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Independência da América Latina

Quase todos os países da América Latina têm duas características comuns: terem se emancipado politicamente nas primeiras décadas do século XIX, e terem se tornado dependentes da Inglaterra logo após a emancipação.

A crise do sistema colonial

Internamente, os principais fatores da crise do antigo sistema colonial foram o próprio crescimento das colônias e o consequente aproveitamento dos conflitos entre estas e os governos metropolitanos. Externamente, a crise se explica pela opressiva política mercantilista adotada em toda a América Latina. As metrópoles, como vimos, procuravam obter a maior renda possível por meio do monopólio do comércio colonial. Além disso, arrecadavam grandes somas por intermédio das cobranças abusivas de impostos nas colônias.
Contribuíram também para a crise do antigo sistema colonial, a Revolução Industrial e a independência dos Estados Unidos. Com a Revolução Industrial, os donos de indústria – necessitando de mercados consumidores cada vez mais amplos – passaram a se opor ao Pacto Colonial e a apoiar a emancipação política das colônias. Já a independência dos Estados Unidos serviu de exemplo para outras colônias americanas. As lutas pela independência na América Latina estão associadas, também, à enorme desigualdade social existente na região.

Desigualdades sociais

Nas sociedades hispano-americanas, era muito grande a desigualdade social entre brancos, índios, mestiços e negros, bem como entre os brancos nascidos na Europa e os nascidos na América.
Os indígenas constituíam a maioria da população; eram descriminados racialmente e duramente explorados nas fazendas e minas. Os mestiços eram vistos como “ilegítimos” e, por isso, proibidos de usar armas, jóias e tecidos de seda. Os negros escravos, numerosíssimos nas ilhas da América Central, viviam nas piores condições.
Os brancos compunham as camadas dominantes da sociedade. Entretanto, era enorme a desigualdade social, entre os chapetones (colonos nascidos na Espanha) e os criollos, mesmo sendo ricos fazendeiros, mineradores, comerciantes e possuindo muitas vezes formação universitária, eram marginalizados do poder político e da administração.
Inferiorizada social e politicamente, a elite criolla liderou a luta pela independência das colônias hispano-americanas.

O Haiti

Durante a conquista, os espanhóis dizimaram quase toda a população indígena da ilha Hispaniola, na América Central, encontrada por Colombo em 1492. Mais tarde, os franceses ocuparam a parte oeste desta ilha e a batizaram de Saint-Domingue. Ai, desenvolveram a agroindústria do açúcar, utilizando o trabalho de milhares de escravos africanos.
Em 1791, os negros, que constituíam cerca de 80% da população local, liderados pelo ex-escravo Vicent Ogé e influenciados pelos ideais da Revolução Francesa, promoveram um violento levante contra a elite branca que os explorava. Vicent Ogé foi morto em combate, mas a rebeldia negra continuou, sob o comando do líder popular Toussaint L’Ouverture. Para afugentar de vez o fantasma da escravidão e libertar sua terra da opressão colonialista, Toussaint organizou um exército popular e iniciou a luta pela independência.
Toussaint L’Ouverture
Durante a luta, esse líder negro foi preso e acabou morrendo numa prisão francesa. Mesmo assim, o movimento rebelde foi adiante e saiu vitorioso, tendo à frente Jean-Jacques Dessalines, outro líder popular negro. Assim, em 1804, nasceu a República do Haiti, primeiro país livre da América Latina.

Lutas pela independência na América espanhola

A partir do século XVIII, tornaram-se frequentes as manifestações contra o abuso e as violências praticadas pela metrópole a seus representantes. Uma delas foi a gigantesca rebelião indígena ocorrida no Peru, em 1780, sob a liderança de Tupac Amaru. Foram mais de 50 mil nativos armados, exigindo o fim da escravidão indígena e a independência do Peru.
Porém, essa revolta social não conseguiu o seu intento. Soldados espanhóis prenderam e executaram Tupac Amaru, sua família e os seus principais seguidores na cidade de Cuzco. Apesar da repressão, outros movimentos de libertação continuaram a explodir em diversos pontos do território hispano-americano.

Os efeitos do expansionismo napoleônico sobre a América

Em 1808, quando Napoleão tomou o trono espanhol à força e o entregou a seu irmão José Bonaparte, os espanhóis reagiram prontamente, pegando em armas para combater os franceses. Na América, de início, as elites criollas foram estimuladas, por agentes enviados pelo próprio Napoleão Bonaparte, a lutar pelo próprio Napoleão Bonaparte, a lutar pela emancipação política no continente americano.

México

Enquanto as elites criollas preocupavam-se exclusivamente em livrar seus países do domínio espanhol, os camponeses do México – índios e mestiços basicamente – desejavam algo mais que a independência: a divisão da terra entre os pobres. Foi com essa intenção que, em 1810, o padre Miguel Hidalgo, à frente de um exército de camponeses que carregavam estandartes da Nossa Senhora de Guadalupe, iniciou uma rebelião contra a metrópole.
Os rebeldes chegaram a conquistar algumas cidades, entre elas Guadalajara. Mas acabaram sendo derrotados por forças governamentais. Miguel Hidalgo foi fuzilado a mando dos próprios criollos mexicanos que, temerosos em perder seus privilégios, uniram-se aos chapetones para reprimir o movimento.
No ano seguinte, um outro religioso, José Maria Morelos, encabeçou um novo movimento de libertação, cujos objetivos eram:
- a independência do México;
- a divisão das grandes propriedades entre os camponeses;
- o fim dos privilégios e a busca da Igualdade social e racial.
Morelos e seus seguidores chegaram a tomar o poder e a romper oficialmente com a metrópole. No entanto, mais uma vez, a elite criolla juntou-se aos espanhóis e conseguiu massacrar os rebeldes. A rebeldia, porém, continuou crescendo. Para sufocar esses movimentos, o governo espanhol confiou o comando das forças repressoras ao coronel Augustin Itúrbide, que havia se destacado na luta contra o padre Morelos.
Entretanto, o oportunista coronel aproveitou-se da situação, fez um acordo com os rebeldes e proclamou a independência do México em 1821, sagrando-se imperador com o nome de Agustin I. Mas devido ao seu autoritarismo, manteve-se no poder por pouco tempo. Em 1823, um movimento liderado pela elite criolla forçou-o a abdicar. Depois de alguns meses, foi proclamada a República.

América Central

Animados pelo exemplo do México, os criollos centro-americanos proclamaram a independência da Capitania Geral da Guatemala em 1821. Mas, no ano seguinte, ela foi anexada ao México pelo imperador Agustin Itúrbide. Reagindo às pretensões expansionistas do imperador mexicano, os centro-americanos desligaram-se de México em 1823 e formaram a República das Províncias Unidas da América Central.
Entretanto, essa união são sobreviveu por muito tempo. Foi desfeita por causa das disputas políticas entre as elites criollas e, também, porque contrariava os interesses do capitalismo inglês, que preferia a América dividida para mais facilmente dominá-la. O esfacelamento das Províncias Unidas da América Central deu origem às republicas independentes da Guatemala, Honduras, Costa Rica, Nicarágua e El Salvador.

América do Sul

Desde o início do século XIX, os países de colonização espanhola da América do Sul organizaram exércitos patrióticos para lutar pela independência. Esses exércitos eram formados, em sua maior parte, por forças populares. Já a direção militar e política da luta esteve sempre nas mãos da elite criolla, que recebeu ajuda militar e financeira da Inglaterra, fato que muito contribuiu para o sucesso da luta. Os ingleses, como vimos, tinham interesses na abertura dos mercados americanos a fim de colocar os seus produtos.
O Paraguai foi o primeiro país sul-americano a conquistar sua independência, em 1811. Para isso, foi decisiva a união entre os criollos de Asución, liderados por Gaspar Rodrigues de Francia, e um exército de libertação enviado pelos argentinos.
O Uruguai continuou fiel à Espanha até 1821, ano em que foi conquistado e incorporado ao Brasil, com o nome de Província Cisplatina. Os uruguaios só conseguiram libertar-se do domínio brasileiro graças a mediação da Inglaterra, que desejava preservar seus interesses na região. Em 1828, depois de três anos de lutas, nasceu a República Oriental do Uruguai.

Na Argentina, a luta pela independência partiu de Buenos Aires e foi comandada por San Martin. O exército de libertação que se formou nessa cidade teve de lutar em duas frentes: contra os espanhóis e contra as províncias do interior que não aceitavam a liderança da capital. Isso contribuiu para atrasar a oficialização da independência, que só ocorreu em 1816, no Congresso de Tucumã. Depois de ter garantido a independência da Argentina, San Martin avançou através dos Andes, acompanhado de 4 mil soldados e auxiliado pelas forças chilenas lideradas por Bernardo O’Higgins. Em 1818, derrotaram os espanhóis e libertaram o Chile. Depois, o chamado “Exército dos Andes” desembarcou na costa peruana, protegido por navios ingleses, e libertou o Peru (1821).
Ao mesmo tempo, um outro exército de libertação, comandado por Simon Bolívar, venceu as forças espanholas sucessivas vezes, libertando a Colômbia (18190), a Venezuela (1821) e o Equador (1822). Finalmente, em 1825, atendendo ao pedido dos habitantes da região mineira de Potosi, o general José Sucre ocupou Lapaz e proclamou a independência da Bolívia.

Simón Bolívar e o pan-americanismo

Nascido em uma família aristocrática de Caracas, Simón Bolívar aparece em posição de destaque porque é considerado um dos principais responsáveis pela organização das lutas pela independência da América espanhola, tendo liderado o processo de independência de diferentes nações, como Bolívia, Equador, Colômbia, Panamá, Peru e Venezuela, de onde foi presidente por mais de dez anos.
Bolívar tinha um projeto político de unidade latino-americana, amparado nas raízes culturais e nos interesses em comum da população que vivia no continente. Para ele, depois das lutas emancipacionistas, os povos da América deveriam se unir como forma de se livrar dos resquícios do domínio colonial no continente e, juntos, terem força no jogo das relações internacionais da época.
Esse projeto ficou conhecido como pan-americanismo, um movimento que tinha como objetivo unificar os territórios da América espanhola sob uma única liderança. Porém, ele não se transformou em realidade. Os povos dominados pela Espanha se organizaram, de acordo com suas identidades políticas e culturais, em torno de diferentes países, cada qual com seu próprio governo e com sua própria organização de Estado.
Apesar disso, em 1826, Bolívar e seus aliados organizaram um congresso no Panamá para aproximar os países da América Latina. As elites criollas, temendo perder o controle de muitas regiões, opuseram-se e inviabilizaram o projeto.
Simon Bolívar

Reações externas à Independência

Nas lutas para impedir a libertação de suas colônias americanas, a Espanha contou com suas próprias armas e também com a ajuda dos exércitos da Santa Aliança. Apesar disso, foi derrotada graças à ação da Inglaterra e dos Estados Unidos, que apoiaram abertamente a emancipação política da América Latina.
A Inglaterra colocou-se ao lado dos países latino-americanos porque esperava transformá-los em mercados fornecedores de matérias-primas e consumidores de produtos industrializados. Os Estados Unidos, por sua vez, desejavam estender sua influência política e econômica sobre toda a América. Por isso, colocaram-se radicalmente contra a intervenção europeia em qualquer das nações latino-americanas. Prova dessa intenção é a Doutrina Monroe em 1823, cujo lema era a “América para os americanos”.

Negros, indígenas e mulheres

De fato, as guerras pela independência iniciadas nas regiões de Caracas (sob a liderança de Bolívar) e de Buenos Aires (lideradas por José de San Martín) foram movimentos protagonizados pelos criollos, ou seja, representantes das camadas altas da sociedade colonial, como donos de terras e comerciantes. Porém, esses movimentos se espalharam junto a outros grupos sociais, e, ao longo do continente, negros, indígenas, mestiços e camponeses tiveram grande participação nas batalhas travadas, o que foi deixado de lado na obra do artista.
Durante o período colonial, as populações negras e indígenas sofreram um processo de exclusão nos territórios coloniais. As práticas escravistas e a exploração compulsória do trabalho indígena resultaram em diversas formas de violência e limitaram a participação desses grupos em espaços de decisão política. Com o processo de independência, essa situação pouco mudou, e indígenas e negros tiveram seus direitos de cidadania negados na quase totalidade dos novos Estados.
Na região do México, o movimento emancipacionista começou justamente entre os representantes das camadas mais baixas da população. Ali, negros, camponeses, indígenas, mestiços e
mulheres, sob a liderança de religiosos como o padre Miguel Hidalgo e José Maria Morelos, protagonizaram as lutas contra a dominação espanhola. Apesar dessa grande participação popular, quando o México se tornou independente, em 1821, o país ficou sob o controle de um líder criollo.

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