quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

A VOLTA DA DEMOCRACIA NO BRASIL E A CONSTITUIÇÃO DE 1988

Tancredo Neves venceu a eleição indireta. Sua posse estava marcada para 15 de março de 1985, mas, na véspera, adoeceu e foi internado em um hospital de Brasília (DF), onde passou por cirurgias. Fragilizado, não resistiu às sucessivas operações e faleceu no dia 21 de abril. Com isso, José Sarney assumiu a presidência. Começava uma nova fase política, de transição para a democracia, que só se estabeleceria definitivamente com a promulgação da nova Constituição Federal Brasileira, em 1988, e com a primeira eleição direta para a Presidência da República, em 1989.

A posse de José Sarney como presidente da República, em março de 1985, representou o fim da ditadura civil-militar. Entretanto, para que a democracia no Brasil se efetivasse, ainda seriam necessárias a eleição direta para a Presidência da República e a promulgação de uma nova constituição. Assim, logo após a posse de Sarney, foi convocada uma Assembleia Nacional Constituinte para elaborar e aprovar a nova Constituição do Brasil. A Assembleia instalou-se em março de 1987 e, em outubro do ano seguinte, era promulgada a Constituição, contendo 250 artigos. Por apresentar avanços nos direitos civis, políticos e sociais, a nova Carta foi chamada de Constituição Cidadã.

Esta foi a primeira Carta Constitucional brasileira a aceitar emendas populares. Durante o período em que os constituintes se encontraram reunidos no Congresso, discutindo a elaboração da nova legislação, grupos à direita e à esquerda do campo político brasileiro articularam-se e coletaram assinaturas com o objetivo de propor cláusulas a serem votadas pelos parlamentares.

A Constituição Cidadã

A promulgação da Constituição Federal de 1988 inaugurou uma nova etapa na construção da democracia no Brasil. Em seus 250 artigos, foram introduzidos princípios e direitos importantes em relação ao período anterior, com destaque para leis que permitiram a eliminação definitiva de marcas políticas da ditadura. Exemplos disso são a proibição da censura prévia a manifestações culturais, a condenação da prática de tortura e o direito do cidadão de acessar quaisquer informações que os órgãos públicos tenham a seu respeito (habeas data).

Além disso, a Constituição Federal trouxe avanços muito importantes do ponto de vista dos direitos sociais, como a garantia do acesso a serviços de saúde, previdência social, assistência social, educação, cultura e desportos a todos os cidadãos brasileiros. Outro elemento central na atual constituição está relacionado ao reconhecimento das culturas dos diferentes povos e etnias do território brasileiro e à proteção das manifestações socioculturais indígenas, afro-brasileiras e de outros grupos. A prática de racismo, até então considerada contravenção penal, passou a ser considerada crime inafiançável, o que contribuiu para o enfrentamento de um grave problema social e o resgate da cidadania da população negra do país.

A Constituição também trouxe avanços importantes em relação à questão da ocupação de terras por comunidades tradicionais. Os povos indígenas tiveram reconhecidos seus direitos sobre as terras que tradicionalmente ocupam e sobre os recursos nelas disponíveis. Já os remanescentes das comunidades de quilombos conquistaram a propriedade definitiva sobre as terras em que vivem e que lhes foram deixadas por seus antepassados.

A DITADURA CIVIL-MILITAR NO BRASIL (1964-1985)

Com a deposição do presidente João Goulart e a ascensão dos militares ao poder, o Brasil viveu uma época na qual as liberdades e os direitos políticos foram suspensos. A ditadura civil- -militar brasileira vigorou de 1964 a 1985. Durante os 21 anos desse regime, os cidadãos brasileiros foram impedidos de escolher seus representantes para os principais cargos do Poder Executivo. As eleições para presidente da República, governadores dos estados, prefeitos das capitais e de municípios considerados áreas de segurança nacional passaram a ser feitas de maneira indireta, e os escolhidos eram, em geral, civis que apoiavam o regime. Nesse período, o país teve cinco presidentes, todos eles generais indicados pelo Exército e eleitos também indiretamente, sem disputar o cargo com qualquer outro adversário. Muitas pessoas que faziam oposição ao regime foram presas e torturadas, várias delas foram mortas e outras tiveram de se exilar para sobreviver. A imprensa e as manifestações culturais, como o teatro, o cinema, a música e a literatura, também foram cerceadas, sendo muitas vezes submetidas à censura prévia.

Primeiros tempos (1964-1968)

Entre as primeiras medidas da ditadura esteve a organização de uma rede de informações voltadas ao controle, repressão e censura aos oposicionistas e à proibição de estes participarem da vida política. Em 1965, os partidos políticos foram encerrados e instaurou-se o bipartidarismo. Assim, os políticos que apoiavam a ditadura – grande parte deles oriundos da antiga União Democrática Nacional (UDN) – uniram-se em torno da Aliança Nacional Renovadora (Arena); e os da oposição, em torno do Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Ao adotar o bipartidarismo, visava-se dar um verniz democrático ao regime, uma vez que ele parecia acolher posições políticas divergentes no Legislativo.

Os atos institucionais

O golpe de Estado que derrubou o presidente João Goulart e colocou os militares no poder foi um ato que violou a Constituição em vigor. Para legitimar o regime então instalado, o comando militar criou o regulamento que ficou conhecido como ato institucional. Os atos institucionais (AIs) eram decretos que permitiam ao governo modificar leis, sem que tal decisão passasse pela aprovação do Congresso, como ocorre em uma democracia. Por meio desses atos, o governo procurava criar embasamento legal para suas decisões autoritárias. Com base no argumento de que os atos institucionais tinham por objetivo combater a corrupção e a subversão, entre 1964 e 1969 foram decretados 17 atos institucionais, bem como 104 atos complementares, que garantiram ao regime amplos poderes para interferir nos poderes Legislativo e Judiciário e conduzir a política nacional.

A oposição se fortalece

Setores variados da população reagiram ao autoritarismo implantado. Entre os estudantes, por exemplo, era forte o descontentamento com o governo. Nos sindicatos, começaram a surgir líderes contrários ao autoritarismo e à política de arrocho salarial do governo. Diversos filmes e peças de teatro faziam constantes críticas ao regime. Na música popular, as manifestações contrárias ao governo eram ainda mais fortes. Mesmo sujeitos à censura e ao controle, muitos artistas produziram canções que criticavam abertamente as ações do regime.

Os anos de chumbo (1969-1978)

Em 1968, ocorreram grandes greves e manifestações populares. Para conter esses movimentos, foi decretado, em 13 de dezembro, o Ato Institucional número 5, conhecido como AI-5, um conjunto de medidas que inauguraram o período mais autoritário e repressivo da ditadura. O decreto do AI-5 autorizava o presidente da República a fechar o Congresso Nacional, legislar sobre qualquer assunto e intervir em estados e municípios. Permitia ainda que o presidente suspendesse os direitos políticos de qualquer cidadão pelo prazo de dez anos, cassasse mandatos de deputados e senadores e estabelecesse censura prévia às manifestações culturais e à imprensa. O AI-5 também proibia o habeas corpus aos presos políticos e determinava que as decisões do governo, baseadas nesse ato institucional, não podiam ser discutidas na Justiça. Era, assim, um instrumento que impedia a manifestação dos que discordavam do governo e aumentava a perseguição contra eles. Muitos oposicionistas tiveram de deixar o país e se exilar. Entre essas pessoas estavam artistas, professores, intelectuais, políticos, estudantes etc. Outros, principalmente os mais jovens, passaram a fazer parte de grupos clandestinos que combatiam a ditadura por meio da luta armada. Isso deu origem a diversas organizações guerrilheiras, chamadas de organizações terroristas pelos militares.

O aumento da repressão

Em resposta às ações de guerrilha, o governo endureceu a repressão. Para isso, criou órgãos encarregados de desmantelar os grupos de esquerda, armados ou não, e prender seus integrantes. Assim, os grupos guerrilheiros, após uma fase inicial de organização da resistência, foram duramente reprimidos pela ditadura. Muitos militantes morreram em sessões de tortura, outros em confrontos com a polícia, outros ainda foram dados como desaparecidos. Seus familiares também eram vítimas do regime, que os torturava em troca de informações que muitas vezes não tinham. Organizações de defesa dos direitos humanos afirmam que 210 militantes presos nessa época nunca mais foram vistos; entre eles, 191 foram oficialmente declarados mortos. Toda essa violência acabou por desmantelar não só os grupos de luta armada, mas também as organizações de esquerda que haviam optado por não pegar em armas naquele momento. No começo dos anos 1970, nenhum desses grupos estava em condições de prosseguir em seu combate à ditadura. Segundo os militares, as ações dos grupos guerrilheiros também provocaram diversas mortes. De acordo com dados das Forças Armadas, os confrontos com os militantes acarretaram a morte de 126 agentes do governo, entre militares e civis.

Milagre econômico e repressão Com a censura aos meios de comunicação, o governo militar impedia que jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão publicassem notícias contrárias a seus interesses. Ao mesmo tempo, fazia uso intenso da propaganda para divulgar sua ideologia e exaltar o regime e suas realizações. Dessa forma, a ditadura procurava isolar os opositores do regime, denunciando-os como inimigos do Brasil. Um dos slogans mais repetidos nessa época era: “Brasil, ame-o ou deixe-o.”, como se amar o país fosse apoiar o governo.

Grande parte da propaganda do governo alardeava o crescimento econômico e a realização de obras, como a rodovia Transamazônica, que atravessava parte da região Norte, e a ponte Rio-Niterói, que foi construída na época e é usada ainda hoje. Era a época do “Brasil grande”. Esse clima de exaltação da ditadura foi favorecido pela vitória da seleção brasileira de futebol na Copa do Mundo de 1970 e pela comemoração do Sesquicentenário (150 anos) da Independência do Brasil. O rápido crescimento econômico do país entre 1967 e 1973 foi chamado por entusiastas do regime de milagre econômico. Os índices resultavam da ampliação de investimentos internacionais no país, da intervenção do Estado em setores importantes da economia e da redução de salários. No entanto, a realidade não era tão positiva como o governo queria fazer parecer, já que o “milagre econômico” foi combinado a uma forte concentração de renda (aumento da desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres). No campo, o aumento da concentração de terras resultou na migração de muitos trabalhadores rurais sem-terra para as cidades. Entretanto, não havia habitações para todos nos centros urbanos e, consequentemente, milhares de trabalhadores passaram a morar em casas improvisadas e precárias nas periferias e em favelas. Além disso, diversas comunidades quilombolas tiveram suas terras expropriadas em decorrência das ações que privilegiavam os grandes fazendeiros e a monocultura. Os conflitos por terra aumentaram, e a população quilombola acabou articulando-se com o movimento negro urbano na luta por seus direitos. O período do “milagre econômico” foi também o mais repressivo. O governo montou uma rede de órgãos para investigar e reprimir a oposição. Alguns desses centros de investigação contavam com o apoio financeiro da iniciativa privada. Foi assim com a Operação Bandeirante (Oban), um centro de informações e investigações criado em São Paulo pelo exército, responsável por prender e torturar opositores da ditadura, e que recebeu verbas de grandes grupos comerciais e industriais.

A repressão à população indígena

Desde o início do século XX, os governos brasileiros adotaram políticas agressivas contra as populações indígenas, buscando intervir em seus modos de vida para utilizar suas terras. Essa política foi intensificada pela ditadura civil-militar brasileira.

Em 1967, foi criada a Fundação Nacional do Índio (Funai) com o objetivo de garantir a “pacificação” de grupos indígenas que ameaçavam o avanço das atividades econômicas na Amazônia. Além disso, o órgão deveria organizar aldeamentos retirando os grupos indígenas de suas terras a fim de dar lugar ao avanço das fronteiras agrícolas, transformando esses indígenas em mão de obra acessível. O resultado dessa política foi desastroso. Muitas comunidades indígenas foram expulsas de suas terras e outras dizimadas após o contato com as expedições governamentais. Um exemplo desse impacto foi o caso da população araweté, que vivia nas margens do Rio Xingu.

Em 1976, cerca de 200 pessoas formavam esse grupo. Com as obras da Transamazônica e a ocupação da região, 73 indígenas morreram por causa de doenças e da fome. Como forma de resistência, diversos povos indígenas se organizaram e exigiram o direito de permanecer em suas terras, contestando o modelo desenvolvimentista da ditadura em curso. Esse ato sensibilizou políticos e outros membros da sociedade brasileira, que passaram a se preocupar com a situação indígena e iniciaram investigações sobre as arbitrariedades cometidas na região amazônica. Todo esse movimento possibilitou a criação de leis que reconheceram os direitos indígenas de permanecer em suas terras, especialmente após a redemocratização do país.

Em 1974, realizou-se, em Diamantino (MT), uma grande assembleia de povos indígenas para discutir suas lutas e demandas. Depois desse primeiro encontro, muitos outros ocorreram e essa mobilização resultou na criação da União das Nações Indígenas (UNI), em 1980. Essa organização indígena é considerada a primeira a ter caráter nacional e cumpriu papel fundamental, ao final da ditadura, no processo de elaboração de uma nova Constituição em 1988.

A inflação e a mobilização popular No final de 1973, os preços internacionais do petróleo dispararam por iniciativa dos grandes países produtores. Isso afetou a economia mundial. No Brasil, como os salários continuavam controlados, o aumento dos preços das mercadorias reduziu significativamente o poder de compra da população. O país entrou em uma recessão. Era o fim do “milagre econômico”. Esse cenário, no entanto, não impedia que os órgãos de segurança do governo continuassem a reprimir violentamente os grupos de oposição.

Em outubro de 1975, o jornalista da TV Cultura Vladimir Herzog foi assassinado em um quartel do Exército, na cidade de São Paulo. Em janeiro do ano seguinte, outro assassinato sob tortura ocorreu também em São Paulo. Dessa vez, a vítima foi o operário Manuel Fiel Filho, acusado de ser comunista. Apesar da repressão e dos desaparecimentos de grupos de oposição ao governo, nos anos de 1976 e 1977, estudantes universitários retomaram a mobilização estudantil contra o regime. Nos anos seguintes, entre 1978 e 1979, ocorreram importantes greves operárias por todo o Brasil, e as de maior repercussão foram organizadas na região do ABC paulista.

Diante da pressão, o governo foi obrigado a fazer reformas e concessões que favoreceram o processo de redemocratização do país. Desde 1975 já vinha ganhando força no Brasil um movimento reivindicando a anistia dos presos e exilados políticos brasileiros. As articulações em torno dessa ideia surgiram em 1975, com a formação do Movimento Feminino pela Anistia (MFA), liderado pela advogada e ativista Therezinha Zerbini. Aos poucos, a campanha espalhou-se pelo país.

A pressão popular deu resultado e, em 1979, o Congresso aprovou uma lei que anistiou tanto os presos políticos quanto as pessoas cassadas e perseguidas pela ditadura. Cerca de dez mil exilados retornaram ao Brasil ao mesmo tempo que presos políticos foram postos em liberdade. Em contrapartida, a lei da Anistia perdoou também os agentes da ditadura envolvidos em assassinatos e torturas de presos políticos.

As Diretas Já

Ainda em 1979, o Congresso Nacional aprovou o fim do bipartidarismo e cinco novos partidos se formaram logo em seguida. Alguns setores da ditadura eram contrários ao processo de redemocratização; por isso, decidiram utilizar estratégias terroristas para enfraquecer a oposição, promovendo atentados. Apesar disso, a luta pela redemocratização do país não se deteve, e surgiu o movimento Diretas Já. Esse movimento suprapartidário teve início em 1983, período em que partidos de oposição organizaram uma campanha por eleições diretas para presidente. Ganhou força em 1984, quando foram realizados comícios dos quais participaram milhões de pessoas, em todo o Brasil, em defesa da redemocratização. Nesse contexto, a oposição apresentou no Congresso Nacional uma proposta de emenda constitucional destinada a restabelecer as eleições diretas para presidente. No entanto, tal iniciativa foi derrotada em abril de 1984. Dessa forma, a escolha do presidente continuaria a ser feita pelo Colégio Eleitoral, órgão formado por deputados e senadores. A eleição indireta para presidente estava marcada para janeiro de 1985. Com a derrota das Diretas Já, a oposição escolheu o político mineiro Tancredo Neves, do PMDB, como seu candidato. Para vice na chapa oposicionista, foi escolhido José Sarney, que havia sido presidente da Arena, partido que apoiara a ditadura, mas que então se alinhava com a oposição. O candidato do PDS, partido do governo, era Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo

AS DITADURAS NA AMÉRICA LATINA

Entre 1950 e 1980, diversos países da América Latina tiveram governos de caráter autoritário que cometeram arbitrariedades contra indivíduos e grupos sociais. Após a reinstalação das democracias, setores da sociedade civil começaram a se mobilizar para investigar os crimes cometidos pelos Estados ditatoriais. No Brasil, em 2011, foi criada a Comissão Nacional da Verdade (CNV) para investigar as violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988. O relatório final da CNV, apresentado à sociedade em 2014, levantou o nome de 377 responsáveis diretos pelas práticas violentas ocorridas durante a ditadura civil-militar brasileira. Entre eles, estão os nomes de ex-presidentes militares, membros das Forças Armadas e policiais acusados de executar prisões arbitrárias, de cometer torturas e assassinatos, entre outros crimes. No mesmo ano em que o relatório da CNV foi apresentado, clubes militares afirmaram que 126 pessoas, entre civis e militares, também morreram pela ação dos grupos considerados terroristas no mesmo período. A frase que norteou o trabalho da CNV foi “pelo direito à memória e à verdade histórica”. O Exército Brasileiro também afirmou que “a fratura da sociedade é uma experiência para ser lembrada. Deixou-nos ensinamentos que não podem ser esquecidos ou negligenciados”.

DITADURAS CIVIS-MILITARES

Nas ditaduras, há uma dura repressão contra indivíduos, grupos e partidos de oposição, e a supressão, ou restrição, dos direitos e das liberdades públicas e privadas. Ou seja, a ditadura é o estado de exceção. Isso significa que, em uma ditadura, o governo pode fazer e desfazer leis com base em suas próprias vontades e interesses, sem o controle de nenhuma outra instância de poder, como ocorre em um governo democrático. A transparência na gestão das contas e do serviço público também costuma ser limitada pelos governos ditatoriais. Ditadura militar é aquela na qual os militares concentram o poder de decisão. Porém, nem toda ditadura conta apenas com a participação de militares. Na América Latina, entre os anos 1950 e os anos 1980, diversas ditaduras tiveram também a participação de civis, como empresários, políticos, policiais e outros setores da sociedade que apoiavam ativamente os regimes. Por isso, elas podem ser chamadas de ditaduras civis-militares.

Guerra Fria na América Latina

Como você estudou no capítulo 6, o pós-guerra foi marcado por uma intensa polarização entre regimes capitalistas e comunistas no mundo todo, que resultou na perseguição política de indivíduos considerados inimigos internos em muitos países. Acreditava-se que comunistas estariam infiltrados em países capitalistas, conspirando contra o sistema político-econômico vigente, e vice-versa. Nesse contexto, a América Latina tornou-se área de influência dos Estados Unidos e passou a fazer parte do bloco capitalista. Consequentemente, indivíduos ou grupos políticos associados ao comunismo passaram a ser perseguidos. Outro efeito dessa polarização diz respeito ao crescimento da influência dos militares na política latino-americana, já que eles eram vistos como responsáveis pelo combate às ideias comunistas. Essa projeção foi incentivada pelos Estados Unidos, que realizavam treinamentos e investiam na modernização dos recursos militares de diversos países para reprimir as ameaças comunistas.

O apoio dos Estados Unidos

Para organizar esse tipo de ação, os Estados Unidos criaram, em 1948, a Organização dos Estados Americanos (OEA), uma instituição que tinha como objetivo promover o desenvolvimento econômico e o social do continente. Além disso, a OEA servia aos países associados como um instrumento de combate à ameaça comunista e a qualquer tipo de subversão da ordem capitalista. Os Estados Unidos passaram assim a favorecer ditaduras que já existiam na América, como era o caso da ditadura cubana de Fulgêncio Batista, e também a apoiar golpes militares com a intenção de depor presidentes considerados como ameaças aos interesses capitalistas. A exemplo disso, em 1954, os Estados Unidos forneceram armas e recursos para um golpe militar derrubar o presidente da Guatemala, Jacobo Arbenz. No mesmo ano, apoiaram o golpe do general Alfredo Stroessner no Paraguai. Stroessner derrubou o presidente paraguaio Federico Chaves, que defendia uma política externa independente dos interesses estadunidenses e das instituições econômicas internacionais. Com o golpe, implementou-se uma ditadura que durou 35 anos, alinhada diretamente aos interesses dos Estados Unidos. O apoio estadunidense a golpes militares intensificou-se a partir de 1961. Nesse ano, após uma revolução, Cuba se tornou socialista, e isso contribuiu para reforçar o temor da disseminação da influência soviética na América. Por essa razão, os Estados Unidos decidiram criar a Aliança para o Progresso com o objetivo de treinar militares na América para reprimir movimentos revolucionários capazes de ameaçar os interesses americanos. Depois de alguns anos, em 1976, boa parte da América do Sul estava tomada por regimes ditatoriais.

Desde o século XIX, por meio da Doutrina Monroe, os Estados Unidos reivindicam o direito de intervir nos assuntos latino-americanos para promover os interesses estadunidenses. Em 1946, por exemplo, o governo dos Estados Unidos criou a School of the Americas, uma escola militar para o treinamento de militares latino-americanos. Presidentes estadunidenses influenciaram, auxiliaram e colocaram seus governos ao lado de diversas ditaduras civis-militares na América Latina na segunda metade do século XX. O argumento utilizado pelos Estados Unidos, frequentemente, era o de combate às ideias comunistas.

Características gerais das ditaduras latino-americanas

As ditaduras latino-americanas foram marcadas pelo intenso uso da violência e da repressão contra todos os grupos considerados uma ameaça aos interesses dos Estados Unidos e das elites nacionais. Com isso, não foram apenas indivíduos ou grupos sociais que defendiam ideias comunistas que foram reprimidos. Artistas, estudantes, sindicalistas, jornalistas e intelectuais, bem como políticos moderados ou que defendiam propostas mais democráticas, sofreram com a repressão. O uso de técnicas de tortura e de assassinatos foi comum nos regimes ditatoriais. Com isso, muitas pessoas foram obrigadas a abandonar seus países para escapar da repressão. Em alguns casos, como na Argentina e no Chile, a violência das ditaduras foi tão intensa que milhares de pessoas foram mortas ou desapareceram. Só no Chile, foram cerca de 40 mil as vítimas de torturas e prisões políticas, além dos 3 mil mortos ou desaparecidos pelo regime. Outra forma de repressão foi o uso da censura. Jornais, revistas, livros, peças de teatro, filmes, programas televisivos e radiofônicos, entre outros exemplos, eram frequentemente censurados e impedidos de divulgar livremente informações ou críticas ao regime. Canções e outras obras de arte que denunciavam as violências das ditaduras foram proibidas, e seus autores sofreram ameaças de perseguição, prisão e morte.

Os regimes autoritários aproveitaram seus amplos poderes para realizar reformas econômicas. Para isso, promoveram a abertura das economias nacionais ao capital internacional e recorreram a investimentos e empréstimos internacionais. Esse tipo de reforma ajudou a dinamizar as economias, mas promoveu intenso endividamento, enfraquecendo a autonomia dos governos latino-americanos para comandar seus processos econômicos e projetar suas economias nacionais no mercado globalizado. As reformas também contribuíram para o aumento das desigualdades sociais no continente.

Ditaduras na América do Sul

Paraguai: 1954-1989

Em 1954, um golpe de Estado colocou no poder o general Alfredo Stroessner, que implantou uma ditadura. Em eleições caracterizadas por fraudes, Stroessner foi eleito presidente do Paraguai por sete mandatos consecutivos. A ditadura paraguaia estabeleceu que para ter acesso às universidades ou aos cargos públicos era necessário filiar-se ao Partido Colorado. Além disso, foi montada uma ampla rede de delação no país, provocando a morte e a prisão de milhares de opositores do regime.

Uruguai: 1973-1985

O Uruguai, assim como outros regimes ditatoriais da América do Sul, fez parte da Operação Condor, uma aliança dos regimes ditatoriais com os Estados Unidos para perseguir as pessoas identificadas como comunistas, socialistas e marxistas. Em 1976, refugiados políticos uruguaios foram capturados e torturados com o apoio das Forças Armadas dos Estados Unidos.

Peru: 1968-1980

Durante a ditadura civil-militar no Peru, mais de 70 mil pessoas morreram nos confrontos entre Exército e guerrilheiros. Assim como nos demais países da América Latina, a ditadura peruana contou com apoio do governo dos Estados Unidos.

Bolívia: 1964-1982

Che Guevara, um importante líder de esquerda, que participou da implantação do regime socialista em Cuba, foi morto em 1967 pelo Exército boliviano com ajuda da CIA.

Brasil: 1964-1985

A CIA colocou em prática uma extensiva campanha de propaganda contra João Goulart, o presidente brasileiro, que acabou destituído e substituído por uma ditadura civil-militar. Ele havia iniciado uma série de reformas que limitava os lucros de empresas transnacionais, incluindo as estadunidenses.

Chile: 1973-1990

O general Augusto Pinochet, após um golpe de Estado, destituiu o presidente eleito Salvador Allende e instaurou uma ditadura alinhada aos interesses dos Estados Unidos. Durante a ditadura civil-militar chilena, cerca de 3 mil pessoas foram assassinadas e aproximadamente 200 mil foram para o exílio.

Argentina: 1966-1983

A tomada do poder pela ditadura civil-militar que ocorreu na Argentina teve apoio do governo estadunidense. Durante esse período, foram dois regimes ditatoriais – um de 1966 a 1973, e outro de 1976 a 1983. Durante esses regimes, cerca de 30 mil pessoas desapareceram no país.

A Operação Condor

As ditaduras latino-americanas não agiram sozinhas no combate aos grupos considerados subversivos. Em diversas ocasiões, os regimes autoritários negociaram entre si para perseguir opositores que se refugiavam em outros países latino-americanos. Um dos principais exemplos disso foi a chamada Operação Condor, um acordo estabelecido entre os governos do Brasil, da Argentina, do Chile, do Uruguai, do Paraguai e da Bolívia para perseguir grupos que ameaçassem os interesses desses governos e garantir maior controle da repressão política na América do Sul.

Resistência, crise econômica e o fim dos regimes

Na década de 1970, quando o capitalismo entrou em crise em diversas partes do mundo, as economias latino-americanas pararam de crescer e começaram a sofrer com problemas frequentes de inflação, desemprego e recessão. Isso intensificou a pobreza, a desigualdade social e a concentração de renda. Como consequência, na década de 1980, a maior parte dos países latino-americanos atravessou um período de grave crise econômica.

A recessão abalou as estruturas das ditaduras latino-americanas e contribuiu para enfraquecer os regimes militares. Entre 1979 e 1990, 13 países retornaram ao Estado democrático de direito, entre eles, Bolívia (1982), Argentina (1983), Uruguai (1984), Brasil e Guatemala (1985) e Chile (1990). As forças de resistência cumpriram papel fundamental nesse contexto, como sujeitos históricos do processo de abertura dos regimes. Setores das sociedades latino-americanas procuraram resistir de diferentes maneiras aos governos autoritários. Por meio de suas obras, artistas criticaram as ditaduras, e muitos precisaram se exilar para fugir de perseguições políticas em seus países. Grupos de guerrilha adotaram a luta armada como maneira de combater o poder ditatorial, a exemplo dos Tupamaros, no Uruguai, e o Sendero Luminoso, no Peru. Também surgiram grupos que combateram os regimes de exceção de maneira pacífica. Um deles foi o das Mães da Praça de Maio, criado em Buenos Aires em 1977, um ano após a instauração da ditadura na Argentina. As mulheres do grupo se reuniam todas as quintas-feiras na Praça de Maio – importante local de protesto do povo argentino − exigindo do governo informações sobre seus filhos, detidos pelo regime ou desaparecidos, de cujos paradeiros os militares afirmavam desconhecer. Em virtude das denúncias das Mães da Praça de Maio, os crimes praticados pelos militares argentinos ficaram conhecidos em todo o mundo. Com o fim do regime militar na Argentina, o grupo passou a exigir o julgamento dos responsáveis por esses crimes. Até 2018, mais de 800 pessoas relacionadas à ditadura argentina foram julgadas e condenadas por crimes contra a humanidade.

INDEPENDÊNCIAS NA ÁSIA

Na região hoje conhecida como Indonésia, colonizada pelos holandeses, as forças nacionalistas proclamaram a independência em 1945. O governo da Holanda não aceitou a decisão e lançou suas tropas contra os revoltosos até 1949, quando finalmente reconheceu a independência do país. As Filipinas, sob o domínio dos Estados Unidos desde 1898, conquistaram sua emancipação em 1946. A Indochina, região dominada pelos franceses, só se tornou independente em 1954, depois de uma guerra contra a França, potência da qual era colônia. Com a emancipação, formaram-se ali três países autônomos: Laos, Camboja e Vietnã. Você deve se lembrar do que estudamos sobre o Vietnã no capítulo anterior. Após a independência, o país se tornou palco de um dos principais conflitos ocorridos durante a Guerra Fria, e implementou um regime socialista em 1976.

Índia: não violência e desobediência civil

A Índia era uma colônia da Inglaterra desde meados do século XIX. Em 1919, uma greve geral de trabalhadores indianos, liderada por Mohandas Gandhi (1869-1948), abalou o domínio inglês na região. O líder logo ficaria conhecido como Mahatma (“grande alma”) Gandhi, pois incentivava os indianos a resistir à dominação pelo caminho da não violência e da desobediência civil, que se traduzia na recusa a participar de conflitos, no boicote a produtos ingleses e no não pagamento de impostos às autoridades coloniais. O emprego de métodos pacíficos de resistência conferiram a Gandhi enorme prestígio popular e reconhecimento internacional. Gandhi unificou os indianos contra a dominação inglesa, e, em 1947, a Índia se tornou independente. Entretanto, diante de disputas entre grupos religiosos, o território colonial foi dividido em dois países autônomos: a Índia (de maioria hindu) e o Paquistão (de maioria muçulmana). Em 1948, um extremista hindu assassinou Gandhi. Em 1971, uma nova divisão deu origem a um terceiro país: Bangladesh.

Índia 

A Índia foi um importante entreposto comercial britânico desde o século XVI. Mas o domínio inglês sobre a região se concretizou em 1858. Com isso, a elite indiana ligada ao comércio e à administração pública teve acesso a escolas e a universidades europeias. 
Em 1885, essa elite formada nos centros europeus fundou o Partido do Congresso, que defendia mais autonomia para a Índia. Foi, porém, no século XX que o movimento pela independência hindu ganhou força. Uma das figuras que se destacou nesse momento foi Mohandas Karamchand Gandhi, apelidado de Mahatma (“grande mestre espiritual”). Nascido na Índia, em 1869, Gandhi formou-se em Direito no Reino Unido e seguiu para a África do Sul, onde permaneceu por duas décadas. Ao longo de sua trajetória de vida, percebeu o efeito nocivo das leis racistas e do imperialismo sobre as populações negras e indianas. 
De volta à Índia, em 1914, Gandhi tornou-se símbolo da resistência pacífica contra a colonização britânica. A resistência pacífica, também conhecida como ação não violenta, consiste em condutas pacíficas contra os poderes estabelecidos, como boicotes, greves e bloqueios. Por convicção, os militantes não devem revidar quando agredidos. A partir dos anos 1920, a campanha de resistência pacífica de Gandhi ganhou adesão popular. 
Os indianos promoveram boicote aos produtos britânicos, além de se recusar a pagar impostos. Outra ação emblemática foi a Marcha do Sal, em 1930, em protesto contra a lei que proibia os indianos de produzir sal. Nessa ocasião, milhares de pessoas marcharam durante vários dias até o litoral, a fim de obter o próprio sal no mar. 

Independência e divisão do país 

No contexto da Segunda Guerra Mundial, o Partido do Congresso avançou na direção da luta pela independência. Os britânicos, tentando conter o movimento, prenderam Gandhi e outros líderes em 1942. A ação, contudo, não conteve as manifestações pela independência. Houve crescimento da mobilização popular, o que levou, em 1944, à libertação de Gandhi. Após anos de luta, a independência da Índia foi conquistada em 1947. A região, porém, encontrava-se dividida entre muçulmanos e hindus. Por isso, o território foi separado em dois países: a Índia, de maioria hindu, e o Paquistão, de maioria muçulmana. Muitas pessoas morreram em decorrência da intolerância religiosa. Gandhi defendia a união entre hindus e muçulmanos, mas foi assassinado em 1948 por um radical hindu. Até hoje, a Índia e o Paquistão vivem em conflito, especialmente pela posse da Caxemira, região de maioria muçulmana em cujo território estão localizadas as nascentes dos rios Ganges e Indo. O controle da região é hoje compartilhado entre a Índia, o Paquistão e a China.


A AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS

A Segunda Guerra Mundial provocou mudanças decisivas na configuração geopolítica do planeta. Ao mesmo tempo que a França e a Inglaterra, Estados à frente de grandes impérios coloniais, saíram enfraquecidos do conflito, União Soviética e Estados Unidos se firmaram como superpotências, assumindo posição de destaque na política global.

Com o fim da guerra, os países africanos e asiáticos que lutavam contra o domínio das potências colonialistas europeias ganharam dois aliados de peso. Interessados em ampliar suas zonas de influência para outras regiões do planeta durante a Guerra Fria, os governos dos Estados Unidos e da União Soviética passaram a defender o princípio da autodeterminação dos povos.

A defesa da autodeterminação dos povos estava prevista no primeiro artigo da Carta das Nações Unidas de 1945. Esse princípio ajudou a mobilizar a opinião pública mundial contra o colonialismo na Ásia e na África, além de contribuir para ampliar a luta dos povos africanos e asiáticos pela independência. Em alguns casos, o processo de emancipação ocorreu por vias pacíficas. Em outros, a independência só foi conquistada por meio da luta armada contra as potências colonizadoras.

Luta anticolonial e crise do colonialismo após 1945 

Como você estudou, as potências europeias dominaram a Ásia e a África no século XIX. Desde as primeiras ações imperialistas, povos afro-asiáticos resistiram a essa dominação. Contra os britânicos, por exemplo, ocorreram as guerras Anglo-sudanesa, entre 1881 e 1884, e Anglo-egípcia, em 1882, as revoltas somalis, em 1884 e 1894, e a Revolta dos Cipaios, na Índia, entre 1857 e 1858. Entre o final da Segunda Guerra Mundial e a dé - cada de 1970, a maioria das colônias europeias na África e na Ásia se emancipou politicamente, originando novos países. Isso só foi possível, pois, alguns fatores favoreceram o sucesso dos movimentos de resistência desses povos nesse período.
Um dos motivos foi o enfraquecimento sofrido pelas potências europeias em decorrência da Segunda Guerra Mundial. Mesmo as que estavam do lado vence - dor sofreram perdas materiais e humanas que abalaram sua capacidade de domi - nação sobre as colônias. Além disso, a Carta de São Francisco, de 1945, que deu origem à ONU, e outras normas internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Político, de 1966, garantiram às ex-colônias o direito à autodeterminação e ao autogoverno. 
Somaram-se a esse cenário as disputas entre os Estados Unidos e a União Soviética no contexto da Guerra Fria. As duas superpotências apoiaram muitos movimentos de libertação, já que cada novo país poderia ampliar o bloco de países aliados a uma ou a outra. 
Os povos africanos e asiáticos souberam aproveitar esse contexto favorável para organizar movimentos pela libertação de seus países e intensificar sua luta contra a dominação imperialista; nesse período foram formados ou fortalecidos partidos políticos, milícias populares armadas, jornais e associações de estudantes e intelectuais contrários à dominação imperialista europeia. Também cresceu a desobediência às autoridades coloniais, os boicotes aos produtos europeus e a organização de greves



AS INDEPENDÊNCIAS NA ÁFRICA

A União Africana é uma organização internacional que tem como objetivo promover a aproximação dos países africanos de modo a fortalecer a democracia, impulsionar o crescimento econômico e ajudar na superação de desigualdades e problemas sociais. Ela existe desde 2002 e é composta de 55 Estados-membros que têm poder de voto para decidir políticas em comum. Em 2018, a maioria desses países aprovou o tratado da Zona de Comércio Livre Continental Africana. Isso abriu caminho para a criação de uma das maiores zonas de livre-comércio do planeta. A expectativa é que essa zona de livre-comércio, que começou a funcionar em 2021, não só promova o desenvolvimento econômico do continente, como também contribua para aproximar cultural e politicamente diversas nações da África. Essa ideia de aproximação de diversas regiões da África como forma de fortalecer o continente é antiga. No início do século XX, muitos já defendiam a criação de alianças políticas entre grupos de diversas partes da África para lutar contra o neocolonialismo e criar governos independentes no continente. Esse conceito de união foi chamado de pan-africanismo.

O pan-africanismo teve suas origens no século XIX entre os africanos e seus descendentes que viviam nos Estados Unidos, Caribe e Europa. Os pioneiros do movimento, entre eles o sociólogo afro-americano W.E.B Du Bois (1868-1963), defendiam uma identidade única e comum a todos os afrodescendentes. Essas pessoas criaram, a partir do início do século XX, entidades em prol da independência de países africanos e organizaram conferências para divulgar suas ideias e projetos. Seu lema era: “A África para os africanos”.

A via pacífica

Os governos da União Soviética e dos Estados Unidos defendiam a autodeterminação dos povos e, portanto, o fim do colonialismo. Essa tomada de posição das duas maiores potências da época foi um fator de pressão sobre os governos das nações colonialistas. A isso se somava a própria luta dos povos africanos pela independência. Nessas condições, algumas potências colonialistas passaram a negociar o processo de independência com as lideranças africanas. Tentavam, dessa forma, preservar seus interesses econômicos no continente, como a manutenção das empresas europeias e da exploração de riquezas minerais nas ex-colônias. Como parte dessa política de conciliação, o governo da Inglaterra aceitou a independência de muitas de suas colônias na África. Esse foi o caso do Sudão (1956), da Costa do Ouro (atual Gana, 1957), da Nigéria (1960), de Serra Leoa (1961), do Quênia (1963) e de Zâmbia (antiga Rodésia do Norte, 1964), entre outros (confira o mapa nesta página). Com o objetivo de manter sua influência nas regiões colonizadas, o governo da Inglaterra convidou esses países a fazerem parte da Comunidade Britânica das Nações, o Commonwealth, uma associação de Estados soberanos formada pelo Reino Unido e suas antigas colônias. O governo da França também administrou pacificamente a independência de algumas de suas colônias, e, em 1960, quase todas as colônias francesas na África estavam emancipadas, entre elas Camarões, Madagascar, Costa do Marfim, Senegal e Mali. Para manter os Estados independentes sob sua órbita, criou, em 1958, a Comunidade Francesa.

Contudo, muitas antigas colônias francesas decidiram romper completamente com a metrópole, como a Guiné, que optou por cortar todos os vínculos com a França. Em represália, o governo francês suspendeu os recursos econômicos destinados ao país. Apesar disso, o exemplo da Guiné incentivou outras ex-colônias francesas a cortar relações com seus antigos colonizadores. Assim, até 1960, praticamente todas as ex-colônias que inicialmente haviam integrado a Comunidade Francesa decidiram se retirar dela.

Revoltas armadas 

Um dos principais líderes do pan-africanismo foi Jomo Kenyatta, o homem de kufi em destaque na imagem condutora deste capítulo. Ele desempenhou papel central na conquista da independência do Quênia, país que estava sob o domínio britânico e do qual se tornou primeiro-ministro em 1963. Na década de 1950, Kenyatta liderou um movimento que promovia ações armadas contra os ingleses e, por isso, foi preso pelas autoridades britânicas. Na mesma época, a França começou a enfrentar revoltas armadas na Tunísia, no Marrocos Francês e na Argélia, as três colônias francesas no norte da África. Enquanto a Tunísia e o Marrocos conquistaram a independência em 1956, na Argélia, a luta contra os franceses se estendeu até 1962. Também no caso das colônias de Portugal, a emancipação política só foi possível por meio da luta armada. Uma das razões para isso é que a economia portuguesa era muito dependente das riquezas exploradas nas colônias africanas. Por isso, o governo de Portugal se recusava a ceder às pressões dos africanos que lutavam pela independência de seu povo. Outra razão que levou os movimentos de independência das colônias portuguesas a empregar a luta armada foi o caráter ditatorial do governo de Portugal. Desde 1926, a nação portuguesa era governada por uma ditadura que reprimia toda e qualquer manifestação de oposição. Como costuma acontecer em ditaduras, as autoridades portuguesas eram incapazes de dialogar e de negociar com aqueles que discordavam do regime, ou que lutavam por seus direitos.

Diante dessas intransigências, surgiram movimentos guerrilheiros de caráter popular na maioria das colônias de Portugal: Cabo Verde, Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Foi somente com a queda da ditadura em Portugal, em 1974, que o novo regime democrático reconheceu oficialmente a independência de suas colônias na África.

PROBLEMAS APÓS AS INDEPENDÊNCIAS

As nações africanas enfrentaram muitas dificuldades após a emancipação. Boa parte desses problemas era consequência direta dos anos de dominação e exploração do continente pelas potências europeias.

A ocupação da região do Rio Congo pelos belgas, a partir de 1879, deu início a uma das mais dramáticas e violentas experiências de colonização na África. Milhares de pessoas foram escravizadas, mutiladas e assassinadas para que o governo belga impusesse seu domínio na região. Nasceu, assim, o Congo Belga. Em janeiro de 1959, ocorreram no Congo Belga grandes manifestações populares contra o colonialismo. Acuado por essas mobilizações, o governo da Bélgica reconheceu a independência de sua antiga colônia. Durante os 70 anos em que dominaram o Congo, os belgas nada fizeram para melhorar a vida da população congolesa. Ao saírem da ex-colônia, não deixaram universidades nem indústrias. Também não promoveram uma transição de poder tranquila para que as autoridades locais pudessem garantir a estabilidade do novo país. Em junho de 1960, Joseph Kasavubu assumiu o cargo de presidente da jovem república. Para o cargo de primeiro-ministro foi escolhido Patrice Lumumba (1925-1961), principal líder da luta pela independência do Congo.

A interferência da CIA e as ditaduras militares 

Logo ressurgiram as velhas rivalidades existentes entre os diversos grupos étnicos que viviam na região antes da chegada dos belgas, e o país atravessou um período de grande instabilidade política. Considerado comunista pelo governo dos Estados Unidos, Lumumba foi preso e assassinado em 1961, em uma ação que contou com o apoio da Agência Central de Inteligência (CIA), do governo estadunidense. Em meio à crise, o país entrou em uma verdadeira guerra civil. As disputas de poder envolveram milhares de assassinatos e a separação de regiões que não aceitavam se submeter a um governo controlado por uma etnia diferente da sua. A Organização das Nações Unidas (ONU) realizou intervenções na região, mas o conflito persistia. Em 1965, o próprio Kasavubu foi deposto por um golpe que colocou o poder nas mãos de Joseph Mobutu (1930-1997), general que implantou uma ditadura militar na então chamada República Democrática do Congo. Esse não foi um caso isolado. A partir de 1965, ditaduras militares foram implantadas em diversos países africanos, como a Nigéria, a Argélia e Gana. Algumas dessas ditaduras foram resultado de lutas pelo poder entre grupos do próprio governo. Outras foram implantadas por influência ou com o apoio direto da União Soviética, dos Estados Unidos, ou de grupos econômicos europeus ou estadunidenses. No caso das duas superpotências, o grande interesse de seus governos era evitar o crescimento das zonas de influência do regime adversário. Os grupos econômicos, por sua vez, queriam garantir para si a exploração das riquezas dos territórios africanos, como diamantes e petróleo.

O caso de Uganda: décadas de ditadura

A população de Uganda é formada por diversos grupos étnicos, alguns deles rivais entre si. Na época da colonização, a rádio estatal dessa antiga colônia britânica chegava a transmitir sua programação em 24 línguas africanas diferentes. Isso dá uma ideia da diversidade étnica da região. Milton Obote se tornou primeiro-ministro de Uganda em 1962, ano da independência do país. Algum tempo depois, foi acusado de corrupção e de contrabando de ouro. Em resposta, Obote suspendeu a Constituição, destituiu o presidente e prendeu líderes da oposição. Em 1971, foi deposto pelo general Idi Amin (c. 1925-2003), que assumiu todos os poderes. Durante a ditadura de Amin, cerca de 400 mil ugandenses foram mortos, boa parte de forma brutal. Por causa dessa violência, ele era chamado pela população de “açougueiro” e “senhor do horror”. Seu governo durou até 1975, quando tropas da Tanzânia, com o apoio da população de Uganda, o tiraram do poder.

A ÁFRICA DO SUL

Os primeiros europeus a colonizar o extremo sul da África foram os holandeses, ainda no século XVII. No século seguinte, chegaram os ingleses, que entraram em conflito com os antigos colonizadores, chamados de bôeres ou africânderes. Esses conflitos deram origem às Guerras dos Bôeres (a primeira entre 1880 e 1881, e a segunda entre 1899 e 1902), vencidas pelos ingleses. Embora cerca de 75% da população sul-africana fosse negra, os brancos detinham o poder político-econômico da região no início do século XX. Os negros enfrentavam uma série de restrições: só podiam circular em determinadas áreas, não tinham pleno direito de voto etc. Para lutar pelos seus direitos, em 1912, eles organizaram o Congresso Nacional Africano (CNA), partido político que reivindicava a igualdade racial. No entanto, a situação dos negros agravou-se ainda mais quando, em 1948, o primeiro-ministro e pastor protestante, Daniel Malan, instituiu a política do apartheid, que legalizava o racismo e segregava a população negra. Os negros passaram então a precisar de passaportes para circular por seu próprio país. Também foram impedidos de utilizar os mesmos ônibus ou hospitais, frequentar as mesmas escolas ou morar em áreas residenciais reservadas aos brancos.

Com o apartheid, os bairros e os serviços voltados para os negros eram sempre de qualidade muito inferior em relação aos utilizados pela população branca. Além disso, as pessoas negras eram tratadas com muita truculência pela polícia. Em 1960, durante um protesto contra o regime segregacionista, 67 manifestantes foram mortos pela ação policial, e 180 ficaram feridos. Nesse mesmo ano, o CNA foi declarado ilegal, e seu líder, Nelson Mandela, condenado à prisão perpétua. O apartheid provocou protestos no mundo inteiro, particularmente a partir da década de 1970. Isso levou diversos governos a adotar medidas para isolar a África do Sul no cenário mundial: sanções econômicas e políticas foram impostas pela ONU, o país foi expulso da Comunidade Britânica e seus atletas foram impedidos de participar de torneios internacionais. Diante das pressões externas e das lutas internas, Nelson Mandela foi libertado, mas o CNA foi legalizado apenas em 1990. Em 1994, o apartheid chegou ao fim, e Mandela foi eleito presidente.

Congo 

No século XIX a região do Congo foi dominada pelo rei belga Leopoldo II. Diamantes, zinco e cobre foram explorados por empresas internacionais, que pagaram tributos ao rei. Em 1908, o território foi entregue ao governo belga. A exploração do Congo foi feita por meio do trabalho compulsório dos nativos, envolvendo extrema violência, como chibatadas, mutilações e mortes. Mas essa crueldade nunca impediu a constante resistência: houve sempre fugas, recusa ao trabalho e revoltas coletivas. No final dos anos 1950, organizações políticas como o Movimento Nacional Congolês (MNC), liderado por Patrice Lumumba, posicionaram-se contra a exploração. Diante da força das lutas anticoloniais, a Bélgica se retirou do Congo em 1960 e Lumumba foi eleito chefe do governo. Mas nem todos os congoleses apoiaram Lumumba e seu projeto de união nacional. O embate entre governistas e separatistas resultou em uma guerra civil entre as forças de Lumumba, apoiadas pela União Soviética, e os partidários do general Mobutu Sese Seko, apoiados pelos Estados Unidos. Em 1961, Lumumba foi preso e assassinado. Em 1965, por meio de um golpe de Estado, Mobutu implantou uma ditadura militar. Renomeado Zaire, o país foi governado por Mobutu até sua deposição em 1997, quando passou a ser denominado República Democrática do Congo. 

Argélia 

No século XIX a França dominou a região da Argélia, rica em petróleo e produtos agrícolas. A colonização foi muito violenta e as manifestações contra o domínio francês e o tratamento dado aos árabes e berberes intensificaram-se após a Segunda Guerra Mundial, sendo duramente reprimidas pelas tropas francesas. Em 1954, membros da elite política e cultural argelina fundaram a Frente de Libertação Nacional (FLN), de orientação socialista, que liderou a luta contra os franceses. Diante das revoltas na Argélia e da pressão internacional contra o prolongamento do conflito, a França cedeu. Em 1962, foi assinado um cessar-fogo e, pouco depois, foi feito um plebiscito no qual a maioria dos argelinos optou pela independência do país.

Colônias portuguesas

As lutas pela libertação das colônias portuguesas cresceram a partir dos anos 1950, com destaque para os jovens universitários africanos que estudavam em Portugal e se reuniam em torno da Casa dos Estudantes, em Lisboa. O grupo incluía Amílcar Cabral, de Cabo Verde, Noémia de Sousa, de Moçambique, e Agostinho Neto, de Angola, entre outros que combinavam ideais socialistas com a negritude e a luta contra a exploração colonial. Nos anos 1970, aproveitando-se da crise do salazarismo, as ações dos movimentos por independência política se intensificaram, e a maioria das colônias portuguesas conquistou sua independência.

Guiné-Bissau e Cabo Verde 

Em 1956, Amílcar Cabral e outros guineenses fundaram o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). De inspiração socialista, o partido defendia a independência política, o progresso econômico, os interesses nacionais e o avanço sociocultural. Em 1961, teve início a luta armada pela independência. Em setembro de 1973, o PAIGC declarou a independência da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, reconhecida por Portugal no ano seguinte.

Moçambique 

Nos anos 1950, a luta pela independência de Moçambique se intensificou, com greves e passeatas ocorrendo frequentemente. Em 1962, foi fundada a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), sob a liderança de Eduardo Mondlane. Partindo da Tanzânia, país vizinho, o grupo passou à luta armada contra as tropas portuguesas em Moçambique. A independência moçambicana foi proclamada em 25 de junho de 1975. 

Angola 

Em 1956, formou-se o Movimento Popular pela Libertação de Angola (MPLA), liderado por Agostinho Neto. O governo português respondeu com força e a luta do MPLA e de outros grupos armados, como a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), estourou em 1961. Em 1975, após catorze anos de luta, o MPLA proclamou a independência de Angola. A guerra em Angola, contudo, não terminou com a independência. No contexto da Guerra Fria, iniciou-se uma guerra civil, opondo o MPLA, apoiado pelos soviéticos, à União Nacional para a Independência Total de Angola (Unita), suportada pelos Estados Unidos. Essa violenta guerra civil só terminou em 2002.

Desafios após a independência 

Após a independência, os novos países africanos se depararam com enormes desafios, como a subordinação econômica aos interesses dos países ricos. Além disso, continuaram a ocupar a periferia do sistema econômico, exportando produtos primários e importando bens industrializados. Ademais, havia a questão das fronteiras artificiais. Como integrar grupos étnicos com histórias e interesses tão distintos? Como a colonização europeia não respeitou as divisões populacionais existentes antes da partilha da África, os processos de independência ocorreram dentro dessas fronteiras territoriais impostas pelos europeus. A fragilidade econômica, associada a uma união nacional frágil, causou e continua a gerar grande instabilidade social e política, culminando em guerras civis que assolam o continente até hoje. Por isso, ainda há um longo caminho até a efetiva independência dos povos africanos, estabelecendo como prioridade o bem-estar humano. 

domingo, 18 de agosto de 2024

Produção de energia no Brasil

Movimentar máquinas, cargas e pessoas por longas distâncias demanda muita energia. No Brasil, usam-se combustíveis derivados de fontes não renováveis (petróleo e gás natural) e renováveis (como o álcool e o biodiesel) para o transporte. Já em relação à energia elétrica outras fontes são usadas, como será estudado a seguir. A energia pode ser gerada de diferentes fontes. As fontes fósseis são resultado da queima de materiais como o petróleo, o gás natural e o carvão mineral. A energia de fonte nuclear usa o urânio para gerar energia. As fontes de energia renováveis usam a força dos ventos, o calor do Sol e a água acumulada pelas chuvas para encher reservatórios que movimentam hidrelétricas, por exemplo. O conjunto de fontes de energia de um país forma sua matriz energética. No Brasil, são empregadas fontes renováveis e não renováveis tanto para o transporte quanto para gerar energia elétrica.
Petróleo e gás natural 
A principal fonte de energia utilizada para o transporte é o petróleo. Seus derivados – como o óleo diesel e a gasolina – movimentam motores de aviões, navios, caminhões, automóveis e ônibus. Existem carros, trens e ônibus movidos a eletricidade, mas eles representam uma pequena fatia no conjunto dos sistemas de transportes. Desde 1953, o Brasil conta com uma empresa que atua nas áreas de exploração, produção, refino, comercialização e transporte de petróleo, gás natural e seus derivados. Essa empresa desenvolveu tecnologias importantes para retirar petróleo do mar, até mesmo de camadas que estão no interior da superfície marinha, chamada pré-sal, e podem estar a cerca de 7 mil metros de profundidade. A descoberta de petróleo em águas profundas no oceano mudou a posição do Brasil entre os países que detêm reservas dessa fonte de combustível. A exploração dessas reservas garante autonomia ao país, apesar das mudanças recentes que permitem que elas sejam exploradas por empresas internacionais. 
Já o gás natural veicular é empregado em automóveis que rodam bastante porque é caro instalar um equipamento para adaptar o motor a esse combustível. Por isso, ainda que seja mais eficiente que a gasolina na queima e que polua menos, é pouco usado para o transporte urbano. 
Álcool 
O álcool produzido a partir da cana-de-açúcar é uma fonte energética importante desde a implantação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), em 1975. Esse programa visava desenvolver uma alternativa ao consumo de petróleo, procurando diminuir a dependência do Brasil em relação à importação desse combustível. 
O plantio da cana-de-açúcar e sua transformação em álcool combustível – etanol – garantem ao Brasil uma fonte energética renovável para produzir combustível. O etanol polui menos que a gasolina e, principalmente, que o óleo diesel. Por isso, sua utilização deve ser estimulada como uma forma de diminuir a poluição, em especial em grandes cidades. Nos últimos anos, foi definido que a gasolina vendida no Brasil deve ter em sua composição um percentual de álcool, que em 2017 era de 27%. Desse modo, o governo procura estimular a utilização desse combustível.
Biodiesel 
Em relação ao óleo combustível, as experiências em curso remetem ao uso de óleo vegetal biodiesel e ao reaproveitamento de óleo de cozinha. No primeiro caso, o objetivo é produzir um substituto para o óleo diesel tradicional, derivado do petróleo, a partir de uma matéria-prima renovável. O biodiesel pode ser produzido a partir de dezenas de espécies vegetais, como a mamona, o dendê (palma), o girassol, o babaçu, o amendoim e a soja, entre outras, todas bem adaptadas às diferentes condições geográficas brasileiras. No caso do reaproveitamento do óleo de cozinha, são dois os objetivos: evitar a degradação ambiental que ocorre quando se lança o óleo sem tratamento ao ambiente e usar uma fonte renovável. 

Produção de energia elétrica 

As indústrias utilizam grandes quantidades de energia elétrica para movimentar suas máquinas. A atividade industrial é a que mais consome energia elétrica no Brasil. Em seguida, aparecem os setores residencial e comercial. A fabricação em larga escala de aço, alumínio e outras matérias-primas pelas indústrias de base consome mais energia do que muitas cidades de porte médio. Por isso, essas indústrias são conhecidas como eletrointensivas. 

Geração e distribuição da energia elétrica no Brasil 

Para acender uma lâmpada em uma residência é preciso energia elétrica, que resulta de um processo de produção dividido em três partes: a geração, que no Brasil predominantemente é por hidrelétricas (grandes e pequenas), mas também conta com termelétricas que queimam combustíveis fósseis; a transmissão, que consiste em levar a energia da fonte geradora aos consumidores, em geral por meio de cabos sustentados em torres que suportam elevada tensão elétrica; e a distribuição, ou seja, uma estação que converte a energia de alta-tensão em uma energia que pode ser usada em residências, iluminação pública, indústrias, entre outros usos. Sem essa conversão os equipamentos elétricos não suportariam a carga elétrica.
Com a presença de indústrias no século XIX, principalmente no estado de São Paulo, surgiram algumas hidrelétricas de investidores privados que funcionavam junto às fábricas. Mais tarde, a produção de energia passou a ser centralizada pelo governo, seja federal, seja estadual. 
A partir da década de 1990, novas regras foram criadas. Os governos federal e estaduais permitiram a volta de investidores privados para a geração de energia, que são fiscalizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Porém, a transmissão permaneceu quase totalmente dirigida pelos governos, mas a distribuição está tanto com agentes públicos, quanto com agentes privados, estes em maior número.
A energia elétrica gerada no Brasil está conectada pelo Sistema Interligado Nacional (SIN). Desse modo, ela pode ser gerada na Amazônia e ser usada em São Paulo – a eletricidade é transportada por meio de um conjunto de cabos e torres de energia, denominado rede de transmissão. Cabe ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) analisar a demanda de energia e ajustar seu fluxo. 
No Brasil, a energia elétrica é obtida pelo aproveitamento do movimento da água (usinas hidrelétricas) e do calor (usinas termelétricas). As fontes renováveis também são usadas, mas em menor quantidade.

Hidrelétricas 

O Brasil continua sendo um dos poucos países industrializados do mundo em que grande parte da energia elétrica é obtida em usinas hidrelétricas. Nessas usinas, a água do rio é represada por meio de uma barragem de concreto, para então cair de uma grande altura sobre imensas turbinas que, ao girar, produzem energia elétrica. O aproveitamento de usinas hidrelétricas no Brasil decorreu das condições naturais do território. O regime tropical de chuvas, predominante na maior parte do país, associado à presença de uma grande rede hidrográfica resulta em elevada capacidade de produção de energia hidrelétrica. O relevo também é um fator que influencia a instalação de uma usina hidrelétrica. Porém, se as chuvas não ocorrem por muito tempo, a geração de energia pode ser prejudicada.

Térmicas: combustíveis fósseis e nuclear 

As usinas termelétricas tradicionais utilizam combustíveis fósseis, como carvão, petróleo ou gás natural, para gerar eletricidade. O ar quente gerado pela queima do combustível movimenta as turbinas, produzindo energia elétrica. Pouco utilizado no país, o carvão é empregado em Santa Catarina, onde está a maior produção nacional. 
Já o uso de óleo diesel, um dos produtos do refino do petróleo, tem aumentado nos últimos anos para alimentar as termelétricas, que foram mais usadas por causa da falta de chuvas e da consequente queda na produção das hidrelétricas. Por sua vez, o gás natural para geração de energia está crescendo em virtude do acordo com a Bolívia, que dispõe de importantes reservas de gás natural em seu território.
Um dos resultados desse acordo foi a construção de um gasoduto de mais de 3 mil quilômetros de extensão, capaz de transportar para o território brasileiro 30 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia. Novas descobertas de gás natural no Brasil ampliam as perspectivas de usar essa fonte de energia. 
As centrais nucleares são termelétricas que utilizam elementos radioativos – tais como o urânio – para fazer funcionar seus reatores e gerar calor. Existem apenas duas unidades em funcionamento no Brasil. A terceira unidade está em construção, também em Angra dos Reis(RJ).

Energias renováveis 

O uso de energias renováveis no Brasil ainda é pouco estimulado. Apesar disso, tem aumentado. A energia solar é um tipo de energia renovável que pode ser usada tanto para gerar eletricidade quanto para aquecer água. 
No primeiro caso é preciso ter uma placa especial que recolhe a energia solar e a transforma em energia elétrica – chamada de placa fotovoltaica. No segundo caso é preciso instalar coletores no telhado das residências para que o sol aqueça a água. A água é aquecida ao percorrer uma série de serpentinas instaladas nos coletores. 
A energia solar pode ser estimulada no Brasil, que tem, em grande parte do território, muita insolação. Ela pode ser uma alternativa para áreas afastadas que ainda não integram a rede de distribuição de energia ou mesmo para áreas urbanas, diminuindo a necessidade de construção de novas hidrelétricas e termelétricas.
Está crescendo o uso do lixo na produção de energia. Atualmente, as principais tecnologias para produção de energia a partir do lixo são a fermentação do lixo orgânico, que gera gás para queima, e a incineração controlada do lixo, que pode gerar resíduos prejudiciais à saúde se feita sem cuidados. 
A fermentação pela decomposição do lixo orgânico geralmente é feita em biodigestores, ou acontece naturalmente em aterros sanitários, que, por meio de uma rede de tubos, podem drenar o gás gerado e utilizá-lo em termelétricas. No caso da incineração direta do lixo, a energia é gerada pela queima de resíduos, também em usinas termelétricas. Nesse caso, o que pode ser reciclado é separado, e o que não pode é queimado.
Em estados como Piauí, Ceará e Maranhão ocorre o aproveitamento da energia eólica. O Brasil possui grande potencial de uso dessa fonte de energia. Uma das vantagens dessa fonte é que ela não gera poluição. As enormes pás giram movidas pelo vento e geram eletricidade. As fontes tradicionais geram mais impactos ambientais que as renováveis (leia a seção Fique por dentro). Apesar do potencial de fontes renováveis, o Brasil ainda as utiliza pouco, se comparado a outros países. Por isso, é preciso reduzir o consumo de energia, economizando no dia a dia e evitando o desperdício.


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