Pular para o conteúdo principal

A Presença Holandesa na Paraíba

Portugal desde 1580 estava sob domínio espanhol, e consequentemente, o Brasil. A instalação da empresa açucareira no Brasil contou com a participação holandesa, desde o financiamento das instalações até a comercialização no mercado europeu. Assim, quando Felipe II proibiu a manutenção dessas relações comerciais, tirou dos holandeses uma grande fonte de lucros, levando-os a reagirem com a invasão ao Nordeste brasileiro. Para isso, os holandeses organizaram uma Companhia – a Companhia das Índias Ocidentais –, e decidiram invadir a capital, em 1624. Prenderam o Governador Geral e o enviaram para a Holanda.

Não conseguiram, no entanto, governar a região. Sob o comando de D. Marcos Teixeira, as forças brasileiras mataram vários chefes batavos, enfraquecendo as tropas holandesas. Em maio de 1625, eles foram expulsos da Bahia pela esquadra de Fradique Toledo Osório. 

As invasões holandesas atingem também a Paraíba e através de ataques contínuos a Cabedelo, onde a resistência foi muito acentuada, tentam se fixar em nossas terras, porém só concretizando em 1634, quando desembarcam ao norte da foz do Jaguaribe e conseguiram vitória sobre as tropas do governador paraibano Antônio de Albuquerque Maranhão e partindo para dominar Cabedelo, onde tiveram êxito.

Em dezembro de 1634 os holandeses entraram na cidade de Filipéia de Nossa Senhora das Neves e passaram a administra-las até 1645.

A preocupação inicial dos holandeses consistiu em manter defesas, para estabilizar a conquista, e atrair a simpatia dos habitantes da Paraíba, cuja capital teve a denominação mudada para Frederica. A Fortaleza de Santa Catarina, no Cabedelo, foi rebatizada como Margareth.

Alguns dos nossos moradores pressentindo a derrota e não querendo se submeter aos inimigos, retiraram-se da Capitania. Porém antes da retirada, queimavam os canaviais e inutilizavam os engenhos. André Vital de Negreiros foi o primeiro a tocar fogo no engenho do seu pai e muitos seguiram-lhe o exemplo.

Para impedir possível rebelião, os holandeses tanto fortificaram a Igreja de São Francisco e o convento de Santo Antônio, a cujas portas instalaram entrincheiramentos e bateria, quanto ocuparam a inacabada Igreja de São Bento, na Rua Nova. Quando os religiosos franciscanos tentaram desobedecer às ordens dos novos senhores, foram expulsos da Capitania.   

Nova organização política, social e econômica

Os holandeses reconheceram a desvantagem de ver a terra desamparada, engenhos abandonados, outros danificados. Então se prestaram a fazer com os moradores uma espécie de pacto. Duarte Gomes da Silveira foi um dos primeiros a se apresentar ao inimigo e serviu de mediador entre os moradores e os invasores. Não traindo os seus, mas para não entregar de tudo o que lhes custara tanto trabalho.

O primeiro governador da província holandesa da Paraíba e Rio Grande do Norte foi Servaes Carpentier que em nome do Príncipe de Orange, dos Estados Gerais e da Companhia fez aos paraibanos, em ata de 13 de janeiro de 1635, as seguintes promessas: ofereceram anistia, liberdade de consciência e de culto católico, manutenção do regime de propriedade, proteção aos negócios e observâncias das leis portuguesas nas pendências aos naturais da terra.

Tais recomendações surtiram efeito, daí porque não foram poucos os que aderiram aos invasores. O padre jesuíta Manoel Morais abjurou a fé católica e embarcou para a Holanda, onde se fez calvinista e casou.

No plano administrativo, conservou-se parte da antiga administração, subordinada, porém, ao diretor geral, função inicialmente ocupada pelo conselheiro Servaes Carpentier. Funcionários denominados escabinos e escoltetos encarregou-se de administra a justiça e cobrar impostos.

No plano econômico-social, os holandeses mantiveram a escravidão. Com esse objetivo, ocuparam, preliminarmente, a província portuguesa de angola, na África, principal fonte de fornecimento de cativos. Introduzindo aperfeiçoamentos técnicos como moendas metálicas, no lugar das antigas, feitas de madeira, ofereceram empréstimos aos proprietários de engenhos. A maior parte destes, liderados por Duarte Gomes da Silveira aceitou a oferta.

A principal colaboração recebida pelos holandeses proveio dos índios Potiguaras enquadrados pelos caciques Pedro Poti e Paraupaba. Em troca, os holandeses chegaram a realizar assembleia de índios para a qual os principais do Ceará e Pernambuco enviaram representantes à vila de Itapessirica, em Pernambuco. 

A Resistência anti-holandesa

O controle holandês sobre a Paraíba durou apenas vinte anos, de 1634 a 1654, e nunca se fez total. Isso porque, desde cedo, os que não o aceitaram partiram para a luta armada que assolou a várzea do Paraíba. Nesta os flamengos nunca conseguiram firmar-se.

Já em 1636, o segundo diretor geral Ippo Eyssens, tido como arbitrário, foi morto numa emboscada, quando assistia a farinhada no engenho Santo Antônio. O principal responsável foi o capitão Francisco Rabello, o Rabellinho. Reagindo, os holandeses procuraram apresentar combate no Tibiri, que foi evitado pelos luso-brasileiros que pretendia retrair-se e recorrer a ataques rápidos e de surpresa. Era a guerrilha. Por conta desta os holandeses nunca se sentiram seguro na Paraíba, salvo durante algum tempo na Capital e, mais tarde, no interior da Fortaleza de Santa Catarina. A repressão holandesa caracterizou-se pela brutalidade. Alguns engenhos e propriedades foram confiscados. A pena capital foi igualmente aplicada, e, em 1645, o diretor geral Paul Linge, responsável por enforcamentos, mandou arrastar pela cidade o corpo de condenado que morrera na prisão.

A tensão somente aliviou entre 1638 e 1644, durante a administração dos diretores Elias Hercman e Gisberth Wirth. Por essa época, chegou ao Brasil o conde Maurício de Nassau, que se instalou no Recife, com artistas, cientistas, e estudiosos do melhor nível.

Emancipados da Espanha, em 1640, os portugueses encontravam-se com as finanças abaladas, de modo que alguns conselheiros do rei, com o padre Antônio Vieira, o maior sábio do mundo luso da época, elaboraram documento que propunha a preservação de todo Norte pelos holandeses que se absteriam de invadir o restante do Brasil e as possessões lusas no Oriente.

Esse documento ganhou a denominação de papel forte, tão convincente pareciam suas razões. Na Paraíba, os proprietários e altos funcionários, beneficiários da invasão flamenga, concordaram com os termos.

Não foi esse, porém, o caso do jovem André Vital de Negreiros. Paraibano, filho de proprietários portugueses, participou da campanha anti-holandesa de 1624, na Bahia , onde ficou por algum tempo. Em 1630, encontrava-se em Olinda, quando os flamengos dominaram a cidade. Novamente na Paraíba, entre 1634 e 1636, nunca pactuou com invasor que o respeitava.

De 1636 a 1644 permaneceu em Portugal onde, em vão, tentou mobilizar os espíritos em prol da resistência. Sem conseguir o intento, retornou ao Brasil, desembarcando na praia pernambucana de Tamandaré, acima da qual, em Santo Antônio do Cabo, fez junção com as tropas pernambucanas de João Fernandes Vieira. A luta doravante, iria travar-se em campo aberto, e, nela, Vidal de Negreiros revelaria dons de estrategista. Participante das duas batalhas dos Montes Guararapes, figurou entre os chefes que receberam a rendição holandesa, na Campina da Taborda. Anteriormente, não hesitara em atear fogo aos canaviais do próprio pai, na Paraíba. 

A Capitania da Paraíba na época da invasão holandesa

Na época da invasão holandesa, a população era dividida em dois grupos: os homens livres (holandeses, portugueses e brasileiros) e os escravos (de procedência brasileira ou africana). A mistura de raças não era bem vista pelo governo holandês, portanto, durante vinte e quatro anos de domínio holandês no Brasil, sabe-se de raras uniões entre holandeses e nativos, sendo consideradas uma exceção.

Ao contrário do que ocorreu em Pernambuco a presença dos holandeses não trouxe muitas vantagens à Paraíba. Houve apenas algum aumento na produção de açúcar, mas de caráter temporário, pois, com a volta de Meurício de Nassau para Holanda (1644), a capitania da Paraíba entrou em completa desordem.

A Capitania da Paraíba de 1635 a 1645 teve como administradores alguns governadores holandeses:

-       Servaes Carpentier: Também governou o Rio Grande do Norte, e sua residência oficial foi no Convento São Francisco de onde para execução do seu intento, expulsaram os franciscanos que lá moravam. O Convento de São Francisco, além de ser a residência oficial do governo holandês, servia também para abrigo dos mercadores neerlandeses em ocasiões necessárias, servindo também de quartel, para os soldados da guarnição que serviam na cidade.

- Ippo Elyssens: Foi um administrador violento e desonesto. Apoderou-se dos melhores engenhos da capitania. Foi morto quando assistia a uma farinhada no povoado do Espírito Santo.

-   Elias Herckman: Governador holandês importante, que governou por cinco anos. Bastante estimado pela população, pelo modo distinto como tratava os moradores, como pela capacidade administrativa demonstrada. Era homem de sensibilidade, poeta, escritor.

- Sebastian Von Hogoveen: Governaria no lugar de Elias Heckman, mas morreu antes de assumir o cargo.

-    Daniel Aberti: Substituto do anterior.

-   Gisbert De Withtambém considerado um dos melhores da província, razão pela qual foi feito um abaixo-assinado pedindo sua permanência, quando do término de seu mandato. Trabalhador incansável, não descuidou dos interesses da comunidade. Mesmo assim, o Alto Conselho holandês, designou outro para substituí-lo: Paulo de Linge.

- Paulo de Linge: Foi derrotado pelos “Libertadores da Insurreição”, e retirou-se para Cabedelo.

Restauração

O Brasil comemorou festivamente, em 1640 a restauração do trono português, livre agora do jugo espanhol. Os representantes da Holanda participaram também das alegrias, visto que eram inimigos da Espanha. Mas os nativistas almejavam a liberdade. Nunca os paraibanos aceitaram o domínio holandês  e quase não se consideravam filhos de colonos, pois tinham Portugal como pátria mãe.

A dominação holandesa de 1634 a 1645, na Paraíba, foi vista e sentida como uma imposição a que obedeciam constrangidos, mas não aceitavam. Ao assumir o lugar do Conde Maurício de Nassau, a Companhia holandesa impôs uma política contrária a que foi proposta por Nassau, confiscando fazendas e engenhos, perseguindo católicos e judeus, aumentando impostos.

Insatisfeito com a "virada holandesa", o senhor de engenho, João Fernandes Vieira, parte para a luta armada comandando seu exército de libertação. O negro Henrique Dias ofereceu-se como voluntário para lutar contra os holandeses, tendo recrutado um grande número de negros alforriados, oriundos dos engenhos conquistados pelos invasores.. O índio Potí, batizado católico em 1614 com o nome de Filipe Camarão, à frente dos guerreiros de sua tribo organizou ações de guerrilha que se revelaram essenciais para conter o avanço dos invasores. 

André Vidal de Negreiros, paraibano, filho de proprietários portugueses,  fez se chefe da Guerra de Libertação Nacional (Insurreição Pernambucana). Na Paraíba, a insurreição contra os flamengos propagou-se com tanta rapidez que, em 1645, o capitão Lopo Curado Garro, autor de relação das pugnas contra os holandeses no Nordeste, já dominava a região do Tibiri. Daí suas colunas ingressaram, nesse mesmo ano, na capital, de onde os holandeses se retiraram para a Fortaleza de Santa Catarina. Nos últimos nove anos de permanência na Paraíba, limitaram-se ao controle dessa fortificação. Após 20 ano de domínio os holandeses foram expulsos da Paraíba em 1654. 

Considerado um dos maiores Paraibanos de todos os tempos Vidal de Negreiros fez-se indiscutível chefe da Guerra de Libertação Nacional que a insurreição contra os holandeses representou. Sua carreira foi uma sucessão de êxitos. Escolhidos para levar a Portugal os resultados da insurreição contra os holandeses, foi nomeado governador dos estados do Maranhão e Grão-Pará, que constituíam territórios independentes do restante do Brasil. Em 1662, designaram-no governador de Angola, onde fortificou a capital, Luanda. Ao falecer, em 1680, seus restos mortais foram transladados para a Igreja dos Prazeres, nos montes Guararapes.

 Cultura e contribuições holandesas

O capítulo das invasões holandesa na Paraíba não deve ser  encarado apenas do ponto de vista militar. Bem mais importante fez-se a contribuição cultural dos invasores – e cultura é o que fica. Nesses termos, os flamengos contribuíram para o conhecimento da terra.

Tal deveu-se, em primeiro lugar, aos relatórios que produziram.

O primeiro, de autoria do conselheiro Servaes Carpentier, revela caráter ecológico, ao recomendar as áreas mais adequadas ao plantio da cana-de-açúcar, fumo e mandioca, além de criação de gado. Entusiasmado com a fertilidade da terra, Carpentier deteve-se, longamente, sobre as árvores, frutos e animais que nela se encontravam.

Descrição das Capitanias de Pernambuco, Itamaracá, Parahyba e Rio Grande do Norte intitula-se o relatório assinado por Adriaen Verdonck, que teve um fim trágico. Segundo esse autor, a Paraíba, dispunha, em 1630, de dezoito a dezenove engenhos responsáveis por cento e cinquenta mil arrobas anuais que significavam seiscentas a setecentas caixas de açúcar, embarcadas nos navios. Contudo, havia pouco, movimento de negócios na capital.

Em matéria de produção açucareira, o melhor documento de origem holandesa é o minucioso Relatório sobre as Capitanias Conquistadas no Brasil pelos Holandeses, datado de 1639, e de autoria de Adriaen Van Der Dussen. De portos, rios, cidades, freguesias, aldeias, escravos, pau-brasil e madeiras, fortificações, religião e abastecimento ocupa-se Dussen cujo texto detalha os vinte engenhos existentes na Paraíba, com as respectivas tarefas e lavradores.

O mais completo relatório sobre a Paraíba proveniente do domínio holandês, é a Descrição geral da Capitania da Paraíba, de Elias Herckman, objeto, em 1982, de duas edições, ambas em João Pessoa. Geógrafo, poeta e cartógrafo, Herckman que na condição de Diretor da Companhia das Índias Ocidentais, governou a Paraíba de 1636 a 1639, elaborou documento verdadeiramente modelar. A primeira parte é dedicada a capital, a segunda aos engenhos do vale do Paraíba e a terceira aos costumes dos índios Tapuias. Geografia Urbana, Economia e antropologia combinam-se, dessa forma, harmoniosamente.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Zabala - Os ‘materiais curriculares’

  Os ‘materiais curriculares’ e outros recursos didáticos O PAPEL DOS MATERIAIS CURRICULARES Os materiais curriculares, corno variável metodologicamente são menosprezados, apesar de este menosprezo não ser coerente, dada a importância real que têm estes materiais. Uma olhada, mesmo superficial, permite que nos demos conta de que os materiais curriculares chegam a configurar, e muitas vezes a ditar, a atividade dos professores. A existência ou não de determinados meios, o tipo e as características formais, ou o grau de flexibilidade das propostas que veiculam são determinantes nas decisões que se tomam na aula sobre o resto das variáveis metodológicas. A organização grupai será cie um tipo ou de outro conforme a existência ou não de suficientes instrumentos de laboratório ou de informática; as relações interativas em classe serão mais ou menos cooperativas conforme as caraterísticas dos recursos; a organização dos conteúdos dependerá da existência de materiais com estruturações disc

A Revolução Francesa

O Antigo Regime – ordem social que garantia os privilégios do clero e da nobreza – foi sendo abalado e destruído lentamente por uma série de fatores, como as revoluções burguesas na Inglaterra, o Iluminismo, a Revolução Industrial e a Independência dos Estados Unidos da América. Mas o fator que aboliu de vez o Antigo Regime foi a Revolução Francesa (1789-1799), uma profunda transformação sócio-política ocorrida no final do século XVIII que continua repercutindo ainda hoje em todo o Ocidente. O principal lema da Revolução Francesa era “liberdade, igualdade e fraternidade”. Por sua enorme influência, a Revolução Francesa tem sido usada como marco do fim da Idade Moderna e o início da Idade Contemporânea. Embora não tenha sido a primeira revolução burguesa ocorrida na Europa, foi, com certeza, a mais importante. 1. Situação social, política e econômica da França pré-revolucionária a) Sociedade A França pré-revolucionária era um país essencialmente agrícola. O clero e a nobreza possuíam en

SIMBOLISMO EM PORTUGAL E NO BRASIL

  O Simbolismo, assim como o Realismo-Naturalismo e o Parnasianismo, é um movimento literário do final do século XIX. No Simbolismo , ao contrário do Realismo , não há uma preocupação com a representação fiel da realidade, a arte preocupa-se com a sugestão. O Simbolismo é justamente isso, sugestão e intuição. É também a reação ao Realismo/Naturalismo/Parnasianismo, é o resgate da subjetividade, dos valores espirituais e afetivos. Percebe-se no Simbolismo uma aproximação com os ideais românticos, entretanto, com uma profundidade maior, os simbolistas preocupavam-se em retratar em seus textos o inconsciente, o irracional, com sensações e atitudes que a lógica não conseguia explicar. Veja as comparações: Parnasianismo 1. Preocupação formal que se revela na busca da palavra exata, caindo muitas vezes no preciosismo; o parnasiano, confiante no poder da linguagem, procura descrever objetivamente a realidade. 2. Comparação da poesia com as artes plásticas, sobretudo com a escultura. 3. Ativid