quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Ditadura Civil-Militar no Brasil

A crise política brasileira, desencadeada em 2014 por denúncias de corrupção, provocou o descrédito de parte da sociedade em relação aos governantes e aos agentes públicos. Esse cenário produziu um fenômeno social insólito no qual alguns segmentos sociais clamam por medidas autoritárias e chegam a reivindicar a recondução dos militares ao poder. Esses segmentos alegam que a Ditadura Civil-Militar que vigorou no país foi uma fase de crescimento econômico. Esse posicionamento recebe críticas por minimizar o fato de que esse crescimento foi desfrutado somente pelas elites e empresas estrangeiras. Também porque desconsidera que o Estado se sobrepôs aos cidadãos, negando-lhes o direito de participar e decidir os rumos do país; impôs rigoroso controle sobre ações, ideias e informações; encobriu desmandos, torturas e práticas de corrupção.

Em contrapartida, diversos movimentos sociais vêm se organizando para ampliar a democracia no país, trazendo à discussão demandas identitárias e propostas políticas para inclusão social, redução das desigualdades e combate a quaisquer manifestações de preconceito e violência. O panorama de embates entre essas diferentes visões reflete, de forma mais ampla, a crise global do sistema capitalista e das democracias ocidentais, com o crescimento de partidos ultraconservadores e a ascensão de governos autoritários. Impõe-se, assim, o que talvez seja o maior desafio do século XXI: tornar as sociedades mais plurais e democráticas.

A frágil democracia

Em agosto de 1961, a renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República criou um cenário político conturbado no país. O Congresso Nacional, temeroso de que o vice-presidente João Goulart, o Jango, fizesse um governo de inspiração comunista, adotou o parlamentarismo. Por isso, quando ele tomou posse em setembro, seus poderes estavam diminuídos. Em seu governo, elaborou o Plano Trienal, que visava à recuperação econômica do país com investimentos na indústria, controle da inflação e diminuição do déficit público. Criou o 13o salário para manter o apoio das classes trabalhadoras, que reivindicaram também reajuste de 100% no salário-mínimo. Jango idealizou as Reformas de Base, amplo programa que previa a reforma agrária, fiscal, administrativa, educacional, bancária e eleitoral. As classes trabalhadoras rurais e urbanas apoiaram essas medidas, enquanto os latifundiários, empresários e as Forças Armadas se opuseram a elas.

Os setores conservadores consideravam essas reformas uma demonstração da tendência comunista do presidente. Entretanto, elas não visavam ao fim do capitalismo nem ameaçavam os interesses capitalistas, como faziam crer seus opositores. Jango participara dos governos Vargas, Kubitschek e Quadros e seguia as diretrizes políticas deles. Sua simpatia pelas causas trabalhistas era uma forma de controlar as massas populares; com seu nacionalismo, pretendia fortalecer o empresariado brasileiro; suas propostas de reforma agrária visavam diminuir as tensões no campo e evitar revoltas sociais que ameaçassem a ordem vigente.

Do plebiscito ao golpe

Em fins de 1962, o governo Jango deu início aos preparativos para realizar o plebiscito em que a população escolheria entre a continuidade do parlamentarismo ou o retorno ao presidencialismo, conforme previsto na Constituição.

Em janeiro de 1963, o povo foi às urnas e 82% dos eleitores optaram pelo retorno do país ao sistema presidencialista. Contudo, isso não representou a estabilidade do governo. Jango se chocava com os interesses estrangeiros e aumentava a desconfiança daqueles que temiam o “perigo vermelho” ao nacionalizar refinarias de petróleo e restringir as remessas de lucros ao exterior. Crescia também a desconfiança dos empresários nacionais, que criticavam a falta de crédito, o 13o salário e a reforma agrária. Em março de 1964, ocorreu em São Paulo a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, uma manifestação contra o governo organizada por setores das classes médias e pela burguesia industrial, com cerca de 500 mil pessoas.

Dias depois, um grupo de mais de mil marinheiros organizou um levante contra punições disciplinares na Marinha. Goulart anistiou os rebeldes, provocando reação do alto comando das Forças Armadas, que considerou essa medida muito tolerante. As Forças Armadas estavam cientes de que a política do governo desagradava a elite financeira, industrial e agrária, bem como setores das classes médias, e tinham respaldo de parte da sociedade brasileira para tomar o poder. Além disso, contavam com a declarada simpatia dos Estados Unidos, que preferiam ter à frente dos governos latino-americanos lideranças alinhadas com seus interesses.

Nesse contexto, Goulart foi deposto por um golpe de Estado em 31 de março de 1964, e a presidência foi assumida pelo general Castelo Branco. Sob o pretexto de restabelecer a ordem e o desenvolvimento econômico, os militares assumiram o poder e imprimiram sua marca na história recente do país.

Os militares no poder

Ao longo de 21 anos de regime militar, de 1964 a 1985, cinco generais se sucederam no governo e legitimaram a Ditadura Civil-Militar por meio de um discurso anticomunista e de defesa da pátria, da família, do cristianismo e do combate à corrupção. O regime valeu-se do medo difundido entre a população de um eventual levante comunista no país, tal qual ocorrera em Cuba anos antes, e justificou suas ações mais arbitrárias como necessárias à garantia da segurança nacional.

Em 1966, foi criado o Serviço Nacional de Informações (SNI), encarregado de espionar a sociedade para identificar organizações e indivíduos subversivos, dando início aos crimes contra os direitos humanos.

Ao decretar Atos Institucionais, que tinham força de lei, ampliou-se o poder do presidente da República; estabeleceu-se o bipartidarismo, tornando os partidos políticos existentes até então ilegais; estipulou-se eleições indiretas para cargos do Executivo; instituiu-se uma nova Constituição em 1967, que aumentava o controle dos militares sobre o Estado. Em fins de 1968, o governo promulgou o Ato Institucional no 5, conhecido por AI-5, que representou a restrição aos direitos políticos e às liberdades individuais dos cidadãos, tornando-se um instrumento legal contra a oposição.

Nesse cenário, instaurou-se a censura à imprensa e às produções artísticas e culturais, como canções, filmes, livros, espetáculos teatrais. Artistas, intelec tuais e professores universitários foram exilados. Lideranças políticas, sindicais e estudantis tiveram seus direitos políticos cassados; opositores do regime foram presos e muitos deles torturados, especialmente entre 1969 e 1974, considerados os “anos de chumbo” do regime. Em junho de 1968, ocorreu na cidade do Rio de Janeiro a Passeata dos Cem Mil, liderada por artistas e intelectuais, em protesto às medidas repressivas do regime militar. O ato foi a maior manifestação de protesto desde o golpe de Estado, em 1964.

Resistências à Ditadura Civil-Militar

Alguns grupos, formados principalmente por estudantes, intelectuais e militares, passaram a organizar ações radicais visando à luta armada para derrubada do governo. Destacaram-se os assaltos a bancos e a carros-fortes e o sequestro, por parte de líderes estudantis, do embaixador dos EUA Charles Elbrick, que posteriormente foi solto em troca da libertação de presos políticos. No sul do Pará, integrantes do Partido Comunista do Brasil organizaram a Guerrilha do Araguaia. Os guerrilheiros queriam o fim do regime militar e a implantação do socialismo no país. Entre 1972 e 1974, foram enviados cerca de 4 mil soldados para a região, que executaram prisões e torturas, deixando um saldo de 70 mortes. A censura encobria a violência contra os opositores e os problemas socioeconômicos do país. Em paralelo, a propaganda oficial exaltava o Brasil como grande nação utilizando slogans ufanistas. Anos mais tarde, em 2012, foi instituída a Comissão Nacional da Verdade (CNV) para apurar graves violações de direitos humanos ocorridas no Brasil entre 1946 e 1988.

“Milagre brasileiro”: desenvolvimentismo e conflitos com indígenas

O autoritarismo passou a ser justificado pelo grande desenvolvimento econômico do período, chamado de “milagre brasileiro”. Para sustentar o crescimento da economia, o regime militar concedeu abertura ao capital externo, praticou o arrocho salarial e realizou grandes obras de infraestrutura, o que resultou no endividamento do país e na acentuada concentração de renda. A construção de obras públicas, como estradas e hidrelétricas, forçou muitos povos indígenas a abandonar as terras. Nesse processo, agentes do Estado ou jagunços ligados a proprietários de terras locais agiram com violência contra populações nativas inteiras. Em decorrência, lideranças indígenas passaram a se organizar para exigir a demarcação de suas terras e o direito à preservação de suas culturas e línguas. Contudo, o reconhecimento legal dos direitos dos povos indígenas só viria na Constituição de 1988.

Cultura e contracultura

Durante a Ditadura Civil- -Militar, artistas e intelectuais brasileiros se engajaram em um movimento amplo, diversificado e multifacetado de produção cultural. Além da criatividade, tinham em comum a resistência aos modelos culturais impostos pelos órgãos oficiais de censura e a busca por uma cultura nacional com a qual se identificassem.

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