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Inconfidência Baiana: conjuração popular

Outra revolta, dessa vez na Bahia, ocorreu em 1798. Dela participaram alfaiates, sapateiros, soldados e escravizados de Salvador. Pela ação de grupos populares no movimento, a Conjuração Baiana também ficou conhecida como Revolta dos Alfaiates.

O terceiro movimento influenciado pelas ideias iluministas. Essa conspiração teve caráter mais popular e mais abrangente que as duas anteriores. O movimento iniciou-se em 1797, quando um grupo de proprietários e intelectuais organizaram a primeira sociedade secreta do Brasil, de orientação maçônica, sob inspiração francesa: Cavaleiro da Luz. Seus principais líderes - padre Agostinho Gomes, Cipriano Barata, Francisco Barreto e Hermógenes Pantoja - traduziram textos dos iluministas Voltaire e Rousseau, divulgando os princípios revolucionários franceses, e fizeram circular vários panfletos com propostas para a formação da República fluminense.

Um dos líderes da revolta foi Luís Gonzaga das Virgens e Veiga (1761-1799), um homem que era soldado e foi punido por abandonar o serviço militar várias vezes. Ele sabia ler e escrever, o que não era comum entre as pessoas das camadas populares naquela época.

Os planos dos revoltosos incluíam o fim da escravidão e do domínio português, a proclamação de uma república e a permissão para que navios de todas as nações ancorassem nos portos baianos.

A circulação de panfletos foi o marco inicial da Conjuração Baiana. No princípio, fizeram parte do movimento artesãos, profissionais liberais, oficiais, soldados, escravos, negros, comerciantes, padres e alguns proprietários das elites brancas da Bahia, embora nem todos tivessem o mesmo tipo de participação, nem os mesmos objetivos. As elites brancas, estimuladas pelas ideias francesas, defendiam posições de autonomia em relação à metrópole portuguesa e liberdades individuais, de expressão e política. Já os baianos das classes mais humildes, que compunham a maioria do movimento, viam nos ideais da Revolução Francesa a expressão de seu descontentamento econômico, social e político. Os membros da elite utilizavam os aspectos políticos e ideológicos do liberalismo para reforçar suas críticas ao sistema colonial, mas não pretenderam provocar profundas alterações na estrutura escravista, por exemplo, inclusive por sua condição de proprietários escravocratas. Veja como os autores da História da sociedade brasileira traçaram o perfil das elites abastadas: Os proprietários eram pouco numerosos, pois a maioria recuperava-se da longa crise da economia açucareira com o chamado "renascimento agrícola" do final do século. Pior para os não proprietários: as terras que abrigavam as culturas de subsistência foram novamente tomadas por canaviais. Preços altos e fome torturavam 90% da população; “só os ricos fazendeiros e os grandes comerciantes portugueses de Salvador estavam bem. Não eram, portanto, casuais os saques aos armazéns em busca de carne e farinha, nem o incêndio do pelourinho, símbolo da dominação lusitana”. (Francisco Alencar e outros, História da sociedade brasileira.)
Num primeiro momento, as elites buscaram o apoio de escravos e de grupos mais pobres. Mas as propostas liberarias e igualitárias francesas despertaram as populações humildes para a ideia de igualdade entre os homens, com o fim da escravidão. Quando o movimento incorporou a luta antiescravista, os proprietários abandonaram a conjura.
A adesão de bordadores, pedreiros, sapateiros e alfaiates deu novo impulso ao movimento. Destacaram-se na liderança do movimento João de Deus (de 24 anos) e Manuel Faustino dos Santos (de 23 anos), ambos mulatos e alfaiates - por isso a rebelião ficou também conhecida como Conjuração dos Alfaiates.
No dia 12 de agosto de 1798, as paredes e muros da cidade de Salvador amanheceram repletas de cartazes manuscritos: "Animai-vos, povo bahiense, que está por chegar o tempo feliz da nossa liberdade, o tempo em que todos seremos iguais". Outros boletins diziam: "A liberdade consiste no estado feliz, no estado livre do abatimento: a liberdade é a doçura da vida o descanso do homem com repouso e bem-aventurança do mundo'. Havia panfletos que esclareciam o programa político da República Baianense: fim da escravidão, impostos mais eqüitativos, abertura dos conventos, aumento do soldo das tropas, eleições gerais para a escolha dos representantes da população, luta contra o clero, os reis e as autoridades. É importante perceber que estes três últimos pontos reproduziam os aspectos mais radicais da Revolução Francesa. Por outro lado, todos os movimentos e manifestações que proliferaram na América nas últimas décadas do século XVIII tinham um ponto central em comum: a liberdade do comércio.
O governador da Bahia mandou investigar quem eram os autores dos panfletos e chegou ao nome de Luís Gonzaga.
A repressão lusitana foi rápida e eficiente. O governo proibiu uma reunião que havia sido convocada no campo do Dique e iniciou a prisão dos conjurados mais conhecidos. Instalou-se o pânico na população, enquanto a polícia espalhava o terror, com invasões de casas, prisões arbitrárias, torturas, fugas, delações. Os proprietários que ainda não haviam se afastado do movimento conseguiram escapar à repressão graças a seu prestígio e dinheiro. 
Mais de trinta participantes do movimento foram presos e processados. As penas mais severas foram aplicadas aos líderes mais pobres. Em novembro de 1799, quatro deles, todos mestiços, foram enforcados e esquartejados: os alfaiates João de Deus do Nascimento e Manuel Faustino dos Santos Lira e os soldados Lucas Dantas e Luís Gonzaga das Virgens e Veiga.

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