A sucessão de Geisel foi disputada por dois militares: o general João Batista Figueiredo, apoiado pela ARENA, e o general Euler Bentes Monteiro, que pregava a rápida redemocratização, apoiado pelo MDB. Mais uma vez o Congresso Nacional ratificou o candidato oficial e o general Figueiredo apresentou uma plataforma em que se propunha a diminuir os gastos públicos, desestatizar a economia e ampliar a abertura política.
general João Batista Figueiredo
Eleito de forma indireta em outubro de 1978, o general João
Batista Figueiredo assumiu a presidência da República em março de 1979 para um
período de 6 anos – uma das imposições do Pacote de Abril, que aumentou o
mandato presidencial para prolongar a permanência dos militares no poder.
O governo Figueiredo foi pressionado por uma articulação cada vez mais corajosa das forças oposicionistas da sociedade civil, que exigiam basicamente volta ao estado de direito, com a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, anistia política e justiça social.
A crise econômica se agravava, confirmando as previsões dos economistas da oposição. A taxa de inflação atingiu a casa dos 200%, a dívida pública interna ultrapassou 90 trilhões de cruzeiros, a dívida externa atingiu mais de 100 bilhões de dólares e o índice de desemprego real chegou aos 20% da mão-de-obra ativa.
A liberdade de imprensa permitiu que viesse à tona muitos escândalos financeiros com envolvimento de autoridades governamentais. O processo de abertura gradual continuou controlado pelo governo federal, embora fosse acelerado pelas exigências de uma sociedade pressionada durante quase duas décadas de ditadura. Por outro lado, setores mais radicais do poder, contrários à continuidade da abertura, organizavam atentados terroristas, buscando desestabilizar o próprio governo e criar condições para um retrocesso político.
Em março de 1979, metalúrgicos do ABC, região da Grande São Paulo, entraram novamente em greve, mobilizando 180 000 operários. O governo federal interveio no sindicato, destituindo suas lideranças. Essa foi a primeira de uma série de greves na região: em abril de 1981, 330 000 operários pararam durante 41 dias, enfrentando violenta repressão. Luís Inácio da Silva, o Lula, líder desses movimentos, tornou-se símbolo de uma ação sindical combativa e renovada. Mais de 200 greves eclodiram por todo o Brasil no ano de 1980, fato que se repetiu nos anos seguintes.
Em agosto de 1979, a União Nacional dos Estudantes (UNE) foi reorganizada, embora não recebesse reconhecimento oficial. Nesse mesmo ano foi aprovada a Lei de Anistia, proposta por Figueiredo, e no início de 1980 os presos políticos libertados e os exilados podiam voltar ao país.
No final de 1979, o governo extinguiu a ARENA e o MDB, forçando uma reforma partidária, em que, entretanto, estavam proibidos os partidos comunistas. Formaram-se os seguintes partidos: Partido Democrático Social (PDS), herdeiro da antiga ARENA; Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), continuidade do antigo MDB; Partido Democrático Trabalhista(PDT), liderado por Leonel Brizola; Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), formado por setores da Antiga ARENA; Partido dos Trabalhadores(PT), com uma proposta socialista; e o Partido Popular(PP), que logo se auto extinguiu.
Em 1981, o governo, através de legislação eleitoral, proibiu alianças entre vários os partidos, objetivando forçar a divisão do bloco oposicionista e facilitar a vitória do PDS.
Em novembro de 1982 realizaram-se eleições diretas para governador, o que não ocorria desde 1967. O PDS saiu vitorioso em 12 Estados e a oposição em 10, embora os partidos oposicionistas tivessem 25 milhões de votos e o partido situacionista, 18 milhões. Nos estados mais populosos e de economia mais desenvolvida a oposição alcançou a vitória, com exceção de Pernambuco e Rio Grande do Sul, onde o PDS conquistou o poder por pequena margem de votos.
No Congresso Nacional o governo perdeu a maioria na Câmara dos Deputados, embora tenha mantido sua liderança no Senado, graças aos senadores “biônicos”.
Os governadores estaduais eleitos foram empossados em 1983, apesar da ameaça da extrema direita, dirigidas sobretudo a Leonel Brizola, eleito no Rio de Janeiro.
A vitória dos oposicionistas ampliou o espaço de atuação das forças que exigiam a redemocratização do país.
A linha dura em ação
Entretanto, apesar de o governo combinar a abertura política
com medidas de repressão, a linha dura continuava insatisfeita. Para seus
integrantes era preciso continuar a reprimir qualquer oposição ao regime. Como já
não podiam obrigar o governo a fazer isso, muitos deles passaram a organizar
atentados a Bomba, com o objetivo de tumultuar o processo político e retardar o
retorno ao Estado democrático.
Um desses atentados terroristas ocorreu em outubro de 1979,
com a explosão de uma Bomba no carro do jornalista Hélio Fernandes, no Rio de
Janeiro. Seguiram-se cerca de 40 atentados ao longo de 1980. Em São Paulo, o
jurista Dalmo Dallari, da Comissão de Justiça e Paz, foi sequestrado e
violentamente espancado; bancas de revistas que vendiam publicações de esquerda
sofreram atentados a bomba; uma carta-bomba enviada à sede carioca da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) matou a secretária Lyda Monteiro da Silva.
Na noite de 30 de abril de 1981, os terroristas da linha dura
tentaram sua façanha mais espetacular: colocar bombas em um show de música
popular brasileira realizado no Riocentro, Rio de Janeiro, onde estavam
concentradas milhares de pessoas. Antes que a tragédia acontecesse, uma das
bombas explodiu no carro dos terroristas, matando um sargento e ferindo o
capitão Wilson Chaves Machado: os dois militares eram agentes do Doi-Codi
carioca.
Os responsáveis pelo atentado jamais foram punidos pelo
governo, que tudo fez para abafar essa e outras ações terroristas promovidas
por setores da linha dura.
A luta pela redemocratização
Em maio de 1978, o movimento sindical iniciado no ABC ganhou impulso. Nos anos seguintes foram deflagadas, diversas greves, e as reivindicações sindicais alastraram-se por todo o país: operários, professores, médicos, camponeses, funcionários públicos, motoristas de ônibus, bancários, motoristas de taxi, todas as categorias se mobilizavam.
De 21 a 23 de agosto de 1981, lideranças sindicais de todo o Brasil reuniu-se no município de Praia Grande, no litoral de São Paulo, na primeira conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (CONCLAT). Participaram 5 036 delegados de 1 091 entidades de trabalhadores urbanos e rurais. Apesar de algumas divergências internas, o encontro aprovou resoluções que, resumidamente, estabelecia o seguinte: fim da política econômica do governo, liberdade e autonomia sindical, liberdade de organização política e não-realização de acordos com o FMI.
Em 1983, as divergências internas no movimento sindical resultaram na formação de mais uma central de trabalhadores, além da CONCLAT: a Central Única dos Trabalhadores (CUT). Essa divisão, embora refletisse disputas partidárias no seio do movimento sindical, indicava na realidade, concepções diferentes quanto à ação das classes trabalhadoras. O clima de abertura política e o razoável grau de articulação dos trabalhadores resultaram na tolerância do governo à existência tanto da CONCLAT quanto da CUT, embora não oficialmente reconhecidas.
As reivindicações sindicais passaram ao patamar das exigências políticas, desaguando em uma participação massiva dos trabalhadores no grande movimento das Diretas Já.
Os prefeitos e vereadores eleitos em novembro de 1982 encontraram um quadro desalentador nos municípios, com recursos financeiros escassos, encargos da dívida pública municipal elevados e intensas reivindicações populares por novas obras e serviços locais. Essa situação era fruto da centralização financeira implantada após 1964 para que, através do controle financeiro, o governo federal controlasse a política dos municípios. A luta pela a autonomia municipal contribuiria para a redemocratização do país.
Em maio de 1983, todos os prefeitos do Estado de São Paulo reuniram-se na cidade de Rio Claro, onde foi constituída uma comissão interpartidária de prefeitos com a finalidade de coordenar a luta pelo fortalecimento dos municípios paulistas. Paralelamente, movimentos semelhantes organizaram-se em outros estados do país e em poucos meses o movimento se articulou por todo o Brasil, sendo formada a Frente Municipalista Nacional, cuja presidência seria entregue ao então vice-governador de São Paulo, Orestes Quércia.
Em 27 de setembro de 1983, 3 000 prefeitos e vereadores realizaram uma marcha a Brasília, unindo-se num movimento que exigia mais recursos para os municípios. A proposta do governo federal às suas reivindicações foi negativa, e dois meses depois a Frente Municipalista Nacional realizaria nova marcha a Brasília. À revelia do presidente, o movimento conquistaria no Congresso Nacional a reforma tributária para os municípios.
A Frente Municipalista Nacional ainda se uniria à luta pela Constituinte e à mobilização pelas Diretas Já. Em abril de 1984, prefeitos e vereadores enfrentaram o estado de emergência decretado pelo governo federal e realizaram uma terceira marcha a Brasília, desta feita para apoiar a emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas para presidente.
Toda a insatisfação da sociedade brasileira culminou em uma reivindicação política que mobilizou o país de norte a sul: a campanha pela eleição direta para presidente da República. A luta pelas Diretas Já, como ficou conhecida, foi responsável pelas mais numerosas manifestações de massa de nossa história.
Passados 20 anos, desde o golpe de 1964, mais uma vez o presidente seria escolhido por um Colégio Eleitoral, que deveria, como sempre, referendar o nome indicado pelos detentores do poder. A proposta de uma emenda à constituição restabelecendo eleições diretas para presidente sensibilizaria o Brasil.
Em 27 de novembro de 1983, liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), aconteceu a primeira manifestação pelas eleições diretas, quando 10 mil pessoas se concentraram em frete ao estádio do Pacaembu, em São Paulo. A campanha cresceu nos meses nos meses seguintes. No dia 25 de janeiro de 1984, nova concentração foi realizada, reunindo-se aproximadamente 300 mil pessoas, na praça da Sé, em São Paulo.
Comícios, concentrações e passeatas fora realizadas nas capitais dos estados, nas grandes e pequenas cidades, tornando pública a emenda Dante de Oliveira.
Em 10 de abril de 1984, cerca um milhão de pessoas concentrou-se no Rio de Janeiro. Menos de uma semana depois, ultrapassando o recorde carioca, reunia-se, em São Paulo, uma multidão estimada em 1,7 milhão de pessoas. Era o auge da campanha. Levantamentos realizados pelos órgãos de comunicação indicaram que mais de 6 milhões de pessoas se manifestaram nas ruas antes de 25 de abril, data da votação da emenda constitucional. Nesse dia, entretanto, frustraram-se os anseios nacionais. Com Brasília, Goiânia e mais nove municípios sob estado de emergência, o Congresso Nacional votou a emenda Dante de Oliveira: 298 deputados votaram a favor, 65 contra, três abstiveram-se e 112 não compareceram. Faltaram 22 votos favoráveis para completar os dois terços necessários para aprovação de uma emenda constitucional.
O fim da República militar
A campanha das diretas concentrou momentaneamente as esperanças de quase toda a população brasileira. Ela se apresentava como o primeiro passo para a resolução dos inúmeros problemas que afligiam a nação. A eleição do presidente pelo Colégio Eleitoral sugeria a continuidade da situação por mais seis anos.
Com a derrota da emenda, os partidos de oposição iniciaram articulações visando derrotar o regime no próprio Colégio Eleitoral. O PMDB, o PDT e o PTB tentaram atrair setores descontentes do PDS. O PT, porém, se manifestou contra a ida ao Colégio Eleitoral.
Em junho de 1984, o senador José Sarney renunciou a presidência do PDS. Setores dissidentes desse partido se articularam e formaram o Partido da Frente Liberal (PFL). Em julho, o PFL e o PMDB formalizaram um acordo de apoio à candidatura de Tancredo Neves para presidente da República e José Sarney para vice-presidente. Em agosto, a convenção do PDS escolheu Paulo Salim Maluf para candidato, derrotando Mário Andreazza, indicado pelo presidente Figueiredo. A derrota de Andreazza resultou no apoio de mais dissidentes do PDS ao candidato oposicionista, garantindo a neutralidade de Figueiredo e da maioria dos militares no processo sucessório.
Em 15 de Janeiro de 1985, Tancredo Neves derrotou Paulo Maluf no Colégio Eleitoral por 480 votos a 180. “Fomos ao Colégio Eleitoral para que ele nunca mais seja utilizado”, afirmou Tancredo Neves, cuja eleição encerrava o período de 21 anos de regime militar no país. No entanto, Tancredo não tomou posse. Adoecendo, o novo presidente passou por uma longa agonia, que comoveu toda a população, vindo a falecer em 21 de abril, após sete intervenções cirúrgicas.