terça-feira, 26 de setembro de 2023

EXPANSÃO ULTRAMARINA EUROPEIA

Nos séculos XV e XVI, os europeus fizeram perigosas viagens de longa distância em embarcações pequenas e sem muita segurança. Foram as chamadas Grandes Navegações. Os navegantes lidavam com barcos superlotados, pouco espaço para armazenar barris de água, alimentos que estragavam com facilidade, doenças, fome, ventos contrários, naufrágios, entre outras dificuldades.
Além dos perigos reais, eles conviviam com os imaginários. Acreditavam, por exemplo, que no Oceano Atlântico – chamado de “Mar Tenebroso” – havia criaturas terríveis, capazes de destruir as embarcações, e que os navios pegavam fogo ao se aproximarem da Linha do Equador.

O comércio oriental de especiarias

A partir do século XIII, mercadores que atuavam em cidades da península Itálica, como Veneza e Gênova, dominaram o comércio no mar Mediterrâneo e no mar Negro, de forma a monopolizar os negócios com o Oriente.
Tais mercadores compravam dos comerciantes árabes produtos trazidos de regiões mais distantes, conhecidas como Índias – que abrangiam os territórios dos atuais Sri Lanka, Índia, Malásia e China –, e os revendiam na Europa. Entre esses produtos estavam a seda, as pérolas, o marfim e as especiarias. Tanto árabes como genoveses e venezianos obtinham grandes lucros nessas transações.
A popularidade cada vez maior das especiarias e dos produtos orientais de luxo entre as cortes e a nobreza europeias aumentou a necessidade de ouro e prata para o pagamento dessas mercadorias. Além disso, despertou o interesse de mercadores de outras nações, os quais compravam esses itens diretamente na Ásia, ou seja, sem o intermédio dos comerciantes da península Itálica. Assim, podiam adquirir os produtos a preços menores e obter uma negociação mais vantajosa. Para isso, teriam de encontrar caminhos alternativos ao do mar Mediterrâneo.
Essa procura por novos caminhos influenciou o surgimento das Grandes Navegações, cujo resultado foi a expansão das relações comerciais por diversas regiões do mundo, como África, América e Ásia. Por esse motivo, também chamamos esse movimento de Expansão Marítima e Comercial Europeia.

O COMÉRCIO E AS COLÔNIAS DO MEDITERRÂNEO

Venezianos e genoveses haviam criado uma grande rede de colônias e entrepostos para comercializar seus produtos em todo o mar Mediterrâneo e também no mar Negro, como pode ser observado no mapa desta página. Em muitos lugares, a estrutura desses entrepostos era pequena, limitando-se a um bairro ou a alguns galpões em cidades pertencentes a outros reinos. Em outras localidades, no entanto, colônias completas foram estabelecidas: cidades foram fundadas, ou até mesmo ocupadas, e fortalezas foram construídas e munidas com tropas militares.
Os mercadores da península Itálica negociavam com comerciantes árabes em entrepostos situados ao redor do mar Negro, nas ilhas do mar Egeu (hoje parte da Grécia) e na costa do Levante (região dos atuais Líbano, Israel e Egito). Dali, levavam os produtos a pontos comerciais localizados em países da Europa, como Portugal, de onde parte das mercadorias seguia para o norte do continente.
A tomada de Constantinopla pelos otomanos em 1453, fato que pôs fim ao Império Bizantino (a porção oriental do antigo Império Romano), afetou os negócios dos mercadores genoveses e venezianos, que eram aliados dos bizantinos. No final do século XV, quase todas as colônias de Gênova e Veneza no leste do Mediterrâneo e no mar Negro haviam sido conquistadas por otomanos. Com isso, as frotas, as tropas e os lucros dos mercadores da península Itálica foram diminuindo.
Os monarcas e os mercadores da península Ibérica viram nesse enfraquecimento comercial uma oportunidade de participar do lucrativo comércio com o Oriente.
Nessa época, Portugal e Espanha já haviam começado a explorar o litoral africano.
Como a rota pelo mar Mediterrâneo se tornara desvantajosa após a conquista de Constantinopla, as frotas a serviço de monarcas portugueses e espanhóis planejavam contornar a África para chegar às Índias. Não por acaso, muitas dessas frotas foram comandadas por genoveses e venezianos, que conheciam o litoral africano.

UM OCEANO DE TEMORES

Embora uma parcela dos mercadores e dos monarcas da península Ibérica tivesse interesse em explorar lugares distantes em busca de riquezas, a viagem pelo oceano Atlântico era dificultada por temores e perigos.
Entre os séculos XIII e XV, as técnicas e os instrumentos de navegação usados pelos europeus foram aprimorados, por influência do contato com invenções chinesas trazidas por comerciantes genoveses, venezianos e árabes. No entanto, as embarcações ainda eram frágeis diante de tempestades, tormentas e demais obstáculos à navegação. Além disso, os navios a vela dependiam dos ventos para alcançar boa velocidade, o que tornava as viagens longas e os trajetos imprevisíveis.
A ocorrência de atrasos nas viagens aumentava os riscos de fome, desidratação e disseminação de epidemias entre a tripulação. Eram comuns doenças transmissíveis por vias aéreas, como a coqueluche, e causadas por parasitas, como o tifo. Havia também males causados pela falta de nutrientes. Nessas viagens, as tripulações alimentavam-se de forma precária, comendo carne e peixe secos e salgados, grãos, passas e biscoitos, pois os alimentos frescos se estragavam em pouco tempo e a água se contaminava com facilidade, tornando-se impróprios ao consumo.
Por falta de vitamina C, muitos desenvolviam escorbuto, doença que provoca sangramento, feridas e queda da imunidade. Pessoas infectadas com doenças mais temidas, como a peste bubônica, eram atiradas ao mar.
Além dos riscos relacionados à saúde e à segurança dos tripulantes, havia os temores relacionados ao mar desconhecido. De acordo com o imaginário europeu do período, o oceano Atlântico era povoado por seres fabulosos e monstros marinhos que devoravam tripulantes, além de apresentar abismos que tragavam embarcações e muitos outros perigos.

A FASCINAÇÃO POR OUTRAS TERRAS

Enquanto algumas histórias e lendas causavam temor em relação a terras distantes e inexploradas, outras, relacionadas à abundância de ouro e prata nesses locais, provocavam fascinação entre os europeus.
Uma das narrativas que mais despertou a curiosidade e a cobiça dos povos da Europa foi o relato do comerciante veneziano Marco Polo (1254-1324) a respeito da viagem que realizou até a China, pela Rota da Seda, publicado em seu Livro das maravilhas.
Além das narrativas de viagens reais, como a de Marco Polo e demais exploradores de sua época, os relatos de lugares místicos também faziam parte do imaginário europeu, como o país da Cocanha e a ilha de Atlântida. A crença na existência dessas localidades era tão forte que, em alguns casos, motivou doações de reis a navegadores que desejassem procurá-las, mesmo sem qualquer prova de que elas de fato existissem.
Além de servir de entretenimento, essas narrativas atiçavam planos de exploração e conquista alimentados por muitos comerciantes e navegadores europeus, entre os quais o genovês Cristóvão Colombo.

VISÕES DO PARAÍSO

Durante os tempos medievais, também se espalhou pela Europa a ideia de que haveria um paraíso terrestre em um local muito distante. De acordo com a visão cristã da época, esse paraíso consistiria em um lugar intocado pelo pecado original e no qual predominariam a pureza e a liberdade.
Posteriormente, com o avanço das navegações pela costa africana e a chegada às regiões tropicais do continente americano, navegadores e cronistas europeus viam nas exuberantes florestas encontradas, repletas de animais desconhecidos, um cenário próximo da ideia medieval do paraíso terrestre.

O AVANÇO DOS SABERES NÁUTICOS

A construção de navios destinados à navegação em alto-mar era algo recente em Portugal. Até o início do século XV, eram barcaças rústicas e pesadas destinadas à pesca, próprias para navegar no Mediterrâneo, não para navegações oceânicas.
Incentivados pelo governo português, estudiosos – cartógrafos, astrônomos, navegadores, entre outros especialistas – recuperaram informações náuticas de outros povos, principalmente dos fenícios, gregos, árabes e egípcios.
Essa iniciativa possibilitou o aperfeiçoamento dos instrumentos náuticos, a elaboração de cartas de navegação mais precisas e a construção de novos modelos de embarcações.

AS EXPEDIÇÕES MARÍTIMAS E OS NOVOS INSTRUMENTOS DE NAVEGAÇÃO

Em razão do domínio árabe e do intenso contato com navegadores que traziam produtos do Oriente, os portugueses, no século XV, adotaram instrumentos de navegação inventados pelos árabes e pelos chineses. Bússolas, astrolábios e embarcações foram sendo aperfeiçoados.
Nessa época, os portugueses criaram navios mais ágeis em manobras e que aproveitavam melhor o impulso dos ventos: primeiro, as caravelas, embarcações leves e rasas, apropriadas para viagens de exploração; depois, as naus, maiores e mais adequadas para o transporte de cargas.
Com instrumentos mais precisos e embarcações mais ágeis, foi possível aprimorar também os mapas. Assim, durante as expedições, os tripulantes responsáveis pela cartografia podiam indicar mais elementos nos portulanos – representações náuticas que detalhavam as distâncias e as características dos acidentes geográficos da costa, além de trazer recomendações de navegação.
Tanto as viagens feitas em naus quanto as realizadas em caravelas eram bastante insalubres e precárias, e muitos dos tripulantes eram vítimas de doenças ou naufrágios. De acordo com dados da época, 40% da tripulação morria durante o trajeto.
Com frequência, o estoque de alimentos era atacado por ratos e baratas. Os alojamentos eram pouco arejados, com pequenas passagens de luz, e apresentavam forte mau cheiro. A falta de segurança era bastante comum nessas expedições. Além de serem expostos ao risco de contrair doenças, os navegadores viajavam em navios cuja manutenção era precária (muitas embarcações tinham cascos apodrecidos e velas desgastadas, por exemplo). Havia, ainda, a possibilidade de ataques de piratas, que comprometiam o sucesso das expedições.

Novas embarcações e instrumentos

Uma das novidades do período foi a caravela, embarcação mais leve e apropriada para navegar tanto nos oceanos quanto em rios e enseadas. As caravelas eram impulsionadas
por velas triangulares, dispensavam os remos e atingiam velocidade. Começaram a ser usadas pelos portugueses por volta de 1440 e, em pouco tempo, sua fama se espalhou para outros países europeus.
As naus, por sua vez, eram maiores que as caravelas, tinham três ou quatro andares, podiam transportar mais pessoas e mais cargas. Nas viagens de ida, levavam mercadorias para serem trocadas por outras, além de provisões e armas, incluindo canhões. Na volta, traziam mercadorias valorizadas na Europa – como pimenta e gengibre.
Além disso, foram desenvolvidos e aperfeiçoados vários instrumentos náuticos. Antes desses recursos, os marinheiros navegavam somente durante o dia, orientando-se pelos acidentes geográficos da costa, como enseadas, rios, montanhas etc. Com os novos instrumentos, os marinheiros tinham condições de se localizar em alto-mar e até mesmo durante a noite. Bastava usar os instrumentos para calcular a posição do Sol ou das estrelas.
Na imagem que estamos analisando, estão representados dois instrumentos: a balestilha e o astrolábio. Os primeiros registros portugueses do uso da balestilha são de 1519; e do astrolábio são de 1500, durante a viagem de Cabral. Outro instrumento essencial para os navegadores da época foi a bússola, inventada pelos chineses mais de mil anos antes das Grandes Navegações.

A TRIPULAÇÃO DAS NAUS E CARAVELAS

O número de tripulantes variava conforme o tamanho e o objetivo da viagem, mas, em média, as caravelas levavam 50 pessoas e as naus, 100. Entre essas pessoas havia representantes do rei, nobres em busca de aventura ou de riqueza, estudiosos relacionados ao mundo náutico – cosmógrafos, cartógrafos e outros – e marinheiros encarregados das funções mais pesadas e perigosas.
Quem liderava as expedições era o capitão-mor, mas havia outros cargos, como o de mestre, contramestre e piloto. Nessas viagens, também havia um escrivão, representante direto do rei, encarregado de fazer os relatos da viagem e registrar, em um livro de contabilidade, as despesas e as mercadorias obtidas nela. Um dos primeiros documentos escritos em português sobre a chegada dos europeus à região que hoje corresponde ao Brasil foi redigido pelo escrivão Pero Vaz de Caminha (1450-1500).
Na época das Grandes Navegações, as relações entre a Igreja Católica e alguns reinos europeus, como os da Espanha e os de Portugal, eram muito próximas. Por isso, as viagens transoceânicas promovidas por esses governos também levavam representantes da Igreja, encarregados de dar assistência espiritual aos viajantes e, principalmente, converter ao catolicismo os povos das regiões conquistadas.

Os trabalhadores braçais

Grande parte dos viajantes era de trabalhadores pobres e analfabetos, com problemas de saúde e subnutrição; alguns eram prisioneiros levados à força para cumprir suas sentenças criminais, ou sob a promessa de se verem livres de suas condenações após um período nessas embarcações, e se dividiam em três grupos:
• O primeiro era formado pelos marinheiros (carpinteiros, despenseiros, cozinheiros,
entre outros) com experiência anterior de viagens marítimas.
• O segundo grupo era o dos grumetes – marinheiros de primeira viagem.
• O terceiro era o dos pajens – menores que deviam servir os oficiais, arrumar a mesa, limpar as cabines etc.
Além desses, havia os militares encarregados da defesa da embarcação e de promover guerras de conquista nas novas regiões.
Os oficiais tinham direito a aposentos especiais, mas o restante da tripulação dormia espalhada pela embarcação, sem nenhum conforto ou privacidade. As necessidades fisiológicas eram feitas sobre pequenos assentos pendurados nas bordas da embarcação ou em banheiros improvisados, o que piorava as condições de higiene do navio.

O dia a dia no mar

No dia a dia, a alimentação dos marinheiros era bastante precária, composta de bolachas de farinha; peixes, quando havia; e vinho. A falta de alimentos ricos em vitamina C (laranja e limão, sobretudo) ocasionava muitos casos de escorbuto – doença que provoca inchaço nas gengivas e queda dos dentes. Diarreias, vômitos, doenças pulmonares, cólera, infecção por gangrena e até mesmo doenças mentais eram algumas das moléstias que acometiam a tripulação desses navios.
Por causa das péssimas condições a bordo das embarcações, os motins e revoltas eram comuns, e essas manifestações eram punidas com extrema violência. Outro problema eram os naufrágios, nos quais morriam muitos marinheiros. As cartas de navegação ainda eram imprecisas e não indicavam todos os acidentes geográficos. Assim, era frequente que navios afundassem por colidirem com recifes ou bancos de areia.

Portugal, o pioneiro na expansão

Portugal foi o pioneiro na Expansão Marítima e Comercial, isto é, aquele que deu início às descobertas de novas rotas comerciais. Que fatores impulsionaram os portugueses?
Fator político. Portugal foi o primeiro país europeu a ter uma monarquia centralizada, como vimos anteriormente. Em consequência da centralização, Portugal não passava mais por guerras internas. Como o rei português tinha poder sobre todo o reino, pôde implementar suas políticas sem enfrentar tantos problemas, e uma delas foi apoiar o comércio marítimo a longas distâncias, pois sabia que poderia gerar muito lucro.
Fator econômico. As rotas de especiarias controladas pelos italianos tinham uma escala em Portugal (para reabastecimento e comércio) e continuavam em direção ao Mar do Norte. Os portugueses queriam ampliar sua participação nesse comércio e decidiram encontrar um novo caminho marítimo para o Oriente a fim de terem acesso direto ao comércio de especiarias.
Experiência e conhecimentos em navegação. Os portugueses eram navegadores experientes. Praticavam pesca em alto-mar (de bacalhau, baleia e sardinha) e buscavam desenvolver técnicas de navegação, aperfeiçoar embarcações e confeccionar mapas, além de ter acesso a equipamentos desenvolvidos em outras partes do mundo, como a bússola e o astrolábio.
Fator religioso. Os portugueses queriam expandir a fé cristã e combater os muçulmanos, na época considerados infiéis.
Nesse contexto, em 1415, D. João I iniciou a expansão portuguesa com uma expedição que tomou a cidade de Ceuta, um entreposto comercial e militar muçulmano, localizado no norte da África.
No século XV, os monarcas portugueses entendiam que a expansão comercial era a melhor forma de garantir riquezas e prestígio para o reino. Por isso, selaram uma aliança com a burguesia não apenas para estimular o comércio, mas também para expandir os territórios sob sua influência ou controle. Os portugueses tinham ampla experiência com navegação costeira, pois a pesca era uma importante atividade no reino.
Foi assim que, em 1415, influenciado por interesses econômicos, dom João I decidiu organizar uma grande expedição para conquistar a cidade de Ceuta, no norte da África. Essa cidade era um importante centro comercial de artigos de luxo – como o ouro, a prata e as especiarias – controlado pelos mercadores árabes. A tomada de Ceuta também tinha motivações religiosas: os portugueses queriam propagar o modo de vida cristão e combater o islamismo, que era praticado naquela cidade. Em agosto de 1415, Ceuta foi conquistada pelos portugueses. Assim, iniciou-se a primeira fase da expansão marítima de Portugal.
Após a conquista de Ceuta, os portugueses continuaram a expansão pelo oceano Atlântico. Em 1419, eles ocuparam as ilhas da Madeira; em 1443, chegaram à ilha de Arguim; e, quatro anos depois, em 1447, criaram seu primeiro entreposto comercial, mais conhecido como feitoria.
Em seguida, os portugueses passaram a navegar para o sul, contornando o litoral africano e chegando a arquipélagos mais afastados no oceano Atlântico. Conforme entravam em contato com os povos que habitavam a costa, os expedicionários fundavam feitorias.
Nesses postos comerciais, negociavam, estocavam e taxavam produtos; além disso, reabasteciam as embarcações de mantimentos. Na Costa da Mina ou Costa do Ouro (atual Gana), os portugueses trocavam armas de fogo, pólvora e vinho por ouro em pó, marfim e outros produtos trazidos do interior do continente africano. Foi também nessa região da África Ocidental que os europeus começaram a traficar africanos escravizados. Nas primeiras décadas, os escravizados eram vendidos na Europa ou encaminhados para os arquipélagos Cabo Verde e Açores e a ilha atlântica Madeira. Os portugueses haviam colonizado essas regiões e começaram a plantar cana para a produção e a venda de açúcar, um item raro e cobiçado na Europa.
Embora o comércio de produtos africanos e o tráfico de escravizados trouxessem lucros para Portugal, o objetivo maior desse reino com as navegações pela África ainda era encontrar uma passagem marítima para o Oriente. Após várias tentativas dos navegadores, Bartolomeu Dias contornou, em 1488, o cabo da Boa Esperança, no extremo sul da África, e chegou ao oceano Índico. Os portugueses sabiam que tinham descoberto o caminho por onde chegariam às lucrativas especiarias.

A ROTA DO CABO

Em 1498, três embarcações sob o comando do português Vasco da Gama contornaram o cabo da Boa Esperança. Com informações obtidas de mercadores árabes em Melinde (no atual Quênia), navegaram até a cidade de Calicute, na Índia. Estava aberta a chamada Rota do Cabo.
Apesar do grande número de perdas humanas – estima-se que mais da metade da tripulação inicial tenha falecido durante a viagem –, Vasco da Gama foi saudado ao chegar de volta a Lisboa. Ele trazia muitas informações sobre o Oriente, além de grande quantidade de pimenta-do-reino, cuja venda gerou um lucro altíssimo para a Coroa. O uso da Rota do Cabo finalmente permitiu aos portugueses levar para a Europa as especiarias e os produtos de luxo do Oriente sem intermediários.
Em 1500, entusiasmado com os ganhos gerados pela viagem,
o rei português enviou à Índia uma grande frota, com 13 embarcações, comandada por Pedro Álvares Cabral. A frota de Cabral desviou-se do caminho planejado e chegou ao território que hoje corresponde ao sul do estado da Bahia, no Brasil.
Embora a terra alcançada fosse ocupada havia muito tempo pelos povos nativos desse continente, os navegadores tomaram posse do território em nome do rei de Portugal, registraram o fato e seguiram para a Índia, chegando a Calicute. Essa grande esquadra também levou muitas especiarias para Portugal, confirmando o sucesso da Rota do Cabo. A partir de então, além de enviar novas expedições mercantis ao Oriente, que atingiram lucros de até 6 000% por viagem, Portugal começou a organizar missões de reconhecimento da margem oeste do Atlântico.
Portugal, no entanto, não chegou a dominar a região. Ao longo do caminho marítimo para o Oriente, estabeleceram feitorias, que eram entrepostos comerciais que contavam com proteção militar. Nelas, as mercadorias eram armazenadas e depois levadas para a Europa. Portugal tornava-se assim o centro de um império gigantesco: o Império Ultramarino Português.

A expansão espanhola

A expansão marítima da Espanha teve início em 1492, depois de finalizada a centralização política. Na expectativa de encontrar um caminho para o Oriente, os reis espanhóis organizaram uma expedição, comandada por Cristóvão Colombo.
Diante do enfraquecimento das cidades da península Itálica e
das tentativas dos portugueses de chegar às Índias contornando a África, os reis católicos da Espanha financiaram navegadores que se dispusessem a buscar novas rotas para o comércio de especiarias e outros produtos. Um desses navegadores foi o genovês Cristóvão Colombo (1451-1506), que afirmava ser possível chegar às Índias navegando pelo oceano Atlântico sempre na direção oeste.
Diferentemente do que planejava, em 1492, ele não chegou ao Oriente, e sim ao continente mais tarde denominado América, onde encontrou habitantes diferentes daqueles que conhecia na Europa, a quem denominou índios, por acreditar que havia chegado às Índias. 
Colombo realizou mais três viagens às novas terras, que ele acreditava serem as Índias, por isso chamou de “índios” os diferentes povos daquela região. Nessa época os europeus chamavam de “Índias” todas as regiões localizadas no extremo Oriente, como Japão, China, Indonésia, Molucas e a própria Índia. 
Somente em 1501 reconheceu-se que aquele território correspondia a um continente entre Europa e Ásia. Foi o geógrafo florentino Américo Vespúcio quem provou que as terras visitadas por Colombo não eram as Índias. Em sua homenagem, essas terras receberam o nome de América.
Como a Coroa espanhola seguia empenhada em encontrar uma rota até as Índias pelo Ocidente, outras expedições foram organizadas. Em 1513, Vasco Nunes Balboa chegou ao Oceano Pacífico. Seis anos depois, em 1519, Fernão de Magalhães, navegante português a serviço da Coroa Espanhola, partiu em uma viagem de volta ao mundo. Completada em 1522, por Juan Sebastián Elcano, esta expedição foi importante, pois a conquista do Oceano Pacífico permitiu que os espanhóis atingissem o Oriente sem ter de contornar o continente africano. Assim, uma nova rota comercial foi aberta.

EXPLORANDO OUTROS OCEANOS

As expedições portuguesas e espanholas proporcionaram a descoberta de novas áreas para a extração de metais preciosos e de novos produtos, bem como a ampliação do comércio. Além disso, incentivaram outras monarquias europeias, como as da França e da Inglaterra, a investir na exploração de territórios além-mar.
Apesar da motivação inicial de encontrar novos caminhos para o Oriente, as viagens marítimas possibilitaram um maior conhecimento e a exploração de regiões em outros oceanos.
Com o estabelecimento da Rota do Cabo, as navegações pelo oceano Índico tiveram especial importância para o comércio entre Índia e Portugal, além de permitir a formação de colônias no Sudeste Asiático.
O oceano Pacífico, por sua vez, se destacou mais para os europeus a partir da viagem de Fernão de Magalhães, em 1520, financiada pela monarquia espanhola. No século XVI, os espanhóis estabeleceram importantes pontos comerciais no Pacífico, como o das Ilhas Filipinas.
Na segunda metade do século XVI, os ingleses também voltaram a atenção ao Pacífico. Como vimos, uma das principais formas pelas quais a Inglaterra atuou no contexto das expedições marítimas do período foi o financiamento de piratas e corsários.
Assim, a monarquia inglesa poderia interceptar e tomar para si metais preciosos e demais produtos obtidos pelas monarquias rivais. Entre 1577 e 1580, frotas inglesas lideradas por Francis Drake atravessaram o estreito de Magalhães – passagem navegável entre os oceanos Atlântico e Pacífico, nomeada em homenagem a Fernão de Magalhães – e atacaram as possessões espanholas no oeste do continente americano.
Os portugueses e espanhóis chegaram à China e ao Japão no decorrer do século XVI e, da mesma forma que no Atlântico, estabeleceram relações comerciais nesses lugares. Entre 1515 e 1560, por exemplo, Portugal obteve grande poder com o estabelecimento de feitorias e comércio (madeira, seda, especiarias), além de uma diocese, com o objetivo de expandir o cristianismo pela região.
Essa lógica foi semelhante à implementada nas regiões atlânticas para a expansão do comércio e da fé cristã. No entanto, os contatos dos portugueses nessas regiões não duraram como os domínios na América. No Japão, eles foram acusados de expandirem o cristianismo entre os japoneses com o objetivo de querer colonizar o Japão, situação que deveria ser combatida, segundo os governantes japoneses. Em 1639, os portugueses foram expulsos do Japão.

Portugal e Espanha dividem o mundo

As conquistas espanholas acirraram a rivalidade com os portugueses. Nesse contexto, foram feitas várias negociações diplomáticas entre ambos os governos.
Em 1493, através da Bula Inter Coetera, acordo intermediado pelo papa Alexandre VI, a Espanha garantiu a posse da América, e Portugal assegurou o domínio sobre a costa africana e a rota oriental, que contornava a África.

Os portugueses reiniciaram as negociações e, em 1494, assinaram o Tratado de Tordesilhas, que estabeleceu uma linha imaginária a 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde. Com esse tratado, Portugal garantiu a posse de quase todo o Atlântico Sul, o que facilitava a defesa da rota oriental e parte da América.

INGLATERRA E FRANÇA NA DISPUTA COLONIAL

Embora não dispusessem de uma frota tão poderosa quanto a portuguesa e a espanhola na virada do século XV para o XVI, França e Inglaterra também tinham interesse em lucrar com a exploração e o comércio de produtos de outros continentes.
Ambos os países haviam saído recentemente de disputas pelo trono e, à medida que as monarquias se consolidavam e ganhavam mais poder, cresciam as condições de seguir os passos de Portugal e da Espanha, ignorando a divisão das terras do continente americano estabelecida por esses países em 1494, no Tratado de Tordesilhas. As notícias de descoberta de prata no território que hoje corresponde ao Peru e à Bolívia e também de ouro na região do atual México aumentaram ainda mais o desejo das monarquias francesa e inglesa de entrar na corrida colonial.
Em 1497, menos de um ano antes da chegada de Vasco da Gama a Calicute, o navegador veneziano Giovanni Caboto comandou uma frota inglesa com destino às Índias. Tal como Colombo, ele tentou encontrar uma rota seguindo para o oeste, mas navegando pelo norte do oceano Atlântico. Assim, Caboto chegou ao litoral do atual Canadá, provavelmente à ilha de Terra Nova. Os ingleses financiaram outras expedições de reconhecimento em seguida, mas só iniciaram a colonização desse território no final do século XVI e o comércio regular com as Índias Orientais em 1600.
Nesse meio-tempo, os navios ingleses, cada vez mais numerosos, atuaram principalmente no saque de embarcações espanholas.
Os franceses, por sua vez, chegaram ao continente americano em 1534. Em busca de uma rota para as Índias, a expedição liderada por Jacques Cartier chegou ao rio São Lourenço, no atual Canadá. Em sua terceira viagem, em 1541, Cartier fundou uma colônia onde atualmente fica a província canadense de Quebec.
No entanto, essa colônia não resistiu por muito tempo por causa do clima muito frio e dos ataques de povos indígenas que viviam no local. Apenas no século seguinte os franceses colonizariam com sucesso regiões nos atuais Canadá e Estados Unidos.
Ainda no século XV, piratas franceses promoveram diversos ataques às embarcações portuguesas e espanholas. No litoral
da América do Sul, na área onde atualmente fica o Brasil, saquearam cargas de pau-brasil e tentaram fundar colônias na baía de Guanabara (atual estado do Rio de Janeiro), entre 1555 e 1567, e na ilha em que hoje se localiza São Luís, capital do Maranhão, entre 1612 e 1615. Nas duas tentativas, foram derrotados pelos portugueses.

AS COMPANHIAS DE COMÉRCIO

O interesse dos europeus por especiarias e produtos do Oriente e da América preocupava os pioneiros no comércio marítimo. A exploração desse comércio era uma empreitada cara e, caso houvesse concorrência e aumento da procura, os preços de compra subiriam e os de venda cairiam, reduzindo o lucro nos negócios.
Por isso, os mercadores passaram a se associar em companhias de comércio para dividir os investimentos nos novos negócios. Eles reuniam recursos financeiros, construíam, compravam ou alugavam embarcações e contratavam pessoas para realizar as viagens e negociar as mercadorias. A principal característica dessas companhias era o monopólio comercial concedido pelo Estado, isto é, o direito exclusivo de comercializar determinados produtos ou de atuar em regiões específicas. A ideia dos governantes era garantir os lucros dos comerciantes, incentivando-os a ampliar os investimentos.
As companhias de comércio negociavam nas colônias produtos europeus tradicionais, como pescados, tecidos e vinho, e voltavam com mercadorias que eram raras e caras na Europa, como o cacau, o café, o chá e o tabaco.
Essas empresas também recebiam autorização do Estado para instalar povoamentos e fortificações nas regiões colonizadas e desenvolver o cultivo de produtos valorizados na Europa.
Algumas delas tinham poderes especiais, como fazer acordos diplomáticos com governantes e chefes locais, cunhar moedas e guerrear contra potências concorrentes e povos nativos que se opusessem à colonização.

OS DESDOBRAMENTOS DA EXPANSÃO ULTRAMARINA

A expansão marítima e comercial é um marco na história da humanidade. Ela permitiu o contato entre povos de diferentes continentes e estabeleceu um intenso intercâmbio de mercadorias, conhecimentos tecnológicos, hábitos e costumes de diversas culturas.
Para os europeus, a circulação de pessoas e produtos, até então restrita ao Mediterrâneo, deslocou-se para o Atlântico, e o sistema comercial da Europa integrou-se à África, à Ásia e à América. Além disso, possibilitou a formação de grandes impérios coloniais, resultado do processo de colonização, isto é, de ocupação, exploração e dominação de um ou mais Estados sobre outras regiões do mundo.
Espanhóis e portugueses estabeleceram domínios coloniais em regiões da América, do oceano Índico (como em Goa, hoje território indiano), do oceano Pacífico (como na região da Indonésia), e do mar da China (em Macau, hoje território chinês).
No século XVI, Inglaterra, França e Holanda também entraram na disputa por territórios e pelo controle do comércio marítimo. As principais colônias da Inglaterra situavam-se na América do Norte.
Os holandeses invadiram algumas colônias portuguesas no Oriente e ocuparam, durante 24 anos, parte do atual Nordeste brasileiro.
Os franceses colonizaram parte do atual Canadá, fundaram uma colônia no norte da América do Sul (a Guiana Francesa) e instalaram-se também nas Antilhas. Em 1555, tentaram estabelecer-se na região da baía de Guanabara, no atual estado do Rio de Janeiro, mas foram expulsos pelos portugueses.

As expansões inglesas, francesas e holandesas

Ingleses, franceses e holandeses também queriam participar das rotas comerciais alternativas inauguradas na Expansão Marítima. Chegar ao Oriente era um dos grandes objetivos, para isso buscaram diferentes caminhos. A Inglaterra e a França iniciaram suas navegações após Portugal e Espanha. O objetivo desses países era atingir o Oriente por uma passagem a noroeste da América.
O navegador Francis Drake foi o primeiro inglês a completar a viagem de circum-navegação do mundo, em 1580. Os ingleses tentaram fundar a primeira colônia inglesa na América do Norte (Carolina do Norte), em 1585, mas não obtiveram êxito. Já os franceses tomaram posse, em 1534, de regiões dos atuais Canadá e Estados Unidos e, em 1608, fundaram a cidade de Quebec, dando início à colonização do Canadá.
A Holanda foi o país que iniciou mais tarde suas navegações,
somente no final do século XVI. Mesmo assim, em apenas algumas décadas, os holandeses conquistaram territórios nos diferentes continentes. Ilhas Molucas, Java e Ceilão na Ásia; a região do Cabo, na África; Nova Amsterdã (atual Nova York), na América do Norte; Antilhas, na América Central; e o nordeste do Brasil, na América do Sul, por cerca de trinta anos.

A resistência ao domínio europeu no Oriente

A expansão colonial europeia teve grande impacto em muitos povos que viviam nos territórios conquistados. Para eles, as conquistas ultramarinas significaram violência, escravidão e intolerância. Uma vez integradas ao comércio global, as regiões colonizadas não podiam se desenvolver livremente, pois eram direcionadas a produzir somente o que interessava às metrópoles e sob condições impostas por elas.
Diante das guerras de conquista e das relações de exploração colonial, focos de resistência se insurgiram contra a presença europeia em regiões do Oriente. Na China, por exemplo, os portugueses tentaram se impor militarmente, conquistando entrepostos comerciais em 1521. Porém, forças chinesas destruíram embarcações portuguesas e se apropriaram de tecnologias militares, como canhões e armas de fogo.
Nas décadas seguintes, soldados portugueses fizeram novas investidas em território chinês e foram novamente derrotados. O governo chinês então proibiu a entrada de europeus em seus territórios e determinou a execução de muitos soldados capturados.
Foi apenas no final da década de 1550 que Portugal conseguiu negociar pacificamente a criação de um entreposto comercial em Macau, território no extremo sul da China.
O entreposto instalado em Macau cumpriu papel importante na organização do comércio português com o Japão durante o século XVI. No início do século XVII, contudo, ocorreu uma forte reação japonesa. O envio de missionários católicos para o Japão desagradou setores das elites locais, que iniciaram uma perseguição aos religiosos e promoveram a expulsão dos portugueses de seus portos.
Na metade do século XVII, apenas o porto da cidade japonesa de Nagasaki permitia a presença de comerciantes holandeses. O Japão permaneceu quase totalmente fechado ao Ocidente até o século XIX.









Renascimento urbano e comercial

Começa no século XI, no período conhecido como baixa Idade Média. O aumento da população, o desenvolvimento do comércio e das cidades e a ausência dos senhores feudais em virtude das Cruzadas provocam o enfraquecimento dos feudos e o crescimento do poder dos reis. Surgem as monarquias feudais de caráter nacional, multiplicam-se as guerras e ocorrem epidemias e surtos de fome.
Ganha impulso com a evolução dos transportes, o incremento das manufaturas, o aumento da produção de metais e a criação de uma economia monetária. A partir do século XI, aumenta o número de mercadores que realizam o comércio a longa distância entre os territórios da Europa Central, a Escandinávia e o Oriente. O transporte naval ganha impulso com a construção de caravelas, permitindo a navegação em alto-mar. Para proteger as caravanas, são construídas praças fortificadas, ou burgos. Eles se multiplicam nas rotas de comércio e próximo aos castelos feudais.

A Expansão Ultramarina Europeia

Várias foram as circunstâncias que determinaram a necessidade de a Europa expandir-se: os efeitos da crise dos séculos XIV e XV, o desejo da burguesia comercial em aumentar seu poder econômico, a centralização política que se deu na Baixa Idade Média, os avanços tecnológicos e, principalmente, a ambição das nações europeias em participar do lucrativo comércio oriental.
Portugal e Espanha foram os pioneiros da expansão ultramarina européia do século XV, e isso decorreu do fato de terem se constituído precocemente em estados centralizados.
Os portugueses dirigiram seus esforços expansionistas para o Atlântico Sul. Passo a passo os portugueses foram contornando a África, estabelecendo feitorias e fortificações militares por toda a costa africana. Finalmente, em 1498, Vasco da Gama desembarcou em Calicute, na Índia, passando Portugal a deter o controle sobre o comércio das mercadorias orientais. Dois anos depois, em 1500, Pedro Álvares Cabral e sua esquadra chegavam ao Brasil.
Uma vez unificada, a Espanha iniciou se processo expansionista. Patrocinando a viagem do genovês Cristóvão Colombo. O navegador italiano pretendia atingir o Oriente navegando para o Ocidente (defendia a esfericidade da terra). No dia 12 de outubro de 1492, chegou as Antilhas, na América, convencido, porém, de que alcançara as Índias. A conclusão de que as terras que Colombo descobrira eram um novo continente só veio em seguida, a partir dos estudos do cartógrafo Américo Vespúcio, cujo nome serviu para batizar as novas terras: América.
Portugal e Espanha dividiram o mundo entre si por meio do Tratado de Tordesilhas. Ocupadas com guerras, Inglaterra, França e Holanda lançaram-se as grandes navegações bem mais tarde; de início com atos de pirataria.

“Descobrimento do Brasil”

Há cinco séculos, no início de março de 1500, partiu de Lisboa, a principal cidade do Reino português, uma expedição de treze navios. Ia em direção a Calicute, nas Índias.
Era a maior e mais poderosa esquadra que saía de Portugal. Dela faziam parte mil e duzentos homens: famosos e experientes navegadores e marinheiros desconhecidos. Eram nobres e plebeus, mercadores e religiosos, degredados e grumetes. Parecia que todos os portugueses estavam nas embarcações que enfrentariam, mais uma vez, o Mar Tenebroso, como era conhecido o Oceano Atlântico.
A expedição dava prosseguimento às navegações portuguesas. Uma aventura que, no século XV, distinguira Portugal, por mobilizar muitos homens, exigir inúmeros conhecimentos técnicos e requerer infindáveis recursos financeiros. Homens, técnicas e capitais em tão grande quantidade que somente a Coroa, isto é, o governo do Reino português, possuía condições de reunir ou conseguir. Uma aventura que abria a possibilidade de obter riquezas: marfim, terras, cereais, produtos tintoriais, tecidos de luxo, especiarias e escravos. Uma aventura que também permitia a propagação da fé cristã, convertendo pagãos e combatendo infiéis. Uma aventura marítima que atraía e, ao mesmo tempo, enchia de medo, tanto os que seguiam nos navios, quanto os que permaneciam em terra.
O rei Dom Manuel I, que a seu nome acrescentara o título de "O Venturoso", confiou o comando da esquadra a Pedro Álvares Cabral. Dom Manuel esperava concluir tratados comerciais com o governante de Calicute, o samorim, para ter, com exclusividade, acesso aos produtos orientais. Sua intenção era, também, que fossem criadas condições favoráveis à pregação da religião cristã, por missionários franciscanos. A missão da frota de Cabral reafirmava, assim, os dois sentidos orientadores da aventura das navegações portuguesas: o mercantil e o religioso.
E, ao que parece, Dom Manuel esperava ainda, com essa expedição, consolidar o monopólio do Reino sobre a Rota do Cabo, o caminho inteiramente marítimo até as Índias, aberto por Vasco da Gama, em 1498. Era preciso garantir a posse daquelas terras do litoral atlântico da América do Sul. Terras que, de direito, pertenciam a Portugal, desde a assinatura do Tratado de Tordesilhas, em 1494.
Quarenta e cinco dias após a partida, na tarde de 22 de abril de 1500, um grande monte "mui alto e redondo" foi avistado e, logo em seguida, "terra chã com grandes arvoredos", chamada de Ilha de Vera Cruz pelo Capitão, conforme o relato do escrivão Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal.
Em Vera Cruz os portugueses permaneceram alguns dias, entrando em contato com seus habitantes. Em 26 de abril, frei Henrique de Coimbra, o chefe dos franciscanos, celebrou uma missa observada, a distância, por homens "pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos, andam nus, sem nenhuma cobertura, nem estimam nenhuma coisa cobrir, nem mostrar suas vergonhas, e estão acerca disso com tanta inocência como têm em mostrar o rosto", na descrição de Caminha.
Os portugueses não puderam com eles conversar, porque nem mesmo o judeu Gaspar - o intérprete da frota - conhecia a língua que falavam. Neste momento de encontro, conhecido pelo nome de Descobrimento, a comunicação entre as culturas europeia e ameríndia tornou-se possível, somente, por meio de gestos. Duas culturas apenas se tocavam, abrindo margem às interpretações que ressaltavam as diferenças entre elas. Assim, quando um dos nativos "fitou o colar do Capitão, e começou a fazer acenos com a mão em direção à terra, e depois para o colar", Caminha concluiu que era "como se quisesse dizer-nos que havia ouro na terra".

segunda-feira, 25 de setembro de 2023

O MUNDO MULTIPOLAR

 Na última década do século XX, o mundo bipolar, característico do antagonismo global entre EUA e URSS, foi substituído por uma nova ordem mundial, em que o confronto entre sistemas capitalista e socialista cedeu lugar à disputa dentro do próprio capitalismo. Essa disputa vem se desenvolvendo por meio da formação de blocos regionais de poder político e econômico.

Embora os EUA tenham emergido da Guerra Fria como única superpotência mundial, e ainda possuam a maior economia e o maior poder militar do globo, sua autoridade política no mundo está em declínio. Além disso, outras nações se desenvolveram de forma acelerada, como Japão, Alemanha, França e Inglaterra, passando de países dependentes a concorrentes dos EUA. Nessa nova conjuntura de distribuição do poder econômico, destacam-se três polos: o americano, liderado pelos EUA; o europeu, constituído pelos países da União Europeia; e o oriental, cujo centro é o Japão. Essa nova configuração do poder é conhecida como mundo multipolar.

A formação dos polos econômicos

A formação de diferentes blocos econômicos ocorreu por meio de tratados e acordos oficiais entre os governos ou de maneira informal, ou seja, não institucional. A finalidade de um bloco econômico é ampliar e facilitar as trocas comerciais entre os países-membros. Os meios para atingir esses objetivos implicam na regulação ou eliminação de tarefas alfandegárias e das taxas de impostos sobre os bens e serviços negociados, além da adoção de uma política que visa a solução comum para eventuais problemas comerciais que podem ocorrer entre os países de determinado bloco.
O mais antigo e bem estruturado bloco econômico formou-se na Europa Ocidental, ainda no período da Guerra Fria. A União Europeia, como é chamado esse bloco, começou a se formar logo após a Segunda Guerra Mundial. No início, limitava-se a um setor econômico, formando a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (Ceca). Depois, sua expansão abrangeu toda a economia dos países-membros, surgindo a Comunidade Econômica Europeia (CEE) com a assinatura do Tratado de Roma, em 1957. Nessa época, seis países faziam parte da organização, que ao longo do tempo foi ampliada, recebendo a adesão de outros países europeus.
Em fins 1991, esses países assinaram o Tratado de Maastricht, mudando o nome da CEE para União Europeia (EU). O tratado também estabelecia a adoção de uma moeda única, o Euro, que passou a vigorar a partir de 2002 na maioria dos países, com exceção do Reino Unido, Dinamarca e Suécia. Para o controle cambial da nova moeda, foi criado o Banco Central Europeu, sediado em Frankfurt, na Alemanha.
A integração dos países europeus continua ocorrendo de forma progressiva, com a criação de uma legislação social e ambiental comum, assim como um sistema de defesa unificado. O órgão político de maior autoridade da União Europeia é o Parlamento Europeu, no qual são tomadas as decisões que afetam os países-membros.

Outros blocos econômicos

Além da União Europeia, existem outros blocos econômicos criados mais recentemente. Veja a seguir alguns deles.
Acordo Americano de Livre Comércio (NAFTA, na sigla em inglês), formado em 1922 por EUA, Canadá e México. Com esse acordo, entre outros objetivos, esses países se comprometeram a derrubar barreiras alfandegárias e ampliar as exportações e as prestações de serviço entre si.
Mercado Comum do Sul (Mercosul), união aduaneira entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, criada em 1991, que posteriormente teve a adesão de outros países na condição de associados, como Chile, Bolívia e Venezuela.
Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico (Apec), criado em 1989. Na região conhecida como bacia do Pacífico, está localizado um dos mais dinâmicos polos da economia capitalista. Composta por mais de vinte países da Ásia, Oceania e América, esse bloco econômico é liderado pelo Japão, embora sua hegemonia seja ameaçada pela participação de países como EUA e China. O bloco asiático não se constitui como um processo de integração institucionalizado, tal como a União Europeia, mas sim um conjunto de economias articuladas que tendem a ser complementares.

A globalização

De maneira geral, a globalização designa a crescente integração e interdependência da economia mundial, que se manifesta na expansão das transações comerciai, no rápido avanço tecnológico dos meios de comunicação e de transporte, e também na disseminação em escala planetária dos valores morais e políticos originários do mundo ocidental. Assim, a globalização pode ser definida como o aceleramento da formação de um sistema mundial cada vez mais integrado nos níveis da produção (de mercadorias, de serviços e de conhecimento), da comercialização e das transações financeiras.
A globalização não é um fenômeno recente, mas seu desenvolvimento se acelerou no início da década de 1990. Seu estágio atual pode ser caracterizado pelo aumento vertiginoso dos fluxos de rocas de mercadorias, capital e serviços entre as nações e entre os blocos econômicos.
Embora possa parecer, a globalização não criou uma mundialização homogênea da vida econômica e social, pois ela é seletiva e visa integração apenas de algumas regiões, atividades econômicas e grupos sociais, enquanto exclui a maioria da população mundial, deixando-as às margens do sistema. Isso causa uma grande concentração de riquezas, aumentando as desigualdades entre os Estados. Enquanto no Japão, por exemplo, muitos têm acesso a aparelhos de última geração, na Índia, grade parte da população vive sem fazer o uso dessas novas tecnologias.

CONFLITOS RECENTES NO MUNDO

A configuração do mundo multipolar na eliminou as enormes desigualdades sociais e econômicas entre os países, nem as que existem no interior deles. Além disso, por todo o mundo, vêm ocorrendo conflitos pela autonomia política e também de ordem étnica e religiosa. Veja.

Conflitos na Caxemira

No território da Caxemira, na Índia, vários grupos étnicos mulçumanos lutam pelo reconhecimento de suas nacionalidades, geralmente por meios pacíficos. Outros, entretanto, recorrem ao terrorismo a fim de transformar a Caxemira em um Estado independente, governado sob leis islâmicas.
Alguns desses grupos terroristas são acusados pelo governo indiano de receberem apoio do governo paquistanês, que é um tradicional aliado dos EUA. Por causa dessas acusações, a Índia e o Paquistão enfrentam conflitos diplomáticos, o que preocupa a comunidade internacional, já que ambos possuem arsenal atômico. Além disso, a Caxemira transformou-se em rota de tráfico de armas, que chegam a diversos grupos terroristas do Oriente Médio.

Tensões entre a Coreia do Sul e a Coreia do Norte

Desde o final da Guerra da Coreia, em 1953, permanece uma tensão entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul. A violência dessa guerra, que possuía caráter ideológico (capitalistas contra socialistas), gerou grandes empecilhos para que as duas nações convivessem pacificamente. Atualmente, a Coreia do Sul, capitalista, é um grande polo industrial e tecnológico da região, aliado ao capital do Japão e dos EUA.
A Coreia do Norte, por sua vez, é um país socialista que desenvolve um programa nuclear, causando preocupações em outras nações, principalmente em seus vizinhos japoneses e sul-coreanos. Os testes nucleares realizados em 2006 e em 2009 foram repudiados pelo governo de vários países, que temem a retomada da guerra entre as duas nações rivais. Apesar disso, tentativas de negociar a paz entre as duas Coreias vêm sendo promovidas pela comunidade internacional.

Lutas pela independência do Tibete

O Tibete foi anexado pela China em 1951, tornando-se um Estado nominalmente autônomo, mas governado pelos chineses. A partir de então, o governo socialista chinês passou a enfrentar vários grupos tibetanos, como proprietários de terra, que lutavam contra a desapropriação e coletivização de suas terras. Em 1959, um levante de tibetanos contra o governo chinês foi duramente reprimido, deixando milhares de mortos.
Nessa época, grupos de chineses radicais realizaram um “genocídio cultural”, destruindo templos e monastérios budistas do Tibete. Atualmente, muitos tibetanos têm reivindicado a independência de seu país de forma pacífica, acusando a China de cometer atos violentos contra seu povo. Um deles é Tenzi Gyatso, o Dalai Lama, monge budista que é herdeiro do trono do Tibete.

Conflitos étnicos em Ruanda

Tutsis e hutus são dois grupos étnicos, culturalmente semelhantes, que habitam a África Central. Em Ruanda, essas duas etnias entraram em conflito por causa da segregação implantada pelo governo colonial belga, no início do século XX. Nessa época, os tutsis foram escolhidos pelos colonizadores para comporem a elite governamental, relegando os hutus à servidão.
Em 1959, os hutus iniciaram um levante popular, que derrubou a aristocracia tutsi para, em 1962, proclamar a independência do país. Diante disso, milhares de tutsis se refugiaram na República Democrática do Congo e em outros países da região. A minoria tutsi de Ruanda passou a ser cada vez mais hostilizada, até que uma guerra civil eclodiu no início da década de 199. Em 1994, hutus radicais assassinaram cerca de 800 mil pessoas, entre hutus moderados e tutsis. Depois de muitos massacres e migrações forçadas, o poder central foi tomado por um grupo paramilitar tutsi – a Frente Patriótica Ruandesa. Atualmente, Ruanda é uma democracia multipartidária, governada por uma coalizão de ambas as etnias que tenta reorganizar o país.

Grupos paramilitares na Colômbia


A Colômbia é uma das regiões mais tensas da América do Sul, onde atuam grupos paramilitares como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), de orientação socialista. Fundada na década de 1960, as FARC vêm disputando o poder político da Colômbia desde então com o apoio de parte da comunidade rural.
As FARC dominam várias regiões da floresta amazônica, entrando em constantes choques com o exército colombiano e com outros grupos paramilitares. A situação no país é agravada pela forte influência de narcotraficantes e pelos interesses estratégicos dos EUA, que têm buscado aumentar sua influência militar na região.

Movimento libertário no México

Em 1994, formou-se no estado mexicano de Chiapas o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), formado por mexicanos excluídos da sociedade, principalmente indígenas. De ideologia libertária e anticapitalista, o movimento critica a situação dos indígenas e exige maior participação política para o povo mexicano.
No ano da sua formação, o EZLN lutou contra o exército mexicano e conquistou a autonomia para os indígenas mexicanos. Atualmente, o grupo atua pacificamente, percorrendo todo o país, a fim de divulgar os problemas do povo e reivindicar o respeito aos direitos dos indígenas.

Guerras nos Bálcãs

A Iugoslávia era habitada por povos de várias etnias que viviam espalhadas pelas diversas repúblicas que formavam esse país, o qual também abrigava três religiões (católica, cristã-ortodoxa e mulçumana). Toda essa multiplicidade de povos e culturas se manteve unida enquanto durou o regime centralizado pelo Partido Comunista, mas, com a crise dos regimes socialistas no Leste Europeu, os sentimentos nacionalistas e separatistas desses povos foram despertados.
Em 1991 começou a desagregação do país, mesmo com a oposição da Sérvia, que desejava manter a Iugoslávia unida e sob a sua direção. Em 1992, as lideranças muçulmanas e croatas da Bósnia-Herzegóvina declararam sua independência. No entanto, nessa república havia uma importante minoria sérvia (31,4%) que, contando com apoio iugoslavo, formou milícias para combater os mulçumanos e croatas.
Teve início, então, uma sangrenta guerra civil em que morreram cerca de 300 mil pessoas em combates e em práticas de limpeza étnica,, realizadas principalmente pelos bósnio-sérvios. Com a intervenção de forças da ONU, em 1995, um acordo de paz foi firmado, e a Bósnia-Herzegóvina se tornou independente, mas dividida em duas repúblicas autônomas: uma para os muçulmanos e croatas, e outra para os sérvios-bósnios.
Em 1998, surgiu novo conflito, dessa vez na província sérvia de Kosovo. A Iugoslávia, que a essa altura contava apenas com as repúblicas da Sérvia e Montenegro, tentou reprimir o movimento separatista dos albaneses mulçumanos, a maioria da população do Kosovo. A guerra acabou com o bombardeio da Sérvia pelas forças da OTAN lideradas pelos EUA, 1999. Com o fim da ocupação pela OTAN, kosovo ficou sob a tutela da ONU, declarando sua independência em 2008.

Disputas no Cáucaso

Desde o início dos anos 1990,ocorreram conflitos na região do Cáucaso envolvendo grupos étnicos que, com a extinção da URSS, passaram a exigir o reconhecimento de suas nacionalidades e a formação de repúblicas independentes. Isso vem ocorrendo na Geórgia, república independente que fazia parte da antiga URSS. No território georgiano, etnias da Ossétia do Sul e da Abkházia lutam pela sua independência, com o apoio do governo da Rússia.
Em 2008, o exército russo interveio em defesa dos interesses separatistas dos ossetas que habitam a Ossétia do Sul. Iniciou-se, então, uma guerra entre a Geórgia e a Rússia, que resultou na morte de centenas de pessoas. As montanhas do Cáucaso continuam sendo palco de conflitos entre grupos separatistas, inclusive no território russo, onde a etnia dos chechenos luta pela formação da República da Chechênia.

Iniciando o século XXI

Se Phileas Fogg, personagem do romance do francês Júlio Verne, escrito no século XIX, fizesse hoje uma nova Volta ao mundo em 80 dias, com certeza não deixaria de notar dois fenômenos marcantes que afetam o planeta: a explosão tecnológica e a explosão demográfica. E perceberia, inclusive, que ambos estão geograficamente separados entre si.

O desenvolvimento da tecnologia se concentra nos países desenvolvidos situados no Hemisfério Norte. Quase todos eles têm pequenas taxas de crescimento demográfico, uma população que está estabilizada ou mesmo diminuindo. Por outro lado, o aumento populacional ocorre nos países subdesenvolvidos localizados no Hemisfério Sul, que têm sido pouco ou nada beneficiados pela atual revolução tecnológica. Ao lado de aspectos positivos, nesses países as técnicas inovadoras têm gerado vários problemas ou agravado os já existentes, como a concentração de renda, a alta do desemprego e o incremento da exclusão social. Por sua vez, a explosão demográfica também contribui para que novas doenças se generalizem. É importante ressaltar que, em relação ao crescimento demográfico, o problema não está na opção das famílias por terem filhos ou não, mas sim na falta de acesso delas a condições básicas de vida.
As projeções estimam que, em 2025, a economia mundial estará controlada por apenas quinhentas empresas multinacionais de origem norte-americana, europeia e japonesa. A população mundial, que é atualmente de seis bilhões de pessoas, atingirá então um patamar de 8,5 bilhões de habitantes. Cerca de 90% do crescimento populacional ocorrerá nas regiões asiática, africana e latino-americana. Esses dois processos paralelos e excludentes – avanço da tecnologia e crescimento populacional – são parte integrante daquilo que se convencionou chamar de Nova Ordem Mundial.

Que Nova Ordem Mundial é essa?

A expressão Nova Ordem Mundial foi usada pela primeira vez pelo presidente George Bush (pai), após a vitória norte-americana na Guerra do Golfo, em 1991. O governante se referia à nascente situação surgida com o fim da Guerra Fria e a ascensão dos Estados Unidos à posição de única superpotência global do planeta.
Essa Nova Ordem Mundial, do século XXI teria seu funcionamento assegurado, em última instancia, pelo avassalador poderio militar norte-americano. Esse sistema nascente ficou conhecido também como unimultipolar, porque combina a liderança de uma única superpotência global com a existência de várias potências de âmbito regional. O poder maior é representado pelos Estados Unidos, seguidos por poderes de importância desigual: a China na Ásia Oriental, a Índia na Ásia do Sul, a Rússia na Eurásia, a Alemanha na Europa, o Brasil na América do Sul e a África do Sul na África subsaariana.

As faces da globalização

A rigor, a globalização não é um fenômeno recente. Suas origens, segundo alguns analistas, remontam ao século XV, quando a expansão marítima europeia levou à formação de um mercado mundial que se estendeu por todos os continentes do globo. A mundialização da economia, conhecida como Revolução Comercial, continuou no século XVIII com a Revolução Industrial. Esse processo atingiu o auge no final do século XX, com a incorporação da Rússia, da Europa Oriental e da China ao mercado mundial. O planeta se tornou verdadeiramente uma aldeia global, interligada pela revolução ocorrida na ciência, na tecnologia, nos transportes, na comunicação. A globalização é um fenômeno controverso, com pontos positivos e negativos, elogiado por uns e atacado por outros. No processo de globalização atual, destacam-se três aspectos principais, que veremos a seguir.
Existe uma globalização econômica, que é resultado da revolução científica e tecnológica em curso, da expansão do comércio, dos serviços e das finanças. Esse processo se caracteriza pela derrubada das fronteiras dos Estados, pela abertura dos mercados, pela interdependência dos países e pela retirada do Estado das atividades econômicas. As empresas multinacionais, os grandes bancos e os investidores capitalistas são os principais agentes da globalização econômica. A informática, a internet e a telefonia celular contribuem para acelerar e dinamizar a economia do mundo. Para se ter uma ideia do que significa a globalização econômica, bastaria dizer que em meio século o comércio mundial cresceu cem vezes, saltando de sessenta bilhões para seis trilhões de dólares no ano 2000. Por outro lado, a globalização não é um processo homogêneo e te beneficiado principalmente os Estados Unidos, a União Europeia e o Japão. Seus críticos afirmam que ela tem intensificado a concentração de renda, aumentando, assim, as taxas de desemprego e expandindo os níveis de exclusão social.
A internet possibilitou ao mundo dos negócios uma enorme integração entre empresas de todo o planeta. Além disso, grande parte das companhias de todo o mundo tem página na internet. Assim, é possível que qualquer indivíduo tenha acesso a conhecimentos mais aprofundados sobre um produto ou serviço, sem precisar ir até o local de compra. A facilidade com que se tem acesso a qualquer assunto atualmente é outra forte característica da internet, que é uma enorme fonte de pesquisa. Apesar de todas essas comodidades, a necessidade de saber lidar com um computador gera hoje um fenômeno chamado “exclusão digital”. A maior parte da população do planeta ainda não tem acesso a computadores, principalmente por causa do alto custo desse eletrônico, mas o mercado de trabalho hoje exige que os funcionários tenham conhecimentos de informática. Dessa forma, aqueles que fazem parte dessa exclusão digital tendem a ser excluídos também social e economicamente.
Está em curso também uma globalização cultural, bastante interligada com a globalização econômica e a revolução tecnológica. Sua manifestação mais visível é o processo de padronização e uniformização dos produtos culturais, principalmente os de origem anglo-americana. Nesse processo, o inglês está se tornando a língua franca ou o idioma universal. Os hábitos de consumo, os padrões de comportamento e idiomas locais estão sendo bastante afetados por um processo de “americanização” que atinge todos os campos do conhecimento humano, desde a técnica e a ciência até as letras, as artes e a filosofia. Os críticos desse tipo de globalização afirmam que a exportação da cultura ocidental é uma política deliberada e sutil de conquista dos “corações e mentes” de outros povos e culturas, transformando-se num instrumento de consolidação da hegemonia mundial dos Estados Unidos.
Existe ainda uma globalização política, intimamente relacionada com as globalizações econômica e cultural. Esta última forma de globalização se caracteriza pelo predomínio dos Estados Unidos coo a única superpotência de todo o planeta. Nesse novo sistema político do século XXI, alguns países rebeldes são globalizados “na marra”, por via da guerra e da ocupação militar, como aconteceu com o Afeganistão e o Iraque. Esses países eram apelidados pelos governos norte-americanos de Eixo do mal. Existem, porém, outras nações que procuram resistir a essa globalização forçada, como é o caso de Cuba, do Irã e da Coréia do Norte.
Finalmente, diversas entidades não estatais procuram se organizar a sociedade internacional para oferecer resistência a um tipo de globalização que consideram elitista, desigual e excludente. São entidades sociais como os movimentos ambientalistas, organizações não governamentais (ONGs), partidos políticos, sindicatos trabalhistas e as mais variadas associações que buscam oferecer alternativas ao atual processo de globalização econômica, cultural e política. O Fórum Social Mundial tem sido um dos centros de troca de ideias e propostas mais aglutinador dessas entidades.

Os tipos de regionalização


Junto com a globalização está ocorrendo também no planeta um processo de regionalização. Na verdade, globalização e regionalização são as duas faces da mesma moeda. Dentro do processo de globalização, países de determinados continentes procuram se juntar a seus vizinhos para formar os blocos econômicos regionais. Esses blocos de países procuram abolir diversas barreiras, como as alfandegárias, que os separam para expandir suas relações comerciais e facilitar a livre circulação de mercadorias, capitais, serviços e pessoas. Podemos distinguir alguns tipos de blocos econômicos regionais, conforme veremos a seguir.
A zona de livre comércio reduz ou elimina as tarifas protecionistas internas, permitindo a ampla circulação de mercadorias entre todos os países-membros. Esse tipo de bloco não permite a livre circulação de pessoas. Como exemplo temos o Nafta; o Acordo de Livre Comércio das Américas (Alca), que, se vier a s concretizar, englobará 34 países do continente americano; e o bloco da Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico, que criará uma área de livre comércio entre 20 países dessa região e deve ser efetivado até 2020.
A união aduaneira procura igualmente baixar ou suprimir as tarifas internas que dificultam a expansão do intercâmbio entre os países-membros desse bloco comercial. Mas, além disso, estabelece também uma tarifa alfandegária externa única para seus integrantes. Qualquer produto vindo de fora do bloco econômico deve pagar o mesmo imposto de importação para entrar em qualquer um dos países-membros. Tal imposto é chamado de Tarifa Externa Comum (TEC). Esse é o caso do Mercado Comum do Sul (Mercosul), formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, em 1991. Outro exemplo é o Pacto Andino (ou Comunidade Andina), instituído pela Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, em 1969.
A união econômica e monetária tem como único exemplo na atualidade a União Europeia (EU). Ela adotou como moeda única o euro, que em 2005 já era usado por 12 dos 25 países que integram o bloco.
Essa divisão por tipos de bloco, contudo, é complexa, pois eles estão em constante mudança e tendem a mesclar essas características que os distinguem.
Para se ter uma ideia do peso econômico dos blocos regionais, bastaria mencionar o seguinte. Os blocos mais importantes do planeta são os da América do Norte, da Comunidade Europeia e da Ásia Oriental, que são liderados, respectivamente, pelos Estados Unidos, Alemanha e Japão. Esses três blocos dominam conjuntamente 75% do comércio mundial.

O neoliberalismo

O prefixo neo é utilizado no vocábulo neoliberalismo para distinguir o liberalismo atual do antigo liberalismo, que influenciou políticas econômicas desde antes da Revolução Industrial até a crise mundial do capitalismo de 1929. O velho liberalismo defendia a economia de mercado e a liberdade de comércio e produção. Defendia também o “Estado mínimo”, visto como um “mal necessário” para preservar o direito de propriedade e garantir o respeito à lei e à ordem. O Estado liberal era “mínimo” porque não interferia nas atividades econômicas nem em questões sociais, como os baixos salários, as condições de trabalho e o desemprego.
Durante a década de 1930, o Estado voltou a adotar uma política intervencionista para enfrentar a crise econômica e social agravada pela Grande Depressão. Os governos realizam obras públicas para reativar a economia e criar empregos, tomavam medidas para evitar a falência das empresas e o fechamento das fábricas e adotavam uma legislação social para combater a miséria,a fome e a exploração do trabalho. Essa política ficou conhecida como Keynesianismo, em homenagem a seu formulador, o economista inglês John Mynard Keynes. A política de bem-estar social (welfare state), concebida por Keynes, foi adotada por muitos dos países desenvolvidos depois da Segunda Guerra Mundial.
O neoliberalismo surgiu na década de 1970 como a política econômica como uma política econômica do capitalismo na época da globalização. Este novo liberalismo prega o abandono da política econômica do bem-estar social e o retorno às características do liberalismo econômico, entre elas, a redução do papel do Estado e sua retirada da economia. Para os neoliberais, o Estado não soluciona os problemas, mas, ao contrario, o Estado é o grande problema. Na sua visão, o Estado se tornou caro demais e é preciso retirá-lo das costas dos contribuintes, já sobrecarregados de tributos. O neoliberalismo defende a abertura da economia, a abolição das tarifas alfandegárias e a liberação dos mercados nacionais à livre circulação de mercadorias, serviços e capitais estrangeiros. Seu grande objetivo é a integração e a interdependência da economia em âmbito global. Essa liberalização deve ser feita em escala mundial, por cima das fronteiras das nações, tendo como agentes os grandes bancos e as empresas multinacionais. Cabe ao Estado “enxugar” a máquina governamental, isto é, cortar os gastos públicos e reduzir as despesas com políticas sociais.
Segundo a visão neoliberal, o governo deve se desfazer das empresas e serviços públicos, transferindo-os para a iniciativa privada. Esse é o processo de privatização da economia. A partir daí, a única função do Estado seria deixar o mercado se auto-regular sem nenhuma interferência, mas procurando coibir os abusos e evitar os excessos da livre-concorrencia. Problemas sociais como a concentração de renda, a redução dos postos de trabalho e o aumento do desemprego seriam resolvidos naturalmente com o desenvolvimento da economia, a expansão da produção, a redução dos impostos e o incremento do comércio externo. Exemplos clássicos de neoliberalismo foram políticas econômicas adotadas pela primeira-ministra conservadora Margaret Thatcher, na Grã-Bretanha, e pelo presidente republicano Ronald Reagan, nos Estados Unidos, durante a década de 1980.
O desmanche do Estado de bem-estar social nesses países se deu sob a alegação de que a política keynesiana estaria se mostrando inflacionária à medida que as despesas públicas subiam e a capacidade fiscal estagnava. Segundo Thatcher e Reagan, a redução do crescimento significava problemas para o Estado de bem-estar social. Na realidade, a ideia de Estado de bem-estar social era algo que os países capitalistas utilizavam para conter a difusão das ideias e o avanço do comunismo pelo mundo. Mas, como no início da década de 1980 os regimes comunistas já estavam em declínio, os governos da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos não viam mais motivos para evitar um enorme aumento na concentração de renda.

O desequilíbrio demográfico

Segundo o historiador Paul Kennedy, desde o aparecimento das primeiras comunidades humanas até o ano de 1825 a população mundial atingiu o número de um bilhão de habitantes. Nos cem anos seguintes ela saltou para dois bilhões de pessoas e meio século depois, em 1975, havia dobrado para quatro bilhões. Em 2005, a população do planeta ultrapassava seis bilhões de seres humanos. Daí para frente as previsões demográficas são divergentes. A estimativa mais provável é que, em 2025, nosso planeta terá por volta de 8,5 bilhões de habitantes. Os demógrafos afirmam que a curva de crescimento tenderá a se estabilizar por volta de 2050 em torno dos nove bilhões de pessoas.
Do total previsto, cerca de 7,5 bilhões estarão concentrados nos países subdesenvolvidos da Ásia, África e América Latina. Cerca de 1,5 bilhão habitará os países desenvolvidos do Hemisfério Norte. É de se resaltar que, na metade deste século, somente a Índia terá uma população de 1,5 bilhão, ultrapassando inclusive a China, que terá 1,4 bilhão de habitantes. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a previsão é que, até meados do século XXI, mais de 90% da população mundial estará vivendo nas áreas hoje subdesenvolvidas do Hemisfério Sul. Não é difícil prever os efeitos dessa explosão demográfica na propagação da miséria e da fome, na devastação do meio ambiente e dos recursos naturais, bem como na transmissão de doenças epidêmicas, caso não haja uma mudança na redistribuição de renda entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos e entre os próprios habitantes, um grande investimento na área de saúde e uma nova mentalidade da relação entre o ser humano e o meio ambiente.

As migrações populacionais

Um dos reflexos do desequilíbrio demográfico é o aumento crescente das migrações populacionais dos países subdesenvolvidos para os países desenvolvidos. N realidade, houve como que uma radical inversão na direção dos fluxos migratórios. No passado havia uma certa coincidência geográfica entre o desenvolvimento tecnológico e o crescimento demográfico. Ambos os processos ocorreram principalmente na Europa. O resultado foi que o excedente populacional europeu migrou para as regiões periféricas do globo, indo povoar as Américas, a África do Sul, a Austrália e a Nova Zelândia. A primeira onda migratória ocorreu nos séculos XVI-XVII, após a expansão marítima europeia e a colonização dos novos continentes. A segunda onda transcorreu nos séculos XIX-XX quando a industrialização e as guerras levaram mais de cinquenta milhões de europeus a buscar uma nova vida e condições de trabalho nas terras de além-mar.
As correntes imigratórias atuais percorrem, desde o final do século XX, exatamente o caminho inverso. Os contingentes humanos partem da América Latina, da África, do Oriente Médio e da Europa oriental para a América do Norte, a Europa ocidental, o Japão e a Oceania. Sob a pressão de desemprego, da fome, da miséria e da exclusão social, os novos imigrantes vão da periferia para o centro em busca de empregos e de uma existência mais digna. Além disso, uma parte dos imigrantes deste século é obrigada a deixar sua terra natal fugindo das guerras externas, dos conflitos civis e das perseguições étnicas e religiosas. O fato é que, em consequência desta terceira onda migratória, mais de cem milhões de estrangeiros vivem, hoje, de forma legal ou clandestina, nos países desenvolvidos.
Nestes países desenvolvidos, setores sociais ultraconservadores desenvolveram uma reação hostil diante das levas de imigrantes, assumindo atitudes excludentes, discriminatórias ou violentas contra os trabalhadores estrangeiros e suas famílias. Os atuais movimentos de extrema-direita, como os neonazistas, os skinheads e os adeptos do poder branco (White powers), dirigem sua propaganda, sua ação e seus preconceitos étnicos e raciais contra esses recém-chegados “diferentes”. Aliás, é importante resaltar que esse fenômeno anti-social não se restringe aos países da Europa e aos Estados Unidos. Ele tem ocorrido também aqui no Brasil e suas principais vítimas são esses “outros” representados pelos migrantes nordestinos, pelos homossexuais e pelos judeus.

A degradação ambiental

As explosões tecnológica e demográfica, e principalmente o modo como a sociedade lida com o os recursos naturais, são responsáveis por uma série de graves impactos ambientais no planeta. Isso significa que a responsabilidade pelo processo de degradação ambiental é compartilhada, ainda que em medidas desiguais, tanto pelos países desenvolvidos quanto pelos países subdesenvolvidos. A degradação ambiental afeta a terra, a água, o ar e as espécies vivas, estando em curso tanto no Hemisfério Norte quanto no Hemisfério Sul. Neste novo século defrontamos com diversos problemas em âmbito regional e global, que requerem soluções baseadas na cooperação internacional. Alguns desses problemas são, por exemplo, a exploração predatória de recursos naturais não-renováveis; a poluição do solo, da atmosfera, dos rios e oceanos; a destruição da fauna e da flora; a extinção de espécies do mundo animal e vegetal; as alterações climáticas que podem colocar em risco a própria existência humana na Terra.
Atualmente, cerca de 24% das espécies de mamíferos e 12% das aves do planeta estão ameaçadas de extinção. O desmatamento do solo pelas queimadas e a destruição das florestas pela extração de madeira, atividades de mineração, construção de barragens e atividades agropastoris já eliminaram quase 50% da cobertura vegetal do globo terrestre. De um total de 62 milhões de km². Nas últimas décadas foram destruídas mais de 20% das florestas tropicais asiáticas, africanas e latino-americanas. É difícil acreditar que 40% dos seres humanos não dispõem de água suficiente para suas mais elementares necessidades, por causa da desertificação do solo, da contaminação dos rios e do esgotamento dos lençóis freáticos.
Existem vários outros graves impactos produzidos pela ação predadora da sociedade sobre a natureza. Um dos mais importantes é denominado efeito estufa, ou seja, o aumento da temperatura média do planeta, que pode causar o degelo das regiões polares e a desertificação de áreas continentais. Uma das prováveis consequências do aquecimento global seria a elevação do nível dos oceanos, inundando muitas regiões costeiras, provocando o despovoamento de cidades litorâneas e a destruição de áreas cultivadas em todos os continentes. Somente a título de exemplo, diversos especialistas afirmam que a camada de gelo do Oceano Ártico ficou 40% mais fina e perdeu 14% de sua área total nas últimas décadas.
Diante desses desafios, é necessário desenvolver nas novas gerações uma consciência ecológica voltada para a preservação ambiental. A defesa de um ecossistema equilibrado é fundamental para a continuidade da vida no planeta, seja ela humana, animal ou vegetal. Nesse contexto assume bastante relevância a noção de desenvolvimento sustentável, ou seja, sem que os recursos naturais consumidos se esgotem e o meio ambiente seja danificado.
É preciso colocar um freio à busca suicida de um crescimento a todo custo e combater a mentalidade de um consumismo egoísta e irresponsável. É necessário difundir uma nova visão de mundo baseada num princípio altruísta que pode ser resumido numa única frase: “sabendo usar não vai faltar”. Assim, a ideia de desenvolvimento sustentável defende o princípio de que as gerações atuais precisam procurar atender suas necessidades básicas com parcimônia, evitando destruir o patrimônio natural que deve garantir a sobrevivência das gerações futuras em nosso planeta.

A globalização: internacionalização do capitalismo

 Desde seu aparecimento, no início dos tempos modernos, o capitalismo tendeu para a internacionalização. Essa tendência já se manifestava nos séculos XV XVI, com as Grandes Navegações abrindo os caminhos para a expansão do capitalismo comercial em escala mundial.

No século XIX, o processo de internacionalização tomou a forma de imperialismo, caracterizado pela expansão do capital financeiro e pela divisão internacional do trabalho. No fim do século XX, esse processo ganhou novos contornos. Devido ao avanço tecnológico, sobretudo nas áreas de informática e de comunicações, capitais e mercadorias passaram a circular de forma mais intensa por todo o mundo, dando origem à globalização.
Esse processo está conduzindo os povos do mundo uma interdependência cada vez maior. Mas a riqueza gerada pela globalização não chega a ser apropriada de forma igualitária por todas as nações, o que amplia os contrastes entre países ricos e pobres, gerando conflitos ao redor do mundo.

Uma nova ordem mundial

Após a Segunda Guerra Mundial, foi inaugurada outra etapa na internacionalização do capitalismo, comandada pelo poder militar e econômico dos Estados Unidos, cuja moeda – o dólar – se converteu na base do sistema monetário mundial. Essa fase, encerrada na década de 1970 em consequência das crises do petróleo (1973 e 1979), já foi chamada de Era de Ouro do capitalismo, em virtude dos altos índices de crescimento da produção e de geração de empregos, apresentados pelos países capitalistas industrializados.
Durante os “anos dourados”, contudo, a humanidade viveu sob o risco permanente de uma guerra nuclear, que ameaçava destruir todo o planeta. Nesse período, como vimos, o mundo estava dividido em dois grandes blocos antagônicos, separados por um abismo ideológico. Com a economia estatizada, o bloco soviético era uma barreira intransponível para a internacionalização do capital sob a égide dos EUA.
Com a desintegração da União Soviética e o fim da Guerra Fria, caíram as barreiras que impediam a completa internacionalização da economia mundial. Por isso, costuma-se dizer que, desde o início dos anos 1990, surgiu uma nova ordem mundial, construída a partir do processo de globalização.
Uma das características da economia globalizada consiste na circulação de grandes massas de capital pelo planeta, em busca das aplicações mais lucrativas no mercado financeiro. Até a China, onde o socialismo ainda se mantém, flexibilizou sua economia por meio de reformas que a inseriram no mercado internacional.

Empresas transnacionais

Nos últimos 250 anos, a humanidade passou por três processos de transformação econômica conhecidos como “revoluções industriais”. O primeiro deles, iniciado por volta de 1750, foi marcado pelo desenvolvimento da máquina a vapor de 1850, surgiram a ferrovia, a eletricidade, o telégrafo e o automóvel.
Atualmente, está em curso a terceira revolução industrial, iniciada na década de 1970, quando chegaram ao mercado importantes inovações tecnológicas, como computadores, os telefones celulares, a fibra óptica, etc. Esse avanço tecnológico, impulsionado principalmente pelo setor de informática, permitiu a automação da indústria e, em consequência, o aumento e a diversificação da produção, além do barateamento de numerosos produtos. Na década de 1980, por exemplo, um computador vendido no Brasil custava tanto quanto um carro de porte médio. Hoje, milhares de computadores são vendidos em todo o país a preços muito acessíveis.
Para chegar ao barateamento nos custos de produção, as grandes empresas investem maciçamente em pesquisa e desenvolvimento de novos métodos produtivos. Como as pequenas não têm como investir no próprio crescimento, elas não conseguem acompanhar o ritmo imposto pelo mercado e são absorvidas pelas empresas de grande porte. Por isso, uma das características do processo de globalização é a formação de gigantescos grupos econômicos pela fusão de várias empresas ou de companhias líderes do mercado.
Outro aspecto dessa política econômica que também concorre para baixar os custos da produção consiste na formação de empresas transnacionais. Uma empresa transnacional é uma espécie de “fábrica mundial” que produz bens montados com peças fabricadas em diversas partes do mundo. Uma empresa de capital estadunidense, por exemplo, fabrica computadores. Os componentes que ela utiliza, entretanto, podem ter sido produzidos na China, em Taiwan, na Coreia do Sul, no Japão, no Vietnã ou até mesmo nos EUA. O que determina, nesses casos, em que país deve ser fabricada tal ou qual peça é o preço da mão de obra, paga com salários mais baixos nos países do Terceiro Mundo.
Mais um exemplo: a empresa estadunidense Ford fabrica automóveis e é dona de 25% da Mazda japonesa. Juntas, as duas produzem carros de pequeno porte. As duas companhias são sócias da empresa coreana Kia Motors. A Kia vende certas peças para a Ford/Mazda. Outra fábrica japonesa, a Yamaha, fornece os motores. O produto final é um carro da marca Ford, mas ele não tem identidade nacional: não é coreano, nem estadunidense nem japonês.

O comércio em escala mundial

Ao longo da história, o comércio sempre desempenhou importante papel no intercâmbio entre os povos e na dinamização das atividades econômicas. Desde que os europeus começaram as viagens marítimas interoceânicas, no início da Idade Moderna, o comércio vem se ampliando de modo contínuo e crescente. A expansão das trocas internacionais, porém, tem sido mais acentuada em épocas recentes, particularmente a partir do fim da Segunda Guerra Mundial. Isso porque, em 1948, foi criado o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (cuja sigla em inglês é GATT), que pôs em prática uma política de redução das tarifas alfandegárias. Assim, as tarifas, que eram em média de aproximadamente 40% em 1940, baixaram para cerca de 5% na década de 1990. Como resultado dessa política, as exportações mundiais cresceram muito mais rapidamente do que a produção entre os anos de 1960 e 1990.
Em janeiro de 1995, o GATT foi substituído pela Organização Mundial do Comércio (OMC), que ainda hoje tem, entre outras, as atribuições de administrar acordos comerciais, atuar como fórum de negociações entre países e resolver disputas comerciais. Ao ser criada, a nova entidade manteve e ampliou ainda mais a política de estímulo ao intercâmbio mundial de mercadorias. Para ter ideia do êxito dessa política, o comércio internacional passou de 61 bilhões de dólares, em 1950, para 5,2 trilhões de dólares, em 1998.

O capital especulativo

Nas últimas décadas, as trocas comerciais têm sido acompanhadas de um gigantesco crescimento nos movimentos de capitais, feitos com o objetivo de buscar aplicações lucrativas de diversos tipos, nos mais diferentes mercados. Boa parte desses capitais está voltada a aplicações de curto prazo (capital especulativo), em mercados de ações, moedas e títulos emitidos pelos governos de muitos países.
Esse tipo de capital surgiu de dois processos combinados. Um deles foi resultado da adoção de políticas neoliberais, durante a década de 1980, pelo presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, e pela primeira-ministra da Inglaterra, Margaret Thatcher. Como se sabe, o neoliberalismo é uma doutrina que defende a não intervenção do Estado nas atividades econômicas, a privatização das empresas estatais e a abertura das economias nacionais. Com essa política, Reagan e Thatcher estimularam a queda de barreiras econômicas entre os países e contribuíram para a intensificação do intercâmbio comercial e financeiro no mercado mundial. O segundo processo foram as inovações introduzidas nas telecomunicações e na informática, que imprimiram incrível rapidez às transações financeiras. Essa nova modalidade de investimento consiste em capitais especulativos, que circulam com grande velocidade pelos mercados financeiros de todo o mundo, explorando as melhores taxas de juros em cada país.
Um exemplo de especulação financeira é o seguinte: o investidor estrangeiro converte seus dólares (ou outra moeda forte) em moeda nacional ( o real, por exemplo) e aplica-os no mercado de ações, aproveitando-se de um momento favorável da Bolsa de Valores. Ao menor sinal de instabilidade, o investidor vende as ações, faz a conversão da moeda e leva os dólares embora. Se vários investidores fizerem isso ao mesmo tempo, pode haver uma crise na economia local que rapidamente se propaga para outros países em virtude da integração das economias. Crises desse tipo afetaram recentemente o México (1995), a Tailândia (1997), a Rússia (1998), o Brasil (1999) e os EUA (2008), repercutindo em quase todo o mundo.

A era dos computadores

A globalização financeira foi facilitada pelas inovações no campo das telecomunicações. Como vimos, a rápida evolução da tecnologia da informação colocou em uso o computador pessoal, o telefone celular, a videoconferência, etc. a introdução dos cabos telefônicos de fibra óptica aumentou em milhares de vezes a capacidade das ligações telefônicas simultâneas. Essas mudanças tiveram um efeito revolucionário na expansão do comércio, nos fluxos de investimentos e na atuação das empresas multinacionais, possibilitando a unificação do mercado mundial.
O salto decisivo da globalização das comunicações ocorreu com a popularização da internet no início dos anos 1990. Essa rede computadorizada de informações surgiu no fim da década de 1960, patrocinada pelos órgãos de defesa dos Estados Unidos, na época da Guerra Fria. Tinha a finalidade de interligar centros de comando e de pesquisa militar. Pouco depois, a rede começou a ser utilizada pelas universidades. À medida que os computadores pessoais se tornaram acessíveis e se desenvolveram dispositivos especiais de localização, mais pessoas puderam “navegar” na rede. A internet constitui, hoje, o principal meio de transmissão de dados, de pesquisa, de comunicação entre pessoas e empresas, devendo causar também uma revolução na telefonia mundial.

O estado em face da globalização

O papel do Estado passou por diversas mudanças nos últimos anos, particularmente a partir do fim da década de 1980. Para isso, contribuíram:
A onda neoliberal que, a partir dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, se propagou pelo planeta defendendo a redução do papel do Estado tanto na economia quanto nas funções de previdência social;
O fim da Guerra Fria, que reduziu ainda mais a possibilidade de conflitos armados entre as grandes potências.
Além disso, as novas tecnologias digitalizadas de comunicação (satélites, fax, redes de computadores) tiraram do Estado o controle exclusivo da informação em seu próprio território. A mídia internacional ignora as distâncias tanto quanto as fronteiras e possibilita, de forma crescente, que pessoas de países diferentes se interliguem. Como consequência. Há hoje forte tendência para a globalização dos padrões culturais e de consumo, enquanto a língua inglesa se impõe como idioma universal.
Para alguns estudiosos, a aceleração desse processo poderia provocar o enfraquecimento do Estado e a perda da soberania nacional. Essa posição, no entanto, é polêmica, visto que o Estado continua sendo responsável pela integração dos mais diversos setores da sociedade.

A precarização do trabalho

Com a revolução tecnológica das três últimas décadas, o trabalho humano passou a ser substituído por máquinas e processos produtivos cada vez mais complexos e sofisticados. Esse processo, conhecido como automação, provocou a extinção de milhões de postos de trabalho em todo o mundo, levando à demissão em massa de trabalhadores na indústria e no setor de serviços.
Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelam que, em janeiro de 2003, havia no mundo cerca de 180 milhões de pessoas desempregadas. Além delas, cerca de 550 milhões de trabalhadores sem remuneração fixa que não contam com os benefícios da legislação trabalhista, como as de camelô, catadores de papel, engraxates, etc.
Para alguns economistas, a automação extingue funções e, portanto, o aumento do desemprego é inevitável. Para outros, trata-se de uma situação passageira, semelhante à que ocorreu durante a primeira Revolução Industrial, quando as máquinas começaram a substituir o trabalho humano. Nesse caso, a atual onda de desemprego seria seguida da criação em grande escala de novos postos de trabalho, ligados à tecnologia de ponta.
Seja qual for a causa do desemprego, é certo que, na maioria dos países a globalização está associada à precarização do trabalho. A competição entre empresas e a necessidade de reduzir custos levaram os patrões e exigir mais de seus empregados, nem sempre aumentando os salários.
Embora em condições precárias, muitos empregos haviam sido criados por conta do crescimento econômico registrado nos últimos anos em muitos países, sobretudo na zona do euro e nos Estados Unidos. Esses países, para suprir a falta de braços, vinham atraindo trabalhadores estrangeiros, principalmente para o setor de construção civil.
A crise econômica iniciada em 2008 mudou esse quadro. A recessão que se espalhou pelo mundo fez desaparecer muitos postos de trabalho e os países ricos tomaram medidas mais rígidas contra a imigração. Cálculos da OIT divulgados no início de 2009 previam que a crise poderia eliminar até 40 milhões de empregos em todo o mundo até o fim daquele ano.

Globalização e desigualdade

O processo de globalização é considerado irreversível pelos especialistas, mas seus rumos são criticados por diversos por diversos grupos políticos em todo o mundo. Uma das principais críticas é que a globalização não favorece a distribuição da riqueza entre os países, agravando a exclusão social. Enquanto países desenvolvidos detêm mais de 70% do comércio internacional, as nações em desenvolvimento não conseguem usufruir dos lucros gerados pela globalização.
Com as desigualdades denunciadas por diversos países em desenvolvimento e ONGs (organizações não governamentais) internacionais, as instituições financeiras supranacionais, como Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (Bird) e Organização Mundial do Comércio (OMC), começam a se preocupar com o aumento do “abismo” que separa os países ricos dos países pobres.

O espírito de Seattle

O primeiro grande protesto contra a globalização ocorreu em dezembro de 1999, em Seattle (EUA), durante uma reunião da OMC que pretendia lançar a Rodada do Milênio – um novo cronograma para a redução de tarifas comerciais. Do lado de dentro, países ricos e pobres divergiam quanto a metas e prioridades. Nas ruas de Seattle, cerca de 100 mil representantes de sindicatos e ONGs realizavam protestos contra a OMC e a globalização, entrando em choque com a polícia. Os confrontos duraram três dias e deixaram um saldo de mais de 500 pessoas presas e centenas de feridos. Estabelecimentos comerciais considerados símbolos da globalização, como as lanchonetes da rede McDonald’s e lojas de artigos da Nike, foram depredados.
A partir de Seattle, as manifestações antiglobalização cresceram. Nascia o chamado espírito de Seattle, que envolve grupos políticos de todo o mundo.
Em abril de 2000, durante a reunião semestral do FMI e do Banco Mundial, em Washington, mais de 10 mil manifestantes tomaram as ruas da capital dos Estados Unidos com bandeiras e cartazes com slogans antiglobalização. Cinco meses depois, novamente num encontro entre o FMI e o Banco Mundial, em Praga (República Tcheca), os protestos terminaram num conflito violento entre os manifestantes e a polícia.
Em janeiro de 2001, a reunião anual do Fórum Econômico Mundial – entidade que reúne representantes dos países mais ricos, banqueiros, economistas e empresários –, realizada em Davos (Suíça), contou com um esquema de segurança rigoroso: a polícia suíça isolou a cidade e fechou temporariamente as fronteiras do país. Os poucos mais de mil ativistas que conseguiram romper o bloqueio seguiram para Zurique, onde queimaram carros e enfrentaram os policiais.
Enquanto isso, em Porto Alegre (Brasil), aproximadamente 10 mil pessoas representando ONGs, sindicatos, movimentos de esquerda, entidades estudantis, etc. se reuniram no Fórum Social Mundial. Devido à grande quantidade de críticas Á globalização e discursos exigindo dos países ricos o cancelamento das dívidas dos países pobres, o encontro foi logo chamado de anti-Davos.
Em julho de 201, em Gênova (Itália), pela primeira vez um confronto entre os ativistas antiglobalização e a polícia terminou em tragédia. O italiano Carlo Giuliani, de 23 anos, morreu quando protestava, ao lado de mais de 150 mil manifestantes, contra uma reunião de G-8 (grupo das sete maiores economias mundiais mais a Rússia). Cerca de 200 ativistas foram presos e 560 pessoas ficaram feridas.

Em busca de soluções globais

Aspecto interessante da globalização é que ela está levando povos do mundo a pensar em soluções globais para seus problemas.
Em Kyoto (Japão), em dezembro de 1997, foi firmado um tratado internacional (Protocolo de Kyoto) que prevê a redução pelas nações industrializadas das emissões de gases-estufa (causadores do efeito estufa, que é o aquecimento anormal da atmosfera), os EUA, país que mais polui o planeta (são responsáveis por 25% de todo o dióxido de carbono emitido no mundo), foram a única nação que não ratificou o protocolo. Os outros países industrializados concordaram em, até 2012, reduzir em 5,2% suas emissões de gases-estufa.
Em junho de 2001, foi realizada em Nova York (EUA) a Assembleia Geral das Nações Unidas sobre aids, cujo objetivo era discutir a prevenção e o combate à doença. Além de reafirmar que o acesso aos medicamentos é um direito humano, os países participantes decidiram intensificar a prevenção entre grupos vulneráveis, como homossexuais, prostitutas e usuários de drogas; ampliar o tratamento dos portadores do HIV; e criar um fundo internacional para a realização desses trabalhos. A aids já atingia, nessa época, mais de 36 milhões de pessoas em todo o mundo.
Outra solução global foi buscada na Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação, a Xenofobia e a Intolerância, que reuniu 173 países em Durban (África do Sul), entre agosto e setembro de 2001.
O documento final do encontro reconheceu a escravidão como crime contra a humanidade. Também reivindicou medidas efetivas dos países ricos para reverter as injustiças históricas cometidas contra os povos africanos. Foram exigidos o alívio das dívidas, a erradicação da pobreza e investimentos em saúde e no combate à aids.

Produção de energia no Brasil

Movimentar máquinas, cargas e pessoas por longas distâncias demanda muita energia. No Brasil, usam-se combustíveis derivados de fontes não r...