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O Brasil Pré-Colonial

Com a descoberta do novo caminho para as Índias, o comércio de especiarias transformou-se em preciosa fonte de riquezas para Portugal. Lisboa, cidade-porto desse lucrativo comércio, destacava-se pela agitada vida econômica no século XVI.

Nessa época, quando as atenções portuguesas estavam voltadas ao comércio oriental, deu-se o “descobrimento” do Brasil. Após as primeiras viagens, percebeu-se que as terras da América não ofereciam lucros fáceis e imediatos. De início não se encontraram, aqui, jazidas de ouro. É certo que havia, no litoral, grande quantidade de pau-brasil, madeira da qual se extraía tinta corante usada para tingir tecidos. Porém, o lucro a ser obtido com a exploração dessa madeira seria menor do que o vantajoso comércio de produtos africanos e asiáticos. Além disso, sendo um “território virgem”, não constituía mercado consumidor para os europeus.
Por essas razões, o interesse de Portugal em relação à colônia americana, nos primeiros trinta anos após a chegada de Cabral, limitou-se ao envio de algumas expedições destinadas a fazer o reconhecimento da terra e preservar sua posse.
Apesar do pau-brasil ter o seu valor, o comércio de especiarias com as Índias ainda era muito mais lucrativo. Neste período Portugal sofria de escassez de mão-de-obra e recursos, de forma que investir na extração de pau-brasil significava deixar de ganhar dinheiro nas Índias. Assim a Coroa reservou aos principais nobres os privilégios de explorarem as Índias, e a nobreza do "segundo escalão" as concessões para a exploração de pau-brasil.

Comércio de pau-brasil

Até 1530, o comércio de pau-brasil foi a principal atividade econômica realizada pelos portugueses na América.
A madeira dessa árvore, já conhecida pelos europeus, podia ser utilizada na construção de casas e navios e, sobretudo, na produção de um corante avermelhado para tingir tecidos.
Durante o início da colonização, a maioria dos navios enviados ao Brasil era abastecida de enormes quantidades de pau-brasil. Depois, os carregamentos dessa madeira eram levados a Portugal e, de lá, partiam para Amsterdã (na atual Holanda), onde se extraía dela um corante avermelhado (brasilina), utilizado para tingir tecidos.
Graças a seu valor econômico, não demorou para que o governo de Portugal decretasse que a exploração do pau-brasil era monopólio da Coroa. Com isso, ninguém poderia extrair essas árvores sem permissão do governo e sem pagar impostos. Mas o monopólio do pau-brasil não foi totalmente respeitado. Comerciantes ingleses, espanhóis, franceses e mesmo portugueses contrabandeavam a madeira.
A primeira concessão da Coroa para a exploração do pau-brasil foi dada ao comerciante português Fernão de Noronha, em 1501. Seus navios foram os primeiros a chegar à ilha que mais tarde recebeu seu nome. Posteriormente, a partir de 1513, o governo autorizou que seus súditos fizessem a livre exploração de pau-brasil desde que fossem pagos os tributos à Coroa portuguesa.

A decisão de colonizar

Os reinos de Portugal e de Espanha dividiram as terras da América por meio do Tratado de Tordesilhas (1494). Como se sabe, os indígenas não foram consultados sobre o assunto.
Franceses, holandeses e ingleses não aceitaram esse tratado e, por isso, disputaram a posse dos territórios americanos. A disputa ficou mais intensa depois que os espanhóis descobriram ouro e prata em suas colônias.
O relativo abandono em que foi deixado o Brasil, durante vários anos após a descoberta, facilitou as incursões de outros povos europeus, especialmente franceses e espanhóis. Eles eram atraídos pelas notícias dos viajantes e pelos relatos dos sobreviventes de naufrágios que falavam de povos e de costumes totalmente diferentes, e contavam sobre riquezas fabulosas. Aos franceses, por exemplo, atraía a tinta do pau-brasil, fundamental para suas manufaturas têxteis. Em constantes viagens às novas terras, recolhiam a madeira e abasteciam seus navios.
Sem ainda um plano de ocupação da nova terra americana, o governo de Portugal limitava-se a explorá-la na única riqueza que aparentemente apresentava, o pau-brasil. Tratava de assegurar o monopólio da exploração desse produto e defender a terra das investidas dos corsários estrangeiros. Com estes objetivos, entre 1500 e 1516, expedições exploradoras e expedições guarda-costas chegavam ao Brasil.
A partir de 1530, encerra-se essa fase pré-colonial. Inicia-se um processo efetivo de colonização da América Portuguesa.

Expedições Exploradoras

As expedições exploradoras vinham ao litoral brasileiro com a finalidade de mapear suas potencialidades e fazer um reconhecimento geográfico e antropológico da terra e de seus habitantes, os índios.
Na relação dos portugueses com os nativos predominava o interesse de acumular o máximo de dados e, ao mesmo tempo, abrir o maior número de pistas a futuras relações. As expedições exploradoras combinavam ações da Coroa e de particulares. Nestas últimas incluíam-se, em especial, ricos comerciantes, muitos dos quais eram cristãos-novos, os judeus recém-convertidos ao cristianismo para escapar dos rigores da Santa Inquisição - o tribunal que julgava os atos praticados contra a Igreja.
A primeira expedição exploradora, em 1501, foi uma ação da Coroa. Comandada por Gaspar de Lemos aportou, inicialmente, no litoral do atual estado do Rio Grande do Norte rumando, em seguida, em direção ao sul. Os principais acidentes geográficos encontrados no caminho recebiam nomes relacionados aos santos e dias de festas: Cabo de São Roque e Rio São Francisco, entre outros. Em janeiro de 1502, a expedição chegava ao Rio de Janeiro, indo depois até o Rio da Prata.
As informações enviadas ao rei de Portugal referiam-se, principalmente, ao clima, às condições da terra e à única riqueza até então encontrada, o pau-brasil. Este produto, de modo algum, superava os lucros obtidos no comércio com o Oriente. As matas do pau-brasil estendiam-se por grande parte do litoral, em especial do cabo de São Roque até São Vicente. Daí o nome "costa do pau-brasil". De São Vicente para o sul, o litoral era conhecido como "costa do ouro e da prata", em função das notícias sobre a existência daqueles metais preciosos na região.
A expedição comandada por Gonçalo Coelho, em 1503, constituiu-se em uma ação de particulares. Para organizá-la, a Coroa firmou, em 1502, contrato com um grupo de comerciantes, à frente Fernão de Noronha. A terra foi arrendada por um período de três anos para exploração do pau-brasil. Os arrendatários, em troca, comprometiam-se a construir feitorias e pagar, à Coroa, parte do lucro obtido. O arrendamento foi renovado mais duas vezes, em 1505 e em 1513. Como conseqüência do contrato e da expedição de 1502, o rei Dom Manuel doou, em 1504, a Fernão de Noronha, a primeira capitania hereditária no litoral brasileiro: a ilha de São João da Quaresma, atual Fernando de Noronha.
As feitorias instaladas serviam como depósitos do pau-brasil até que as embarcações portuguesas aqui chegassem. Os índios cortavam a madeira e recebiam, por este trabalho, objetos de pouco valor como facas, pentes e espelhos. Esse tipo de relação, baseada na troca de produtos, chama-se escambo. Nessa época, as pessoas que exploravam o comércio do pau-brasil eram denominadas brasileiros.
As notícias sobre a grande quantidade de pau-brasil existente no litoral, passaram a atrair outros países europeus. Em especial a França que, sentindo-se prejudicada pelos termos do Tratado de Tordesilhas, não reconhecia sua validade. O governo francês, então, patrocinou grupos de corsários que começaram a percorrer a "costa do pau-brasil", negociando a extração da madeira diretamente com os índios, por meio do escambo. Em conseqüência da pressão exercida pelas frequentes incursões de franceses e de outros europeus às suas terras, a Coroa portuguesa organizou expedições, chamadas "guarda-costas", para expulsar os corsários.

As Expedições Guarda-Costas

Cristóvão Jacques comandou as duas expedições guarda-costas organizadas pela Coroa. A primeira em 1516 e, a segunda, em 1526. Contudo, devido a grande extensão da costa brasileira, o esquema de policiamento foi ineficiente. Alguns navios inimigos chegaram a ser aprisionados, mas muitos outros escaparam ao cerco, tornando evidente a impossibilidade de controlar todo o litoral.
O historiador brasileiro Capistrano de Abreu ressaltou outra grande dificuldade: as alianças feitas entre os europeus e os indígenas. Os Tupinambás se aliavam, com freqüência, aos franceses e os portugueses tinham ao seu lado os Tupiniquins. E, segundo Capistrano, "durante anos ficou indeciso se o Brasil ficaria pertencendo aos Peró (portugueses) ou aos Mair (franceses)”.
Entretanto, a existência de sobreviventes de naufrágios, degredados e desterrados portugueses no Brasil, além de favorecer o contato com os índios, facilitou a defesa e a ocupação da terra. Esses homens, que teriam chegado com as primeiras viagens e permanecido pelas mais diversas razões, já estavam adaptados às condições físicas e sociais do território e ao modo indígena de viver. Alguns deles sucumbiram ao meio, a ponto de furar lábios e orelhas, matar prisioneiros segundo os ritos nativos, e alimentar-se de sua carne.

A Expedição de Martim Afonso de Sousa (1530-1532)

Em 1530, com o propósito de realizar uma política de colonização efetiva, Dom João III, "O Colonizador", organizou uma expedição ao Brasil. A esquadra de cinco embarcações, bem armada e aparelhada, reunia quatrocentos colonos e tripulantes.
Comandada por Martim Afonso de Sousa, tinha um tríplice missão: combater os traficantes franceses, penetrar nas terras na direção do Rio da Prata para procurar metais preciosos e, ainda, estabelecer núcleos de povoamento no litoral. Portanto, iniciar o povoamento das terras brasileiras. Para isto traziam ferramentas, sementes, mudas de plantas e animais domésticos.
Martim Afonso possuía amplos poderes. Designado capitão-mor da esquadra e do território descoberto, deveria fundar núcleos de povoamento, exercer justiça civil e criminal, tomar posse das terras em nome do rei, nomear funcionários e distribuir sesmarias.
Durante dois anos o Capitão percorreu o litoral, armazenando importantes conhecimentos geográficos. Ao chegar no litoral pernambucano, em 1531, conseguiu tomar três naus francesas carregadas de pau-brasil. Dali dirigiu-se para o sul da região, indo até a foz do Rio da Prata.
Fundou a primeira vila da América portuguesa: São Vicente, localizada no litoral paulista. Ali distribuiu lotes de terras aos novos habitantes, além de dar início à plantação de cana-de-açúcar. Montou o primeiro engenho da Colônia, o "Engenho do Governador", situado no centro da ilha de São Vicente, região do atual estado de São Paulo.
Diogo Álvares Correa, o Caramuru, João Ramalho e Antônio Rodrigues facilitaram bastante a missão colonizadora da expedição de Martim Afonso. Eram intérpretes junto aos índios e forneciam valiosas informações sobre a terra e seus habitantes. Antes de retornar a Portugal, ainda em 1532, o Capitão recebeu carta do rei Dom João III. Este falava de sua intenção de implantar o sistema de capitanias hereditárias e de designar Martim Afonso e seu irmão Pero Lopes de Sousa como donatários.
Enquanto Portugal reorganizava sua política para estabelecer uma ocupação efetiva no litoral brasileiro, os espanhóis impunham sua conquista na América, chegando quase à exterminação dos grupos indígenas: os astecas, no atual México, os maias, na América Central e os incas, no atual Peru.

Trabalho indígena

Para extrair tanta madeira, os europeus precisavam do trabalho dos indígenas. Eram os nativos que localizavam o pau-brasil, derrubavam as árvores, cortavam as toras e carregavam as madeiras até os navios ou feitorias.
Esse trabalho era complexo, pois a madeira do pau-brasil é pesada e compacta, sendo difícil de cortar e de transportar. Em troca de seu trabalho, os indígenas recebiam dos portugueses objetos como tecidos, espelhos e pentes.
Além disso, também recebiam objetos de ferro como facas, anzóis, tesouras, machados e foices. As trocas de produtos entre europeus e indígenas eram chamadas escambo.

Escambo, escravidão e riquezas

Os contatos entre os europeus e os indígenas nem sempre foram marcados pela violência e pela exploração do trabalho. Também houve casos de negociações e alianças.
Inicialmente, os portugueses conseguiram fazer negócios com os Tupi, trocando pau-brasil por objetos europeus de pouco valor. Caso semelhante ocorreu entre os espanhóis e os Guarani em relação à erva-mate e entre os ingleses e os iroqueses (povo indígena da América do Norte) em relação às peles de animais. Posteriormente, ficou difícil fazer trocas como essas, e os colonos passaram a fornecer ferramentas, armas e cavalos aos nativos.
Alguns nativos usaram essas armas nas guerras contra povos rivais com o objetivo de aprisionar os vencidos e entregá-los aos colonos para serem escravizados. Assim, o escambo deixou de ser uma simples troca de produtos por recursos naturais, como era nos primeiros anos da colonização, e passou a incluir também a troca de produtos por seres humanos.

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