Desde seu aparecimento, no início dos tempos modernos, o capitalismo tendeu para a internacionalização. Essa tendência já se manifestava nos séculos XV XVI, com as Grandes Navegações abrindo os caminhos para a expansão do capitalismo comercial em escala mundial.
No século XIX, o processo de internacionalização tomou a forma de imperialismo, caracterizado pela expansão do capital financeiro e pela divisão internacional do trabalho. No fim do século XX, esse processo ganhou novos contornos. Devido ao avanço tecnológico, sobretudo nas áreas de informática e de comunicações, capitais e mercadorias passaram a circular de forma mais intensa por todo o mundo, dando origem à globalização.
Esse processo está conduzindo os povos do mundo uma interdependência cada vez maior. Mas a riqueza gerada pela globalização não chega a ser apropriada de forma igualitária por todas as nações, o que amplia os contrastes entre países ricos e pobres, gerando conflitos ao redor do mundo.
Uma nova ordem mundial
Após a Segunda Guerra Mundial, foi inaugurada outra etapa na internacionalização do capitalismo, comandada pelo poder militar e econômico dos Estados Unidos, cuja moeda – o dólar – se converteu na base do sistema monetário mundial. Essa fase, encerrada na década de 1970 em consequência das crises do petróleo (1973 e 1979), já foi chamada de Era de Ouro do capitalismo, em virtude dos altos índices de crescimento da produção e de geração de empregos, apresentados pelos países capitalistas industrializados.
Durante os “anos dourados”, contudo, a humanidade viveu sob o risco permanente de uma guerra nuclear, que ameaçava destruir todo o planeta. Nesse período, como vimos, o mundo estava dividido em dois grandes blocos antagônicos, separados por um abismo ideológico. Com a economia estatizada, o bloco soviético era uma barreira intransponível para a internacionalização do capital sob a égide dos EUA.
Com a desintegração da União Soviética e o fim da Guerra Fria, caíram as barreiras que impediam a completa internacionalização da economia mundial. Por isso, costuma-se dizer que, desde o início dos anos 1990, surgiu uma nova ordem mundial, construída a partir do processo de globalização.
Uma das características da economia globalizada consiste na circulação de grandes massas de capital pelo planeta, em busca das aplicações mais lucrativas no mercado financeiro. Até a China, onde o socialismo ainda se mantém, flexibilizou sua economia por meio de reformas que a inseriram no mercado internacional.
Empresas transnacionais
Nos últimos 250 anos, a humanidade passou por três processos de transformação econômica conhecidos como “revoluções industriais”. O primeiro deles, iniciado por volta de 1750, foi marcado pelo desenvolvimento da máquina a vapor de 1850, surgiram a ferrovia, a eletricidade, o telégrafo e o automóvel.
Atualmente, está em curso a terceira revolução industrial, iniciada na década de 1970, quando chegaram ao mercado importantes inovações tecnológicas, como computadores, os telefones celulares, a fibra óptica, etc. Esse avanço tecnológico, impulsionado principalmente pelo setor de informática, permitiu a automação da indústria e, em consequência, o aumento e a diversificação da produção, além do barateamento de numerosos produtos. Na década de 1980, por exemplo, um computador vendido no Brasil custava tanto quanto um carro de porte médio. Hoje, milhares de computadores são vendidos em todo o país a preços muito acessíveis.
Para chegar ao barateamento nos custos de produção, as grandes empresas investem maciçamente em pesquisa e desenvolvimento de novos métodos produtivos. Como as pequenas não têm como investir no próprio crescimento, elas não conseguem acompanhar o ritmo imposto pelo mercado e são absorvidas pelas empresas de grande porte. Por isso, uma das características do processo de globalização é a formação de gigantescos grupos econômicos pela fusão de várias empresas ou de companhias líderes do mercado.
Outro aspecto dessa política econômica que também concorre para baixar os custos da produção consiste na formação de empresas transnacionais. Uma empresa transnacional é uma espécie de “fábrica mundial” que produz bens montados com peças fabricadas em diversas partes do mundo. Uma empresa de capital estadunidense, por exemplo, fabrica computadores. Os componentes que ela utiliza, entretanto, podem ter sido produzidos na China, em Taiwan, na Coreia do Sul, no Japão, no Vietnã ou até mesmo nos EUA. O que determina, nesses casos, em que país deve ser fabricada tal ou qual peça é o preço da mão de obra, paga com salários mais baixos nos países do Terceiro Mundo.
Mais um exemplo: a empresa estadunidense Ford fabrica automóveis e é dona de 25% da Mazda japonesa. Juntas, as duas produzem carros de pequeno porte. As duas companhias são sócias da empresa coreana Kia Motors. A Kia vende certas peças para a Ford/Mazda. Outra fábrica japonesa, a Yamaha, fornece os motores. O produto final é um carro da marca Ford, mas ele não tem identidade nacional: não é coreano, nem estadunidense nem japonês.
O comércio em escala mundial
Ao longo da história, o comércio sempre desempenhou importante papel no intercâmbio entre os povos e na dinamização das atividades econômicas. Desde que os europeus começaram as viagens marítimas interoceânicas, no início da Idade Moderna, o comércio vem se ampliando de modo contínuo e crescente. A expansão das trocas internacionais, porém, tem sido mais acentuada em épocas recentes, particularmente a partir do fim da Segunda Guerra Mundial. Isso porque, em 1948, foi criado o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (cuja sigla em inglês é GATT), que pôs em prática uma política de redução das tarifas alfandegárias. Assim, as tarifas, que eram em média de aproximadamente 40% em 1940, baixaram para cerca de 5% na década de 1990. Como resultado dessa política, as exportações mundiais cresceram muito mais rapidamente do que a produção entre os anos de 1960 e 1990.
Em janeiro de 1995, o GATT foi substituído pela Organização Mundial do Comércio (OMC), que ainda hoje tem, entre outras, as atribuições de administrar acordos comerciais, atuar como fórum de negociações entre países e resolver disputas comerciais. Ao ser criada, a nova entidade manteve e ampliou ainda mais a política de estímulo ao intercâmbio mundial de mercadorias. Para ter ideia do êxito dessa política, o comércio internacional passou de 61 bilhões de dólares, em 1950, para 5,2 trilhões de dólares, em 1998.
O capital especulativo
Nas últimas décadas, as trocas comerciais têm sido acompanhadas de um gigantesco crescimento nos movimentos de capitais, feitos com o objetivo de buscar aplicações lucrativas de diversos tipos, nos mais diferentes mercados. Boa parte desses capitais está voltada a aplicações de curto prazo (capital especulativo), em mercados de ações, moedas e títulos emitidos pelos governos de muitos países.
Esse tipo de capital surgiu de dois processos combinados. Um deles foi resultado da adoção de políticas neoliberais, durante a década de 1980, pelo presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, e pela primeira-ministra da Inglaterra, Margaret Thatcher. Como se sabe, o neoliberalismo é uma doutrina que defende a não intervenção do Estado nas atividades econômicas, a privatização das empresas estatais e a abertura das economias nacionais. Com essa política, Reagan e Thatcher estimularam a queda de barreiras econômicas entre os países e contribuíram para a intensificação do intercâmbio comercial e financeiro no mercado mundial. O segundo processo foram as inovações introduzidas nas telecomunicações e na informática, que imprimiram incrível rapidez às transações financeiras. Essa nova modalidade de investimento consiste em capitais especulativos, que circulam com grande velocidade pelos mercados financeiros de todo o mundo, explorando as melhores taxas de juros em cada país.
Um exemplo de especulação financeira é o seguinte: o investidor estrangeiro converte seus dólares (ou outra moeda forte) em moeda nacional ( o real, por exemplo) e aplica-os no mercado de ações, aproveitando-se de um momento favorável da Bolsa de Valores. Ao menor sinal de instabilidade, o investidor vende as ações, faz a conversão da moeda e leva os dólares embora. Se vários investidores fizerem isso ao mesmo tempo, pode haver uma crise na economia local que rapidamente se propaga para outros países em virtude da integração das economias. Crises desse tipo afetaram recentemente o México (1995), a Tailândia (1997), a Rússia (1998), o Brasil (1999) e os EUA (2008), repercutindo em quase todo o mundo.
A era dos computadores
A globalização financeira foi facilitada pelas inovações no campo das telecomunicações. Como vimos, a rápida evolução da tecnologia da informação colocou em uso o computador pessoal, o telefone celular, a videoconferência, etc. a introdução dos cabos telefônicos de fibra óptica aumentou em milhares de vezes a capacidade das ligações telefônicas simultâneas. Essas mudanças tiveram um efeito revolucionário na expansão do comércio, nos fluxos de investimentos e na atuação das empresas multinacionais, possibilitando a unificação do mercado mundial.
O salto decisivo da globalização das comunicações ocorreu com a popularização da internet no início dos anos 1990. Essa rede computadorizada de informações surgiu no fim da década de 1960, patrocinada pelos órgãos de defesa dos Estados Unidos, na época da Guerra Fria. Tinha a finalidade de interligar centros de comando e de pesquisa militar. Pouco depois, a rede começou a ser utilizada pelas universidades. À medida que os computadores pessoais se tornaram acessíveis e se desenvolveram dispositivos especiais de localização, mais pessoas puderam “navegar” na rede. A internet constitui, hoje, o principal meio de transmissão de dados, de pesquisa, de comunicação entre pessoas e empresas, devendo causar também uma revolução na telefonia mundial.
O estado em face da globalização
O papel do Estado passou por diversas mudanças nos últimos anos, particularmente a partir do fim da década de 1980. Para isso, contribuíram:
A onda neoliberal que, a partir dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, se propagou pelo planeta defendendo a redução do papel do Estado tanto na economia quanto nas funções de previdência social;
O fim da Guerra Fria, que reduziu ainda mais a possibilidade de conflitos armados entre as grandes potências.
Além disso, as novas tecnologias digitalizadas de comunicação (satélites, fax, redes de computadores) tiraram do Estado o controle exclusivo da informação em seu próprio território. A mídia internacional ignora as distâncias tanto quanto as fronteiras e possibilita, de forma crescente, que pessoas de países diferentes se interliguem. Como consequência. Há hoje forte tendência para a globalização dos padrões culturais e de consumo, enquanto a língua inglesa se impõe como idioma universal.
Para alguns estudiosos, a aceleração desse processo poderia provocar o enfraquecimento do Estado e a perda da soberania nacional. Essa posição, no entanto, é polêmica, visto que o Estado continua sendo responsável pela integração dos mais diversos setores da sociedade.
A precarização do trabalho
Com a revolução tecnológica das três últimas décadas, o trabalho humano passou a ser substituído por máquinas e processos produtivos cada vez mais complexos e sofisticados. Esse processo, conhecido como automação, provocou a extinção de milhões de postos de trabalho em todo o mundo, levando à demissão em massa de trabalhadores na indústria e no setor de serviços.
Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelam que, em janeiro de 2003, havia no mundo cerca de 180 milhões de pessoas desempregadas. Além delas, cerca de 550 milhões de trabalhadores sem remuneração fixa que não contam com os benefícios da legislação trabalhista, como as de camelô, catadores de papel, engraxates, etc.
Para alguns economistas, a automação extingue funções e, portanto, o aumento do desemprego é inevitável. Para outros, trata-se de uma situação passageira, semelhante à que ocorreu durante a primeira Revolução Industrial, quando as máquinas começaram a substituir o trabalho humano. Nesse caso, a atual onda de desemprego seria seguida da criação em grande escala de novos postos de trabalho, ligados à tecnologia de ponta.
Seja qual for a causa do desemprego, é certo que, na maioria dos países a globalização está associada à precarização do trabalho. A competição entre empresas e a necessidade de reduzir custos levaram os patrões e exigir mais de seus empregados, nem sempre aumentando os salários.
Embora em condições precárias, muitos empregos haviam sido criados por conta do crescimento econômico registrado nos últimos anos em muitos países, sobretudo na zona do euro e nos Estados Unidos. Esses países, para suprir a falta de braços, vinham atraindo trabalhadores estrangeiros, principalmente para o setor de construção civil.
A crise econômica iniciada em 2008 mudou esse quadro. A recessão que se espalhou pelo mundo fez desaparecer muitos postos de trabalho e os países ricos tomaram medidas mais rígidas contra a imigração. Cálculos da OIT divulgados no início de 2009 previam que a crise poderia eliminar até 40 milhões de empregos em todo o mundo até o fim daquele ano.
Globalização e desigualdade
O processo de globalização é considerado irreversível pelos especialistas, mas seus rumos são criticados por diversos por diversos grupos políticos em todo o mundo. Uma das principais críticas é que a globalização não favorece a distribuição da riqueza entre os países, agravando a exclusão social. Enquanto países desenvolvidos detêm mais de 70% do comércio internacional, as nações em desenvolvimento não conseguem usufruir dos lucros gerados pela globalização.
Com as desigualdades denunciadas por diversos países em desenvolvimento e ONGs (organizações não governamentais) internacionais, as instituições financeiras supranacionais, como Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (Bird) e Organização Mundial do Comércio (OMC), começam a se preocupar com o aumento do “abismo” que separa os países ricos dos países pobres.
O espírito de Seattle
O primeiro grande protesto contra a globalização ocorreu em dezembro de 1999, em Seattle (EUA), durante uma reunião da OMC que pretendia lançar a Rodada do Milênio – um novo cronograma para a redução de tarifas comerciais. Do lado de dentro, países ricos e pobres divergiam quanto a metas e prioridades. Nas ruas de Seattle, cerca de 100 mil representantes de sindicatos e ONGs realizavam protestos contra a OMC e a globalização, entrando em choque com a polícia. Os confrontos duraram três dias e deixaram um saldo de mais de 500 pessoas presas e centenas de feridos. Estabelecimentos comerciais considerados símbolos da globalização, como as lanchonetes da rede McDonald’s e lojas de artigos da Nike, foram depredados.
A partir de Seattle, as manifestações antiglobalização cresceram. Nascia o chamado espírito de Seattle, que envolve grupos políticos de todo o mundo.
Em abril de 2000, durante a reunião semestral do FMI e do Banco Mundial, em Washington, mais de 10 mil manifestantes tomaram as ruas da capital dos Estados Unidos com bandeiras e cartazes com slogans antiglobalização. Cinco meses depois, novamente num encontro entre o FMI e o Banco Mundial, em Praga (República Tcheca), os protestos terminaram num conflito violento entre os manifestantes e a polícia.
Em janeiro de 2001, a reunião anual do Fórum Econômico Mundial – entidade que reúne representantes dos países mais ricos, banqueiros, economistas e empresários –, realizada em Davos (Suíça), contou com um esquema de segurança rigoroso: a polícia suíça isolou a cidade e fechou temporariamente as fronteiras do país. Os poucos mais de mil ativistas que conseguiram romper o bloqueio seguiram para Zurique, onde queimaram carros e enfrentaram os policiais.
Enquanto isso, em Porto Alegre (Brasil), aproximadamente 10 mil pessoas representando ONGs, sindicatos, movimentos de esquerda, entidades estudantis, etc. se reuniram no Fórum Social Mundial. Devido à grande quantidade de críticas Á globalização e discursos exigindo dos países ricos o cancelamento das dívidas dos países pobres, o encontro foi logo chamado de anti-Davos.
Em julho de 201, em Gênova (Itália), pela primeira vez um confronto entre os ativistas antiglobalização e a polícia terminou em tragédia. O italiano Carlo Giuliani, de 23 anos, morreu quando protestava, ao lado de mais de 150 mil manifestantes, contra uma reunião de G-8 (grupo das sete maiores economias mundiais mais a Rússia). Cerca de 200 ativistas foram presos e 560 pessoas ficaram feridas.
Em busca de soluções globais
Aspecto interessante da globalização é que ela está levando povos do mundo a pensar em soluções globais para seus problemas.
Em Kyoto (Japão), em dezembro de 1997, foi firmado um tratado internacional (Protocolo de Kyoto) que prevê a redução pelas nações industrializadas das emissões de gases-estufa (causadores do efeito estufa, que é o aquecimento anormal da atmosfera), os EUA, país que mais polui o planeta (são responsáveis por 25% de todo o dióxido de carbono emitido no mundo), foram a única nação que não ratificou o protocolo. Os outros países industrializados concordaram em, até 2012, reduzir em 5,2% suas emissões de gases-estufa.
Em junho de 2001, foi realizada em Nova York (EUA) a Assembleia Geral das Nações Unidas sobre aids, cujo objetivo era discutir a prevenção e o combate à doença. Além de reafirmar que o acesso aos medicamentos é um direito humano, os países participantes decidiram intensificar a prevenção entre grupos vulneráveis, como homossexuais, prostitutas e usuários de drogas; ampliar o tratamento dos portadores do HIV; e criar um fundo internacional para a realização desses trabalhos. A aids já atingia, nessa época, mais de 36 milhões de pessoas em todo o mundo.
Outra solução global foi buscada na Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação, a Xenofobia e a Intolerância, que reuniu 173 países em Durban (África do Sul), entre agosto e setembro de 2001.
O documento final do encontro reconheceu a escravidão como crime contra a humanidade. Também reivindicou medidas efetivas dos países ricos para reverter as injustiças históricas cometidas contra os povos africanos. Foram exigidos o alívio das dívidas, a erradicação da pobreza e investimentos em saúde e no combate à aids.