas, a confiança em sua própria competência para enfrentar os desafios que se apresentem na classe. Estas representações serão o resultado do grau de adequação dos desafios que são propostos aos alunos e da avaliação que se faz de seu trabalho. Como já se disse, as características das atividades que se propõem serão essenciais, mas o que determina em maior ou menor grau a própria imagem serão os tipos de comentários de aceitação ou de rejeição por parte dos professores durante as atividades e, sobretudo, o papel que se atribui à avaliação. Assim, pois, as avaliações centradas exclusivamente nos resultados, e especialmente em relação a alguns objetivos gerais ou à média da classe, não ajudarão em absoluto a melhorar a auto-imagem de todos aqueles que, apesar do esforço realizado, não conseguem superar esta média. Para manter e melhorar uma auto-imagem que facilite a atitude favorável à aprendizagem, será necessário que estas avaliações sejam feitas conforme as possibilidades reais de cada um dos meninos e meninas, para que a aceitação das competências pessoais não ocorra cm detrimento de uma auto-imagem positiva.

Promover canais de comunicação

Entender a educação como um processo de participação orientado, de — construção conjunta, que leva a negociar e compartilhar significados, faz com que a rede comunicativa que se estabelece na aula, quer dizer, o tecido de interações que estruturam as unidades didáticas, tenha uma importância crucial. Para construir esta rede, em primeiro lugar é necessário compartilhar uma linguagem comum, entender-se, estabelecer canais fluentes de comunicação e poder intervir quando estes canais não funcionem. Utilizar a linguagem da maneira mais clara e explícita possível, tratando de evitar e controlar possíveis mal-entendidos ou incompreensões.

Para facilitar o desenvolvimento do aluno é preciso utilizar o grupo- classe, potencializando o maior número de intercâmbios em todas as direções. Para isso será imprescindível promover a participação e a relação entre os professores e os alunos e entre os próprios alunos, para debater opiniões e ideias sobre o trabalho a ser realizado e sobre qualquer das atividades que se realizam na escola, escutando-os e respeitando o direito de intervirem nas discussões e nos debates. E importante aceitar as contribuições dos meninos e meninas, mesmo que se expressem de forma pouco clara ou parcialmente incorreta, e estimular especificamente a participação dos alunos com menor tendência espontânea a intervir, através do oferecimento de espaços de trabalho em pequenos grupos ou da relação e de contato pessoais com alguns alunos em momentos pontuais. A diversificação dos tipos de atividades para tornar possível que num momento determinado os alunos possam escolher entre atividades diferentes e a proposição, em alguns casos, de atividades com opções ou alternativas diferentes para possibilitar a participação do conjunto de alunos no maior grau possível.

A rede comunicativa será mais ou menos rica conforme as possibilidades veiculadas pelas diferentes sequências didáticas e as que se decorrem do tipo de estruturação do grupo e do papel que outorga aos diversos membros do grupo. Pode se escolher uma estrutura praticamente linear, cujas relações sejam fundamentalmente unidirecionais de professor a aluno e cujos níveis de comunicação se limitem a uma aceitação acrítica das exposições e critérios do primeiro. Ou também se pode promover que os canais comunicativos, e, portanto, da aprendizagem, se ampliem graças a modelos cuja estrutura organizativa obrigue a corresponsabilizar todo o grupo-classe com o objetivo de conviver e aprender e, assim, abrir o leque de possibilidades de relações entre os diferentes membros do grupo. Atividades comunicativas que fomentem a bidirecionalidade das mensagens e aproveitem a potencialidade educativa que oferece a aprendizagem entre iguais.

Potencializar a autonomia e possibilitar que os alunos aprendam a aprender

O crescimento pessoal dos alunos implica como objetivo último serem autônomos para atuar de maneira competente nos diversos contextos em que haverão de se desenvolver. Impulsionar esta autonomia significa tê-la presente em todas e cada uma das propostas educativas, para serem capazes de utilizar sem ajuda os conhecimentos adquiridos em situações diferentes da que foram aprendidos. Para poder alcançar esta autonomia será necessário que ao longo de todas as unidades didáticas os professores e os alunos assumam responsabilidades distintas, exercendo um controle diferente conforme os conteúdos tratados, com o objetivo de que no final os alunos possam aplicar e utilizar de maneira autônoma os conhecimentos que adquiriram.

Será necessário oportunizar situações em que os meninos e meninas participem cada vez mais intensamente na resolução das atividades e no processo de elaboração pessoal, em vez de se limitar a copiar e reproduzir automaticamente as instruções ou explicações dos professores. Numa primeira fase, os alunos seguirão os modelos ou as diferentes ações propostas pelos professores, com uma ajuda intensa por parte deste. Nas fases seguintes será retirada esta ajuda de maneira progressiva, usando pouco a pouco os conteúdos que ainda são utilizados pelo professor ou professora e assegurando a passagem progressiva de competências do nível interpessoal inicial, quando todos trabalham juntos, para o nível intrapessoal, quer dizer, quando o aluno é capaz de utilizá-las de forma autônoma.

Isto supõe levar a cabo uma ação de observação do processo de cada aluno para retirar as ajudas e assegurar-se, assim, de que o aluno atua de forma autônoma não apenas na compreensão, no domínio ou na interiorização dos conteúdos, procedimentais ou atitudinais, como também na definição de objetivos, no planejamento das ações que lhe permitam alcançá-los e em sua realização e controle. Enfim, em tudo o que envolve ter adquirido estratégias metacognitivas que possibilitem a autodireção e a auto-regulação do processo de aprendizagem.

Haverá que promover o trabalho independente através de situações em que possam se atualizar e utilizar autonomamente os conhecimentos construídos, assegurando a atividade construtiva do aluno e sua autonomia, a fim de que possa aprender por si mesmo. Frente aos entraves que se apresentam ao aprender, é possível recorrer à ajuda externa. Mas só na medida em que os meninos e meninas sejam capazes de se dar conta dos próprios erros e de buscar os recursos necessários para superá-los, poderemos falar de aprender a aprender, o que quer dizer que para aprender a aprender eles também devem aprender a se dar conta do que sabem e do que não sabem e a saber o que podem fazer quando encontram um obstáculo. Será necessário ensinar-lhes que, quando aprendem, devem levar em conta o conteúdo de aprendizagem, assim como a maneira de se organizar e atuar para aprender.

Avaliá-los conforme suas possibilidades reais e incentivar a auto-avaliação de suas competências

Pudemos ver a importância da percepção que cada um tem de si mesmo para encontrar interesse na aprendizagem. Também vimos a necessidade de que os meninos e meninas sejam partícipes do próprio processo de aprendizagem, que sejam conscientes de como se desenvolveu. Do papel que tem para a aprendizagem a avaliação que os professores fazem de seus alunos e da necessidade de que as ajudas que ofereçam sejam adequadas a suas possibilidades reais, decorre que a função básica dos professores deve ser incentivar os alunos a realizar o esforço que lhes permita continuar progredindo. E isto só será possível quando a avaliação dos resultados que se transmite ao aluno for feita com relação a suas capacidades e ao esforço realizado. Este é provavelmente o único conhecimento que é preciso saber com justiça, já que é o que permite promover a autoestima e a motivação para continuar aprendendo.

Assim, pois, será preciso confiar, e demonstrar esta confiança, no esforço dos meninos e meninas, devolvendo-lhes a avaliação de seu próprio progresso, levando em conta a situação pessoal de partida, os obstáculos que tiveram que superar e os tipos de ajuda com que contaram, quer dizer, o conjunto de variáveis que intervêm em cada um dos trajetos realizados. Trata-se de reconhecer o trabalho bem feito, mas sobretudo o esforço realizado, fazendo-os ver as dificuldades que tiveram que solucionar e os meios de que dispuseram. Enfim, respeitar o fato diferencial é uma medida-chave para promover a atitude favorável para continuar aprendendo e para melhorar o conhecimento dos processos pessoais de aprendizagem. Com esta finalidade será necessário apresentar atividades de avaliação nas quais seja possível atribuir os êxitos e os fracassos da aprendizagem a motivos modificáveis e controláveis, como fórmula para entender que é possível avançar quando se realiza o trabalho e o esforço suficientes para consegui-lo.

E necessário que os alunos conheçam e se apropriem dos critérios e dos instrumentos que os professores utilizam para avaliá-los. Que possam conhecer desde o princípio o que se quer deles, que sentido tem este objetivo, de que meios de ajuda disporão, que pautas e instrumentos são utilizados para, conhecer suas aprendizagens e que critérios- avaliativos serão aplicados. Neste sentido, ganha uma importância crucial a integração de atividades que promovam a auto-avaliação dos alunos. E preciso recusar fórmulas em que o controle e a avaliação recaem exclusivamente nos professores, sobretudo em situações e momentos alheios aos processos individuais de aprendizagem. Por outro lado, as situações de atuação conjunta favorecem o processo de autonomia progressiva e, portanto, a aquisição progressiva de estratégias de controle e regulação da própria atividade, imprescindíveis para promover a capacidade de aprender a aprender.

A INFLUÊNCIA DOS TIPOS DE CONTEÚDOS NA ESTRUTURAÇÃO DAS INTERAÇÕES EDUCATIVAS NA AULA

Do conhecimento de como se produzem os processos de aprendizagem se deduz, como vimos, uma série de relações que os incentiva: Estas condições são generalizáveis, referem-se a qualquer aprendizagem, independentemente do tipo de conteúdo. No entanto, todas elas são especialmente adequadas para o ensino dos conteúdos de caráter conceituai. Por outro lado, também, neste caso as características dos diferentes conteúdos fazem com que o tipo de atuação do professorado, e as relações interativas que tenham que se promover, sejam de uma maneira ou de outra conforme os conteúdos sejam de um ou outro tipo. Portanto, haverá que matizar os critérios gerais descritos anteriormente ou acrescentar outros novos, conforme os conteúdos a serem trabalhados sejam de caráter procedimental ou atitudinal.

A condição ativa dos conteúdos procedimentais e o fato de que os meninos e meninas realizem a aprendizagem com estilos diferentes, mas sobretudo com ritmos diferentes, obriga a incluir, em primeiro lugar, atividades suficientes que permitam realizar as ações que comportam estes conferidos tantas vezes quantas for necessário e, em segundo lugar, formas organizativas que facilitem as ajudas adequadas às necessidades específicas de cada um dos alunos. A realização de ações deve ser precedida, em termos gerais, da observação de modelos indicados pelos professores, adequados às possibilidades reais de cada menino e menina. Assim, pois, é preciso oferecer modelos da maneira de realizar o procedimento ou a técnica, é preciso oferecer um apoio constante na realização de cada um dos passos e é preciso retirar progressivamente estas ajudas até que os alunos sejam capazes de atuar de forma autônoma.

Para poder oferecer esta ajuda e apoio segundo as características particulares de cada menino e menina, será necessário adotar, entre outras coisas, medidas organizativas e meios materiais que facilitem uma atenção o mais individualizada possível: grupos fixos e móveis ou flexíveis, trabalho em dupla ou individual, com propostas de atividades e disposição de materiais que permitam o trabalho progressivo e sistemático na exercitação indispensável para o domínio da estratégia, procedimento ou técnica.

A aprendizagem dos conteúdos atitudinais, no entanto, requer uma reflexão mais profunda a respeito das relações interativas que devem ser promovidas. Relações que neste caso estão determinadas tanto pelas características gerais destes conteúdos - dada a importância que tem seu componente afetivo -, como pelos traços próprios de cada um dos valores, atitudes e normas que se propõem.

O fato de que para a aprendizagem dos conteúdos atitudinais seja preciso articular ações formativas, nas quais estes conteúdos sejam "vividos" pelos alunos, obriga a integrar em aula não apenas tarefas concretas, como principalmente formas específicas de desenvolvê-las em um clima e em. relações adequadas entre professores e alunos e entre os próprios alunos. O ambiente geral, as avaliações que se faz e as relações que se estabelecem têm que traduzir os valores que se quer ensinar. Assim, por exemplo, se um dos valores que se quer transmitir é a solidariedade, não basta propor atividades de debate e reflexão sobre comportamento de cooperação em diferentes ambientes e espaços sociais, mas será necessário que na aula se viva num clima de solidariedade onde existam possibilidades de atuar segundo estes princípios. Uma observação, este clima será o resultado das imagens que os próprios professores transmitem.

Se lembramos alguns dos valores mais relevantes e algumas das atitudes que decorrem dos mesmos, nos daremos conta de que sua aceitação como conteúdos de aprendizagem obriga os professores e os alunos a adotarem certos papéis determinados. Se como exemplo tomamos qualquer dos valores de tolerância, justiça, cooperação, solidariedade, liberdade, respeito mútuo, responsabilidade, participação, diversidade - que todo mundo aceita que é preciso promover nas escolas e pensamos as implicações educacionais que têm, poderemos ver que tipo de relações deve se propor na aula. Em primeiro lugar, observamos que dificilmente pode se cultivar algum destes valores se os próprios professores não têm, defendem e demonstram atitudes de tolerância, justiça, cooperação, etc. Isto, que é uma condição indispensável, não substitui as atuações educativas adequadas para que o valor em questão seja progressivamente incorporado pelos alunos.

Querer que os alunos assumam como valores a tolerância com os demais e a aceitação da diversidade, suas opiniões, suas maneiras de ser e suas crenças exige a presença em aula de um clima em que se atue de acordo com estes princípios. E este clima deve se traduzir em atividades que impliquem comover, que não se limitem à simples realização de trabalhos mais ou menos acadêmicos, mas que proponham tarefas em que seja necessário aceitar a diferença: trabalho em grupos heterogêneos, visitas, passeios, atividades recreativas, etc. Requer-se um conjunto de atividades e situações em que se produzirão conflitos, em que se deverá levar em conta os demais e renunciar à imposição dos próprios pontos de vista. Atividades, enfim, que obriguem a manifestar o contraste entre os colegas como ponto de partida para analisar os próprios comportamentos e fazer as avaliações que permitam interiorizar os princípios da tolerância.

Estreitamente vinculado à tolerância, conseguir que o respeito mútuo seja assumido como princípio de atuação supõe um ambiente que possibilite o diálogo e a abertura aos demais, um clima de participação em que se avaliem as opiniões, em que seja. possível defender os diferentes pontos de vista, em que exista a possibilidade de debater o que cada um pensa, aceitando que há diversas perspectivas sobre um mesmo fato, e a conivência harmoniosa de opiniões discrepantes. Implica fazer com que os alunos vejam ao que conduz a falta de respeito e sobre que princípios se sustenta. Os debates, a expressão das ideias, os diálogos, o trabalho em equipe ou a convivência são instrumentos tão necessários como os que decorrem do clima institucional que existe, da maneira de resolver os conflitos que possam se produzir ao nível de equipe por parte dos professores, de como se relacionam entre eles e com outros profissionais e pais, etc.

Para que os alunos sejam cada vez mais cooperativos e solidários será necessário promover atividades que os obriguem a trabalhar em diferentes tipos de grupos, que proponham situações que requeiram compartilhar materiais, trabalhos e responsabilidades, que lhes permitam se ajudar entre eles e nas quais se avalie sua conduta em relação a seu grau de participação. Atividades em que as relações entre os colegas potencializem a colaboração em vez da competição. Vivência dos brinquedos em equipe e esportes, não com o objetivo-chave de submeter o outro, mas de compartilhar um tempo agradável em grupo. Também convém trabalhar a potencialidade do grupo cooperativo como ajuda a aprendizagem e como instrumento de apoio emocional e situar o trabalho conjunto num marco em que o êxito de um implique o êxito dos outros, renunciando á situação habitual na qual o êxito costuma apoiar-se no fracasso mais ou menos encoberto do companheiro/adversário.

Formar na liberdade supõe considerá-la como uma possibilidade de expressão e ação (exercício responsável ao direito à liberdade); portanto, será necessário poder viver sensações em que se tenha cada vez mais a possibilidade de exercê-la. Trata-se de criar um clima em que os meninos e meninas percebam que são levados em conta; em que haja espaços onde possam atuar sentindo que o fazem segundo seus próprios critérios. São atividades em que as relações pessoais e coletivas são entendidas como vínculos de reciprocidade que fomentam a elaboração de projetos pessoais adequados às próprias necessidades e interesses em complementaridade com os dos demais. Neste sentido, convém evitar situações enganosas em que se dá liberdade aos alunos para que decidam o que convém que decidam; em que não se deixa que se enganem. Com os limites necessários para assegurar sua formação pessoal, educar na liberdade supõe assumir alguns riscos: os que decorrem de ter que renunciar à regulação externa exaustiva das decisões e dos comportamentos dos alunos. Portanto, educar na liberdade é educar nos critérios que tornam possível seu exercício responsável e respeitoso em relação aos demais.

Conseguir que a responsabilidade seja considerada como um valor próprio e se atue de acordo com ela implica promover, progressivamente, o trabalho autônomo. Há que possibilitar que os alunos, desde pequenos, sintam que há confiança em suas capacidades para assumir responsabilidades, que são capazes de tomar decisões de forma autônoma, que vejam que suas valorações e opiniões contam. Por tudo isso, é necessário que na aula se compartilhem cada vez em maior grau a gestão da escola, as decisões cruciais na vida do grupo, na avaliação cie seu trabalho e seu progresso.

Para que a participação, entendida como o compromisso pessoal para com o coletivo, seja um fato, será necessário dar oportunidades de participação em todos os níveis. Oferecer oportunidades de tomada de decisões que afetem a todo o grupo-classe, deixar espaços onde nem tudo esteja regulado externamente ou sujeito a mecanismos de controle. A participação não envolve tanto "fazer sua parte" num projeto pensado e compartimentado desde fora, mas definir um projeto compartilhado e estabelecer o compromisso pessoal para a realização de objetivos comuns.

Enfim, a complexidade do trabalho das atitudes e dos valores na escola é determinada por diversos fatores. Um deles, muito importante, decorre da contradição que seguido se torna evidente entre o que se tem que trabalhar em aula e o que está presente em nível social, nos meios de comunicação, nos interesses dos grupos de pressão, nos outros sistemas onde os alunos vivem. O segundo é a consideração que estes conteúdos devem, necessariamente, impregnar as relações institucionais em seu conjunto. E, o terceiro, a dificuldade para achar "procedimentos" claramente estabelecidos para trabalhá-los, ao contrário do que acontece com outros conteúdos. Acrescentamos, também, desde o ponto de vista do docente: haver refletido sobre os valores, haver adotado pontos de vista e opções e ser beligerante quando necessário. Tudo isso coloca alguns desafios suficientemente importantes para os professores, que requerem respostas individuais e coletivas.

Conclusões

Para concluir este capítulo devemos dizer que os princípios da concepção construtivista do ensino e da aprendizagem escolar proporcionam alguns parâmetros que permitem orientar a ação didática e que, de maneira específica, ajudam a caracterizar as interações educativas que estruturam a vida de uma classe. O resultado da análise destes parâmetros apresenta um marco complexo. Ensinar é difícil e não dá para esperar que a explicação das variáveis que intervêm possa ser feita por um discurso simplista.

Agora, tampouco devemos perder de vista que, em grande parte, poder trabalhar desde este marco implica uma atitude construtivista - baseada no conhecimento e na reflexão -, que contribui para que nossas intervenções, talvez de forma intuitiva em grande parte, se ajustem às necessidades dos alunos que temos em frente, nos levem a incentivá-los, a ver seus aspectos positivos, a avaliá-los conforme seus esforços e a atuar como o apoio de que necessitam para seguir adiante. Esta atitude, que mobiliza diversos recursos, se concretiza de forma diferente conforme o trabalho que realizam se centra mais em conteúdos conceituais, procedimentais ou atitudinais. Que todos façam parte do que temos que ensinar na escola não se deduz tanto de uma exigência burocrática da administração educacional, mas da necessidade de educar de modo íntegro as pessoas. De nosso ponto de vista, esta reflexão, talvez mais ideológica, se articula com a reflexão anterior, talvez mais psicopedagógica, para estabelecer as bases de um ensino que possa ajudar os alunos a se formarem como pessoas no contexto da instituição escolar.

Antoni Zabala - A Prática Educativa


Zabala - A organização social da classe


O PAPEL DOS AGRUPAMENTOS

Historicamente, a forma mais habitual de preparar as pessoas mais jovens de qualquer grupo social para sua integração na coletividade tem sido através de processos geralmente individuais, seja em casa ou no campo por parte dos pais, seja nas oficinas por parte de mestres artesãos. As classes mais privilegiadas tinham acesso a outros tipos de aprendizagens, como a leitura, a escrita ou outros saberes, mas sempre se tratava de uma formação individualizada. A maioria das aprendizagens era o resultado de atividades cotidianas. Quando chega o momento em que se considera necessário generalizar o ensino da leitura, da escrita e da denominada "cultura geral" para outras camadas sociais, é que se coloca a necessidade de resolver o problema de como ensinar ao mesmo tempo a um número máximo de alunos.

É assim que nascem as primeiras formas de agrupamento. Em fins do século XVI, se define uma das formas para organizar os alunos, que se tornará habitual praticamente até nossos dias: grupos de cinquenta a sessenta alunos do mesmo sexo e da mesma idade situados numa mesma aula e dependentes de um professor/tutor ou de diversos professores. Toda escola, e mais quanto mais pretensões de "qualidade" tenha, dará ênfase em destacar a estrutura organizativa em grupos homogêneos e graduados. Nos núcleos de população com um número reduzido de alunos se aceitam, embora como algo negativo, outras formas organizativas diferentes, sempre dentro do grande grupo, neste caso heterogêneo. As relações e a organização social neste modelo são bastante simples. O grande-grupo atua como um todo, como soma de pessoas selecionadas previamente segundo certos critérios uniformizadores: sexo, nível, capacidades... O grande grupo e a estrutura social têm a função de solucionar fundamentalmente os problemas de ordem e disciplina. As relações no grupo se articulam como uma fórmula para favorecer a comparação e a competição "estimuladora" (divisão em "romanos" e "cartagineses", êmulos, atos públicos de distribuição de notas, quadros de honra, etc.).

Em fins do século XIX e no começo do XX, começam a surgir de forma apreciável outras formas de organização da escola e das aulas que rompem com este modelo único. Estruturação das aulas em grupos fixos e móveis, equipes de trabalho, grupos homogêneos e heterogêneos, oficinas, "cantos", estudos individualizados, etc. O surgimento de diferentes modelos organizativos é a resposta às novas inquietações no ensino, às diferentes concepções educativas e aos conhecimentos psicopedagógicos. Defende-se o trabalho em equipe como meio para promover a socialização e a cooperação, para poder atender aos diferentes níveis e ritmos de aprendizagem, para resolver problemas de dinâmica grupal, para tornar possível a aprendizagem entre iguais, etc.

Neste capítulo descreveremos as formas mais genéricas de organização...social nas escolas a partir de referenciais de análise que nos permitam reconhecer as possibilidades de cada urna das opções. Desta maneira poderemos dispor de critérios para selecionar, em cada momento, a forma de agrupamento mais adequada a nossas intenções educacionais. Analisaremos os motivos que as justificam e os critérios para avaliá-las e a seguir trataremos, com estas mesmas proposições, as variáveis metodológicas do tempo e do espaço.

FORMAS DE AGRUPAMENTO

Uma revisão das formas de organização grupai nos permite fazer uma classificação mais ou menos esquemática das diferentes maneiras de agrupar os meninos e meninas em classe.

Nesta classificação podemos observar que as diferenças mais características das diversas formas de agrupamentos estão determinadas por seu âmbito de intervenção: grupo/escola e grupo/classe; e em cada uma delas conforme o trabalho seja realizado com todo o grupo ou com grupos ou equipes fixos ou móveis. E também deve se precisar, nos dois âmbitos, se os critérios que se utilizaram para estabelecer estes agrupamentos foram a homogeneidade ou a heterogeneidade dos mesmos em relação a considerações de sexo, nível de desenvolvimento, conhecimentos, etc. 

Em primeiro lugar temos o grupo/escola como primeira configuração grupai da escola, grupo que em toda escola tem uma forma e estrutura social determinada. Neste primeiro âmbito encontramos atividades que se realizam em diferentes tipos de agrupamento: o grande grupo em atividades globais da escola, assembleias, atividades esportivas ou culturais, etc.; o grupo/classe, que geralmente implica grupos fixos de idade, embora em alguns casos sejam móveis e, portanto, os componentes variam conforme a atividade a ser desenvolvida, a área ou a matéria: oficinas, atividades facultativas, níveis, etc.

No âmbito do grupo/classe encontramos atividades de grande grupo: exposições, assembleias, debates, etc.; atividades organizadas em equipes fixas: organizativas, de convivência, de trabalho, etc.; atividades em equipes móveis de dois ou mais alunos: investigações, diálogos, trabalhos experimentais, observações, elaboração de dossiês, "cantos", etc.; atividades individuais de exercitação, aplicação, estudo, avaliação, etc.

DESCRIÇÃO E AVALIAÇÃO DAS DIFERENTES FORMAS DE AGRUPAMENTO

Como qualquer uma das outras variáveis metodológicas, as diferentes tendências de organização social das instituições educacionais e da classe têm sido determinadas mais pelo costume e pela história do que por uma reflexão fundamentada das opções escolhidas em cada momento. Assim, encontramos escolas e professores que mantiveram a todo custo os modelos herdados, e outros que foram mudando, quase de forma compulsiva, conforme as tendências do momento. E em ambos os casos se fazem desqualificações globais das opções contrárias. Em nossas escolas, infelizmente, não tem sido frequente dispor de espaço e tempo para a reflexão serena, fato que não contribui para a análise constante, profunda e desapaixonada que uma tomada de decisão tão complexa merece. Como veremos, e esta pode ser a conclusão fundamental, cada uma das opções organizativas comporta determinadas vantagens e determinados inconvenientes, certas possibilidades e certas potencialidades educativas diferentes. De algum modo, nós, educadores, temos em mãos alguns instrumentos educativos que não são nem bons nem maus em si mesmos, mas que são basicamente ferramentas que podem ser adequadas para satisfazer determinadas necessidades educativas. Nossa tarefa consiste em conhecer estas potencialidades didáticas, sem renunciar, por princípio, a nenhuma delas, e utilizá-las convenientemente quando for necessário.

A escola como grande grupo

As características da organização grupai neste âmbito estão determinadas, em primeiro lugar, pela organização e pela estrutura de gestão da escola e, em segundo lugar, pelas atividades que toda a escola realiza de forma coletiva, as quais, apesar de serem bastante limitadas, são cruciais para o sentimento de identificação pessoal com a escola, tanto por parte dos alunos como dos professores.

Portanto, são instrumentos ou ferramentas formativas de todo o grupo/escola as atividades vinculadas à gestão da escola, que configuram determinadas relações interpessoais, uma distribuição de papéis e responsabilidades e um diferente grau de participação na gestão. E também o são as atividades gerais da escola, de caráter cultural, social e esportivo, de natureza interna e de difusão exterior, quer dizer, dirigidas aos familiares dos alunos ou abertas a setores mais amplos da comunidade, do bairro ou cidade. Assim, pois, é preciso distinguir entre as atividades com participação de toda a escola e as que são consequência da maneira de gerir esta escola.

Atividades gerais da escola

Durante o ano, a maioria das escolas organiza uma série de atividades que em geral são de caráter social, cultural, lúdico ou esportivo. As principais diferenças entre as escolas estão associadas à abrangência e à finalidade destas atividades. Portanto, há algumas que são do grupo e para o grupo, quer dizer, de caráter interno, e outras que estão abertas a outras coletividades. Em relação à função ou finalidade, encontraremos atividades para o prazer, a motivação, a promoção externa, a demonstração e o compromisso.

Todas as atividades de grupo/escola, se são satisfatórias, potencializam o sentimento de pertinência e de identificação com o grupo, a auto- estima coletiva. Portanto, promovem atitudes de compromisso e responsabilidade para com os demais e também reforçam o estímulo e a motivação em relação aos projetos da escola, entre eles os que estão relacionados com a formação e o estudo. Esta identificação também envolve a adoção ou a rejeição dos valores do grupo, constituindo então um dos meios mais valiosos para promover a aprendizagem de conteúdos de caráter atitudinal.

Esta potencialidade obriga a avaliar com muita atenção as características das atividades que se propõem. Em muitos escolas existe uma contradição paradoxal: algumas, por exemplo, apesar de terem uma declaração de intenções não-consumistas, promovem festas, representações ou comemorações, em que é imprescindível a compra de fantasias ou vestidos caros e inúteis, para outras atividades; outras fazem manifestações cooperativas e anticompetitivas e, em troca, seguido organizam concursos, competições e jogos com prêmios; há as que, apesar de.se definirem como não-sexistas, não levam em conta este aspecto ao atribuir papéis de ambos os sexos nas representações, nas atuações ou nos brinquedos e também há as que fazem declarações de "humildade" e organizam grandes atos que basicamente são manifestações publicitárias.

Também encontraremos escolas em que muitas destas Atividades gerais ocorrem no exterior ou estão dirigidas para o exterior: atividades de participação em festas ou atividades culturais de bairro, visitas a campos de trabalho, atividades de pesquisa social, serviços para a comunidade (coleta e reciclagem de papel, oferecimento das instalações escolares, etc.). Trata-se de atividades que demonstram o compromisso social da escola e que constituem a forma mais coerente, e, portanto, mais formativa, de responder a certas finalidades educacionais vinculadas a valores como a solidariedade, o respeito, o compromisso, etc.

Que critérios utilizaremos para avaliar estas atividades? Como em todas as experiências que os alunos vivem, deveremos nos perguntar que aprendizagens promovem. Temos que nos perguntar que conteúdos conceituais, procedimentais e sobretudo atitudinais são trabalhados em cada uma das atividades e relacioná-los com as finalidades educacionais que promovem. Uma vez mais, a análise dos conteúdos da aprendizagem deve nos permitir chegar a conclusões sobre a função social do ensino que a escola tem e sobre a capacidade de incidência formativa que estas atividades têm.

Tipo de gestão da escola

A estrutura e a organização da escola como grupo se define pelo tipo de organograma da escola e, portanto, pelo grau de envolvimento e atribuição de responsabilidades dos professores e dos próprios alunos. O funcionamento está determinado pelo regimento da escola, que define os papéis dos diferentes segmentos que compõem a comunidade escolar.

A distribuição de papéis e de responsabilidade que ocorre na escola pode ser resultado de uma análise exclusivamente pragmática, efetuada unicamente com critérios relativos às necessidades de dinamização, organização e desenvolvimento das diferentes tarefas de uma instituição com funções complexas. Ou, pelo contrário, pode responder a uma concepção que tem presente que a própria, estrutura organizativa e as relações que define se convertem em instrumentos educativos de primeira ordem ao oferecer imagens, e sobretudo vivências, que marcam a maneira de entender o que são ou o que têm que ser as organizações sociais e a forma como se distribuem os deveres e os direitos de cada um de seus membros. Este funcionamento também define determinadas relações interpessoais, uma maneira de conceber as relações de trabalho, que podem ser de ajuda, de colaboração, de confiança ou exatamente o contrário. Uma gestão mais ou menos colegiada ou compartilhada, monitorias coordenadas ou não, certas decisões em equipe ou individuais, etc., vão incidindo de maneira imperceptível, mas profunda, no pensamento e nos valores dos alunos.

O diferente grau de participação na gestão

Se a estrutura organizativa é central no oferecimento de pautas e modelos de gestão e atribuição de responsabilidades, o grau e a maneira em que os diferentes segmentos da comunidade escolar participam nas decisões da escola são igualmente básicos na formação dos alunos. E especialmente importante o papel que os meninos e meninas devem desempenhar na definição das normas ou regras de convivência da escola.

Toda escola é regida por determinadas normas que permitem, o funcionamento da coletividade. A disciplina necessária, o respeito mútuo e as relações de convivência devem, ser garantidas por normas que regulem as atuações de todos os membros. As diferenças entre escolas não apenas afetam os diversos tipos de normas, como também afetam quem as promove ou estabelece, quem vela por seu cumprimento e quem julga a validade de sua aplicação. Assim, de certo modo, aplicando a distribuição de poderes de Montesquieu, poderíamos nos perguntar: quem ostenta o poder legislativo, o executivo e o judiciário na escola? Certamente encontraremos diferentes graus de participação dos alunos nestes "poderes", mas, dada a tradição escolar, é lógico que na maioria dos casos serão os professores ou a equipe diretiva que utilizarão a capacidade de legislar, executar e julgar na escola.

Chegando a este ponto, podemos fazer uma avaliação educativa das normas que regulam o funcionamento cotidiano da escola e de como são postas em prática. Em muitas escolas já é habitual encontrar declarações de princípios que consideram como função básica a formação de cidadãos democráticos capazes de atuar com autonomia e responsabilidade. Portanto, se trata de escolas que têm considerado como conteúdos de aprendizagem os valores e as atitudes democráticas, o espírito crítico, a responsabilidade pessoal, a aceitação das opiniões dos demais, a autonomia de pensamento e outros conteúdos de caráter atitudinal. Como já vimos no segundo capítulo, a forma de aprender estes conteúdos comporta um trabalho na escola que consiste fundamental mente na realização de experiências que nunca são pontuais e episódicas, mas atividades continuadas, centradas em modelos em que se vivem estes valores e estas atitudes. Nestes casos, as recomendações ou imposições praticamente são inúteis. Por outro lado, é necessário que os meninos e meninas convivam num. ambiente em que aqueles valores impregnem todas as atuações. Dificilmente um aluno ou uma aluna pode ser responsável e aceitar as ideias dos outros se não se exercitou em modelos que lhe obriguem a atuar sob estes princípios. Para ser coerente com objetivos desta magnitude é necessário que as decisões que são tomadas na escola, as normas de convivência que a regem e, sobretudo, a maneira de estabelecê-las e administrá-las estejam em consonância com as finalidades educacionais a que se propõem. Não há dúvida de que são o instrumento mais poderoso que temos em nossas mãos para formar os meninos e meninas nestes valores. Se a opção da escola é a formação integral da pessoa e um dos objetivos é a educação nestes valores democráticos, haverá que incluir instâncias e processos que permitam que o aluno conheça progressivamente as regras do jogo de uma sociedade democrática e, especialmente, que saiba atuar e defendê-la. O julgamento e a revisão das normas da escola, as eleições de representantes, as assembleias de alunos ou da escola, se convém, e, finalmente, todas aquelas formas que permitem que os meninos e meninas aprendam a participar responsavelmente numa coletividade são os meios educativos que possibilitam a formação nesta faceta capital da personalidade.

Longe de se configurar como um elemento estritamente estrutural, o âmbito escola ou grupo/escola, sua gestão e a possibilidade que oferece a seus membros de participar responsavelmente surgem como o marco formativo que irá concretizar-se depois no âmbito mais restrito do grupo/classe, que será objeto de nossa atenção a seguir.

Distribuição da escola em grupos/classe fixos

Esta é a maneira convencional de organizar os grupos de alunos nas escolas. Trata-se de agrupamentos de 20 a 40 (ou inclusive mais) meninos e meninas de idade similar, que durante um ou mais anos trabalham as mesmas áreas ou matérias e terão os mesmos professores.

O fato de que seja a fórmula mais corrente para agrupar os alunos criou uma tradição, um conhecimento e certas habilidades que dificultam a aceitação de fórmulas de organização radicalmente diferentes. No entanto, é preciso analisar as vantagens e os inconvenientes para poder aproveitar os pontos positivos e resolver as deficiências que apresenta. Antes de mais nada, gostaria de considerar a opção de homogeneidade ou não destes grupos.

Nas escolas que têm que formar mais de um grupo/classe por série, devido ao elevado número de alunos, uma das dúvidas mais frequentes que se coloca é a conveniência ou não de agrupá-los conforme os níveis de desenvolvimento ou de conhecimentos, ou fazê-lo heterogeneamente. Se nossa finalidade se limita à realização de determinadas capacidades de caráter cognitivo e se consideramos que a função do ensino é seletiva, a distribuição por grupos/classe homogêneos favorecerá a tarefa do ensino, posto que não haverá tantas diferenças entre os alunos. Agora, inclusive neste caso, o conhecimento que temos dos processos de ensino/ aprendizagem nos obriga a avaliar uma série de condições que não se dão da mesma maneira nos grupos homogêneos, por exemplo, a aprendizagem entre iguais, o contraste, entre modelos diferentes de pensar e atuar e o surgimento de conflitos cognitivos, a possibilidade de receber ajuda de colegas que sabem mais, etc. Todos estes fatores nos levam a considerar a conveniência de que os grupos/classe fixos tenham que ser heterogêneos.......

No caso de que a opção escolhida seja a formação integral e que se centre tanto nas capacidades cognitivas como nas capacidades de equilíbrio pessoal, de relação interpessoal e de inserção social, as formas de agrupamento que não se baseiam na diversidade são improcedentes. Embora os conflitos aumentem devido à existência de níveis, culturas e interesses diferentes, sabemos que as aprendizagens são possíveis precisamente graças a estes conflitos. Para que os meninos e meninas possam reconhecer suas possibilidades e limitações, saibam aceitar-se, possam, entender e respeitar a diferença, possam satisfazer as diferentes- necessidades pessoais, sejam capazes de relacionar-se com os demais e ajudá-los, etc., deverão ter vivido situações, problemas e conflitos que tenham podido aprender a resolver com ajuda da professora ou do professor e dos outros companheiros e companheiras.

Aceitando a conveniência da heterogeneidade do grupo/classe fixo, revisaremos a seguir as vantagens e os inconvenientes que oferece. Independentemente das razões de facilidade organizativa, o motivo primordial que o justifica é o fato de oferecer aos meninos e meninas um grupo de colegas estável, favorecedor das relações interpessoais e da segurança afetiva. As outras vantagens estão relacionadas com o fato de que é a forma em que usualmente se têm organizado as escolas, de tal maneira que o maior número de propostas, materiais e recursos didáticos, assim como de estudos realizados, parte do pressuposto do grupo/classe fixo. Ao mesmo tempo, é uma organização adequada à estrutura espacial das escolas, entendida pelas famílias e pelo resto da coletividade, e baseada em certas tradições consolidadas de gestão da distribuição do trabalho docente.

Os inconvenientes dos grupos/classe fixos estão condicionados pela rigidez que lhes é atribuída, já que correm o risco de fechar-se em si mesmos. Por outro lado, embora se tenha buscado a heterogeneidade, se os alunos têm a mesma idade ainda são muito iguais e isso envolve o perigo de que os processos sejam analisados em relação a um grupo típico (3º do ensino fundamental, 2º do médio...) e no referencial temporal de uma série. Estes perigos e riscos podem ser neutralizados, ao menos em parte, com uma organização por ciclos de mais de uma série. Isto permite criar equipes de professores de ciclo com proposições mais amplas e globais do desenvolvimento dos alunos, ao mesmo tempo que se facilita a realização de atividades que rompam a rigidez do grupo/ classe/série.

Distribuição da escola em grupos/classe móveis ou. flexíveis

Entendemos por grupo/classe móvel o agrupamento em que os componentes do grupo/classe são diferentes conforme as atividades, áreas ou matérias e que pode chegar a ter professores diferentes para cada aluno.

Esta configuração é bastante habitual em escolas que trabalham mediante créditos com conteúdos ou matérias opcionais. Segundo este sistema, cada aluno pertence a tantos grupos quantas matérias ou atividades diferentes configurem seu percurso ou itinerário escolar. Também é habitual nas escolas que trabalham com oficinas abertas a todo um ciclo ou uma etapa, embora neste caso a estrutura básica continue sendo o grupo/classe e, em alguns momentos determinados, os meninos e meninas vão a oficinas diferentes. Portanto, trata-se de oficinas em que encontramos alunos de diferentes idades e que pertencem a diversos grupos/classe.

A razão fundamental que deu origem a esta forma organizativa foi a preocupação em atender aos diferentes interesses e capacidades dos meninos e meninas. E atendê-los fundamentalmente por dois motivos: num caso, quando favorece que cada aluno possa construir um itinerário escolar o mais personalizado possível, ao poder optar por matérias diferentes conforme seus interesses; e em outro, quando a distribuição é dada pelo grau de conhecimentos, de tal modo que, diante de um mesmo itinerário para todos, a designação para um grupo ou para outro é consequência do nível de competência pessoal. Assim, um aluno pode estar no grupo 6 de matemática, no 8 de língua e no 3 de ciências, enquanto que outro assiste ao grupo 7 de matemática, 6 de língua e 8 de ciências. Evidentemente, também pode se dar a combinação de ambos os casos.

Assim, pois, podemos observar que as vantagens manifestas são, por um lado, esta capacidade de ampliar a resposta à diversidade de interesses e competências dos alunos e, por outro, que em cada grupo existe uma homogeneidade que favorece a tarefa dos professores devido ao fato de poder garantir determinados níveis e determinados interesses similares. Quando os alunos podem participar na construção de seu percurso escolar, além de garantir uma melhor predisposição para a aprendizagem, se dá chance para que eles assumam um conhecimento mais profundo de seu processo educacional e um maior grau de responsabilização. Em ambos os casos, a flexibilidade na constituição dos grupos faz com que dificilmente se produza um desfecho negativo.

Uma distribuição grupai deste tipo comporta uma primeira dificuldade, determinada pela complexidade organizativa, mas que deve ser superada se nos detemos nas vantagens que supõe. Também há dois inconvenientes que é preciso solucionar. Um deles é a necessidade de garantir que cada aluno tenha acesso a um grupo de convivência estável. O outro, consequência dos agrupamentos por níveis de competência, é o perigo que já destacamos ao falar dos grupos homogêneos.

Até agora falamos das características dos diferentes agrupamentos no âmbito da escola. Mas avançar na compreensão da organização social da aula requer falar das diferentes formas de organizar as atividades na aula. Isto é o que faremos a seguir.

Organização da classe em grande grupo

Historicamente, esta é a forma mais habitual de organizar as atividades de aula. Nestas atividades todo o grupo faz o mesmo ao mesmo tempo, seja escutar, tomar nota, realizar provas, fazer exercícios, debates, etc. Os professores ou os alunos se dirigem ao grupo em geral, através de exposições, demonstrações, modelos, etc., introduzindo, evidentemente, ações de atendimento a meninos e meninas individualmente.

Esta fórmula é a mais simples e, como já apontamos, a que goza de mais tradição. Questionada pelas concepções progressistas por ter sido a forma exclusiva de agrupamentos de aula, num modelo de escola que considera todos os alunos como iguais e, em todo caso, no qual "sobram" as diferenças. Modelo que corresponde a um ensino de conteúdos fundamentalmente conceituais e ensinados como se se aceitasse que são aprendidos através da memorização mecânica. Esta herança tem feito com que, seguidamente, as desqualificações sejam genéricas, como se fosse uma forma de organização negativa em si mesma.

O problema surge quando se considera que é a única organização possível, de maneira que, independentemente do conteúdo a ser trabalhado, a forma de agrupamento dos alunos sempre é a mesma.

Vejamos a utilidade desta forma de agrupamento. Faremos uma análise segundo os diferentes tipos de conteúdo a serem ensinados e levaremos em conta, em todo momento, os condicionantes determinados pela necessidade de atender à diversidade dos alunos.

Quando é preciso ensinar conteúdos factuais a exposição deve ser clara, o número de alunos e a forma de organizá-los pode ser bastante simples: desde que o número de alunos não seja excessivo para permitir que o professor ou a professora mantenha o atendimento aos alunos, o grande grupo será a forma mais apropriada para desenvolver esta atividade. Se for conveniente, as recomendações sugeridas a cada aluno quanto ao trabalho individual poderiam ser feitas de forma pessoal. Portanto, o grande grupo é uma forma de organização apropriada quando os conteúdos a serem ensinados são factuais, sempre que a idade do aluno lhe permita seguir um plano de memorização de forma autônoma.

Começamos a detectar as limitações da organização.; em grupo quando os conteúdos a serem ensinados são conceituais. Em primeiro lugar, devido ao número de alunos, já que se o grupo é muito numeroso dificilmente poderemos estabelecer as inter-relações necessárias para conhecer o processo de aprendizagem que cada aluno segue. Em segundo lugar, realmente teremos poucas oportunidades de conhecer o processo de elaboração e compreensão de cada aluno se todo o grupo tem que estar sujeito aos diálogos individuais entre professor e aluno. Certamente este trabalho será mais fácil se dividimos o grande grupo em pequenos grupos, cada um deles com trabalhos específicos, para que seja possível circular pelos diferentes núcleos e oferecer a ajuda necessária a cada menino ou menina.

Assim., pois, podemos chegar à conclusão de que uma organização em grande grupo coloca muitos problemas para o ensino dos conceitos se não se introduzem medidas que permitam conhecer o grau e o tipo de processo que está seguindo cada aluno na construção do significado, a fim de que se possa prestar a ajuda que cada aluno precisa. Quanto mais complexo for o conteúdo a ser aprendido e mais jovens forem os alunos, mais dificuldades teremos para atender à diversidade numa estrutura de grande grupo.

Quanto aos conteúdos procedimentais, a estrutura de grande grupo servirá para dar a conhecer a utilidade do procedimento, técnica ou estratégia. Também, poderão se explicar e mostrar as diferentes fases ou os passos que o compõem. E tudo isto com certas garantias de que estamos conseguindo dar conta das diversas formas de aprender dos alunos. Por outro lado, será muito difícil poder propor as atividades de aplicação e exercitação suficientes e necessárias para cada aluno, que representem um desafio pessoal e nas quais se possa prestar a ajuda de que cada um necessita.

Pudemos observar que os conteúdos atitudinais têm a dificuldade de que sua aprendizagem não pode se realizar com poucas atividades. O componente cognitivo destes conteúdos exige um trabalho de compreensão do que representam. Portanto, as atividades que este processo envolve podem ser feitas em grande grupo. Mas os componentes afetivos e comportamentais dos conteúdos atitudinais exigem atividades que impliquem colocar os alunos diante de conflitos ou situações problemáticas que terão que resolver. Situações que dificilmente podem se realizar em grande grupo, excetuando a assembleia.

A assembleia de alunos atua como instrumento de gestão e administração das regras de jogo do grupo, através dos debates, das propostas ou exposições, das revisões das normas de atuação e comportamento; como regulador das relações pessoais e como meio para manter a convivência. E o instrumento mais valioso de que dispomos para promover e potencializar muitos dos valores e das atitudes que consideramos, conteúdos de aprendizagem. As normas que forem estabelecidas e os meios que forem utilizados para assegurar seu cumprimento, assim como a maneira de desenvolver a assembleia, o papel que se outorgue aos alunos, seu grau de responsabilidade e a distribuição de cargos darão a base para a reflexão sobre os atos e os comportamentos elos alunos e sobre os valores que os presidem. Mas se, ao mesmo tempo, não se criam situações que possibilitem a atuação mais ou menos desinibida dos alunos, dificilmente poderão apresentar-se as condições para que se vejam obrigados a escolher entre diferentes formas de comportamento.

Os tipos de atividades que podem ser realizados em grande grupo e que são fatores de conflito, sem deixarem de ser suficientemente controláveis pelo professor, são limitados. Este inconveniente faz com que muitos dos desejos de formação fiquem relegados a um segundo plano, ou esquecidos, se não se dispõe de outras formas organizativas, já que a necessidade de manter a ordem num grupo obriga a tomar medidas de controle que seguidamente entram em choque com as finalidades educacionais estabelecidas. O controle da organização de um grupo sem a existência de outras formas de organização, como as equipes fixas, obriga a que as relações sejam mais rígidas e muitas vezes autoritárias. Deste modo, se potencializam determinadas atitudes. Se são as atitudes desejadas, perfeito: a forma de agrupamento é a correta. Mas não poderemos dizer o mesmo se nossas intenções educacionais são outras.

De acordo com a revisão que realizamos do grande grupo, a respeito dos diferentes tipos de conteúdo, podemos concluir que se trata de uma forma organizativa apropriada para o ensino de fatos, que no caso dos conceitos e princípios aparecem muitos problemas para que se possa conhecer o verdadeiro grau de compreensão de cada menino e menina, que nos conteúdos procedimentais é impossível atender à diversidade no ritmo de aprendizagem e estabelecer as ajudas pertinentes e que no caso dos conteúdos atitudinais o grande grupo é especialmente adequado para a assembleia, mas é insuficiente.

Organização da classe em equipes fixas

A forma habitual de organização da classe em equipes fixas consiste em distribuir os meninos e meninas em grupos de 5 a 8 alunos, durante um período de tempo que oscila entre um trimestre e todo um ano, e nos quais cada um dos componentes desempenha determinados cargos e determinadas funções. As diferenças no número de componentes, a duração e o tipo de cargos e funções estão determinadas pela idade dos alunos. Assim, as equipes são mais reduzidas e sua duração é mais curta na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental do que no ensino médio, e os cargos e as funções estão relacionados com a capacidade de atuação autônoma dos meninos e meninas.

As funções fundamentais das equipes fixas são duas. A primeira é organizativa e deve favorecer as funções de controle e gestão da classe. A segunda é de convivência/ já que proporciona aos alunos um grupo afetivamente mais acessível.

A função organizativa se resolve atribuindo a cada equipe, e dentro desta a cada aluno, certas tarefas determinadas, que vão desde a distribuição do espaço e da administração dos recursos da aula até a responsabilidade pelo controle e pelo acompanhamento do trabalho de cada um dos membros da equipe em cada uma das áreas. Assim, em cada um dos grupos podemos encontrar uma distribuição de cargos: coordenador da equipe, secretário, responsável pela manutenção, etc., e, por outro lado, as responsabilidades de cada um deles relacionadas com o processo mais acadêmico: responsável pela matemática, língua, etc., com funções de acompanhamento e auto-avaliação do grupo. Deste modo, cada um dos

membros da equipe pode ter um cargo organizativo (secretário, coordenador...) e outro de responsável por uma área. Tal como apontamos anteriormente, as funções dos cargos e dos responsáveis estão determinadas pela idade dos alunos.

A outra razão que justifica os grupos fixos é que oferecem aos alunos um grupo que, por suas dimensões, permite as relações pessoais e a integração de todos os meninos e meninas. O objetivo consiste em formar grupos em. que possam, se estabelecer relações de amizade e colaboração, assim como de aceitação das diferenças. Com esta intenção, a constituição dos grupos leva em conta a diversidade de seus membros. Para alcançar estes objetivos se propõem atividades que não se reduzem às estritamente disciplinares, como por exemplo, saídas, passeios, etc.

A análise desta forma de agrupamento está relacionada com as duas funções expostas. A mais clara é a organizativa. A organização da classe em equipes fixas resolve muitos dos problemas de gestão e controle da classe. Ter uma estrutura socialmente complexa permite a co-responsabilização dos grupos em muitas das tarefas de organização da classe, liberando os professores, em grande parte, de um trabalho que consome muito tempo e costuma ser pouco "produtivo". Ocorre o paradoxo de que é fácil encontrar esta forma organizativa em aulas de educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, onde não há excessivos problemas de disciplina, enquanto que naqueles níveis em que as características da pré-adolescência com frequência ocasionam problemas de convivência, os professores se encontram seguidamente órfãos de instrumentos que lhes ajudem a resolvê-los.

Mas ao mesmo tempo, uma organização deste tipo oferece uma grande quantidade de oportunidades para que os meninos e meninas assumam cada vez mais responsabilidades para com os outros, aprendam a se comprometer, a avaliar seu trabalho e o dos demais, a oferecer ajudas... É aqui também que há relação com a função de convivência, já que dá chance para que se estabeleçam vínculos afetivos, de ajuda, de; companheirismo e de aceitação dos outros e de suas diferenças.

Portanto, independentemente de sua capacidade organizativa, as equipes fixas só têm sentido se a escola traçou como objetivos prioritários o desenvolvimento das capacidades de equilíbrio e autonomia pessoal, de relação interpessoal e de inserção social e, portanto, os conteúdos atitudinais que decorrem disso. Se estes são os objetivos, dificilmente serão alcançados se a escola não se dotar de instrumentos organizativos que, como as equipes fixas, os tornam possíveis.

Estes mesmos argumentos podem nos servir para julgar a conveniência de que os grupos fixos sejam homogêneos ou heterogêneos. A resposta está condicionada pelos objetivos educacionais estabelecidos. A homogeneidade de sexo, atitudes, capacidades ou interesses aparentemente favorece a gestão dos grupos, já que reduz os problemas de convivência. Problemas e conflitos que, como já sabemos, são as oportunidades formativas de que dispomos para conseguir a aprendizagem de determinados conteúdos atitudinais. Desde uma perspectiva que promova a colaboração e o respeito pela diferença, os grupos fixos sempre deverão ser heterogêneos.

Por outro lado, é bastante frequente encontrar opiniões contrárias às equipes fixas, justificadas pela possibilidade de que os grupos se fechem, que surjam lideranças fortes ou despóticas, que apareça uma rejeição a um determinado menino ou menina, sem levar em conta que precisa­mente estas situações são as que permitem a intervenção educacional. Prescindir deste instrumento educativo pode ser uma forma de esconder a realidade da aula e desperdiçar a possibilidade de fazer intervenções que ajudem os grupos fechados a se abrirem, a reconduzir as atitudes despóticas dos líderes, a integrar os que foram rejeitados.

Em resumo, as equipes fixas oferecem numerosas oportunidades para trabalhar importantes conteúdos atitudinais. Sua estrutura também é apropriada para a criação de situações que promovam o debate e os correspondentes conflitos cognitivos e pela possibilidade de receber e dar ajuda, o que facilita a compreensão dos conceitos e procedimentos complexos. Comprometem os alunos na gestão e no controle da aula e constituem um bom instrumento para promover a cooperação e a solidariedade, valores que, embora sempre tenham sido fundamentais para a formação das pessoas, agora, numa escola cada vez mais aberta à diversidade (de culturas, de competências...), se erigem em instrumentos básicos de convivência e progresso.

Organização da ciasse em equipes móveis ou flexíveis

O termo equipe móvel ou grupo flexível implica o conjunto de dois ou mais alunos com a finalidade de desenvolver uma tarefa determinada. A duração destes agrupamentos se limita ao período de tempo de realização da tarefa em questão. Podem ser alguns breves momentos ou todo um trimestre. Sua vida se limita à tarefa e, portanto, numa organização de conteúdos por áreas ou matérias, não existe continuidade das equipes. A estrutura interna destas equipes está condicionada pelo trabalho a ser realizado e pela necessidade de formarem determinadas atitudes. As diferenças fundamentais com as equipes fixas são a variabilidade no número de integrantes e a permanência ou vida do grupo para além da atividade concreta.

Os motivos que justificam os grupos móveis são diversos, embora o principal seja a necessidade de atender às características diferenciais da aprendizagem dos meninos e meninas. Posto que esta estrutura permite distribuir trabalhos em pequenos grupos, é possível que os professores atendam àqueles grupos ou alunos que mais o necessitem, que distingam as tarefas a serem realizadas conforme possibilidades ou interesses, ou que exijam diferentes níveis de elaboração. Trabalhos que sempre devem estar bem definidos, para que os grupos possam trabalhar autonomamente e seja possível favorecer a atenção personalizada por parte dos professores. E o caso dos "cantos" na educação infantil ou das oficinas ou dos trabalhos de pesquisa em níveis superiores, em que os passos a serem seguidos e as técnicas a serem aplicadas são bastante conhecidos pelos alunos e, portanto, a intervenção dos professores está mais em oportunizar desafios e ajudas a cada aluno em particular, sem interromper o trabalho do resto do grupo.

Há outras razões comuns às equipes móveis e aos grupos fixos, que decorrem das possibilidades que a aprendizagem entre iguais oferece. Numa estrutura de tais características surgem muitas situações em que é possível que os próprios meninos c meninas se ajudem entre si. Ensinar modelos, novas explicações, ou interpretações mais próximas dos pontos de vista dos alunos faz com que nesta estrutura possam se beneficiar tanto da comparação entre perspectivas diferentes como da possibilidade de dar e receber ajuda entre colegas.

Outro dos motivos é determinado pelos próprios objetivos educacionais, quando se considera conteúdo de aprendizagem saber trabalhar em equipe e tudo o que isso envolve, tanto nos aspectos operativos de distribuição de trabalho como nos mais atitudinais de relação colaboração entre colegas; ou no caso da aprendizagem das línguas, concretamente da conversação e do diálogo; ou quando a autonomia e a co-responsabilidade são consideradas conteúdos de aprendizagem; etc.

Quanto à homogeneidade ou não das equipes móveis, é preciso realizar as mesmas considerações que se mencionaram até agora em relação ao grupo/classe ou às equipes fixas. No entanto, neste caso, devemos levar em conta que, posto que são agrupamentos limitados a algumas atividades concretas e a um período de tempo curto, e, portanto, não são estáveis, os inconvenientes das equipes homogêneas, numa opção educativa de formação integral, podem ser relativizados. Caso se tenha a precaução de variar a configuração e o grau de homogeneidade dos grupos, conseguiremos, por um lado, aproveitar as vantagens que oferece o fato de poder trabalhar em alguns momentos com grupos de alunos de características similares - sexo, nível, interesses, etc. - e as vantagens educativas da diversidade. Deste modo, as equipes móveis algumas vezes poderão ser homogêneas e outras heterogêneas, segundo as intenções educacionais ou a situação do grupo e seus interesses.

Levando em conta as características e o funcionamento das equipes móveis, podemos observar que são especialmente adequadas, quando não imprescindíveis, para o trabalho de conteúdos procedimentais - portanto, nas áreas em que os componentes procedimentais são básicos, como as de língua, matemática, artes, etc. -, dada a necessidade de se adaptar às diferentes capacidades, ritmos, estilos e interesses de cada aluno. Para a aprendizagem dos conteúdos procedimentais é imprescindível realizar múltiplas atividades de aplicação e exercitação, convenientemente sequenciadas e progressivas. Neste caso, uma estrutura de classe limitada ao grande grupo obrigará a estabelecer uma sequência idêntica para todos, com as dificuldades para atender aos diferentes estilos e ritmos de aprendizagem que isso supõe. De outro modo, uma distribuição em equipes favorece a definição de propostas educativas que levam em conta a diversidade dos alunos. Também será extremamente apropriada para o trabalho dos conteúdos atitudinais no âmbito das relações interpessoais.

Trabalho individual

Consiste nas atividades que cada menino ou menina realiza por si só e é a forma de trabalho que a maioria de sequências de ensino/aprendizagem propõe num ou noutro momento. Seja qual for a corrente pedagógica, nas propostas educativas sempre esteve presente o trabalho individual. E é lógico que seja assim, porque a aprendizagem, por mais que se apoie num processo interpessoal e compartilhado, é sempre, em última instância, uma apropriação pessoal, uma questão individual. As diferenças são encontradas no papel que se atribui a este trabalho, no momento em que ele é realizado, nos tipos de conteúdos que se trabalham e em seu grau de adaptação às características pessoais de cada aluno.

É impossível fazer uma análise isolada do trabalho individual, já que seu valor varia enormemente conforme seja realizado. Se não fosse assim, poderíamos dizer que é imprescindível, e pouco mais. Vejamos em que condições se aplica esta forma de trabalho e que conteúdos são trabalhados para fazer uma avaliação.

Começaremos com um modelo expositivo e posteriormente introduziremos diferentes atividades conforme os conteúdos que forem trabalhados. Numa sequência de ensino/aprendizagem tópica, de exposição- memorização-exame, o trabalho individual é realizado na fase de memorização e exame. Nesta sequência, evidentemente esquemática, a fase expositiva ocorre em grande grupo; a memorização é uma tarefa individual que cada menino ou menina realiza em aula, ou em casa, nas séries mais avançadas e, finalmente, o exame é um trabalho individual que se realiza em grande grupo. Neste modelo, é um tipo de trabalho que não permite a interação professor/aluno, além da devolução do exame com a nota correspondente. Se analisamos este processo desde a perspectiva dos tipos de conteúdos que podem ser trabalhados, observaremos que quando os conteúdos são de caráter factual, as atividades de aprendizagem que consistem em exercícios que ajudam a memorizar - fundamentalmente atividades de repetição verbal - são bastante simples e cada aluno as pode realizar sem mais ajuda do que a motivação para fazê-las. Posto que as diferenças de aprendizagem entre os alunos se centram, a grosso modo, no tempo que cada ura tem que dedicar ao estudo, e posto que é um fator que só depende dos próprios alunos, podem fazê-lo sozinhos com bastante chance de êxito. Um resultado negativo na prova não implicará repetir todo o processo de ensino/ aprendizagem, mas unicamente exigirá que o aluno por si só lhe dedique o tempo de que realmente necessite.

Por outro lado, não podemos dizer o mesmo no caso dos conceitos e dos princípios. Para poder adaptar o processo de ensino às características singulares da aprendizagem de cada um dos meninos e meninas, será necessário introduzir mudanças qualitativas na forma de realizar este trabalho individual. Neste caso, não podemos deixar o aluno sozinho na fase de estudo, já que se não entendeu o conceito - durante a exposição, com os diálogos e as perguntas que se introduziram, nos debates ou nos trabalhos em grupos reduzidos -, dificilmente poderá resolver as dificuldades de compreensão por si só. De outro modo, o trabalho individual será eficaz quando, uma vez compreendido o conceito, realize as atividades e exercícios que lhe permitirão ampliar, detalhar, recordar e eventualmente reforçar o que já tinha compreendido. As diferenças entre os alunos serão solucionadas com o tempo que cada um deles terá que dedicar a cada uma destas finalidades.

Quando os conteúdos a serem aprendidos forem de caráter procedimental, a necessidade de oferecer atividades de aplicação e exercitação para cada aluno, adaptadas a seu nível de domínio e dentro de um conjunto progressivo, obriga a introduzir em todas as unidades didáticas momentos em que se levam a cabo estas tarefas de exercitação personalizada. A dificuldade consistirá em oferecer os desafios e ajudas adequados às características de cada um dos alunos, mas na maioria dos casos o trabalho será individual. O problema a ser resolvido se encontra nos meios para poder orientar o processo de cada menino e menina no domínio progressivo da técnica, do procedimento ou da estratégia.

Quanto à aprendizagem dos conteúdos atitudinais, a necessidade de propor atividades vivenciais que impliquem a resolução de conflitos de atuação e tomada de posições faz com que o trabalho individual só seja adequado na análise e na avaliação de casos, nos aspectos mais conceituais dos valores e, sem dúvida, em todos aqueles relacionados com o estudo individual: dedicação, autonomia, interesses, responsabilidade, atenção, etc.

Assim, pois, vemos que o trabalho individual é especialmente útil para a memorização de fatos, para o aprofundamento e a memorização posterior de conceitos e, especial mente, para a maioria dos conteúdos procedimentais em que se deve adaptar o ritmo e a proposição das atividades às características de cada menino ou menina. Ao mesmo tempo, podemos comprovar a complexidade da tarefa educacional pelo fato de ter que acompanhar as diferentes trajetórias neste trabalho individual. Como podem se propor a cada aluno atividades de aprendizagem específicas, quando há mais de trinta alunos numa classe? Os diferentes métodos de ensino foram buscar fórmulas que favorecessem o andamento de todos os alunos. Fórmulas, técnicas e instrumentos que em muitos casos se converteram no "método" que serve para qualquer coisa. Por tudo quando vimos até agora, a atenção à diversidade envolve formas de ensinar notavelmente complexas porque têm que responder a muitas variáveis que estão estreitamente inter-relacionadas. Tudo isso leva a que nos demos conta, cada vez mais, da necessidade de utilizar formas de intervenção extremamente flexíveis, que integrem todos aqueles meios que potencialmente ajudam a aprender. Um destes meios, especialmente útil no andamento do trabalho individual, é o denominado por Freinet de "contrato de trabalho". Dado o interesse que tem, vamos descrevê-lo rapidamente.

Os contratos de trabalho

A função básica dos contratos de trabalho consiste em facilitar a tarefa dos professores ao propor a cada aluno as atividades de aprendizagem apropriadas a suas possibilidades e a seus interesses. Recebe o nome de contrato porque cada aluno estabelece um acordo com o professor sobre as atividades que deve realizar durante um período de tempo determinado, geralmente uma ou duas semanas. Para poder levar a cabo o controle destes acordos e de seu cumprimento, cada menino e menina dispõe de uma agenda - em educação infantil costuma ser um mural - onde constam os compromissos assumidos para o espaço de tempo em questão. A cada semana, ou a cada quinze dias, ocorre uma reunião entre o professor e o aluno, com uma dupla função: revisar o trabalho feito e combinar a nova tarefa para o período seguinte. Dada a dificuldade que representa fazer uma proposta específica para cada aluno, é imprescindível contar com materiais preparados previamente que contemplem atividades claramente sequenciadas e progressivas, como por exemplo as fichas de trabalho de Freinet, as fichas ordenadas de leituras, os cadernos de cálculo ou ortografia, as fichas de interpretação e confecção de planos e mapas, as atividades de pesquisa, de elaboração tecnológica, de práticas de laboratório, etc., sempre que, como já apontamos, estejam convenientemente ordenadas. Assim, pois, o trabalho do professor está centrado em determinar quantas atividadesdevem se fazer em cada uma das sequências ou o grau de aprofundamento que deve se conseguir num determinado período.

Se uma das tarefas mais pesadas dos professores é a correção das produções dos alunos quando estas são iguais para todos, num modelo de contratos o será mais ainda. Para solucionar este inconveniente é interessante, sempre que seja possível, que as atividades sejam autocorretivas ou que se introduzam fórmulas de correção compartilhada.

Voltando às ideias expostas anteriormente, cabe dizer que esta forma de dar resposta ao andamento do trabalho individual é interessante só para aqueles conteúdos que permitem estabelecer uma sequência mais ou menos ordenada. Como vimos, trata-se dos conteúdos adequados para o trabalho individual, quer dizer, de alguns conteúdos factuais e principalmente muitos conteúdos procedimentais. Conteúdos que representam porcentagens muito elevadas do trabalho cotidiano, especialmente em algumas áreas.

Com os contratos de trabalho, ao mesmo tempo que se contribui para o desenvolvimento destes conteúdos, se promove a aprendizagem de conteúdos atitudinais como a autonomia, o compromisso ou a responsabilidade. E, sobretudo, se faz o aluno participar nos objetivos educacionais que são propostos, porque ele se vê obrigado a ter uma visão global, não apenas dos conteúdos a serem trabalhados, como também de seu próprio processo de aprendizagem.

Sem um meio como o contrato de trabalho e sem materiais com propostas de atividades sequenciadas de forma progressiva, dificilmente pode ser solucionado o problema que envolve o atendimento aos diferentes processos de aprendizagem que segue cada um dos meninos e meninas em determinados conteúdos.

DISTRIBUIÇÃO DO TEMPO E DO ESPAÇO

As formas de utilizar o espaço e o tempo são duas variáveis que, apesar de não serem as mais destacadas, têm uma influência crucial na determinação das diferentes formas de intervenção pedagógica. As características físicas da escola, das aulas, a distribuição dos alunos na classe e o uso flexível ou rígido dos horários são fatores que não apenas configuram e condicionam o ensino, como ao mesmo tempo transmitem e veiculam sensações de segurança e ordem, assim como manifestações marcadas por determinados valores: estéticos, de saúde, de gênero, etc. São muitas as horas que os alunos passam num espaço concreto e com um ritmo temporal que pode ser mais ou menos favorável para sua formação.

O papel do espaço

Como nas outras variáveis, a estrutura física das escolas, os espaços de que dispõem e como são utilizados correspondem a uma ideia muito clara do que deve ser o ensino. Logicamente, posto que os aspectos físicos são os que mais perduram no tempo, não são tanto uma consequência do que tem que ser ou é hoje em dia o ensino, mas o papel que se atribuiu a ele num momento determinado.

Se a utilização do espaço tem sido o resultado de uma maneira de entender o ensino, tanto em relação à função social como à compreensão dos processos de aprendizagem, certamente uma mudança nestes elementos levaria a uma reconsideração das características que deveriam ter de acordo com outras concepções do ensino.

A todos nós parece lógica a distribuição atual das escolas. Consideramos que tuna escola tem que ser um conjunto de unidades espaciais, as aulas, situadas uma junto à outra e unidas mediante corredores. Este conjunto pode variai' desde uma ou duas aulas nas escolas unidocentes até escolas que têm dezenas. Também o interior destas unidades espaciais apresenta uma distribuição bastante similar: um conjunto de cadeiras e mesas colocadas de duas em duas ou individualmente e alinhadas de frente para o quadro-negro e para a mesa do professor ou professora.

A pergunta que devemos nos fazer é se realmente esta é a fórmula mais adequada, a melhor, a única. E, sobretudo, temos que nos perguntar que critérios nos permitem justificá-la.

Se iniciamos de novo uma revisão histórica, veremos que esta configuração não é gratuita. Como pudemos observar, nossa tradição é herdada de um ensino centrado nos conteúdos factuais e conceituais, que tem girado em torno de modelos de comportamento inspirados em fórmulas disciplinares rígidas e uniformizadoras. O ensino dos conteúdos conceituais e factuais através de estratégias de reprodução comportava o uso de exposições gerais para todo um grupo de alunos que, em função das finalidades da educação, podia ser bastante numeroso, colocado de forma que os alunos pudessem receber facilmente as exposições e instruções do ensino. Ao mesmo tempo, esta disposição contribuía para manter a ordem. Trata-se de uma disposição espacial criada em função do protagonista da educação, o professorado, em que os meninos e meninas, como se estivessem num cinema ou num teatro, se situam de forma que possam ver e escutar quem representa uma fonte básica do saber. A opção propedêutica, mas basicamente a concepção transmissora e uniformizadora do ensino, comportava determinadas formas bem definidas e bastante eficazes se levamos em conta o que se pretendia.

Se nos perguntam qual é o número máximo de alunos que pode haver numa classe onde se tenham que explicar, por exemplo, os nomes dos rios da Europa, os códigos da língua, matemática, física ou química, as obras mais importantes do romantismo, etc., certamente responderemos que é limitado, sempre e quando se possa manter a ordem. E também diremos que a melhor maneira de situar estes alunos será a que lhes permita ver e escutar melhor o professor. Assim, pois, o espaço físico adequado será o que permita acomodar o número máximo de alunos que se estabeleceu, e a distribuição da aula mais apropriada será a que favoreça o controle dos professores. Para garantir que esta função de transmissão e controle seja mais eficaz só será necessário situar o professor num nível superior ao dos alunos mediante um tablado.

As razões de ordem, controle e eficácia, segundo uma concepção do ensino e da aprendizagem, determinaram os usos do espaço e, portanto, as características físicas da maioria das escolas.

A utilização do espaço começa a ser um tema problemático quando o protagonismo do ensino se desloca do professor para o aluno. O centro de atenção já não é o que há no quadro-negro, mas o que está acontecendo no campo dos alunos. Este simples deslocamento põe em. dúvida muitas das formas habituais de se relacionar em classe, mas questiona consideravelmente o cenário. O que interessa não é o que mostra o quadro, mas o que acontece no terreno das cadeiras e, mais concretamente, em cada uma das cadeiras.

Este deslocamento faz com que muitos dos elementos que configuram o meio físico do aluno adquiram uma grande importância. A necessidade de que o aluno viva num ambiente favorável para seu crescimento também inclui, e de maneira preferencial, o ambiente em que deve se desenvolver. O estado de ânimo, o interesse e a motivação receberão a influência do meio físico da escola. Criar um clima e um ambiente de convivência e estéticos, que favoreçam as aprendizagens, se converte numa necessidade da aprendizagem e, ao mesmo tempo, num objetivo do ensino. Ao mesmo tempo, as características dos conteúdos a serem trabalhados determinarão as necessidades espaciais.

A necessidade de elaboração pessoal do conhecimento acarreta, sobretudo para os alunos mais jovens, a necessidade de favorecer a atividade mental do aluno através de ações que não se limitem a escutar as exposições do professor ou da professora. A observação, o diálogo ou o debate, a manipulação e a experimentação são atividades imprescindíveis para favorecer os processos construtivos dos alunos, e para realizar estas atividades é preciso dispor de espaços que as facilitem. Neste momento nos vemos obrigados a reconsiderar a adaptação da distribuição convencional do espaço. Em atividades com estas características, o centro de atenção já não pode ser somente o que diz o professor, mas tem que se deslocar para o que os alunos fazem e, portanto, para as necessidades que estas tarefas comportam. Se as atividades selecionadas são debates, diálogos ou discussões em grupos reduzidos, bastará que a disposição da classe possa variar conforme as características da tarefa: distribuição em círculo ou semicírculo, por pequenos grupos ou por duplas. Por outro lado, se as atividades a serem realizadas se concretizam na manipulação, na experimentação, na observação ou na pesquisa bibliográfica, será necessário que a configuração da classe permita estas tarefas ou será imprescindível contar com outros espaços adequados fora da aula.

Quando nossa atenção se concentra no ensino dos conteúdos procedimentais, a necessidade de revisar o tratamento do espaço se multiplica, já que, como vimos, é necessária uma atenção às diferenças no tipo de ajuda e em relação à realização das diferentes atividades, estabelecendo desafios e apoios adequados às características diferenciais de cada menino ou menina. Isto implica a organização de agrupamentos de diferente natureza e, portanto, dispor de espaços que possibilitem o trabalho de cada um dos diferentes grupos. Pode se tratar de espaços fixos em classe, onde se encontrem os elementos e materiais que permitam realizar o trabalho correspondente ("cantos" e pequenas oficinas, bibliotecas da classe...), ou outros espaços adequados fora da aula e concebidos para realizar trabalhos deste tipo (auditórios, laboratório, biblioteca, horta escolar...). Conforme as etapas ou níveis, será necessário avaliar a possibilidade de que haja aulas de grupo/classe que convivam com aulas especializadas. Por outro lado, é preciso levar em conta as possibilidades de ampliar o espaço físico da escola, introduzindo como concepção espacial geral a utilização dos serviços que 3 a comunidade oferece: biblioteca pública, serviços municipais, associações, museus, etc. Quanto aos conteúdos atitudinais, excetuando-se o papel da assembleia e das necessidades de- espaço desta atividade, sua relação com a variável espaço está associada à série de manifestações que indiretamente constituem a maneira de entender os valores por parte da escola sobre determinados campos. Referimo-nos, por exemplo, aos espaços que são de todos ou os que estão destinados a coletivos determinados, e dentro deste último grupo aos que são de uso exclusivo dos professores; às diferenças de mobiliário dos setores e das salas de professores e de alunos; às características físicas e aos objetos diferenciados nos refeitórios ou nos banheiros; às diferenças relacionadas ao gênero nos banheiros e vestiários e ao uso do pátio. Trata-se de manifestações do sentido que têm para a escola as relações de hierarquia e_ poder e as: funções e papéis que se atribuem às pessoas, conforme o status social ou de gênero. São manifestações aparentemente sem importância, mas que formam de modo decisivo valores e atitudes determinadas.

É conveniente dedicar especial atenção às dimensões das escolas. As necessidades de uma escola seletiva e uniformiza dor a não têm nada que ver com as de outra cujo objetivo seja a formação integral das pessoas. Os prédios grandes, com centenas de alunos e dezenas de professores, são radicalmente contrários a propostas educativas encaminhadas para o desenvolvimento não apenas cognitivo dos meninos e meninas. É impossível promover determinadas atitudes ou estabelecer um bom clima afetivo se os meninos e meninas não podem se sentir membros, com personalidade própria, de uma comunidade, onde todos se conhecem, professores e alunos, com nomes e sobrenomes. Dificilmente podem se sentir seguros no anonimato que envolve conviver com centenas de desconhecidos. Daí que é muito difícil manter marcos coerentes de maneiras de viver, conforme os valores e as atitudes que se pretende promover, numa perspectiva personalizada e global. Dado que as construções já estão feitas, e evidentemente segundo outros modelos educativos, em muitos casos será necessário criar divisões e espaços que rompam com a grandiosidade dos prédios e viabilizem, ao máximo, formas de relações personalizadas. E, logicamente, será necessário ampliar este requisito às dimensões das equipes docentes. Será conveniente que ao estruturar e organizar as equipes docentes se leve em conta a necessidade de que os meninos e meninas possam conhecer todos os professores. A tradição seletiva e propedêutica, especialmente nas escolas do ensino médio, não tem que impedir a adaptação das estruturas físicas e organizativas às novas necessidades educativas postas por uma proposta integral.

Por outro lado, se a participação, a democratização, o serviço à comunidade, entre outros, são os valores que se querem promover entre os alunos, será necessário considerar que possibilidades existem de que outros grupos do bairro ou da cidade possam utilizar as instalações da escola. Independente dos motivos de racionalização e utilização das instalações escolares, determinados valores de inserção e atuação social só podem ser defendidos se se convertem em modelos de participação e compromisso real. A biblioteca, o auditório, o ginásio, os pátios e as aulas, em coerência com estes princípios, devem estar a serviço da comunidade a que pertencem, aceitando como fatores educativos todos os inconvenientes e conflitos que supõe uma proposta deste tipo.

A distribuição do tempo não é o menos importante

Numa perspectiva racional, a variável temporal seria resultado e consequência das decisões tomadas em relação às outras variáveis: a sequência didática, o tipo de atividade, a organização de conteúdos, etc. - para além da necessidade, sobretudo com os menores, de orientação no tempo e de segurança pessoal. O tempo teve, e ainda tem, um papel decisivo na configuração das propostas metodológicas.

Em geral o tempo parece ser um fator intocável, já que os períodos de uma hora determinam o que é que se tem que fazer e não o contrário. Apesar de que não exista nenhum estudo científico que conclua que a hora é o melhor tempo para aprender, a distribuição horária em frações homogêneas exerce uma forte pressão sobre as possibilidades de atuação na aula. Muitas das boas intenções podem fracassar se o tempo não for considerado como uma autêntica variável nas mãos dos professores, para utilizá-la conforme as necessidades educacionais que se apresentem em cada momento.

Quando a tarefa educativa se limita à exposição, ao estudo ou à realização de exercícios individuais padronizados, o fator tempo importa pouco. Em todo caso, é suficiente que exista uma certa variedade de conteúdos durante o dia. A estruturação horária em períodos rígidos, sejam de uma hora ou de quarenta e cinco minutos, é o resultado lógico de uma escola fundamentalmente transmissora. A ampliação dos conteúdos educativos e, sobretudo, uma atuação consequente com a maneira como se produzem as aprendizagens, nos leva a reconsiderar estes modelos inflexíveis.

Já comentamos a grande importância que têm os debates, os trabalhos em grupo, as atividades de motivação, a continuidade e o encadeamento de muitas atividades nas sequências didáticas, as necessidades de estabelecer o máximo de relações entre umas atividades e outras e como condicionam o interesse e a atenção dos alunos. O que acontece quando o ritmo se rompe. Justamente quando havíamos conseguido uma boa participação? E se isto acontece no momento mais interessante de um debate, de uma experiência ou de uma observação? Conseguir captar o interesse dos alunos é suficientemente difícil para condicioná-lo à arbitrariedade de um horário que não se adapta às necessidades educacionais. Existem certas tarefas que podem ser executadas em quinze minutos ou conteúdos que podem ser maçantes se os trabalhamos durante um espaço de tempo mais prolongado. Pelo contrário, há atividades e conteúdos que merecem uma dedicação muito mais prolongada. No entanto, é evidente que o ritmo da escola, de toda uma coletividade, não pode se deixar levar pela aparente improvisação, principalmente quando existe mais de um professor encarregado de um grupo. No entanto, o planejamento necessário não impede que, apesar das dificuldades, se estabeleça um horário que pode variar conforme as atividades previstas no transcurso de uma semana.

Conclusões

A revisão que fizemos neste capítulo torna manifesto que as diversas formas de agrupamento dos alunos são úteis para diversos objetivos e para o trabalho de diferentes conteúdos. Assim, pois, uma primeira conclusão é que antes de defender fervorosamente um modelo e rejeitar outro de maneira irrevogável, é preciso saber encontrar a utilidade de cada um e transpô-lo para a prática, quando a situação o exija.

É esclarecedor analisar as formas de agrupamento em relação aos diferentes conteúdos. Quando ensinamos, os conceitos, os procedimentos, as atitudes e os fatos seguidamente formam um conjunto que seria artificial dividir estritamente. Assim, pois, uma segunda conclusão nos leva a afirmar que não devemos nos mostrar inflexíveis. Numa mesma unidade didática, e também numa mesma sessão, teremos que recorrer a formas diversas e sucessivas de agrupamento dos alunos e de organização das atividades que serão mais adequadas do que outras para os objetivos que queremos alcançar.

Como pudemos ver, a forma de agrupar os alunos não é uma decisão técnica prévia ou independente do que queremos ensinar e do aluno que queremos formar. A terceira conclusão deste capítulo indica que, assim como se aprende a nadar nadando, se aprende a participar, a questionar, debater, comprometer-se, responsabilizar-se, etc., quando há tipos de conteúdos aos quais se referem, influem, e inclusive às vezes determinam, o tipo de participação dos protagonistas da situação didática, assim como as características específicas que esta participação assume.

Antoni Zabala - A Prática Educativa


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