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A Independência dos Estados Unidos

As Treze Colônias pertencentes à Grã-Bretanha tinham considerável autonomia em relação à metrópole. No entanto, essa situação começou a mudar na segunda metade do século XVIII. Com a Revolução Industrial em curso provocou amplas mudanças no sistema produtivo, sendo necessários o envio de mais matérias-primas para as indústrias britânicas e a ampliação do mercado consumidor para seus produtos.

Na perspectiva britânica, seguindo os princípios da política mercantilista, suas colônias americanas podiam atender a essas necessidades. Para que isso ocorresse, porém, era preciso reduzir a autonomia das colônias e subordiná-las aos interesses econômicos metropolitanos.

A Independência dos Estados Unidos destrói a unidade do sistema colonial, colaborando decisivamente para a derrocada do Antigo Regime. As 13 colônias, estabelecidas a partir do século XVII no território norte-americano, contam, nas últimas décadas do século XVIII, com mais de 2 milhões de colonizadores. No centro – Pensilvânia, Nova York, Nova Jersey e Delaware – e no norte – Massachusetts, New Hampshire, Rhode Island e Connecticut – europeus exilados por motivos políticos ou religiosos vivem em pequenas e médias propriedades. Embora a Inglaterra proíba o estabelecimento de manufaturas nas colônias, a incipiente indústria do centro-norte não é incomodada pelas autoridades, pois não compete com o comércio da metrópole. No sul – Virgínia, Maryland, Carolina do Norte, Carolina do Sul e Geórgia – predomina a grande propriedade rural, ocupada pela monocultura dirigida à exportação e tocada pela mão-de-obra escrava, com pouco espaço para o trabalho livre. Os nortistas, no entanto, atravessam as fronteiras e concorrem com o comércio metropolitano, levando a Inglaterra a endurecer a política com as colônias.


Influência da Guerra dos Sete Anos 

Travada de 1756 a 1763 entre a Inglaterra e a França e vencida pelos ingleses, transfere para a Coroa britânica a maioria das possessões francesas, incluindo as terras situadas na América, a oeste das 13 colônias. Como os colonos norte-americanos não haviam contribuído para o esforço militar inglês, o Parlamento decide cobrar deles os custos da guerra, aumentando as taxas e reforçando os direitos da Coroa no continente.

Para compensar as perdas financeiras, o Parlamento britânico elaborou leis que visavam criar novos impostos nas Treze Colônias. A imposição desses tributos não era apenas uma forma de captar recursos rapidamente; com eles, a coroa também pretendia frear as atividades manufatureiras nas colônias e, assim, ampliar o mercado para os produtos britânicos. Os impostos foram usados ainda para custear e manter um exército regular na América.

A questão das terras indígenas

Com a vitória na Guerra dos Sete Anos, a Grã-Bretanha expandiu seu território colonial na América do Norte até o Vale do Rio Mississípi. O objetivo era ocupar as áreas recém conquistadas da França e avançar em direção ao oeste. Vários povos indígenas que viviam na região, porém, uniram-se contra as investidas coloniais utilizando táticas de guerrilha. Para combater as forças indígenas, os colonos empregaram todos os recursos, até mesmo a distribuição de objetos infectados para espalhar doenças entre os nativos.
Mesmo com a derrota dos indígenas, a coroa britânica não permitiu o acesso de colonos às terras dos nativos situadas entre os Apalaches e o Mississípi. Com essa proibição, a metrópole pretendia assegurar o controle do comércio de peles na região.
A restrição ao avanço dos colonos para as terras do oeste, somada aos novos impostos, provocou o aumento da tensão entre as Treze Colônias e o governo metropolitano.

Novos impostos ingleses 

Para recuperar as perdas financeiras causadas pela Guerra dos Sete Anos e aumentar o controle sobre suas colônias, o governo britânico criou diversos impostos, que geraram muito descontentamento entre os colonos. São cobrados para cobrir as despesas com uma força militar de 10 mil homens deslocada para a América pelos ingleses. O Parlamento aprova, em 1764, a Lei do Açúcar (Sugar Act) e, em 1765, a Lei do Selo (Stamp Act).
- Lei do Açúcar – também conhecida como Lei da Receita, por meio da qual estabeleceu tarifas alfandegárias para a importação de açúcar, vinho, café e produtos têxteis e de luxo, bem como limitou as exportações de madeira. 
Proíbe a importação de rum estrangeiro e taxa a importação de carregamentos de açúcar procedentes de qualquer lugar que não das Antilhas britânicas. Com essa lei, a metrópole procurou ainda controlar as importações de melaço.
- Lei do Melaço – a coroa britânica já havia tentado impor altos impostos sobre o produto, caso fosse adquirido fora de suas possessões. Contudo, essa lei nunca foi cumprida porque a Grã-Bretanha não conseguia controlar o comércio feito pelas colônias.
- Lei do Selo – Institui a cobrança de impostos sobre documentos, determinando que todos os impressos (livros, jornais, documentos oficiais, certidões, cartazes etc.) deveriam conter um selo real para comprovar que sua circulação havia sido autorizada.
As leis do Açúcar e do Selo são revogadas por pressões dos colonos e dos comerciantes ingleses. Os colonos reagiram com violência, destruindo agências postais, e muitos comerciantes britânicos protestaram, pois os conflitos provocados pela lei atrapalhavam seus negócios. Pressionado, o Parlamento suspendeu a lei no ano seguinte.
- Lei dos Alojamentos – É aprovada em 1765 e exige dos colonos norte-americanos o pagamento pelos alojamentos e alimentação das tropas inglesas.
- Lei do Chá (Tea Act) – É o estopim da crise entre a colônia e a metrópole, pois dá o monopólio do comércio do chá à Companhia das Índias Orientais, depositária dos interesses de diversos políticos ingleses. Com a nova legislação, a Companhia transporta o chá diretamente das Índias para a América, prejudicando os intermediários residentes na colônia.
O governo britânico pretendia, com essa medida, fortalecer a companhia, que enfrentava dificuldades em seus negócios no Oriente. Além disso, visava articular os dois lados do império colonial britânico, que se estendia do Oceano Índico ao Atlântico.
Festa do chá em Boston – Nome pelo qual é conhecida a destruição, em 1773, de três centenas de caixas de chá retiradas dos navios ingleses, no porto de Boston. Disfarçados de indígenas, colonos invadiram navios britânicos ancorados no porto de Boston, capital da colônia de Massachusetts, e despejaram no mar toda a carga de chá.
- Leis Intoleráveis – O nome designa as leis promulgadas pelo Parlamento, em 1774, em represália à revolta da Festa do chá, com o objetivo de conter o clima de insubordinação. 
O porto de Boston foi ocupado e fechado até que os colonos ressarcissem o valor da mercadoria destruída à Companhia Britânica das Índias Orientais. A colônia de Massachusetts foi tomada por tropas metropolitanas, e sua assembleia, fechada.
As demais colônias tiveram de se submeter ao controle militar britânico.
Decretou-se também que os participantes do ataque aos navios seriam julgados por tribunais britânicos, e não pelas cortes coloniais. Mais do que a disputa pelo abastecimento de chá, estava em jogo o domínio britânico na região.
As Leis Intoleráveis provocam a convocação do Primeiro Congresso Continental de Filadélfia (1774), não separatista, cujos participantes pedem ao rei e ao Parlamento a revogação da legislação autoritária como forma de concretizar a igualdade de direitos dos colonos.

O processo de independência (1776-1783)

O processo da Independência tem importante antecedente em setembro de 1774, quando as Leis Intoleráveis determinaram a convocação do Primeiro Congresso Continental de Filadélfia, de caráter não separatista: as principais resoluções do evento foram a desobediência às Leis Intoleráveis, a igualdade de direitos entre os habitantes das colônias e o direito de rebelião.
Em 1775, um conflito em Lexington provocou a morte de alguns colonos e eles passaram a organizar-se militarmente.
O rei declarou os americanos em rebeldia e os colonos passaram à revolta aberta. Um panfleto de Tom Paine, Bom Senso, exortava à luta por liberdade. Em 1776, a Virgínia tomou a iniciativa e declarou-se independente, com uma explícita Declaração dos Direitos do Homem. O Segundo Congresso de Filadélfia, reunido desde 1775, já manifestava caráter separatista. George Washington, da Virgínia, foi nomeado comandante das tropas americanas e encarregou uma comissão, liderada por Thomas Jefferson, de redigir a Declaração da Independência. No documento, defendia-se também o direito dos indivíduos à vida e à liberdade, assim como o de resistir contra a tirania e contra qualquer governo que desrespeitasse esses direitos. Em 4 de julho de 1776, reunidos na Filadélfia, delegados de todos os territórios promulgaram o documento, com mudanças introduzidas por Benjamin Franklin e Samuel Adams.
A Declaração de Independência foi apenas o início da luta pela emancipação. A guerra contra as forças metropolitanas estendeu-se por mais oito anos. No combate aos britânicos, os colonos receberam, após 1777, auxílio militar de franceses, holandeses e espanhóis.
A Guerra da Independência começa em março de 1775: os americanos tomam Boston. Tinham força de vontade, mas interesses divergentes e falta de organização. Das colônias do Sul, só a Virgínia agia com decisão. Os canadenses permaneceram fiéis à Inglaterra. Os voluntários do exército, alistados por um ano, volta e meia abandonavam a luta para cuidar de seus afazeres. Os oficiais, geralmente estrangeiros, não estavam envolvidos no conflito. Vencidos em Nova York e Filadélfia (1777), os colonos ganharam novo ânimo ao ganhar a batalha de Saratoga.
A intervenção francesa foi decisiva. Os franceses estavam afinados com os ideais de liberdade do movimento, estimulados pela propaganda feita por Franklin e motivados pela intenção de golpear a Inglaterra, que lhes havia imposto pesadas perdas em 1763. Assinaram um tratado, transferindo dinheiro aos americanos e buscando a aliança dos espanhóis contra os ingleses. Com a ajuda marítima francesa, a guerra ampliou-se para o Caribe e as Índias. Em 1779, La Fayette conseguiu a liberação de 7 500 franceses comandados pelo general Rochambeau. Em 1781, sitiado em Yorktown, o exército inglês capitulou.
-Declaração de Independência – É redigida por uma comissão de cinco membros liderados por Thomas Jefferson. O documento, com mudanças introduzidas por Benjamin Franklin e Samuel Adams, é promulgado em 4 de julho de 1776, na Filadélfia, por delegados de todos os territórios. A Declaração de Independência dos Estados Unidos é inspirada nos ideais do Iluminismo e defende a liberdade individual e o respeito aos direitos fundamentais do ser humano.
Somente em 1783, com a assinatura do Tratado de Paris, a independência dos Estados Unidos da América foi reconhecida pelo governo britânico, com fronteiras nos Grandes Lagos e no Mississipi. A França recuperou Santa Lúcia e Tobago nas Antilhas e seus estabelecimentos no Senegal. A Espanha recebeu a ilha de Minorca e a região da Flórida.

Da Confederação à constituição

Durante a guerra contra a Grã-Bretanha, os treze estados se organizaram em torno de um governo. Essa união foi estabelecida por meio dos Artigos da Confederação, que teriam validade até que a constituição do país fosse elaborada. O documento, aprovado em 1777, assegurava a autonomia dos estados e atribuía ao Congresso os principais poderes do governo central.
O governo, durante o período da Confederação, teve muita dificuldade para unificar as ex-colônias, que foram fundadas e se desenvolveram de maneira autônoma. Algumas delas relutaram em abrir mão de sua liberdade e chegaram a criar moedas e milícias próprias.
A redação da constituição foi concluída somente em setembro de 1787. Nela foi adotado o modelo federativo, que, embora submetesse os estados ao poder do governo federal, garantia a eles autonomia administrativa, legislativa e de organização militar. O texto constitucional também estabeleceu a divisão do Estado em três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. O Poder Executivo era exercido pelo presidente da república,
o Legislativo foi dividido em duas câmaras (Senado e Câmara dos Representantes), que se reuniam para compor o Congresso, e o Judiciário era conduzido pela Suprema Corte.
A Constituição dos Estados Unidos foi elaborada com o propósito de afirmar e proteger os direitos dos cidadãos estadunidenses. No entanto, a noção de cidadania no século XVIII era bastante diferente da que temos hoje. A palavra “cidadão” referia-se aos indivíduos do sexo masculino livres, brancos e que atuavam politicamente na sociedade.
Alguns estados, como Massachusetts, exigiam ainda um mínimo de renda ou de propriedades para a pessoa participar da vida política. A constituição redigida no final do século XVIII
continua em vigor, tendo sido acrescidas a ela, até o momento, 27 emendas. O primeiro conjunto de emendas foi introduzido em 1789 e ficou conhecido como Bill of Rights (Carta de Direitos). Ele assegurou a liberdade de expressão, de imprensa, de crença, de reunião em espaços públicos e de protesto contra o governo. No entanto, mulheres só conquistaram o direito ao voto nos Estados Unidos em 1920 e os negros, apesar de terem esse direito estabelecido pela 15a emenda desde 1870, foram frequentemente impedidos de votar até 1965, quando uma lei federal proibiu a existência de qualquer dispositivo de discriminação racial no processo eleitoral.

Construindo a nação

A união entre as antigas colônias britânicas durante as lutas de independência mostrou-se temporária. Isso aconteceu, principalmente, porque os estados do norte e do sul tinham interesses diferentes e muitas vezes conflitantes, resultado das condições particulares de colonização das duas regiões.
Desse modo, a união promovida pela guerra de independência não foi suficiente para criar o sentimento de identidade nacional entre os habitantes das ex-colônias, ou seja, a ideia de que eles pertenciam a uma nação.
As tensões se tornaram crescentes, e o debate político parecia incapaz de superar as diferenças. Às tensões políticas somaram-se os problemas econômicos. As batalhas pela independência deixaram o país devastado, com inflação e dívidas enormes. Aqueles que lutaram pela independência saíram da guerra sem nenhuma recompensa, a não ser títulos de propriedade de terras indígenas no oeste do país.
Outro fator importante a ser lembrado é que a independência dos Estados Unidos não garantiu o fim da escravidão nem incluiu os indígenas como cidadãos no novo Estado.
No entanto, do ponto de vista político, a independência foi revolucionária. Com ela, nasceu a democracia moderna, fundada nos ideais do Iluminismo. A experiência estadunidense serviria de exemplo de vitória da soberania popular sobre o jugo metropolitano, especialmente para o restante das colônias na América.

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