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Os movimentos pela independência do Brasil

Dois movimentos ocorridos no Brasil no fim do século XVIII indicam o despertar de uma consciência nacional contra a dominação portuguesa:

· Inconfidência Mineira (1789);
· Conjuração Baiana (1798).
Você entenderá melhor a formação dessa consciência se examinar as grandes transformações que se registraram ao longo do século XVIII, no plano mundial.
Em 1776, treze colônias norte-americanas tornaram-se independentes de sua metrópole, a Inglaterra, passando a constituir o primeiro país livre da América, os Estados Unidos da América. O exemplo dos Estados Unidos semeou idéias de liberdade em todas as colônias americanas.
Também nessa época, tinha início na Inglaterra a Revolução Industrial, com a invenção da máquina movida a vapor e, depois, a eletricidade. Surgiram então numerosas fábricas, como as de tecidos, com milhares de operários e enorme produção.
Com a Revolução Industrial, a Inglaterra passou a consumir muita matéria-prima – como o algodão, que o Brasil produzia. Para o comerciante inglês, seria vantajoso comprar o algodão diretamente do Brasil. Entretanto, isto não era possível, devido ao monopólio comercial: o algodão primeiramente era vendido para o comerciante português e este, depois de pagar o imposto ao governo, vendia o produto para os ingleses.
Você pode compreender, assim, porque a Inglaterra, com a Revolução Industrial, tornou-se defensora da independência dos países coloniais.
Ainda no século XVIII, houve na França uma revolução importante (1789): o povo, oprimido, cansado de pagar pesados impostos, reagiu com violência contra o poder real sem limites (absolutismo) e até condenou o rei à morte. O lema Liberdade, igualdade e fraternidade, que orientou os revolucionários franceses, propagou-se por todo o mundo, traduzindo os ideais de uma verdadeira onda de revoluções.
Todas essas transformações foram animadas, naturalmente, por novas idéias. Contra o absolutismo e a desigualdade social levantaram-se as vozes de grandes pensadores franceses, que defendiam a liberdade política e o respeito aos direitos do homem e do cidadão. Esses pensadores ficaram conhecidos como iluministas.
Também contribuiu para as mudanças verificadas no século XVIII, o liberalismo econômico, conjunto de idéias defendidas por economistas que pregavam o livre comércio entre as nações, opondo-se ao monopólio comercial e, portanto, ao Pacto Colonial.
As transformações que acabamos de examinar ecoaram no Brasil, contribuindo para a formação da consciência nacional. Entre os que sofreram a influência dos acontecimentos e das novas ideias que estavam agitando o mundo incluem-se os escritores, poetas e padres de Vila Rica que participaram da Inconfidência Mineira.

Por que houve a Inconfidência (1789)

A Inconfidência Mineira foi estimulada não só por acontecimentos externos, como a Independência dos Estados Unidos, mas, sobretudo, pela crescente revolta contra o domínio português. Contribuíram para essa revolta:
- Impostos elevados: Além de elevados, os impostos recaíam sobre muita gente pobre que não podia pagá-los. Também não beneficiavam o povo, em forma de prestação de serviços (escolas, hospitais etc.); eram quase totalmente, mandados para Portugal, para enriquecer ainda mais a metrópole.
- Pacto Colonial e monopólio comercial: As leis do Pacto Colonial impossibilitavam o progresso da colônia, porque impediam os brasileiros de fabricarem artigos que concorressem com os da metrópole e obrigavam os produtores a entregar suas mercadorias exclusivamente aos comerciantes portugueses.
- Reserva de altos cargos para os portugueses: Para o exercício de altos cargos, na colônia, não valia o mérito, mas a condição de ter nascido em Portugal.
- Falta de escolas de ensino primário: O governo português não queria que o povo se instruísse por que sabia que, com a instrução, teria maior chance de se libertar.
- Rigorosa censura na entrada de livros estrangeiros: A razão é a mesma do item anterior: a leitura de livros que falavam de liberdade, poderia incentivar o povo a se revoltar contra o domínio português. Vale a pena lembrar que era proibida a entrada no Brasil até da Constituição dos Estados Unidos.

INCONFIDÊNCIA MINEIRA (Vila Rica, 1789)

A partir de 1750, a produção de ouro começou a diminuir. As lavras, que antes forneciam grande quantidade de metal, estavam se esgotando rapidamente. Por isso, tornava-se difícil pagar ao governo português as 100 arrobas (1470 kg) de ouro que ele exigia por ano.
Para completar essa quantidade de ouro, toda a população, mesmo os que não eram mineradores, era obrigada a contribuir. Esse sistema de cobrança chamava-se derrama.
É claro que a população das minas ficava revoltada com a derrama. Além de totalmente injusta, a cobrança era feita de maneira violenta: os soldados invadiam as casas e obrigavam todas as pessoas a pagarem uma parte da quantidade exigida.
Havia ainda outros atos do governo português que desagradavam a população.
Em 1785, a Rainha Dona Maria I proibiu o funcionamento de qualquer fábrica no Brasil. Todos os artigos antes eram feitos aqui mesmo, em pequenas oficinas, como calçado, sabão, tecidos, ferramentas, utensílios domésticos etc., deviam daí por diante ser importados de Portugal.
Essa medida prejudicou muito os brasileiros, pois: a população passou a pagar mais caro por esses produtos importados; os mais prejudicados foram os habitantes do interior, pois as mercadorias importadas deviam ser transportadas por longas distâncias, o que as encarecia bastante; além disso, por causa das dificuldades de transporte, nem sempre chegavam às cidades do interior (como era o caso das cidades mineiras) produtos em quantidade suficiente para todos; muitas pessoas tiveram suas oficinas desmontadas pelo governo, sofreram prejuízos e ficaram proibidas de exercer sua profissão.
O descontentamento da população das minas aumentava ainda mais por causa das atitudes do governador da capitania de Minas Gerais. Ele era autoritário e cruel: mandava espancar presos, exigia dinheiro da população, demitia funcionários para nomear seus amigos.
A situação começou a ficar insuportável em 1788, com a chegada de um novo governador, o Visconde de Barbacena. Além de não ser nada melhor que o anterior, o Visconde de Barbacena trazia ordens de realizar uma derrama, para cobrar mais de 5000 quilos de ouro. A população ficou alarmada.
Como você pode ver, os mineiros tinham muitos motivos para se revoltarem contra o governo português. Aos poucos, muitas pessoas da região começaram a perceber que seria muito melhor ter um governo próprio, não precisando mais obedecer às ordens de Portugal.
Assim, na cidade de Vila Rica, um grupo de pessoas começou a se reunir secretamente para discutir as novas ideias de liberdade e planejar uma revolta. Essa revolta que teria por finalidade tornar o Brasil independente de Portugal.

Os planos dos inconfidentes eram:

· Libertar o Brasil de Portugal, criando uma república com capital em São João Del Rei.
· Adotar uma nova bandeira que teria um triângulo no centro com a frase latina: Libertas quae sera tamen (liberdade ainda que tardia).
· Desenvolver indústrias no País.
· Criar uma universidade em Vila Rica.

A denúncia

Os conspiradores marcaram a revolta para o dia em que fosse realizada a derrama, prevista para o primeiro semestre de 1789. Eles esperavam obter o apoio de fazendeiros, donos de minas e do próprio povo, ameaçado pela derrama. Confiavam também na ajuda do Rio de Janeiro e de São Paulo.
Tiradentes ficou encarregado de tomar o palácio do governador, em Vila Rica. Em março de 1789, ele viajou para o Rio de Janeiro, fazendo propaganda da revolta. Mas os planos não deram certo.
O coronel Joaquim Silvério dos Reis, minerador português que devia muitos impostos ao governo, contou todo o plano dos inconfidentes ao governador de Minas. Silvério dos Reis havia prometido apoio a Tiradentes, mas, temendo ser descoberto, resolveu denunciar o movimento a fim de salvar-se e conseguir o perdão do governo português para suas dividas. Imediatamente, Barbacena suspendeu a derrama. Um pouco mais tarde mandou prender os suspeitos. Tiradentes foi preso no Rio de Janeiro e seus companheiros em Vila Rica.
Alguns dos acusados negaram sua participação na Inconfidência. De modo geral, os que confessavam, acusavam Tiradentes de ser o chefe do movimento.
Nos três primeiros interrogatórios, Tiradentes negou que tivesse participado de qualquer tentativa de revolta. Mas a partir do quarto, realizado em 1790, Tiradentes declarou ser o responsável pela Inconfidência. Como você vê, ele agiu de forma mais digna que os outros, que procuraram salvar-se lançando toda a culpa sobre um companheiro.
No julgamento, algumas pessoas foram soltas e 35 foram condenadas: onze deveriam ser enforcadas e outras mandadas para o exílio na África. Mas afinal, apenas Tiradentes foi executado. Os outros condenados à morte foram mandados para o exílio.
Tiradentes foi enforcado no dia 21 de abril de 1792, no Rio de Janeiro. Seu corpo foi dividido em pedaços e colocado em vários locais de Minas, como exemplo, para que ninguém mais tivesse coragem de participar de movimentos de revolta contra os portugueses.
Após a devassa e a execução das sentenças sobrava o lema da Inconfidência, continuando a inspirar novos movimentos: "Liberdade ainda que tardia".
Os principais líderes da Inconfidência Mineira foram Cláudio Manuel da Costa, poeta e rico minerador; Luís Vieira da Silva, cônego; Alvarenga Peixoto, próspero minerador e latifundiário; Tomás Antônio Gonzaga, intelectual e ouvidor de Vila Rica; Carlos Correia de Toledo e Melo, vigário e próspero minerador; José Álvares Maciel, estudante de Química; Francisco de Paula Freire de Andrade, tenente-coronel comandante do Regimento de Dragões; os irmãos Francisco Antônio e José Lopes de Oliveira, o primeiro militar e o segundo padre, ambos grandes proprietários rurais; Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, principal organizador político da rebelião e indivíduo de poucas posses: era alferes, posto militar logo acima do de sargento.
Os rebeldes defendiam o fim do pacto colonial e o desenvolvimento de manufaturas têxteis e siderúrgicas, além do estímulo à produção agrícola. No plano político, alguns almejavam a república, enquanto outros pretendiam uma monarquia constitucional. Os interesses de uns e de outros ficaram claros quando surgiu a discussão da escravatura. Nas reuniões dos conspiradores, organizadas pelo tenente-coronel Freire de Andrade ou por Cláudio Manuel da Costa, a maioria se opunha à abolição da escravatura. Apenas Tiradentes e poucos outros advogaram a causa dos escravos. Álvares Maciel afirmava que "não haveria quem trabalhasse nas terras, tanto na mineração, como na agricultura". A sociedade escravocrata brasileira reelaborava a ideologia liberal europeia, colocando-a dentro dos limites por ela aceitáveis.

Conjuração Baiana ou Revolta dos Alfaiates (Bahia – 1798)

Depois dos acontecimentos de Minas Gerais, nascia um novo movimento revolucionário.
A Conjuração Baiana ou Inconfidência Baiana, em 1798, foi uma rebelião predominantemente popular, constituída por alguns grandes proprietários de terra, insatisfeitos com as medidas da metrópole, e especialmente por um grande número de pessoas desprovidas de terra, como artesãos, soldados e alguns escravos, revoltados com a exploração de Portugal e com a condição de miséria em que viviam.
O movimento foi formado principalmente por mulatos e negros. Os conspiradores foram influenciados pelas revoltas de escravos que resultaram na Independência do Haiti (1758-1804) e pela Revolução Francesa (1789).
Era diferente da Inconfidência Mineira por um motivo bastante simples: em Minas Gerais, o movimento foi organizado por intelectuais, ricos proprietários, mineradores, gente de elevada posição social. Na Bahia, a rebelião foi promovida por gente muito simples. Eram soldados, artesãos, escravos, homens livres, alfaiates. Era um movimento de origem popular, com objetivos populares. Os rebeldes baianos desejavam não apenas a separação política de Portugal, mas também modificar, de forma profunda, as condições sociais brasileiras, acabando com a escravidão negra.
Constavam nos planos dos inconfidentes baianos medidas tais como:

· Libertar o Brasil de Portugal e proclamar uma República democrática.
· Extinguir a escravidão negra no Brasil.
· Aumentar os soldos dos soldados.
· Melhorar as condições de vida do povo brasileiro.
· Abrir os portos às nações amigas.

Em agosto de 1798, apareceram panfletos nas ruas de Salvador convocando a população para uma revolta. Pregavam a igualdade entre brancos e negros, o fim do controle comercial português e a pena de morte aos padres fiéis ao rei de Portugal.
Os inconfidentes baianos inspiraram-se nos ideais que marcaram a Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. O espelho inspirador mesmo é quando os jacobinos, que representam as camadas médias e baixas na França revolucionaria, tomam o poder das mãos da grande burguesia.
Inúmeros cartazes foram escritos, fazendo a propaganda da revolta e conclamando o povo a participar. Os panfletos eram encontrados nas portas das igrejas, nos muros da cidade e em diversos outros lugares públicos. Diziam o seguinte: “Está para chegar o tempo feliz da nossa liberdade, o tempo em que todos seremos irmãos, o tempo em que seremos iguais”.
Preocupado com o que estava acontecendo, o governador da Bahia, D. Fernando José de Portugal e Castro, procurou descobrir os autores dos cartazes. O movimento é delatado e reprimido: 49 pessoas são presas, inclusive três mulheres. Os líderes foram presos, processados e condenados. Os alfaiates João de Deus e Manuel Faustino dos Santos, que tinham apenas 17 anos, e os soldados Luís Gonzaga das Virgens e Lucas Dantas foram enforcados, pois o governo mostrava sua repressão de forma desumana e cruel com todos aqueles que ousassem contestar a autoridade lusa.
Observação: A Inconfidência Mineira e a Conjuração Baiana não alcançaram seus objetivos, mas transformaram-se em símbolos de luta pela emancipação do Brasil.

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