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Inconfidência Mineira: movimento das elites

A Inconfidência Mineira ocorreu em Vila Rica, atual Ouro Preto, como a primeira grande manifestação das contradições do sistema colonial no Brasil. A partir do governo de Pombal (1750/1777), a Coroa portuguesa passou a exigir da colônia brasileira um rendimento anual de cem arrobas de ouro. A origem da medida estava nos relatórios da administração lusitana das Minas Gerais, que XX varo o declínio do fornecimento de ouro e atribuíam as causas disso a fraudes e contrabando. Por isso Pombal determinou que, para completar as cem arrobas, o pagamento seria imposto a um centro aurífero qualquer, escolhido de surpresa e arbitrariamente por Sua Majestade. Esse "imposto" estabelecido para completar a falta das arrobas foi chamado de Derrama.

Um clima de tensão tomou conta de Minas Gerais quando o governador da capitania anunciou que haveria nova derrama ou cobrança dos impostos atrasados. Em reação à derrama, um grupo de colonos organizou um movimento contra as autoridades portuguesas, conhecido como Conjuração ou Inconfidência Mineira.

O anúncio da derrama era motivo de grande temor para a população, pois sua decretação prenunciava toda a sorte de violência aos moradores na vila escolhida pelas autoridades: invasão das casas, saque, prisões e torturas. O esgotamento aurífero, causando crise econômica; o controle opressivo da população pela metrópole; as notícias das vitórias norte-americanas sobre os ingleses (1783); e a proibição de instalações manufatureiras na colônia (1785) foram acontecimentos conjunturais que favoreceram o surgimento de protesto contra a política colonizadora da metrópole. Os setores intermediários da sociedade mineira - padres, militares, literatos, estudantes, pequena burguesia urbana (comerciantes) - empolgavam-se com as ideias iluministas dos franceses e o êxito da independência dos Estados Unidos.
Os planos dos conjurados incluíam proclamar uma república (com capital na cidade de São João del-Rei), implantar indústrias na região e criar uma universidade em Vila Rica (atual cidade de Ouro Preto). Porém, não havia propostas efetivas para abolir a escravidão, tampouco para melhorar as condições de vida da maioria da população.
Os inconfidentes mineiros pertenciam às elites, a famílias influentes e ricas. Na liderança do movimento estavam Inácio José de Alvarenga Peixoto (advogado, minerador e latifundiário), Cláudio Manuel da Costa (rico minerador), José Álvares Maciel (químico com formação em Coimbra), Luís Vieira da Silva (cônego formado em filosofia e teologia), Carlos Correia de Toledo e Melo (padre e grande proprietário minerador), Francisco de Paula Freire de Andrade (militar). A única exceção era Joaquim José da Silva Xavier o Tiradentes, que, embora fosse filho de Fazendeiro, teve uma vida profissional inconstante: foi minerador, tropeiro, comerciante, dentista (daí o apelido) e finalmente alferes da cavalaria vários ofícios de Tiradentes demonstravam as dificuldades dos membros daquela "camada média" das Minas Gerais diante do declínio da mineração, dos altos impostos e dos aumentos de preços. Joaquim José era o inconfidente de menores posses.
Os conspiradores desejavam o rompimento com a metrópole e, no plano econômico defendiam um projeto que compreendia: livre produção baseada no desenvolvimento das manufaturas têxteis, siderúrgicas e fábricas de pólvora, estímulos à produção agrícola e liberdade comercial com eliminação do monopólio metropolitano.
No plano social, a maioria dos inconfidentes desejava manter a escravidão, como ficou evidenciado na afirmativa de José Álvares Maciel: com a libertação dos escravos ficaria sem haver quem trabalhasse nas terras, tanto na mineração como na cultura:'.
No plano político, os conjurados não tinham posições comuns: alguns apoiavam um regime republicano, segundo o modelo norte-americano; outros queriam uma monarquia constitucional. De comum, haviam acertado: a transferência da capital para São João Del Rei, a fundação de uma universidade em Vila Rica, uma bandeira com o lema “Libertas quae sem tamen” (Liberdade ainda que tarde) e o começo do levante contra a Coroa no dia da cobrança dos impostos. Naquele ano de 1789, o imposto atrasado atingia 384 arrobas.
O isolamento dos conspiradores em relação à grande massa da população e a falta de organização militar (os rebeldes só se lembraram de providenciar armas nos últimos dias) evidenciavam a fraqueza do movimento. 
O movimento foi denunciado ao governador da capitania de Minas Gerais por Joaquim Silvério dos Reis (1756-1792). Em troca, ele conseguiu o perdão de suas dívidas. Ao saber da conspiração, o governador suspendeu a derrama e ordenou a prisão dos envolvidos.
A devassa (processo contra ato considerado criminoso) iniciou-se em Minas e durou três anos, terminando no Rio de Janeiro. Muitos participantes da conjuração foram presos, julgados e condenados. Onze deles receberam pena de morte, mas a rainha de Portugal, Maria I, mudou a punição para exílio perpétuo em colônias portuguesas na África. Só Tiradentes teve a pena de morte por enforcamento mantida.
A Tiradentes - que jurara dar dez vidas, se dez vidas tivesse -, foi suprimida a única vida. Depois de morto, lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, onde em seu lugar mais público será pregada em poste alto, até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos e pregado em postos onde o réu teve suas infames práticas, e a casa em que vivia será arrasada e salgada:' Essa sentença real foi executada a 21 de abril de 1792, ao meio-dia, no Rio de Janeiro.
A sentença não deve ser vista apenas pelo lado do sofrimento individual de Tiradentes. Esses requintes de crueldade dirigidos a um único homem serviram como símbolo para causar medo, horror, vergonha e, principalmente, uma advertência para que nenhum morador da colônia ousasse rivalizar contra o reino de Portugal.
Além disso, é importante recordar que, ao acusar e condenar Tiradentes como líder da conspiração, puniu-se apenas o menos abastado dos dez principais revoltosos.

Apesar disso, a conjuração mineira foi um movimento de proprietários para proprietários, de homens abastados que queriam romper com a metrópole para defender seus próprios interesses e o aumento de suas margens de lucros. Basta lembrar que a maioria dos inconfidentes era contrária à libertação dos escravos.

Versões da revolta

Ao longo do tempo, a Conjuração Mineira foi interpretada de diferentes maneiras. Vamos conhecer algumas dessas interpretações, pois uma atitude historiadora envolve identificar e analisar diferentes versões de um processo histórico.
Até a independência do Brasil, predominou a versão dos colonizadores. O movimento mineiro foi chamado de inconfidência, palavra que significa “traição” – no caso, traição à Coroa portuguesa.
Durante o império, o movimento continuou sendo malvisto pelos governantes, que descendiam dos monarcas portugueses. Afinal, eles haviam reprimido violentamente a conjuração e punido seus líderes. Foi apenas na república que o movimento foi interpretado como a primeira luta pela independência do Brasil. Tiradentes foi transformado em herói do país e a data de sua execução, 21 de abril, tornou-se feriado nacional.
Ao longo do tempo, o sentido negativo da palavra inconfidência caiu no esquecimento e passou a denominar os movimentos contrários ao domínio colonial. Ainda assim, alguns estudiosos evitam esse termo e preferem usar conjuração, que significa conspiração.

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