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Revolução e ditadura na América Latina

 A Revolução Cubana

Desde 1898, quando Cuba tornou-se independente da Espanha, até 1958, quando era governada pelo ditador Fulgêncio Batista, os governos cubanos sempre contaram com o apoio dos Estados Unidos. A economia cubana, baseada na agroindústria canavieira, era totalmente dependente das importações e dos capitais norte-americanos.
Entre 1956 e 1958, um movimento guerrilheiro, liderado, entre outros, por Fidel Castro e Ernesto Che Guevara, derrubou o governo e seus líderes tomaram o poder em Cuba. O novo governo confiscou e estatizou propriedades norte-americanas e realizou a reforma agrária. Dois anos depois, em 1961, Cuba se proclamou um país socialista.
A Revolução Cubana eliminou o analfabetismo, reduziu a mortalidade infantil e o desemprego no país. O acesso à moradia e à saúde pública foi facilitado. Essa revolução serviu também de exemplo para outros movimentos de contestação na América Latina.
Em 1962, os Estados Unidos decretaram o bloqueio econômico e político a Cuba. Na mesma ocasião, Cuba foi expulsa da Organização dos Estados Americanos (OEA).
No mesmo ano, os governos de Cuba e União Soviética decidiram instalar, na ilha, bases de mísseis nucleares voltados contra alvos norte-americanos. Como resposta, os norte-americanos realizaram um bloqueio naval a Cuba e exigiram a imediata retirada dos mísseis. Os soviéticos desativaram as bases, com a condição de os norte-americanos não intervirem em cuba.

Intervenções na América Latina

A Revolução Cubana significou uma ameaça à influência dos Estados Unidos na América Latina. No auge da Guerra Fria, Cuba era um país socialista na área de influência dos Estados Unidos, o líder do bloco capitalista.
A necessidade de conter movimentos populares ou de esquerda fez com que os Estados Unidos apoiassem golpes de Estado e intervenções militares, eliminando governos democráticos ou populistas, além de intensificar sua presença na região.
A maior parte da América Central e do Caribe vivia desde o século XIX sob influência política e econômica norte-americana. Após a Revolução Cubana, a presença militar dos Estados Unidos se intensificou na região, para evitar que as diferenças sociais, tão presentes naquela parte da América, se tornasse o combustível de revoltas populares inspiradas no sucesso da Revolução Cubana.

A Nicarágua

Um dos mais significativos movimentos revolucionários da América Latina ocorreu na Nicarágua.
Desde a década de 1930 a Nicarágua era dominada por uma ditadura controlada pela família Somoza. Ao pai sucedia o filho e assim por diante. Na década de 1960, um grupo de estudantes e intelectuais organizou um movimento destinado a derrubar aquele sistema de governo. O nome do movimento: Frente Sandinista de Libertação Nacional.
A palavra sandinista vem de Sandino, nome de um herói da Nicarágua. Na década de 1930, Sandino combateu o governo, em nome da liberdade e da independência econômica do país, então dominado por empresas norte-americanas. Convidado a negociar, Sandino aceitou, mais foi traído e assassinado.
Graças ao apoio popular, a Frente Sandinista conseguiu vitórias na sua luta e, em 1979, venceu a ditadura. Somoza foi derrubado e fugiu para o Paraguai. Os líderes da frente assumiram o governo.
Os primeiros decretos do novo governo determinaram a expropriação de todos os bens da família Somoza (que correspondia a 40 % da economia nacional), a criação de tribunais revolucionários, a garantia de liberdade de imprensa e de opinião, reunião partidária e sindical e a estatização de todos os bancos.
Um ano depois começaram os desentendimentos internos. Dois membros não-sandinistas da junta de governo renunciaram; formaram-se também vários grupos anti-sandinistas, chamados de “contras”, armados e treinados pelos Estados Unidos.
Apesar dos esforços do governo revolucionário para erradicar o analfabetismo e a miséria, uma crise econômica aguda afetava o país. Nas eleições realizadas em fevereiro de 1990, a oposição saiu vitoriosa. Violeta Chamorro tomou posse em abril do mesmo ano, pondo fim ao governo sandinista.

Militares no poder

Não foram só os Estados Unidos que se preocuparam com a passagem de Cuba ao socialismo.
Na década de 1960, setores das classes dominantes e militares de muitos países latino-americanos organizaram golpes para assumir o controle do Estado e impedir o fortalecimento dos projetos de esquerda. Há muitos exemplos de golpes militares de direita: o Brasil, em 1964; a Argentina, em 1976; o Uruguai, em 1973.
Nem sempre os Estados Unidos atuavam diretamente na política desses países. Em alguns casos, porém, seu apoio à intervenção militar foi decisivo. O golpe militar no Chile em 1973 é o melhor exemplo.

A ditadura chilena

Em 1970, foi eleito no Chile um presidente socialista, Salvador Allende. O presidente eleito estava realizando a reforma agrária, promovendo a alfabetização, a melhoria do sistema de saúde, nacionalizando as minas de cobre e intervindo no sistema financeiro. Essas medidas, de tendência socialista, provocaram a reação das elites do país e do governo dos Estados Unidos.
Em 1973, com apoio norte-americano, Allende foi derrubado por um golpe militar e morreu durante a invasão do palácio de La Moneda, sede oficial do governo chileno.
O general Augusto Pinochet, o novo chefe do governo, dissolveu os partidos políticos e perseguiu os simpatizantes de Allende. Os opositores passaram a ser presos, torturados ou executados. Durante a ditadura civil-militar chilena, cerca de 3 mil pessoas foram assassinadas e aproximadamente 200 mil foram para o exílio.

Em 1988, um plebiscito decidiu pelo fim do governo de Pinochet. Ocorreram então eleições em 1990 e as oposições elegeram um presidente civil. Apesar dos protestos da sociedade chilena, Pinochet e outros militares não foram imediatamente julgados pelas acusações de torturas e assassinatos de milhares de presos políticos.

Paraguai: 1954-1989

Em 1954, um golpe de Estado colocou no poder o general Alfredo Stroessner, que implantou uma ditadura.

Em eleições caracterizadas por fraudes, Stroessner foi eleito presidente do Paraguai por sete mandatos consecutivos. A ditadura paraguaia estabeleceu que para ter acesso às universidades ou aos cargos públicos era necessário filiar-se ao Partido Colorado. Além disso, foi montada uma ampla rede de delação no país, provocando a morte e a prisão de milhares de opositores do regime.

Uruguai: 1973-1985

O Uruguai, assim como outros regimes ditatoriais da América do Sul, fez parte da Operação Condor, uma aliança dos regimes ditatoriais com os Estados Unidos para perseguir as pessoas identificadas como comunistas, socialistas e marxistas. Em 1976, refugiados políticos uruguaios foram capturados e torturados com o apoio das Forças Armadas dos Estados Unidos. 

Peru: 1968-1980

Durante a ditadura civil-militar no Peru, mais de 70 mil pessoas morreram nos confrontos entre Exército e guerrilheiros. Assim como nos demais países da América Latina, a ditadura peruana contou com apoio do governo dos Estados Unidos. 

Bolívia: 1964-1982

Che Guevara, um importante líder de esquerda, que participou da implantação do regime socialista em Cuba, foi morto em 1967 pelo Exército boliviano com ajuda da CIA. 

Brasil: 1964-1985

A CIA colocou em prática uma extensiva campanha de propaganda contra João Goulart, o presidente brasileiro, que acabou destituído e substituído por uma ditadura civil-militar. Ele havia iniciado uma série de reformas que limitava os lucros de empresas transnacionais, incluindo as estadunidenses. 

 A ditadura no Chile 

Em 1970, a população do Chile elegeu como presidente o socialista Salvador Allende, que se candidatou por uma coligação de diversos partidos de esquerda: a Unidade Popular. Seu programa de governo previa a nacionalização de grandes empresas multinacionais, do sistema financeiro e das minas de cobre, ferro, salitre e carvão, assim como o aumento do salário dos trabalhadores e o congelamento do preço de diversas mercadorias. Além disso, o governo de Allende tinha como objetivo aprofundar o processo da reforma agrária no país. Esses projetos causaram preocupação na elite e na classe média conservadora.

Inicialmente, as medidas tomadas pelo governo melhoraram a economia chilena, mas a retaliação dos Estados Unidos – que impuseram sanções econômicas ao país – provocou desequilíbrio na balança comercial e aumento da inflação, acirrando os ânimos da população, que sofreu com o desabastecimento de mercadorias e paralisações. Na campanha para desestabilizar o governo de Allende, os Estados Unidos fortaleceram o setor conservador chileno, do qual fazia parte a cúpula militar do país.

O golpe de Estado 

Nesse contexto, as forças armadas chilenas, apoiadas pelos Estados Unidos e pelo governo brasileiro, executaram um golpe de Estado.

Em 11 de setembro de 1973, o Palácio de La Moneda, sede presidencial do país, foi bombardeado por setores das forças militares.

Apesar da resistência, Allende foi encontrado morto a tiros dentro do palácio invadido. Por meio de um exame realizado em 2011, verificou-se que a causa da morte foi suicídio. 

A ditadura de Pinochet 

Após o golpe de Estado, o general Augusto Pinochet assumiu o poder no país, adotando um programa econômico muito diferente daquele implementado pelos militares no Brasil.

Enquanto o projeto de desenvolvimento econômico brasileiro foi marcado pela direção estatal, no Chile prevaleceu a lógica do Estado mínimo, pautado pela redução do gasto público e do papel do Estado, assim como pela ampliação das exportações e reformas trabalhistas.

A liberalização da economia, no entanto, não foi acompanhada pela liberdade política. A prosperidade econômica do Chile teve como contrapartida o cerceamento das liberdades individuais e a violação de direitos humanos em escala e intensidade sem precedentes na América Latina. No período, a repressão foi brutal. Mais de 40 mil pessoas foram presas, torturadas ou assassinadas pela ditadura chilena.

Aliados e membros do governo Allende que não conseguiram sair do país foram presos ou mortos e nem todos os que deixaram o Chile foram protegidos. Orlando Letelier, ministro de Allende, foi assassinado em um atentado a bomba a mando de Pinochet, mesmo estando exilado nos Estados Unidos. 

O governo de Pinochet dissolveu os partidos políticos e reestruturou as forças armadas para garantir total controle sobre as tropas.

Além disso, os jornais passaram a sofrer intensa censura, e os intelectuais oposicionistas foram afastados de seus cargos nas universidades.

Sob o terrorismo de Estado, a prática da tortura disseminou-se atingindo não só chilenos, mas também estrangeiros exilados que fugiam de perseguições políticas em seus países de origem. 

O retorno à democracia 

O Chile foi um dos países em que o mesmo ditador permaneceu no poder por mais tempo: dezessete anos. Pinochet deixou a Presidência apenas em 1990, depois do plebiscito de 1988 e da eleição de 1989.

No plebiscito, a população deveria votar pela continuidade ou não do governo de Pinochet. As propagandas a favor do “sim” e do “não” foram veiculadas principalmente pela televisão, o que demonstra a influência desse meio de comunicação na política e na cultura da América Latina. Esse plebiscito pode ser entendido como um julgamento público da ditadura. A maioria da população votou “não”.

A ditadura na Argentina

Entre 1930 e 1976, a Argentina sofreu seis golpes de Estado. No último deles, em março de 1976, Isabel Perón, presidente do país na época, foi obrigada a deixar o governo, iniciando-se uma violenta ditadura, que perdurou até 1983.

O governo ditatorial, constituído por uma junta militar, nomeou o general Jorge Rafael Videla presidente e estabeleceu um regime de terrorismo de Estado. Todos os que se opuseram ao governo – operários, estudantes, intelectuais, artistas ou profissionais liberais – foram perseguidos sistematicamente pelo governo militar, que se autointitulou Processo de Reorganização Nacional.

Organismos de direitos humanos calculam que cerca de 30 mil pessoas morreram ou foram forçadamente desaparecidas nesse período, e outros milhares, presos e exilados. Os sindicatos e os partidos políticos foram impedidos de se manifestar, pois a censura se instalou no país. 

Sequestros e desaparecimentos como políticas de Estado Na Argentina, o governo raptou e sequestrou centenas de filhos de ativistas da oposição. Estima-se que 250 adolescentes desapareceram forçadamente e 500 crianças foram sequestradas, muitas delas separadas de seus pais logo após o nascimento.

Centenas de Centros Clandestinos de Detenção, onde se fazia o extermínio dos opositores ao governo, funcionavam tanto em instalações públicas (presídios, quartéis ou escolas) quanto em propriedades privadas. Nesses locais, as pessoas eram torturadas, assassinadas e dadas como “desaparecidas”. 

Formas de resistência e o fim da ditadura 

Entre os movimentos de resistência à ditadura, um dos mais emblemáticos é o das Madres y Abuelas de la Plaza de Mayo (Mães e Avós da Praça de Maio), que desde 1977 se dedica a obter informações sobre o paradeiro de crianças e jovens sequestrados durante a ditadura. Até o final de 2019, o grupo havia conseguido localizar 130 desaparecidos forçados.

Apenas em 6 de dezembro de 1983, a junta militar assinou a própria dissolução. Apesar dos esforços dos militares para destruir arquivos e anistiar-se, a Argentina é hoje o país sul-americano que mais se empenha em investigar os crimes do período ditatorial.

Mais de mil indivíduos que participaram do sistema repressor foram condenados.



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