Mundo islâmico
A civilização árabe desenvolveu-se na Península Arábica, localizada no sudoeste da Ásia. É uma região de clima quente e seco, onde desertos ocupam 80% do território. Enquanto o Império Romano do Oriente lutava para manter vivas a cultura e as tradições helenísticas, um povo de pastores semitas mudava o curso da História.
Mobilizados pelo profeta Maomé, entraram em choque com a civilização bizantina e com os novos reinos da Europa ocidental. Os muçulmanos construíram a civilização mais brilhante da Idade Média, assimilando o patrimônio cultural dos povos do Oriente Médio e do Extremo Oriente. Atualmente, o islamismo conta com milhões de seguidores em todo o mundo.
A península dos árabes
A Arábia é um imenso deserto de pedras e areia. Seus escassos habitantes se fixaram na costa do mar Vermelho e nos oásis do interior. A península Arábica era habitada por tribos de beduínos semitas, da mesma origem dos judeus, fenícios e assírios.
Os beduínos da Arábia eram pastores de rebanhos de cabras e camelos. Sua principal atividade era o comércio entre os oásis do interior e o litoral. Nas aldeias, tais como Meca e Yatrib, cultivavam a terra.
Islão
A história da Arábia costuma ser dividida em duas grandes fases:
• Arábia pré-islâmica – período anterior à fundação do islamismo.
• Arábia islâmica – período caracterizado pelo islamismo.
Arábia pré-islâmica
Viviam na península Arábica diversos povos semitas, destacando-se os:
• Árabes beduínos – povos seminômades que vagavam pelos desertos. Organizados em tribos, dedicavam-se á criação de animais (ovelhas, cabras, camelos);
• Árabes urbanos – povos sedentários que habitavam as cidades próximas ao litoral. Dedicavam-se sobretudo ao comércio, sendo responsáveis pelas caravanas de camelos que transportavam produtos do Oriente para as regiões do mar Mediterrâneo.
Até o século VII, os árabes não formavam um Estado único. Na Península Arábica, grupos de famílias (ou clãs) viviam sob a liderança de alguns homens mais velhos, chamados xeiques. Os diversos clãs compartilhavam laços culturais e de parentesco. Todos tinham elementos comuns, como o idioma (árabe), com variações regionais, e as crenças religiosas. Eram politeístas e adoravam cerca de 360 divindades.
Numa tentativa de dar maior unidade às diversas tribos árabes, foi construído na cidade de Meca um templo religioso, a Caaba (‘casa de Deus’), que reunia as principais divindade de toda a Arábia. Na Caaba encontra-se a pedra negra (pedaço de meteorito), que acreditam ter sido trazida do céu pelo anjo Gabriel.
Devido ao templo, Meca tornou-se o centro religioso e comercial dos árabes, pois a cidade transformou-se em ponto de encontro de pessoas e mercadorias de diversas regiões.
Arábia islâmica
A construção de um Estado árabe ocorreu com a criação do islamismo. A religião islâmica é monoteísta e foi fundada por Maomé (570-632). Os seguidores do islamismo são chamados muçulmanos (do árabe muslim, que significa “entrega a Deus”). Quando jovem, Maomé era um comerciante de Meca. Em suas viagens pela Península Arábica, ele entrou em contato com adeptos do cristianismo e do judaísmo.
Segundo a tradição muçulmana, o anjo Gabriel apareceu a Maomé e revelou que ele era um emissário de Alá (em árabe, “o Deus”). Maomé, então, iniciou suas pregações religiosas. Dizia que as várias divindades cultuadas na Caaba deveriam ser destruídas e que Alá era o único Deus criador do universo. Isso provocou a reação dos sacerdotes de Meca, que eram politeístas e tinham interesses em manter a cidade como centro religioso e comercial dos árabes.
Devido a suas pregações, Maomé foi obrigado a fugir de Meca para Yathrib (posteriormente denominada Medina, ‘a cidade do profeta’), em 622. esse episódio, conhecido como hégira, marca o início do calendário muçulmano.
Formação da Arábia islâmica
Em Medina, Maomé e seus seguidores difundiram o islamismo e construíram a primeira mesquita de que se tem notícia. Também organizaram um exército formado por fiéis.
Em 630, esse exército conquistou Meca e destruiu os ídolos da Caaba. Esse templo tornou-se um local de orações para Alá, e a Pedra Negra foi preservada e incorporada à tradição islâmica e a crença politeísta foi proibida. O islamismo difundiu-se por toda a Arábia, e seus habitantes foram se unificando em torno da nova religião. Foi por meio dessa identidade religiosa que surgiu o primeiro Estado muçulmano.
A partir daí, Maomé expandiu o islamismo por toda a Arábia, unificando as diversas tribos em torno da religião. Assim, através da identidade religiosa, criou os árabes uma nova organização política e social.
Doutrina islâmica:
A submissão a Alá
O Islamismo prega a submissão total do homem à vontade de Alá, o Deus único, criador de todo universo. Essa submissão é chamada de Islão, e aquele que tem fé em Alá é denominado muçulmano (do árabe muslim).
Os princípios básicos do Islamismo estão contidos nas seguintes regras fundamentais:
• Crer em Alá, o Deus único, e em Maomé, o seu grande profeta.
• Fazer cinco orações diárias.
• Ser generoso para com os pobres e dar esmolas.
• Cumprir o jejum religioso durante o Ramadã (mês do jejum).
• Ir em peregrinação a Meca, pelo menos uma vez na vida.
Alcorão
As revelações feitas por Alá a Maomé foram reunidas por seus discípulos no livro sagrado Alcorão (‘a leitura’). Segundo o Corão, a recompensa para os bons e o castigo para os maus virão no dia do Juízo Final. Os maus irão para o inferno e os bons, para o paraíso, onde permanecerão por toda a eternidade.
Além de orientações puramente religiosas, o alcorão que contribui para a preservação da ordem social e dos interesses dos grandes comerciantes. Proíbe, por exemplo, que os fiéis comam carne de porco, consumam bebida alcoólica, pratiquem jogos de azar. O roubo é severamente punido. A poligamia e a escravidão são permitidas.
O Corão também proibiu os muçulmanos de escravizar outra pessoa da mesma religião. Por isso, a partir do século VII, os escravizados que se convertiam ao islamismo eram libertados. No entanto, a escravidão continuou a existir entre os árabes. Eles passaram a escravizar não muçulmanos, como os negros da África ao sul do Saara.
Maomé
Maomé nasceu em Meca em 570. Era pastor e cuidava de caravanas de camelos. A tradição conta que Maomé recebeu uma revelação do Arcanjo Gabriel, segundo a qual Alá o escolhera para pregar a mensagem de salvação entre seus irmãos árabes: o Islã, que significa a “submissão à vontade divina”.
Maomé e a construção da mesquita
Os ensinamentos de Maomé fortaleceram os laços familiares entre os árabes. A mulher deixou de ser escrava para tornar-se companheira. A poligamia, o costume de manter muitas mulheres, teve seu limite fixado em quatro esposas.
Os sunitas e os xiitas
Após a morte de Maomé, a religião islâmica não conseguiu manter-se plenamente unificada. Dividiu-se em diversas seitas, dentre as quais destacam-se a dos sunitas e xiitas.
As principais diferenças, no plano religioso e político, que separam os sunitas dos xiitas são:
Sunitas – defendem que o chefe do Estado muçulmano (califa) deve reunir sólidas virtudes (honra, respeito pelas leis, capacidade de trabalho), mas não acham que ele deve ser infalível ou implacável em suas ações. Além do Alcorão, aceitam como fonte de ensinamentos religiosos as Sunas, livro que reúne o conjunto de tradições recolhidas com os companheiros de Maomé.
Xiitas – defendem que a chefia do Estado muçulmano só pode ser ocupada por alguém que seja descendente do profeta Maomé ou com ele aparentado. Acreditam que o Corão é a única fonte sagrada da religião e afirmam que os aiatolás, chefes das comunidades islâmicas, são inspirados diretamente por Alá e que os fiéis lhe devem obediência absoluta. Atualmente, a maioria dos seguidores do xiismo encontra-se no Irã, no Iraque e no Iêmen. Nas demais regiões do mundo islâmico, predominam os seguidores do sunismo (aproximadamente 84% dos atuais muçulmanos).
EXPANSÃO ÁRABE
Formação do Império Islâmico
Com a morte do profeta, seu sogro, Abu-Beker, se proclama califa, palavra que significa sucessor, e governa em nome do profeta. O califa era um misto de chefe político e religioso. Tinha como missão preparar os árabes para a conquistada Terra. Abu-Beker foi sucedido pelo califa Omar. Durante seu governo de onze anos, deu-se o início da expansão muçulmana. Guerreiros do Islã atacaram a Pérsia e o Império Bizantino, ambos debilitados por lutas internas.
São várias as razões dessa expansão. Entre elas, destacam-se:
- a busca de terras férteis;
- o interesse na ampliação das atividades comerciais;
- as guerras santas contra os “infiéis”, ou seja, a luta para difundir e preservar o islamismo.
Fases da expansão
As grandes etapas da expansão muçulmana foram:
Primeira etapa (632-661) – período dos califas eleitos que sucederam Maomé. Conquistas da Pérsia, da Síria, da Palestina e do Egito.
Segunda etapa (661-750) – período da dinastia dos califas Omíadas. A capital foi transferida para Damasco. Conquistas, por exemplo, do noroeste da China, do norte da África e de quase toda a península Ibérica. O avanço árabe (ou serracenos) ao Reino Franco foi barrado por Carlos Martel, na Batalha de Poitiers, em 732.
Terceira etapa – (750-1258) – período da dinastia dos califas Abássidas, marcado pela ascensão dos persas rumo ao mundo islâmico. Nessa fase, a capital foi transferida para Bagdá. As conquistas muçulmanas ainda avançaram pela Europa, na parte sul da península Itálica.
Relacionamento com os povos conquistados
O vasto Império Muçulmano era composto por uma grande variedade de povos. Os árabes procuraram relacionar-se com esses povos conquistados de uma maneira prática e, tanto quanto possível, pacífica. Não obrigavam os povos conquistados a aderir ao islamismo, apenas impunham o pagamento de tributos à administração árabe (o imposto do infiel). Quando esses povos eram submetidos às autoridades muçulmanas, costumava-se respeitar a cultura e os costumes locais. Se houvesse, porém, resistência à dominação árabe, o tratamento era rude e impiedoso.
Diversificação econômica
Nas regiões conquistadas, os muçulmanos desenvolveram uma produção agrícola variada graças à construção de grandes obras de irrigação, que tornaram produtivas terras antes estéreis e empobrecidas. Cultivavam lavouras adaptadas ao clima de cada região e destinadas à produção de trigo, algodão, arroz, linho, cana-de-açúcar, espinafre, café, oliveira, laranja e outros produtos.
Ao mesmo tempo em que ampliavam seus territórios, os muçulmanos expandiam a atividade comercial, dominando as grandes rotas, desde as regiões da atual Índia até a península Ibérica.
Viajantes do mar e da terra, os muçulmanos realizaram negócios em diferentes regiões do mundo. Navegavam constantemente pelo mar Mediterrâneo, oceano Índico, mar Vermelho e golfo Pérsico, detendo assim, o controle do comércio entre Oriente e Ocidente. Por terra, percorriam, em caravanas de camelos, regiões da África, Índia, China e Rússia.
Também se tornaram habilidosos comerciantes, criando diversos instrumentos jurídicos para a realização dos negócios: cheques, letras de câmbio, recibos e sociedades comerciais.
O intenso comércio muçulmano foi acompanhado de significativo desenvolvimento da produção artesanal, responsável por grande parte dos artigos comerciais. Em Bagdá (no atual Iraque), por exemplo, produziam-se joias, vidros, cerâmicas e sedas; em Damasco (na atual Síria), destacou-se a produção metalúrgica de armas e ferramentas, além de seu famoso tecido de seda e linho; em Toledo (na atual Espanha), produziam-se ótimas espadas, cobiçadas pelos cavaleiros medievais.
Declínio do império
A partir do século VIII, o poder central nos vários territórios conquistados pelos muçulmanos passou a enfrentar crises internas, provocadas, em sua maior parte, pelas rivalidades entre os califas. Essas disputas levaram ao desmembramento do Império Islâmico e à formação de Estados muçulmanos independentes, como o de Córdoba (na atual Espanha) e o do Cairo (no atual Egito).
No plano externo, os árabes enfrentaram a reação de povos conquistados. Na península Ibérica, por exemplo, os cristão uniram-se para expulsá-los de seus territórios. Já no Oriente, entre os séculos XIII e XV, uma série de povos invasores acabou conquistando os territórios dominados pelos árabes.
No entanto, o islamismo manteve seu predomínio em grande parte dos novos Estados que surgiram com o fim do Império Islâmico. Atualmente, países de diferentes regiões do mundo – como o norte da África, parte da Ásia e o sudoeste da Europa – são islâmicos.
Cultura árabe
Difusão de descobertas e conhecimentos
Durante a Idade Média, os árabes assimilaram e reelaboraram produções culturais de diversos povos, criando, ao mesmo tempo, uma cultura rica e singular.
Em muitas situações, eles difundiram aspectos econômicos e culturais do Oriente e do Ocidente. Foi, por exemplo, por intermédio deles que chegaram à Europa inventos dos povos orientais, como a bússola, a pólvora e o papel. E também muitos textos da Antiguidade Clássica, como as obras de Aristóteles.
Na ciência, podemos destacar contribuições árabes nas seguintes áreas:
Matemática – introduziram os algarismos hindus, que ficaram conhecidos como algarismos arábicos, e o numeral zero. Além disso, desenvolveram a álgebra e a trigonometria;
Medicina – descobriram técnicas cirúrgicas e revelaram as causas de doenças contagiosas, como a varíola e o sarampo;
Química – descobriram substâncias como o ácido sulfúrico, o salitre e o álcool, além de desenvolverem o processo de utilização de diversos elementos químicos.
A expansão islâmica também levou à difusão do idioma árabe, que era a “língua oficial” do mundo islâmico. Por isso, diversos idiomas contam com muitas palavras de origem árabe, como, no caso do português, as palavras arroz, café, algarismo, álgebra, álcool, frango, sorvete, jarra, alface, azeite, tarifa, açúcar, entre tantas outras.
Arte
A literatura foi marcada pela ampla influência dos contos e das fábulas maravilhosas, destacando-se obras como As mil e uma noites, Rubayat e As aventuras de Simbad, o marujo. Nessas narrativas, encontramos a presença de elementos culturais de diversos lugares, como o Egito, a Pérsia e a Índia.
A arquitetura teve como obra mais representativa as mesquitas (templos religiosos), que utilizavam como elementos os minaretes (imponente torres, as cúpulas douradas, os arcos em ferradura e uma esplendorosa decoração baseada em motivos geométricos ou vegetais, denominada arabescos.
A escultura e a pintura receberam pouca atenção dos muçulmanos, devido a severa proibição religiosa da idolatria, que desaconselhava a reprodução de figuras humanas em estátuas ou em quadros. Disso decorre a grande utilização de arabescos, com suas composições estilizadas, muito empregados na brilhante tapeçaria árabe.
Nem todo muçulmano é árabe
Atualmente, o islamismo é a segunda maior religião do mundo em número de seguidores. São mais de 1 bilhão e 300 milhões de muçulmanos em cerca de 75 países. Isso representa aproximadamente 20% da população mundial.
Muita gente pensa que todos os muçulmanos são árabes (habitantes da Península Arábica ou falantes da língua árabe), mas não é bem assim. Embora o islamismo tenha surgido na Península Arábica, atualmente apenas uma pequena parcela dos muçulmanos do mundo é árabe.