sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Agricultura familiar

A agricultura familiar consiste em uma organização social na qual, em geral, são desenvolvidas atividades agropecuárias em um espaço rural. Este, por sua vez, é gerenciado por uma família e há o predomínio da mão de obra familiar. A produção agrícola da agricultura familiar é fundamental para a segurança alimentar do país, pois a maior parte dos alimentos consumidos tem origem na produção dessa organização.
A agricultura familiar tem importante participação na geração de empregos no campo e na produção nacional de alimentos. Do total de pessoas que se dedicam à agropecuária, 67% fazem parte da agricultura familiar. Nesse tipo de produção, emprega-se mão de obra familiar, a propriedade é gerenciada pela família e a atividade agropecuária é a principal fonte de renda. 
A agricultura familiar ou agricultura camponesa é caracterizada pela gestão da propriedade feita por pessoas que mantêm laços de parentesco, trabalham na terra e têm como principal fonte de renda a atividade agropecuária. Esse tipo de agricultura é responsável pela produção de cerca de 70% dos alimentos que vão à mesa dos brasileiros. 
A maior parte dos estabelecimentos rurais no Brasil (77%) faz parte da agricultura familiar. Essa modalidade de produção responde por 23% da área ocupada por estabelecimentos agropecuários no país, com grande variação entre as unidades federativas.
O Censo Agro de 2017 contabilizou cerca de 3,9 milhões de estabelecimentos onde esse tipo de exploração da terra é desenvolvido, ou seja, 77% dos estabelecimentos agropecuários brasileiros. Cerca de 10,1 milhões de pessoas trabalham nesse tipo de estabelecimento (67% do pessoal ocupado na agropecuária), sendo distribuídos regionalmente.
A agricultura familiar ocupa apenas 23% da área total dos estabelecimentos agropecuários, sendo as maiores proporções encontradas em Pernambuco, Ceará e Acre, e as menores nos estados do Centro-Oeste e em São Paulo, onde a agricultura comercial (também classificada como moderna ou capitalista) é ainda mais predominante. Para alguns pesquisadores, a agricultura familiar apresenta outras características não incluídas em sua definição oficial.
Segundo seus estudos, esse tipo de agricultura não trata apenas de um modo de produzir, mas também da relação estabelecida com a terra, com a natureza e com a cultura de um modo de viver comunitário. Destacam, ainda, que a renda não é obtida pela exploração do trabalho de terceiros, mas, principalmente, do trabalho familiar e não assalariado, e que isso leva à construção de uma racionalidade diferente da empresarial (orientada sobretudo pelo lucro).
Os agricultores familiares geralmente realizam uma produção diversificada, em pequenas e médias propriedades, para subsistência e comercialização. Além de ser praticada em pequenas propriedades, de modo geral, a produção familiar é diversificada (distintas espécies vegetais e animais), e, muitas vezes, observa os ciclos da natureza e produz internamente grande parte dos insumos necessários (fertilizantes, por exemplo), conferindo certa sustentabilidade.
É comum que os produtores rurais precisem comprar materiais e equipamentos em etapas anteriores à venda da produção. A atividade agrícola também é vulnerável a eventos climáticos que podem causar a perda da produção, o que fragiliza economicamente os pequenos produtores. Por essas razões e pela importância da agricultura familiar no abastecimento alimentar, o governo federal desenvolve políticas de apoio a esse tipo de produção. 
Nos últimos anos foram criados programas de apoio à agricultura familiar que buscam oferecer crédito para compra de equipamentos e construção de formas de armazenamento da produção, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar Florestal (Pronaf Florestal), que visa estimular a introdução de sistemas agroflorestais para a manutenção de áreas que ainda possuem elevada biodiversidade. Há uma maior participação da agricultura familiar na produção de mandioca, feijão, arroz, milho, café, trigo e hortifrútis (hortaliças e frutas).

Tamanho dos estabelecimentos rurais

A maioria dos estabelecimentos rurais no país, quase 70% deles, tem entre 1 e 50 hectares. A legislação brasileira classifica os imóveis rurais em quatro categorias: minifúndios, pequena propriedade, média propriedade e grande propriedade. Os tamanhos, as áreas, de cada tipo, variam por município, sendo determinados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de acordo com o conceito de módulo fiscal. Um módulo fiscal corresponde à área mínima necessária para que sua exploração seja economicamente viável, variando entre 5 e 110 hectares.
  • Minifúndio – menor que 1 módulo fiscal (área insuficiente para que a unidade produtiva seja economicamente viável).
  • Pequena propriedade – entre 1 e 4 módulos fiscais.
  • Média propriedade – mais que 4 e até 15 módulos fiscais.
  • Grande propriedade – superior a 15 módulos fiscais. Os latifúndios por dimensão são grandes propriedades de terra, com mais de 600 módulos fiscais. Porém, mesmo grandes propriedades de menores dimensões podem ser classificadas como latifúndios se não estiverem cumprindo função social, que é ser produtivo. Os latifúndios improdutivos podem ser retirados do proprietário, como prevê a legislação brasileira.

Raça e etnia

Raça, historicamente, é um termo que se originou de uma leitura preconceituosa para hierarquizar os humanos com base em suas características físicas, mais notadamente a cor da pele. Biologicamente, comprovado por estudos genéticos, todos os seres humanos pertencem a uma mesma raça, independentemente das diferenças da cor de pele e dos traços físicos.
Porém, hoje, raça constitui-se como um conceito sociológico, uma construção humana para agrupar pessoas e diferenciá-la das demais, sem hierarquizá-las. Muitos preferem empregar em vez de raça o conceito de etnia, um pouco mais amplo. Etnia se refere a um grupo humano identificado pelo conjunto de seus traços fenotípicos, suas semelhanças físicas e suas identidades culturais, como língua, valores, tradições, etc.

Os movimentos migratórios

Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), órgão oficial da ONU, migrante é a pessoa que deixou de viver em seu lugar habitual de residência e passou a viver em outro local (município, estado ou país), de maneira temporária ou permanente. Todo migrante é, ao mesmo tempo, um imigrante e um emigrante. É um emigrante em relação ao seu local de origem e um imigrante no seu local de destino. Portanto, sua definição depende de qual referencial é adotado.

A diferença de intencionalidade e de duração das migrações nos coloca a complexa tarefa de distinguir e classificar os deslocamentos populacionais, que hoje são motivados por diferentes razões e apresentam muitas características.

Os principais critérios para diferenciar e classificar os deslocamentos populacionais e as migrações da atualidade são:
  • migração individual (diversidade de motivações) ou migração de massa (grande quantidade de pessoas);
  • migração voluntária ou migração forçada;
  • migração legal ou irregular;
  • migração definitiva ou temporária;
  • migração interna (limitada ao território de um mesmo país) ou internacional (deslocamento de um país para outro).
Esses critérios podem ainda ser desdobrados em outros, como em relação ao espaço (rural ou urbano), aos tamanhos e tipos das cidades, às distâncias dos deslocamentos, à faixa etária e ao gênero dos migrantes, etc.

Movimentos populacionais e suas motivações 

As características dos deslocamentos populacionais são muito variadas e se alteram ao longo do tempo. Devido às disparidades econômicas entre os países, muitas pessoas mudam dos locais mais pobres para mais prósperos com a expectativa de melhorar sua condição de vida. Há muitas outras causas, como a oportunidade de trabalho e desenvolvimento profissional, estudos, calamidade ambiental e perseguições políticas ou religiosas.
Deslocamentos forçados Há situações nas quais as pessoas são deslocadas contra a própria vontade, por exemplo, devido a perseguições políticas, religiosas, étnicas ou algum evento extremo, como desastres naturais. Tornam-se refugiadas. Migrar é um direito humano, mas forçar o deslocamento é não respeitar os direitos humanos. Há um exemplo significativo para todos nós brasileiros e que está arraigado na formação do Brasil: o tráfico de escravizados de distintas regiões e povos da África para cá. Pessoas que foram tratadas como mercadorias e assim transportadas, mal acomodadas nos conveses de navios e impedidas de decidir por suas vidas e destinos. Não sabiam ao certo para onde estavam sendo levadas, e muitas nem chegaram, em razão das péssimas condições às quais eram submetidas na viagem (há estudos sobre a maior concentração de tubarões ao longo das rotas dos navios negreiros naquela época em razão da quantidade de corpos que eram jogados ao mar). E, uma vez em terras brasileiras, podiam ser vendidas ou levadas por seus proprietários para qualquer outro local, também sem poder escolher seus destinos.

Migrações internas 

Em 1980, cerca de 30 mil garimpeiros deslocaram-se em busca de ouro para uma área no sudeste do Pará, batizada de Serra Pelada, registrada pelo fotógrafo Sebastião Salgado em 1986. No ápice da atividade mineradora, em 1984, somavam-se 80 mil residentes. 
Atualmente, o município de Curionópolis, criado em razão da mineração, contabiliza aproximadamente 18 mil habitantes. Historicamente, a força que moveu os deslocamentos internos de pessoas no Brasil foi a fuga da pobreza, o processo de concentração fundiária no campo e a perspectiva de trabalho e renda no local de destino. 
As áreas de atração são aquelas de maior dinâmica econômica, que no século XX se localizavam sobretudo nos grandes centros urbanos industrializados, localizados no Sudeste (São Paulo e Rio de Janeiro). E as áreas mais expressivas de saída de população estavam no Nordeste, em decorrência da decadência econômica e dos mecanismos de expulsão do trabalhador rural. 
Outra força significativa que motivou os deslocamentos internos da população brasileira no século passado foram as fronteiras de expansão em direção ao Centro-Oeste e ao Norte. Boa parte delas resultou de projetos estatais como as grandes obras de infraestrutura (construção de ferrovias, estradas, hidrelétricas), desenvolvimento de cidades planejadas e estímulos fiscais (isenção ou redução de impostos), econômicos (financiamento) e legais (alteração de legislação), além da estruturação de áreas agropecuárias. 
A maioria das migrações ao redor do mundo é interna, ou seja, se dá dentro de um mesmo país. Segundo o Censo Demográfico de 2010, cerca de 15% dos brasileiros não vivem na mesma unidade da Federação onde nasceram e esse número se aproxima de 35% se considerarmos as mudanças de município, o que é expressivo e revela a importância das migrações internas para se compreender o país.

Êxodo rural e urbanização 

Os deslocamentos definitivos do campo para as cidades explicam boa parte das migrações internas. O processo de industrialização, as mudanças da economia, a mecanização da agricultura, a estrutura fundiária e concentração de terras são os fatores que promoveram o êxodo rural, ou seja, um grande deslocamento da população rural para o espaço urbano, iniciado ainda de forma pouco expressiva na década de 1940. 
O êxodo rural caracterizou o principal movimento populacional interno e livre no país, entre os anos 1960 e 1980, e levou a população urbana do país a ultrapassar a rural, como indicou o Censo Demográfico de 1970. Foi nesse período que as migrações de longa distância foram as mais intensas, sobretudo da região Nordeste e dos estados de Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina em direção aos núcleos industriais localizados nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. 
A maior parte dos migrantes desse período era do sexo masculino, em idade produtiva. Assim, os municípios e regiões de partida (áreas de expulsão) passaram a contabilizar números maiores de população do sexo feminino, idosos e crianças. 

Legislação ambiental no Brasil

Desde os tempos coloniais, no território que hoje configura o Brasil, há leis para regular o uso e exploração do solo. Durante muito tempo as leis ambientais serviram mais para disciplinar o uso dos recursos naturais e para evitar conflitos entre interessados, além de funcionar como forma de arrecadação fiscal para o Estado. Hoje, existe uma maior concepção de preservação e conservação ambiental, serviços ambientais e bem-estar social, compreendidos na legislação brasileira. A criação de leis é também acompanhada da fundação de um conjunto de órgãos estatais que objetivam regular, fiscalizar, impedir, julgar e punir. Além disso, podem ser criados aparatos de Estado que geram informações para alimentar tecnicamente as atividades dos órgãos legisladores e julgadores, como os institutos de pesquisa.

No Brasil há órgãos públicos localizados nas diferentes esferas de poder responsáveis por legislar, fiscalizar e gerenciar as práticas que envolvem a temática ambiental, como as secretarias municipais e estaduais do meio ambiente e os órgãos federais. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) tem a missão de coordenar todas as entidades públicas dessa temática em suas tarefas. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) autoriza (ou não) um empreendimento em função dos impactos ambientais e sociais que ele venha a causar (chamado licenciamento ambiental). Há também o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) cujo objetivo é implantar, proteger, fiscalizar e monitorar as Unidades de Conservação.

Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza

O Brasil conta, desde 2000, com uma lei (Lei n. 9985/00) que especifica um conjunto de normas para diferenciar e regulamentar os tipos de unidades de conservação em território nacional, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Segundo a organização não governamental de ação ambiental, World Wildlife Foundation (WWF-Brasil), em 2020, cerca de 18% do território nacional estava inserido em algum tipo de unidade de conservação.

Foram estabelecidas doze categorias de unidades de conservação, definindo seus objetivos, estratégias de implantação e manejo, além da esfera política responsável. Essas unidades também se diferenciam de acordo com os usos permitidos, variando desde áreas de preservação total (preservacionista), sendo impedida a presença humana e qualquer forma de exploração, a áreas que preveem a manutenção de povos e comunidades tradicionais vivendo em seu interior, de forma sustentável (conservacionista). Podem ser de responsabilidade federal, estadual e municipal.

Unidades de Proteção

Integral (preservacionista – mais restritiva)
  • Estação Ecológica
  • Reserva Biológica
  • Parque Nacional
  • Monumento Natural
  • Refúgio da Vida Silvestre

Unidades de Uso Sustentável (conservacionista – menos restritiva)

  • Área de Proteção Ambiental
  • Área de Relevante Interesse Ecológico
  • Floresta Nacional
  • Reserva Extrativista
  • Reserva de Fauna
  • Reserva de Desenvolvimento Sustentável
  • Reserva Particular do Patrimônio Natural

Código Florestal Brasileiro

O atual Código Florestal Brasileiro (Lei no 12.651), em vigor desde maio de 2012, foi e ainda é objeto de muito debate e discórdias entre ambientalistas e ruralistas. Oriente os estudantes a realizarem uma pesquisa para descobrir o que defende cada um dos lados e seus argumentos. Espera-se que compreendam que a implementação do novo Código Florestal ainda enfrenta desafios e por isso caminha lentamente. Ele é o resultado da forte pressão dos grandes ruralistas para flexibilização do Código Florestal de 1965, muito restritivo e rigoroso, na interpretação deles.

A nova lei, que ainda guarda heranças da lei anterior, impõe aos produtores rurais a obrigatoriedade de registro dos imóveis rurais no Cadastro Ambiental Rural (CAR), que é um registro informatizado com as principais informações sobre as características ambientais do imóvel e seus usos. Para os críticos do novo Código Florestal, além da anistia e regularização de milhares de hectares de terras ocupadas de forma irregular, desobrigando seus proprietários de realizar o reflorestamento integral, possibilita ainda o plantio de espécies exóticas como forma de compensação ambiental e considera novos critérios para cálculos de áreas preservadas, que na prática irão reduzir bastante a extensão da vegetação que não deveria ser desmatada.

DISTRIBUIÇÃO DAS TERRAS NO BRASIL

A distribuição das terras e o tamanho das propriedades no Brasil revelam uma concentração fundiária (concentração de terras) no território: quase metade das terras ocupadas pertence a um pequeno número de proprietários.
A maior parte dos estabelecimentos rurais no Brasil é composta por pequenas propriedades (com área inferior a 100 hectares). Elas correspondem a quase 90% das propriedades agrárias do território nacional e ocupam aproximadamente 20% da área total dos imóveis rurais.
As médias propriedades (com área entre 100 e 1 000 hectares) correspondem a 10% do total das propriedades agrárias e ocupam 35% da área total dos imóveis rurais. As grandes propriedades rurais (com área igual ou superior a 1 000 hectares), representam 1% das propriedades agrárias e ocupam 45% das terras agrícolas.

Questão agrária 

Desde a colonização até meados dos anos 1950, o Brasil foi um país essencialmente agrário: os principais produtos que geravam riqueza e receitas de exportação eram provenientes do campo. 
O ponto central da questão agrária brasileira é a estrutura ou organização fundiária. O Brasil apresenta uma grande concentração de terras nas mãos de poucos proprietários, pessoas civis e empresas, e parcela expressiva de trabalhadores rurais e de famílias não têm terra própria para morar e dela extrair os meios necessários à manutenção de suas vidas,
A origem do problema da concentração de terras está na história da formação do território e do Estado brasileiro, e também das transformações econômicas com o capitalismo. Antes da colonização, as terras daqui não eram propriedades, e sim de uso comunal. Havia disputas entre os povos originários por algumas delas, mas não existia compra e venda. 
Ao tornar essas terras propriedade da Coroa portuguesa, seu uso e sua exploração foram alterados. No intuito de gerar riqueza, imensas porções de terra – as capitanias hereditárias – foram cedidas a alguns poucos privilegiados da corte. Por sua vez, essas terras foram subdivididas em sesmarias e concedidas àqueles que se dispusessem a torná-las produtivas e remunerar o governo com uma sexta parte da produção. Entretanto, o sesmeiro não era proprietário da terra, ele poderia ter sua concessão cancelada caso não a explorasse, o que era feito sobretudo com mão de obra escravizada de indígenas e africanos, estes, sim, suas propriedades. Portanto, o capital não era mobilizado na aquisição de terras, e sim na compra de mão de obra escravizada. A terra tinha valor de uso e não de posse, ou seja, seu valor estava naquilo que poderia produzir e não era permitido vendê-la.
A organização territorial da produção colonial ocorreu em grande medida pela expulsão de povos indígenas de suas terras, e a base do sistema produtivo no período colonial se deu com a concessão de títulos de sesmarias (grandes porções de terras a serem cultivadas ou exploradas) para colonos vindos de Portugal, enquanto as populações indígenas e africanas eram utilizadas como mão de obra escravizada. Mesmo com a proibição da escravidão e a chegada de imigrantes às terras, o acesso a elas continuou sendo restrito.

A Lei de Terras de 1850 

As terras brasileiras só se tornaram propriedades privadas a partir de 1850, com a Lei de Terras, o que impediria ex-escravizados, indígenas, camponeses e imigrantes pobres de se tornarem proprietários de terra, porque, a partir de então, elas deveriam ser compradas.
Estabeleceu-se com essa lei que a aquisição de terras no Brasil se daria pela compra. Para os que já possuíam terras, ficou determinado que deveria ser paga uma taxa para a regularização do título de propriedade, o que excluiu boa parte dos proprietários mais pobres, que não possuíam recursos suficientes. Ao mesmo tempo, a população recém-liberta, sobretudo após a abolição da escravidão, permaneceu como mão de obra barata nas fazendas ou se dirigiu às cidades como mão de obra pouco qualificada e mal remunerada.
Não bastava mais tornar produtivas as terras desocupadas, nomeadas de terras devolutas. Para explorá-las, era preciso pagar por elas, comprá-las. Assim, as terras passaram a ter um valor de posse, ou seja, poderiam gerar riqueza por meio de sua compra e venda, mesmo que não fossem exploradas para nada. 
Essa lei perpetua um dos maiores problemas sociais brasileiros: a não reparação dos escravizados pelos anos de exploração e ainda o impedimento deles, por si sós, de conseguirem viver a partir seus próprios trabalhos na terra, tendo que a trabalhar para outras pessoas. Lembrando que a abolição da escravidão só foi ocorrer em 1888, quando a nova política de acesso à terra já estava consolidada. 

Reforma agrária

Ao longo dos anos, a mobilização pelo acesso à terra, pela conquista de uma parcela de solo no campo para trabalhar e viver dignamente e se livrar da pobreza e exploração às quais muitos camponeses e trabalhadores rurais estavam submetidos levou a mobilizações sociais, lutas e movimentos que provocavam e provocam instabilidades políticas. Diante do grande problema social e político, o governo elaborou, em 1964, o Estatuto da Terra, instrumento legal que visava desmobilizar os embates no campo.
O Estatuto da Terra classifica as propriedades rurais segundo tamanho e produtividade e estabelece a política de reforma agrária, de distribuição de terras para camponeses, segundo diversos critérios. Entretanto, não foi elaborada uma política de apoio ao desenvolvimento do pequeno produtor, como financiamento, assessoria técnica, compra, escoamento da produção, etc. 
A reforma agrária também está prevista na atual Constituição do país, promulgada em 1988, que estabeleceu a necessidade de a terra ter função social. Entretanto, até agora, nenhum governo levou a cabo toda a necessidade de redistribuição de terras previsto no Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). Portanto, a questão agrária brasileira e seus desdobramentos, como grilagem de terra, violência, ocupações e assassinatos de camponeses, ainda permanecem um grave problema atual. 
Além do acesso à terra, a reforma agrária envolve outras medidas, como construção de estradas e acesso a transportes para escoar a produção; abastecimento de água e instalação de energia elétrica; facilidades para a compra de equipamentos, sementes e adubos; orientação de especialistas sobre técnicas de produção para aumentar a produtividade; e acesso das famílias a serviços públicos básicos, como atendimento médico e escola.
Embora a reforma agrária e a função social da terra estejam contempladas nas leis brasileiras, por muito tempo essas questões foram deixadas de lado, favorecendo os grandes proprietários, principalmente aqueles que possuem terras improdutivas. Por isso, organizações de trabalhadores rurais lutaram, e ainda lutam, pela reforma agrária, pelo cumprimento de leis trabalhistas no campo, pela alimentação saudável e pela saúde do trabalhador rural, com defesa da agroecologia e outras reivindicações.
Entre essas organizações estão o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), a Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag), entre outras. Uma das formas de ação desses movimentos é a ocupação das propriedades improdutivas por meio da instalação de acampamentos, além de marchas e passeatas com o objetivo de chamar a atenção da sociedade e pressionar os governos para atender às reivindicações.

Os movimentos sociais e a luta pelo acesso à terra 

A partir da década de 1940, formaram-se os primeiros movimentos sociais de luta pela terra. Entre esses movimentos, as Ligas Camponesas foram os de maior repercussão, começando em Pernambuco e, pouco a pouco, difundindo-se para outros estados. Junto de outros movimentos rurais, conseguiram exercer pressão a tal ponto que, em 1964, foi estabelecido o projeto de reforma agrária pelo então presidente João Goulart. No entanto, com o golpe militar nesse mesmo ano, as ligas camponesas e a proposta de reforma agrária foram combatidas e desarticuladas.

O Movimento Sem Terra (MST) 

Em 1964 foi aprovado o Estatuto da Terra, que previa a possibilidade de reforma agrária e a desapropriação de terras que não fossem produtivas. Com a organização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no final da década de 1970, muitas propriedades improdutivas passaram a ser ocupadas, exercendo pressão pelo assentamento e regularização de famílias de agricultores do movimento. Com a Constituição Federal em 1988 e com a pressão dos movimentos sociais em busca de reforma agrária, houve o aumento do número de assentamentos.

Assentamentos

Os assentamentos são lotes de terra redistribuídos pelo governo nos programas de reforma agrária e resultam da mobilização dos trabalhadores rurais sem terra e do cumprimento das leis pelos governantes comprometidos com a justiça social no campo.
Os trabalhadores rurais e as suas famílias passam a morar e a produzir nesses lotes de terra, comprometendo-se a usar exclusivamente mão de obra familiar. Além da propriedade da terra, pela qual devem pagar ao longo dos anos, os assentados recebem auxílios para a compra de produtos e ferramentas agrícolas e para melhorias das técnicas de trabalho. Enquanto não terminam de pagar os lotes para se tornarem proprietários definitivos, os assentados não podem vender, alugar nem emprestar a terra a outras pessoas.
Nos assentamentos, deve-se construir moradias, instalar rede elétrica, abrir estradas e melhorar os acessos locais, entre outras benfeitorias para garantir estrutura digna para as famílias. Até metade da década de 1990, poucas famílias foram assentadas no campo brasileiro. Nos anos posteriores, esse número aumentou.

Conflitos e tensões

No Brasil, ainda persistem muitos conflitos no campo, principalmente os que envolvem disputas pela posse da terra. Há enfrentamentos que vitimizam inúmeros trabalhadores rurais, indígenas, quilombolas e pessoas envolvidas com movimentos sociais. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, ocorreram 1 190 conflitos por terra apenas em 2020, em diferentes Unidades da Federação.
Esses conflitos são mais comuns em terras nas quais vivem posseiros, indígenas e quilombolas, onde há invasões por grileiros, mineradoras e garimpeiros, ou implantação de grandes obras, como estradas e hidrelétricas. Na maioria das vezes, o direito das vítimas de permanecer e produzir nas terras é desrespeitado.
Além dos conflitos pela terra, há muitas ocorrências de desrespeito às leis trabalhistas, como ausência de férias remuneradas, 13º salário, entre outros direitos dos trabalhadores rurais. Há também muitos registros de condições precárias e perigosas de trabalho, assim como formas de trabalho análogas à escravidão. No campo brasileiro, o trabalho escravo é encontrado na produção agropecuária, na produção de carvão vegetal, na mineração, no extrativismo, entre muitas outras atividades.

Violência no campo

Mesmo com a conquista de direitos ao longo do século XX, muitos movimentos sociais rurais continuam mobilizados em defesa de uma distribuição de terra mais equilibrada no Brasil. Principalmente nas áreas de fronteira agrícola da Amazônia, muitas vezes esses grupos são alvo de violência por parte de grandes proprietários de terra, garimpeiros ilegais, posseiros, grileiros, etc. 
Também são frequentes os assassinatos de trabalhadores sem-terra e líderes sociais que lutam pela reforma agrária. Grileiros contratam pessoas armadas (jagunços) para expulsar os posseiros (pessoas que sobrevivem da terra que ocuparam, geralmente chamadas de terras devolutas, há muitos anos). 
Outro problema social no espaço rural brasileiro é o deslocamento e os embates com as populações tradicionais e grupos indígenas por meio do avanço de fronteiras agrícolas, formação de lagos artificiais para hidrelétricas, invasão de garimpeiros em terras protegidas (geralmente Terras Indígenas) e mineração industrial. 

Trabalho escravo no campo

Pela lei, a escravidão no Brasil foi abolida em 1888, há mais de 130 anos. Porém, ainda são encontradas formas de trabalho escravo no campo e na cidade. Na versão atual da escravidão – chamada de “condição análoga ao trabalho escravo” –, o trabalhador se mantém ligado ao empregador por meio de dívidas que é obrigado a fazer. Além disso, tem péssimas condições de trabalho, enfrenta maus-tratos, falta de liberdade, entre outras violações de direitos.

A grilagem de terras 

A grilagem é uma prática ilegal de acesso à terra e ocorre por meio da invasão (geralmente de terras indígenas, quilombolas ou de outros povos tradicionais e de propriedades do governo federal), do desmatamento e da falsificação de documentos de propriedade de terra. Essa tem sido uma prática recorrente no Brasil, principalmente nas regiões Centro-Oeste e Norte, onde grandes extensões de terras estão sob a posse do governo federal e de povos originários e tradicionais.

Quilombos e Terras Indígenas 

As comunidades remanescentes de quilombos, assim como os povos indígenas, também produzem o espaço agrário no Brasil, mas de modo peculiar, já que conservam grande parte das áreas em que vivem há séculos. De certo modo, esses dois segmentos sociais da população brasileira podem ser analisados como parte dos setores que praticam agricultura orgânica. Afinal, eles desenvolveram a agricultura sem devastar os lugares em que vivem usando técnicas para explorar o solo sem esgotá-lo, preservando sementes e selecionando espécies de acordo com seus interesses. Além disso, utilizam a água com parcimônia nas práticas agrícolas e conservam os rios porque eles oferecem alimento por meio da pesca.
O estilo de vida desses povos, porém, está ameaçado. Pressões para que abandonem suas áreas surgem de várias frentes. Existem empresas e indivíduos que desejam explorar os recursos naturais de suas terras. Outros invadem essas áreas para retirar madeira ou extrair água, por exemplo. A contaminação da água, bem como a diminuição do volume em alguns rios, também pressiona para que eles abandonem suas terras. Apesar disso, essas comunidades resistem e mostram que sua cultura e seu modo de produzir no campo devem ser mantidos, já que na maior parte dos casos encontram-se maior biodiversidade que nas áreas agrícolas, além de rios com água em melhores condições que aqueles que atravessam grandes áreas monocultoras.

BRASIL: TRANSFORMAÇÕES NO CAMPO

O campo brasileiro passou, e continua passando, por muitas transformações:

• mecanização da produção, com a utilização de tratores, semeadeiras, colheitadeiras, ceifadeiras e outros equipamentos;
• aumento do uso de adubos, fertilizantes e agrotóxicos;
• desenvolvimento de pesquisas para aplicação de novos conhecimentos e técnicas, como a criação de espécies resistentes a espécies invasoras e doenças ou que se adaptem melhor a determinado tipo de solo ou clima;
• uso de medicamentos e vacinas nos rebanhos para que se desenvolvam mais rapidamente;
• adoção de inovações, com o objetivo de reduzir os impactos ambientais e fazer melhor uso dos recursos naturais. São usadas, por exemplo, as chamadas Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTIC), criando-se softwares e aplicativos para diversos fins, como reduzir o desperdício de água na irrigação e evitar o uso excessivo de produtos químicos.

Esse conjunto de transformações promoveu a modernização do campo, proporcionando grande aumento da produtividade. No entanto, a forma como essas transformações aconteceram priorizou o agronegócio em detrimento da agricultura familiar, trazendo aspectos negativos, como:

substituição da produção: os cultivos de alimentos (feijão, milho, mandioca, hortaliças etc.) foram substituídos por cultivos destinados à indústria nacional e à exportação (soja, cana-de-açúcar, algodão, laranja etc.);
concentração de terras e êxodo rural: a produção em grande escala fez muitas propriedades rurais expandirem ainda mais suas terras para aumentar a produção. Com a dificuldade de acesso à terra e a recursos para a produção, muitas pessoas, principalmente a partir da década de 1960, deixaram o campo em busca de melhores condições de vida nas cidades, causando um intenso êxodo rural. A mecanização da produção também contribuiu para o êxodo, pois as máquinas substituíram o trabalho de muitos agricultores;
problemas ambientais: para aumentar a produção, áreas de vegetação nativa foram transformadas em pastos e plantações, intensificando o desmatamento e as queimadas. O peso das máquinas agrícolas e o pisoteio do gado provocam a compactação (endurecimento) do solo ou da terra, dificultando a infiltração da água e o desenvolvimento de raízes de plantas, o que prejudica a prática agrícola. Outro problema é a contaminação do solo e das águas por agroquímicos (como agrotóxicos e fertilizantes).

Produção de energia no Brasil

Movimentar máquinas, cargas e pessoas por longas distâncias demanda muita energia. No Brasil, usam-se combustíveis derivados de fontes não r...