domingo, 13 de agosto de 2023

Populações e Terras Indígenas no Brasil

A história dos indígenas brasileiros é marcada pela luta por suas terras, desde a época em que foram invadidas por europeus, a partir do século XVI. Quanto às populações que habitavam o interior, de penetração penosa e arriscada, as notícias são escassas e imprecisas. A maioria das estimativas aponta, contudo, para a existência de 2.000.000 a 5.000.000 de indígenas à época da chegada dos portugueses às praias brasileiras. Dois séculos após a vinda das primeiras caravelas, esse número não alcançava 2.000.000 de índios. Atualmente, os índios representam 0,2% da população brasileira. Portanto, em cinco séculos desapareceram mais de 800 etnias e milhares de indígenas, vítimas chacinas, das doenças trazidas da escravização e da catequese jesuíta, todos promovidos pelos europeus.
Atualmente, há mais de 250 povos indígenas no território brasileiro no território brasileiro, sendo que cerca de 40 deles tem parte da população em países vizinhos. Cada povo tem cultura, tradições e manifestações próprias.
No Brasil há grande diversidade de povos indígenas, cada um com sua cultura, vivendo em lugares diferentes, trabalhando, estudando, ensinando, usando os recursos tecnológicos atuais e reivindicando seus direitos políticos.
O contato dos indígenas com os colonizadores europeus trouxe doenças, escravidão e conflitos que causaram a redução da população e do número de povos. Muitos grupos foram exterminados ou integrados à cultura dos colonizadores. outros foram gradativamente expulsos para o interior do Brasil, devido à ocupação do litoral. Ao longo do tempo, os territórios antes ocupados pelos indígenas deram lugar a cidades, extensas áreas agrícolas e de pastagens, áreas de mineração,  estradas etc.
Até os anos 1970, a população indígena brasileira sofreu grande redução. No entanto, a partir dos anos 1980, passou a apresentar índices de crescimento.
Desde a década de 1980, porém, tem havido certa recuperação das taxas de crescimento de maior parte dos povos indígenas. apesar de lento, esse crescimento reverteu o processo de extinção de alguns desses povos. Atualmente, porém, a maior parte dos indígenas brasileiro está aculturado,. ou seja, adaptou-se aos costumes da sociedade dominante. No entanto, ainda se consideram indígena e tentam preservar suas tradições. O critério utilizado para o reconhecimento de um indivíduo como pertencente a etnia é a autoidentificação, ou seja, é o fato de a pessoa se considerar indígena, conservar costumes e hábitos.
Entretanto, se a maioria da população indígena no Brasil já se adaptou aos costumes da sociedade dominante, existe uma minoria que se mantém praticamente isolada e evita o contato com ""o homem branco": os chamados indígenas isolados. Vivendo em lugares distantes e de difícil acesso para evitar o contato com os não indígenas, esses povos procuram preservar sua cultura e sobrevivem ainda basicamente da caça, da pesca, da coleta e da agricultura.

Povos tutelados

Em 1973 foi promulgado e Estatuto do Índio, segundo o qual os indígenas seriam relativamente capazes, ou seja, não estariam aptos a exercer plenamente seus direitos civis, devendo ´por isso serem tutelados por um órgão indigenista estatal, até que estivessem integrados à sociedade nacional (o que na prática significaria assimilação da cultura dominante). De acordo ainda com o Estatuto do Índio, caberia ao Estado proteger esses povos e provê-lo de educação e saúde.
A Funai, criada em 1967, substituiu o Serviço de Proteção ao Índio (criado em 1910) e tornou-se o órgão responsável pela tutela dos indígenas. A Constituição brasileira de 1988 reconheceu direitos permanentes aos indígenas, entre eles o direito à terra e à manutenção de suas organizações social e cultural.
Segundo o Censo de 2010, dos 817 963 indígenas que vivem no Brasil, 315 180 encontra-se em áreas urbanas e 502 783 nas áreas rurais. A maioria vive em Terras Indígenas e em áreas urbanas próximo a elas. 
Entre os fatores que explicam a retomada do crescimento da população indígena, podemos destacar.
- aumento do número de pessoas que passaram a assumir suas origens, se autodeclarando indígenas;
- maior acesso a atendimento médico, vacinas e medicamentos.
Embora muito tenha sido feito para preservação dessas etnias, ainda persistem indicadores sociais preocupantes. Ao comparar os indicadores sociais da população indígena, como educação, saúde, expectativa de vida, com os do restante da população, é possível identificar  uma grande diferença. Daí a importância da luta desses povos por direitos e pela maioria na oferta e na qualidade de serviços públicos essenciais.
As terras, tradicionalmente, ocupadas pelos povos indígenas são aquelas por eles habitadas em caráter permanente, as que são utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem estar. Garantindo assim, as condições necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
Nessas terras, deve haver condições necessárias para sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
Atualmente, a falta de demarcação das terras indígenas permanece como um dos problemas mais graves do Brasil. Apesar disso, os territórios habitados por indígenas possuem uma legislação própria, definida na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 231, garante aos índios, o direito originário sobre as terras tradicionalmente ocupadas.
As terras indígenas são consideradas propriedades da União, porém o direito de usá-la é dos índios. Entretanto, os povos indígenas precisam solicitar ao governo a demarcação de suas terras. "Demarcar terras" significa estabelecer os limites de uma terra indígena. como cada povo possui um estilo de vida, o reconhecimento e definição da área de uma terra indígena é demorado. O governo, por meio de seus técnicos, acompanha a vida cotidiana do povo para identificar o que ele precisa para viver. A partir das informações coletadas em campo, é definida a área do território indígena.                         
Existem muitas Terras Indígenas que ainda não foram demarcadas, ou seja, delimitadas, definidas e regularizadas pelo Governo Federal. Mesmo aquelas que estão regularizadas sofrem invasões e explorações ilegais.
O direito dos povos indígenas à terra, garantido por lei, envolve o processo de demarcação, que deveria ter sido concluído no ano de 1993. No entanto, órgãos responsáveis pelos processos de demarcação demoram para agir. Com isso, os territórios ocupados por povos indígenas ficam sujeitos a invasões por aqueles que têm interesse na exploração comercial dos recursos naturais. Isso ajuda a aumentar a violência no campo, da qual muitos indígenas são vítimas.
Seja morando em, aldeias, seja em agrupamentos mistos ou reservas indígenas, esses povos vivem em constante disputa por terras com fazendeiros, construtores de estradas, madeireiras, empresas mineradoras e grileiros.
Nas décadas de 1970 e 1980 surgiram vários movimentos e entidades nacionais e internacionais de apoio à causa indígena. Um exemplo é o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), criado em 1972. esse organismo, vinculado à Igreja católica, buscou favorecer a integração entre aldeias e povos dispersos, promover assembleias indígenas e garantir a diversidade cultural.
Depois de muito lutarem por seus direitos, lideranças indígenas ingressaram em diversas instituições da sociedade brasileira e passaram a participar dos mecanismos políticos nacionais. Atualmente, diversos indígenas exercem cargos públicos, pois não há qualquer restrição ao indígena votar e ser candidato, desde que ele seja capaz de se expressar em português.
Povos, lideranças e organizações indígenas conquistaram algumas vitórias, como inclusão dos direitos indígenas na Constituição de 1988, avanços na demarcação e regularização das Terras Indígenas e implantação de políticas educacionais e de saúde.
Muitos afirmam que os povos indígenas são a melhor resistência contra a destruição da floresta amazônica, uma vez que utilizam os recursos naturais apenas para subsistência. No entanto, mesmo com terras demarcadas, o desmatamento aumenta nos limites das reservas e avança dentro delas. Em Mato Grosso, nos últimos anos aumentaram o cerco às terras indígenas com a expansão da soja em propriedades mecanizadas. Além disso, a demarcação de terras indígenas contraria interesses de grandes madeireiras, mineradoras, entre outras empresas, atraídas pelas enormes reservas minerais que se concentram nessas terras; daí os inúmeros conflitos.
Grandes grupos econômicos - empresas e investidores ligados à extração de minérios e de madeira - faziam fortes críticas às demarcações. muitos fazendeiros entraram com ações na justiça contra as demarcações. Essa batalha jurídica interrompe e atrasa a demarcação de terras indígenas Apesar disso, segundo muitos antropólogos, as demarcações foram ocorrendo em maior número, principalmente a partir da Constituição de 1988, o que contribuiu para o crescimento populacional dos índios.
A demarcação das terras ianomâmis, ocorrida em 1991, por exemplo, gerou críticas de setores militares, que veem nessa nova situação uma "abdicação da soberania" sobre faixa de fronteiras. Com 9,4 milhões de hectares - aproximadamente o tamanho do território de Portugal - os indígenas dessa reserva habitam o Brasil e a Venezuela, com trânsito livre entre as fronteiras. Também foi motivo de preocupações a grande quantidade de ONGs estrangeiras com interesse na região, com seus integrantes circulando livremente nessas áreas. Uma região rica em biodiversidade, madeira, minérios diversos e água possa suscitar o interesse de outros países.
Em abril de 2005, o presidente Lula aprovou a criação de uma reserva indígena de 1,7 milhão de hectares no estado de Roraima. Conhecida como Raposa Serra do Sol, a reserva deveria beneficiar cerca de 18 700 índios dos povos Patamona, Macuxi Ingaracó,Uapixana e Taurepangue.
Em anos anteriores, porém, seis ou sete empresas agropecuárias haviam se instalado ilegalmente na região, ou seja, sem título de propriedade. Ocupando cerca de 16 mil hectares, essas empresas produzem principalmente arroz. A ocupação ilegal criou uma situação de conflito, pois legalmente a terra pertence à União, que cede aos índios.
Em agosto de 2007, o ministério da Justiça tentou retirar os arrozeiros da região, utilizando como instrumentos para isso a Polícia Federal. Em resposta, os arrozeiros, liderados por Paulo César Quartiero, ameaçaram resistir à mão armada, utilizando táticas de guerrilha. Algumas semanas depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a expulsão dos fazendeiros. Em maio de 2008, dez índios ficaram feridos em confronto com seguranças de Quartiero em uma das suas fazendas no interior da reserva. Quartiero foi preso mais não permaneceu mais do que uma semana na prisão.
Um grande debate girou em torno do comprimento da lei que demarcou definitivamente a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, uma área contígua de 1,6 milhão de hectares no nordeste de Roraima, na qual vivem uma população superior a 15 mil indígenas. O governo estadual e setores das Forças Armadas lutaram para que a reserva fosse fracionada, de forma a garantir a presença dos agricultores e do Exército na região. Para cumprir o que está previsto em lei, a população de não indígena foi retirada das terras, o que foi objeto de muita resistência.
Apesar dos avanços, os povos indígenas continuam lutando para garantir que as conquistas, previstas em lei, sejam colocadas em práticas. Ainda falta muito para que eles tenham os seus direitos respeitados. As comunidades espalhadas pelo país lutam ainda por muitos direitos: acesso à educação, à saúde, aos meios de comunicação, alimentação de qualidade, uso sustentável dos recursos do meio ambiente etc.
Manifestação de povos indígenas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, contra o Marco Temporal, que visava à alteração na demarcação de Terras Indígenas.
O Estado, as organizações não governamentais, as associações indígenas e outras instituições preocupadas com a situação do índio devem buscar conjuntamente novas perspectivas, ações e práticas diante do atual cenário dos grupos indígenas brasileiros. O Estado brasileiro precisa garantir que os direitos previstos na lei sejam de fato cumpridos.

A educação indígena

Na década de 1990, o Ministério da Educação estabeleceu diretrizes específicas para os indígenas brasileiro. A partir de então, vem sendo tomadas medidas para garantir o acesso à educação, o que tem diminuído aceleradamente os índices de analfabetismo em suas comunidades. Atualmente, os indígenas recebem uma educação bilíngue, ou seja, na língua da sua etnia e, também, em língua portuguesa. Além disso, tem-se buscado formar professores indígenas, a fim capacitá-los para ensinar tanto em língua portuguesa quanto nas línguas nativas.

sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Anos de Chumbo: a luta armada

Logo após o golpe de 1964, jovens universitários de esquerda acusaram a direção do Partido Comunista (PCB) de não resistir ao golpe militar e agir com moderação e cautela. Muitos deles julgavam que o momento era de luta armada contra a ditadura.

A luta armada contra o regime militar foi influenciada por outros vários outros movimentos revolucionários na América Latina, no início dos anos 1970. A principal fonte de inspiração para os revolucionários brasileiros era o triunfo da Revolução Cubana. Militantes dos grupos de esquerda acreditavam que era possível derrubar a Ditadura com a Luta Armada. Estavam certos de que os trabalhadores apoiariam e se engajariam em um movimento revolucionário liderado por essas vanguardas.

Vários grupos revolucionários que pegaram em armas contra a ditadura militar brasileira formaram-se nesse período, quando o Brasil era governado pelo general Emílio Garrastazu Médici. Destaca-se a ALN e a VPR.

- Aliança Libertadora Nacional. O Partido Comunista Brasileiro (PCB) posicionava-se contra a luta armada. Diante disso, uma importante liderança do partido, Carlos Marighela, reuniu um grupo de simpatizantes e fundou a ALN.

- Vanguarda Popular Revolucionária. Essa organização era formada, sobretudo, por militares de esquerda, contrários ao golpe militar de 1964. A principal liderança do movimento era Carlos Lamarca. Ex-capitão do exército. Lamarca rompeu com a VPR, em 1971, para ingressar no Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), onde permaneceu até ser morto pelos militares.

O projeto político dessas organizações era desencadear a revolução no campo, mas para isso era preciso arranjar dinheiro nas cidades. A luta armada contra o regime, além de sequestros para libertar presos políticos, promovia também assaltos a bancos e a instalações militares para financiar e armar o movimento. Eram as chamadas expropriações em nome da revolução. O dinheiro conseguido era gasto no aluguel de apartamentos (os aparelhos das células revolucionárias), no sustento dos militantes e no financiamento de novas operações de expropriação. Manter um guerrilheiro urbano na clandestinidade custava muito dinheiro.

O maior problema dessas organizações revolucionárias consistia em que a sociedade brasileira, no seu conjunto, simplesmente não desejava nenhuma revolução socialista, nem estava disposta a apoiar a luta armada. Os trabalhadores não se entusiasmaram com as ações revolucionárias e a maioria dos brasileiros não entendia o que estava acontecendo, tomando conhecimento dos embates entre guerrilheiros e policiais em silêncio. Além disso, o “milagre econômico” começava a deslanchar. Os guerrilheiros somente encontravam algum apoio no que restava do movimento estudantil.

Os militares reagiram criando novos mecanismos de repressão: em 1969, criaram a Obam (Operação Bandeirantes), com o propósito de organizar a repressão na Região Sudeste do país. Logo após, em vários estados, formaram-se os DOI-CODI (Destacamentos de Operações e Informações e Centro de Operações de Defesa Interna), locais onde eram torturados os suspeitos de envolvimento com os grupos revolucionários.

A tortura dos guerrilheiros era praticada em suas instalações. Tão logo eram presos, sofriam bárbaras torturas para entregar os companheiros à repressão. Alguns desses métodos foram ensinados por agentes norte-americanos. Muitos militantes presos não resistiram e morreram em função das torturas, que incluíam o pau de arara, espancamentos variados e choques elétricos em várias parte do corpo.

Para libertar os companheiros, os militantes realizaram várias ações, como o sequestro do embaixador norte-americano, exigindo a libertação de 15 prisioneiro e a leitura, em rede nacional de televisão, de um manifesto revolucionário. Foram sequestrados também os embaixadores alemão e suíço, além do cônsul do Japão. Com os sequestros, a repressão política tornou-se ainda mais dura e cruel.

A luta armada era desigual: jovens de classe média armados com revólveres enfrentando militares profissionais e agentes treinados. Os grupos guerrilheiros estavam derrotados ao final de poucos anos. No entanto, o fator decisivo para a derrota da luta armada foi, como vimos, o isolamento dos guerrilheiros em relação à sociedade. Calcula-se que cerca de 800 pessoas se engajaram na luta armada, sendo que 386 foram mortas ou desapareceram.

Muitos empresários, satisfeitos com os lucros provenientes do “milagre”, apoiaram e inclusive financiaram a repressão ao movimento sindical. Diversos políticos concordaram com o fim das eleições diretas. Nesse período, conhecido como os “anos de chumbo”, restou uma única instituição fora do controle dos militares: a Igreja católica.


O MST

Desde meados dos anos 1980, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST, tornou-se um dos mais importantes movimentos sociais no Brasil contemporâneo. Herdeiro das lutas camponesas dos anos 1940-1960, ele surgiu da confluência de vários conflitos rurais nos anos 1970, quando “camponeses sem terra” ocuparam terras no noroeste do Rio Grande do Sul.

Ao mesmo tempo, agricultores que estavam sendo desalojados no sudoeste do Paraná para construção da usina de Itaipu formaram o Movimento dos Agricultores Sem Terra do Oeste do Paraná. A Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à Igreja católica, conseguiu articular esses e outros movimentos rurais, contribuindo para a construção do MST, em 1984.

O MST inaugurou novas formas de luta e deu início a uma nova identidade social: o “sem-terra”, em que se considera desde aquele que perdeu sua pequena propriedade no Rio Grande do Sul, o desalojado no Paraná, até o desempregado egresso das grandes cidades e o “morador” nos latifúndios do Nordeste. Pode ser também qualquer pessoa que sinta socialmente marginalizada e se identifique com a causa do movimento. Todos esses são definidos como “trabalhadores sem terra”.

Outra novidade é a organização do movimento, cujas direções são plurais, coletivas. Embora haja líderes que se destacam no MST, como João Pedro Stédile, não há um “presidente”, evitando dessa forma a centralização do poder em um só indivíduo. O trabalho de organização é dividido em setores, como educação, saúde, produção e comunicação.

Inicialmente, a grande bandeira do MST era a reforma agrária. Depois, o próprio movimento percebeu que não bastava apenas ter acesso à terra. Assim, passou também a lutar por créditos e financiamento, bem como pelo escoamento da produção para os mercados. Para os líderes do movimento, o grande problema no Brasil era o desenvolvimento econômico social, sobretudo recusando o chamado “agronegócio” e tendo o socialismo como grande objetivo.

Atualmente, o movimento vem dando ênfase à formação de cooperativas voltadas para a produção, para serviços e para o crédito.

Outra inovação nos métodos de atuação do MST são as ocupações, cujo objetivo é criar fatos políticos, ganhando as manchetes de jornais e televisões, mobilizando a população. Com marchas, romarias, apropriação de prédios públicos, embarreiramentos de estradas e invasões de fazendas. O MST faz com que a sociedade tome conhecimento das suas reivindicações. As caminhadas de uma cidade a outra mostram a força dos militantes e a solidariedade entre eles.

O movimento também inovou no trabalho da educação para jovens e adultos. Ao valorizar a cultura do campo, formulou-se uma “pedagogia da terra”, em que professores e militantes são formados em cursos técnicos oferecidos nas Universidades especialmente para eles.

Por vezes, o MST recorre a estratégias radicais, com métodos considerados à margem da lei – como destruição de plantações e depredação de sedes de fazendas produtivas e de laboratórios de pesquisa. Apesar dessas ações, o MST tornou-se um dos movimentos sociais mais importantes no Brasil contemporâneo. Defensor intransigente da luta pela democratização da terra, acena para milhares de pessoas marginalizadas.
Dois massacres de sem-terra, ocorridos no início do governo FHC, não deixam dúvidas quanto à gravidade do problema da terra no Brasil: o de Corumbiara (Roraima), em agosto de 1995, com 11 mortos, e o de Eldorado dos Carajás (Pará), em abril de 1996, com 19 mortos.
Por lei, os latifúndios (grandes propriedades rurais improdutivas) podem ser desapropriados pelo governo federal e entregues à reforma agrária. Isso, porém, envolve muitos interesses. Os grandes fazendeiros contam com uma bancada ruralista formada por deputados e senadores no Congresso Nacional para defender seus interesses. além do mais, os critérios que determinam se uma propriedade é improdutiva ou não são muitos brandos.
Outro problema é consegui fazer uma reforma agrária de qualidade. Muitas vezes as famílias são assentadas, mas as condições para que de fato produzam naquele pedaço de terra não são garantidas. Assim, muitas acabam vendendo suas terras ou abandonam e seguem para as grandes cidades em busca de emprego.

Massacre em Eldorado

Em 17 de abril de 1996, dezenove sem-terra foram mortos num confronto com a Polícia Militar em Eldorado dos Carajás, no sul do Pará. O confronto ocorreu quando 1 500 sem-terra protestavam contra a demora na desapropriação de terras da fazenda Macaxeira. Acusados de estarem obstruindo uma rodovia, a Polícia Militar foi encarregada de tirá-los do local por meios pacíficos ou pela violência. Um dos líderes do movimento, Oziel Alves Pereira, de apenas 17 anos, foi torturado e executado com um tiro no rosto. A operação esteve sob o comando do coronel Mário Pantoja de Oliveira.
Em junho de 2002, 124 soldados e cabos acusados de terem participado do massacre foram a julgamento. Todos foram absolvidos. Quanto ao coronel Mário Pantoja, em 2004 foi condenado a 228 anos de prisão.

As Ligas Camponesas

Em meados da década de 1950, os trabalhadores rurais do Nordeste, ameaçados de expulsão das terras em que trabalhavam como parceiros ou arrendatários, começaram-se a se organizar para garantir o acesso à terra e conquistar melhores condições de trabalho e de vida. Essa mobilização deu origem as Ligas Camponesas, associações que reuniam, principalmente, pequenos proprietários rurais e trabalhadores não assalariados (boias-frias, parceiros, arrendatários, etc.).

A primeira e mais famosa das ligas foi fundada em 1954, em Vitória de Santo Antão, no estado de Pernambuco, reunindo cerca de 1200 pessoas. Antes dela, em 1945 já haviam surgido ligas camponesas em algumas regiões do país, mas foram resultado de ações isoladas de militantes do Partido Comunista que não tiveram continuidade.

Apesar da forte repressão que sofriam por parte dos fazendeiros e da polícia, a partir de1958 as Ligas Camponesas se espalharam pelo Nordeste e, posteriormente, chegaram a Minas Gerais e ao interior do Rio de Janeiro.

Tendo como lema “Reforma agrária na lei ou na marra”, as Ligas Camponesas eram lideradas pelo advogado e deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) Francisco Julião (1915-1999), que procurava orientar os trabalhadores rurais a respeito de seus direitos. Em 1961, foi realizado em Belo Horizonte o Primeiro Congresso Nacional de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, durante o qual representantes das Ligas Camponesas e de sindicatos rurais de todo o país reivindicavam a reforma agrária e a extensão das leis trabalhistas ao campo. Com o Golpe militar de 1964, a atuação das Ligas Camponesas foi proibida e elas foram extintas.

Futebol e ditadura: a Copa de 1970

A seleção brasileira de 1970 tinha um poderoso ataque, formado por Jairzinho, Pelé e Tostão, junto com um meio-campo eficaz e criativo, composto por Gérson, Clodoaldo e Rivelino. A defesa não era brilhante, mas sabia segurar o adversário nos momentos decisivos, como no jogo contra a Inglaterra: e, se falhasse, o ataque fazia gols para compensar. Mas havia um problema que incomodava muita gente: o Brasil vivia o período mais duro da repressão política e a vitória da seleção poderia ser utilizada pelos generais para popularizar a ditadura. Ao final, a maioria esqueceu a questão política e torceu pela “Seleção Canarinho”, como se dizia na época.

A vitória brasileira foi espetacular e consolidou o prestígio do país no futebol internacional. Internamente, o regime militar incorporou a vitória na Copa como mais um instrumento de propaganda. Médici recebeu os atletas em Brasília demonstrando imensa alegria, diante das câmeras de televisão. Enquanto o Brasil jogava a Copa, em junho de 1970, a guerrilha urbana sequestrava o embaixador alemão no Rio de Janeiro. Para os guerrilheiros só interessava libertar os companheiros presos nos “porões” da ditadura.

O TROPICALISMO

O movimento tropicalista nasceu em 1967, inspirados na peça de Osvaldo de Andrade, O rei da vela, em montagem do Teatro Oficina de 1966, e na instalação Tropicália, de Hélio Oiticica, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Rogério Duprat, Torquato Neto e Tom Zé, entre outros, começaram a produzir canções que buscassem uma renovação cultural. Irreverentes e debochados, os tropicalistas opunham-se ao nacionalismo de parte de intelectuais de esquerda. Incorporaram a guitarra à sua música sem ignorar a bossa nova ou qualquer outro estilo musical. Valendo-se da antropofagia cultural modernista de Osvaldo de Andrade (um dos organizadores da Semana de Arte Moderna de 1922). Procuravam incorporar a cultura estrangeira sem deixar de ser nacionais, quer dizer, não estavam imitando, mas sim criando uma nova música ao introduzir elementos de outras culturas. Utilizavam as guitarras do rock e da jovem guarda, elogiavam a bossa nova e tentavam como referência Carmen Miranda, símbolo dessa fusão cultural. Em 1968, quando Caetano Veloso, Gilberto Gil e Os Mutantes entraram em cena no IV Festival Internacional da Canção da TV Globo para cantar “É proibido proibir”, foram fortemente vaiados pelo público, que condenou o uso das guitarras e a maneira extravagantes como os músicos se apresentaram. Caetano Veloso fez um discurso criticando a juventude que o vaiava e, em uma entrevista para o Jornal da Tarde, Gilberto Gil explicou:

“Não temos culpa se eles não querem ser jovens. É isso mesmo, querem que a gente cante os sambinhas. Mas não tenho raiva deles. Não, eles estão embotados pela burrice que uma coisa chamada Partido Comunista resolveu pôr nas cabeças deles”.

Enquanto parte da juventude politicamente engajada considerava a obra tropicalista fruto da alienação e da reprodução da cultura norte-americana, os tropicalistas acusavam essa mesma juventude de ser conservadora e formatada por um pensamento de esquerda que inibia qualquer movimento de renovação cultural.

Entretanto, pouco depois de encerrado o festival de 1968, em setembro, veio o AI-5. Caetano Veloso e Gilberto Gil foram presos e depois se exilaram na Inglaterra, Chico Buarque foi para a Itália. Geraldo Vandré, para a Argélia, passando depois por vários países da Europa. Em 1969, ocorreria o último festival já sem a presença de muitos daqueles que integraram o movimento de renovação da canção brasileira nos anos 1960.

quarta-feira, 2 de agosto de 2023

O governo Figueiredo (1979-1985) – Redemocratização

A sucessão de Geisel foi disputada por dois militares: o general João Batista Figueiredo, apoiado pela ARENA, e o general Euler Bentes Monteiro, que pregava a rápida redemocratização, apoiado pelo MDB. Mais uma vez o Congresso Nacional ratificou o candidato oficial e o general Figueiredo apresentou uma plataforma em que se propunha a diminuir os gastos públicos, desestatizar a economia e ampliar a abertura política.
general João Batista Figueiredo

Eleito de forma indireta em outubro de 1978, o general João Batista Figueiredo assumiu a presidência da República em março de 1979 para um período de 6 anos – uma das imposições do Pacote de Abril, que aumentou o mandato presidencial para prolongar a permanência dos militares no poder.

O governo Figueiredo foi pressionado por uma articulação cada vez mais corajosa das forças oposicionistas da sociedade civil, que exigiam basicamente volta ao estado de direito, com a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, anistia política e justiça social.
A crise econômica se agravava, confirmando as previsões dos economistas da oposição. A taxa de inflação atingiu a casa dos 200%, a dívida pública interna ultrapassou 90 trilhões de cruzeiros, a dívida externa atingiu mais de 100 bilhões de dólares e o índice de desemprego real chegou aos 20% da mão-de-obra ativa.
A liberdade de imprensa permitiu que viesse à tona muitos escândalos financeiros com envolvimento de autoridades governamentais. O processo de abertura gradual continuou controlado pelo governo federal, embora fosse acelerado pelas exigências de uma sociedade pressionada durante quase duas décadas de ditadura. Por outro lado, setores mais radicais do poder, contrários à continuidade da abertura, organizavam atentados terroristas, buscando desestabilizar o próprio governo e criar condições para um retrocesso político.
Em março de 1979, metalúrgicos do ABC, região da Grande São Paulo, entraram novamente em greve, mobilizando 180 000 operários. O governo federal interveio no sindicato, destituindo suas lideranças. Essa foi a primeira de uma série de greves na região: em abril de 1981, 330 000 operários pararam durante 41 dias, enfrentando violenta repressão. Luís Inácio da Silva, o Lula, líder desses movimentos, tornou-se símbolo de uma ação sindical combativa e renovada. Mais de 200 greves eclodiram por todo o Brasil no ano de 1980, fato que se repetiu nos anos seguintes.
Em agosto de 1979, a União Nacional dos Estudantes (UNE) foi reorganizada, embora não recebesse reconhecimento oficial. Nesse mesmo ano foi aprovada a Lei de Anistia, proposta por Figueiredo, e no início de 1980 os presos políticos libertados e os exilados podiam voltar ao país.
No final de 1979, o governo extinguiu a ARENA e o MDB, forçando uma reforma partidária, em que, entretanto, estavam proibidos os partidos comunistas. Formaram-se os seguintes partidos: Partido Democrático Social (PDS), herdeiro da antiga ARENA; Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), continuidade do antigo MDB; Partido Democrático Trabalhista(PDT), liderado por Leonel Brizola; Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), formado por setores da Antiga ARENA; Partido dos Trabalhadores(PT), com uma proposta socialista; e o Partido Popular(PP), que logo se auto extinguiu.
Em 1981, o governo, através de legislação eleitoral, proibiu alianças entre vários os partidos, objetivando forçar a divisão do bloco oposicionista e facilitar a vitória do PDS.
Em novembro de 1982 realizaram-se eleições diretas para governador, o que não ocorria desde 1967. O PDS saiu vitorioso em 12 Estados e a oposição em 10, embora os partidos oposicionistas tivessem 25 milhões de votos e o partido situacionista, 18 milhões. Nos estados mais populosos e de economia mais desenvolvida a oposição alcançou a vitória, com exceção de Pernambuco e Rio Grande do Sul, onde o PDS conquistou o poder por pequena margem de votos.
No Congresso Nacional o governo perdeu a maioria na Câmara dos Deputados, embora tenha mantido sua liderança no Senado, graças aos senadores “biônicos”.
Os governadores estaduais eleitos foram empossados em 1983, apesar da ameaça da extrema direita, dirigidas sobretudo a Leonel Brizola, eleito no Rio de Janeiro.
A vitória dos oposicionistas ampliou o espaço de atuação das forças que exigiam a redemocratização do país.

A linha dura em ação

Entretanto, apesar de o governo combinar a abertura política com medidas de repressão, a linha dura continuava insatisfeita. Para seus integrantes era preciso continuar a reprimir qualquer oposição ao regime. Como já não podiam obrigar o governo a fazer isso, muitos deles passaram a organizar atentados a Bomba, com o objetivo de tumultuar o processo político e retardar o retorno ao Estado democrático.

Um desses atentados terroristas ocorreu em outubro de 1979, com a explosão de uma Bomba no carro do jornalista Hélio Fernandes, no Rio de Janeiro. Seguiram-se cerca de 40 atentados ao longo de 1980. Em São Paulo, o jurista Dalmo Dallari, da Comissão de Justiça e Paz, foi sequestrado e violentamente espancado; bancas de revistas que vendiam publicações de esquerda sofreram atentados a bomba; uma carta-bomba enviada à sede carioca da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) matou a secretária Lyda Monteiro da Silva.

Na noite de 30 de abril de 1981, os terroristas da linha dura tentaram sua façanha mais espetacular: colocar bombas em um show de música popular brasileira realizado no Riocentro, Rio de Janeiro, onde estavam concentradas milhares de pessoas. Antes que a tragédia acontecesse, uma das bombas explodiu no carro dos terroristas, matando um sargento e ferindo o capitão Wilson Chaves Machado: os dois militares eram agentes do Doi-Codi carioca.

Os responsáveis pelo atentado jamais foram punidos pelo governo, que tudo fez para abafar essa e outras ações terroristas promovidas por setores da linha dura.

A luta pela redemocratização

Em maio de 1978, o movimento sindical iniciado no ABC ganhou impulso. Nos anos seguintes foram deflagadas, diversas greves, e as reivindicações sindicais alastraram-se por todo o país: operários, professores, médicos, camponeses, funcionários públicos, motoristas de ônibus, bancários, motoristas de taxi, todas as categorias se mobilizavam.
De 21 a 23 de agosto de 1981, lideranças sindicais de todo o Brasil reuniu-se no município de Praia Grande, no litoral de São Paulo, na primeira conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (CONCLAT). Participaram 5 036 delegados de 1 091 entidades de trabalhadores urbanos e rurais. Apesar de algumas divergências internas, o encontro aprovou resoluções que, resumidamente, estabelecia o seguinte: fim da política econômica do governo, liberdade e autonomia sindical, liberdade de organização política e não-realização de acordos com o FMI.
Em 1983, as divergências internas no movimento sindical resultaram na formação de mais uma central de trabalhadores, além da CONCLAT: a Central Única dos Trabalhadores (CUT). Essa divisão, embora refletisse disputas partidárias no seio do movimento sindical, indicava na realidade, concepções diferentes quanto à ação das classes trabalhadoras. O clima de abertura política e o razoável grau de articulação dos trabalhadores resultaram na tolerância do governo à existência tanto da CONCLAT quanto da CUT, embora não oficialmente reconhecidas.
As reivindicações sindicais passaram ao patamar das exigências políticas, desaguando em uma participação massiva dos trabalhadores no grande movimento das Diretas Já.
Os prefeitos e vereadores eleitos em novembro de 1982 encontraram um quadro desalentador nos municípios, com recursos financeiros escassos, encargos da dívida pública municipal elevados e intensas reivindicações populares por novas obras e serviços locais. Essa situação era fruto da centralização financeira implantada após 1964 para que, através do controle financeiro, o governo federal controlasse a política dos municípios. A luta pela a autonomia municipal contribuiria para a redemocratização do país.
Em maio de 1983, todos os prefeitos do Estado de São Paulo reuniram-se na cidade de Rio Claro, onde foi constituída uma comissão interpartidária de prefeitos com a finalidade de coordenar a luta pelo fortalecimento dos municípios paulistas. Paralelamente, movimentos semelhantes organizaram-se em outros estados do país e em poucos meses o movimento se articulou por todo o Brasil, sendo formada a Frente Municipalista Nacional, cuja presidência seria entregue ao então vice-governador de São Paulo, Orestes Quércia.
Em 27 de setembro de 1983, 3 000 prefeitos e vereadores realizaram uma marcha a Brasília, unindo-se num movimento que exigia mais recursos para os municípios. A proposta do governo federal às suas reivindicações foi negativa, e dois meses depois a Frente Municipalista Nacional realizaria nova marcha a Brasília. À revelia do presidente, o movimento conquistaria no Congresso Nacional a reforma tributária para os municípios.
A Frente Municipalista Nacional ainda se uniria à luta pela Constituinte e à mobilização pelas Diretas Já. Em abril de 1984, prefeitos e vereadores enfrentaram o estado de emergência decretado pelo governo federal e realizaram uma terceira marcha a Brasília, desta feita para apoiar a emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas para presidente.
Toda a insatisfação da sociedade brasileira culminou em uma reivindicação política que mobilizou o país de norte a sul: a campanha pela eleição direta para presidente da República. A luta pelas Diretas Já, como ficou conhecida, foi responsável pelas mais numerosas manifestações de massa de nossa história.
Passados 20 anos, desde o golpe de 1964, mais uma vez o presidente seria escolhido por um Colégio Eleitoral, que deveria, como sempre, referendar o nome indicado pelos detentores do poder. A proposta de uma emenda à constituição restabelecendo eleições diretas para presidente sensibilizaria o Brasil.
Em 27 de novembro de 1983, liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), aconteceu a primeira manifestação pelas eleições diretas, quando 10 mil pessoas se concentraram em frete ao estádio do Pacaembu, em São Paulo. A campanha cresceu nos meses nos meses seguintes. No dia 25 de janeiro de 1984, nova concentração foi realizada, reunindo-se aproximadamente 300 mil pessoas, na praça da Sé, em São Paulo.
Comícios, concentrações e passeatas fora realizadas nas capitais dos estados, nas grandes e pequenas cidades, tornando pública a emenda Dante de Oliveira.
Em 10 de abril de 1984, cerca um milhão de pessoas concentrou-se no Rio de Janeiro. Menos de uma semana depois, ultrapassando o recorde carioca, reunia-se, em São Paulo, uma multidão estimada em 1,7 milhão de pessoas. Era o auge da campanha. Levantamentos realizados pelos órgãos de comunicação indicaram que mais de 6 milhões de pessoas se manifestaram nas ruas antes de 25 de abril, data da votação da emenda constitucional. Nesse dia, entretanto, frustraram-se os anseios nacionais. Com Brasília, Goiânia e mais nove municípios sob estado de emergência, o Congresso Nacional votou a emenda Dante de Oliveira: 298 deputados votaram a favor, 65 contra, três abstiveram-se e 112 não compareceram. Faltaram 22 votos favoráveis para completar os dois terços necessários para aprovação de uma emenda constitucional.

O fim da República militar

A campanha das diretas concentrou momentaneamente as esperanças de quase toda a população brasileira. Ela se apresentava como o primeiro passo para a resolução dos inúmeros problemas que afligiam a nação. A eleição do presidente pelo Colégio Eleitoral sugeria a continuidade da situação por mais seis anos.
Com a derrota da emenda, os partidos de oposição iniciaram articulações visando derrotar o regime no próprio Colégio Eleitoral. O PMDB, o PDT e o PTB tentaram atrair setores descontentes do PDS. O PT, porém, se manifestou contra a ida ao Colégio Eleitoral.
Em junho de 1984, o senador José Sarney renunciou a presidência do PDS. Setores dissidentes desse partido se articularam e formaram o Partido da Frente Liberal (PFL). Em julho, o PFL e o PMDB formalizaram um acordo de apoio à candidatura de Tancredo Neves para presidente da República e José Sarney para vice-presidente. Em agosto, a convenção do PDS escolheu Paulo Salim Maluf para candidato, derrotando Mário Andreazza, indicado pelo presidente Figueiredo. A derrota de Andreazza resultou no apoio de mais dissidentes do PDS ao candidato oposicionista, garantindo a neutralidade de Figueiredo e da maioria dos militares no processo sucessório.
Em 15 de Janeiro de 1985, Tancredo Neves derrotou Paulo Maluf no Colégio Eleitoral por 480 votos a 180. “Fomos ao Colégio Eleitoral para que ele nunca mais seja utilizado”, afirmou Tancredo Neves, cuja eleição encerrava o período de 21 anos de regime militar no país. No entanto, Tancredo não tomou posse. Adoecendo, o novo presidente passou por uma longa agonia, que comoveu toda a população, vindo a falecer em 21 de abril, após sete intervenções cirúrgicas.


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